DECLARAÇÃO
Ex.mo
Sr. Dr. Gilson Roberto de Melo Barbosa
DD.
Representante do Ministério Público.
Soube
por intermédio de minha sobrinha Márcia
Maria Vidal Neves, filha da já falecida,
ex-presa política, Maria Celeste Vidal
Bastos, que além da documentação já
apresentada a esta autarquia, solicitava
V.Ex.a documentos que atestassem violência
contra a mesma durante os terríveis
dias passados, desde o Buck da Secretaria
de Segurança na Rua da Aurora, às
maratonas aos quartéis do IV Exército
e ao porão da casa de Detenção, período
este de verdadeiro terror. Eu
como irmã de Maria Celeste, torno
a liberdade de solicitar a V.Ex.a
que aceite este depoimento, o que
de antemão agradeço.
1. Existe
violência maior do que afastar sem
dó nem piedade, uma mãe de 3 filhos,
crianças cuja faixa etária era entre
10 e 12 anos e deixá-los entregues
a própria sorte?
2. Demitir
sumariamente uma professora com 17
anos de magistério, tirando o ganha
pão dos 3 filhos, pelo fato dela ser
simpatizante de qualquer facção política
ideológica? 3. Jogar
esta mesma professora nos porões da
Casa de Detenção, local onde eram
colocados os presos que enlouqueciam,
convivendo com enormes ratazanas que
vinham com ela disputar as migalhas
de pão? Eu sou testemunha, pois era
a única pessoa que, após o período
de incomunicabilidade vivido por ela
no Buck da Rua da aurora, por ser
irmã tive a autorização de visitá-la
aos domingos, uma vez que nossos pais
já eram falecidos e os filhos pequenos,
a estas alturas, estavam espalhados
pelo Sertão em casa de parentes e,
terminei ficando detida por um dia,
pois um guarda comentou: “Ramalho
coloca ela lá dentro, é irmã de Celeste,
deve ser da mesma laia”.
4. Quanto
A tortura física, acha V.Ex.a que os algozes iam colocar testemunhas
para assistir? E ela com a dignidade que possuía nada dizia para
não aumentar o meu sofrimento, mas de “ouvi dizer” muita coisa
comentou-se sobre o assunto: tortura a presos políticos. Mas quem
poderia melhor falar sobre estas torturas, seria Dra. Mércia Albuquerque
que foi advogada e confidente, inclusive guardando documentos
pessoais e confidenciais corno uma carta de Celeste para o então
Governador MIGUEL ARRAES.
Só
sei dizer Dr. Gilson que ela apresentou grande sequela auricular,
proveniente dos “telefones” recebidos nos interrogatórios. Ao
deixar a prisão após 3 anos ou mais de sofrimento, fez consultas
a otorrinos, mas nunca ficou curada da “cachoeira” que sentia
a despejar água em sua cabeça.
Por
tudo isso e por tudo mais que ela passou, espero da sensibilidade
de V.Ex.a a aceitação deste meu depoimento, fruto de muita dor
e sofrimento.
Que
Deus ilumine as decisões de V.Ex.a
e de toda equipe que cuida do caso
de minha irmã e de todos que passaram
o que ela passou. Muito
obrigada,
NEUSA
VIDAL
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