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Origem e História da assistência

Jurídica e da Defensoria Pública

A idéia de Defensoria Pública como instituição organizada é, de certa forma, uma idéia recente. No entanto, a consciência de que aos necessitados deve-se garantir o acesso à Justiça e o direito a igualdade, remonta aos tempos mais antigos da sociedade.

É desta forma, que, o Código de Hamurabi admitiu um tratamento especial e um limite às cobranças por empréstimos dados a quem tivesse insuficiência de recursos.

“Teria que ter no mínimo um defensor para cada vara. E não é assim.”
Paula Brasil – Secretária da 6ª Vara do Júri

já em Atenas, na Grécia antiga, podemos vislumbrar uma atuação mais concreta junto aos pobres. Nesta região eram designados anualmente dez advogados para defender esses menos favorecidos contra os poderosos diante dos tribunais civis e criminais. Em Roma, existiam diversos dispositivos legais que resguardavam os direitos dos necessitados, e era uma questão de honra para os governantes, observar se seus governados mantinham entre si uma certa igualdade perante a lei, cabendo a estes governantes sanar qualquer abuso.

Entretanto, é somente com a Revolução Francesa, em 1789 que o Estado passou a organizar instituições oficiais a fim de prestar assistência judiciária aos pobres. É que, junto com a Revolução Francesa, foi proclamado o Princípio da Igualdade perante a lei, e com esta proclamação adveio a necessidade clara de que ao Estado cabia responsabilizar-se, através de instituições organizadas, pela minimizarão das desigualdades sociais em favor de uma suposta igualdade jurídica.

No Brasil, Pinto Ferreira ensina-nos que já as ordenações Afonsinas amparavam aos miseráveis (Liv. 3º, Tit. 8º; Liv. 3º, Tit. 5º). Não obstante, a maioria dos estudiosos sobre o assunto, atestam como primeiras manifestações sobre assistência jurídica, em nosso país, as ordenações Filipinas, promulgadas em 1603. Transcreveremos, então, parte do diploma, a qual nos interessa:

“Em sendo o aggravante tão pobre que jure não ter bens móveis, nem de raiz, nem por onde pague o aggravo, e dizendo na audiência uma vez o Pater Noster pela alma del Rey Don Diniz, ser-lha-á havido como que pagasse os novecentos reis, contanto que tire de tudo certidão dentro do tempo, em que havia de pagar o aggravo.”

Embora esta Ordenação date de 1603, somente em 1823, estes dispositivos vieram a vigorar por força de lei. Alguns anos depois, outros dispositivos vieram sobre formas de leis e regulamentos, estabelecendo, de forma mais concreta a assistência judiciária no país. Em um primeiro momento, essas leis disciplinavam essa assistência em processos penais. Entretanto, posteriormente, outras leis vieram lhe dar um caráter mais abrangente compreendendo o processo civil.

“Quem dá acesso à justiça é o defensor público.”

(Sérgia Miranda – Juíza)

sabemos que, à época do Império, o Estado não se onerava com o patrocínio da assistência judiciária, através de instituições oficiais. Cabe, neste momento, então uma indagação: quem exercia durante este período, o patrocínio dessa assistência aos pobres?

A única resposta é que ou os pobres ficavam completamente desamparados juridicamente ou este serviço acabava por recair sobre a classe dos advogados. Ora, vejamos, a estes profissionais restava acumular seus serviços particulares, dos quais dependia sua sobrevivência, com a “caridosa” prestação da assistência judiciária gratuita. Obviamente, tal sistema mereceu justas críticas por parte de muitos estadistas, aos quais não agradava a ver a força de trabalho destes profissionais explorada, gratuitamente, pelo Estado. Tornou-se evidente o clamor de uma nova construção legislativa que regulasse de maneira mais justa o assunto.

“Trabalho com aproximadamente 2.000 processos

“(Hélio Gomes – Defensor Público)

neste período, também, foi criado pelo Instituto dos Advogados Brasileiros um conselho com o escopo de prestar assistência judiciária aos necessitados em causas civis e criminais. No entanto, este conselho não conseguia realizar com total satisfação este serviço. As demandas eram muitas e os custos incalculáveis, o que ocasionava por fim um completo desrespeito ao princípio da igualdade perante a lei. Fazia-se imprescindível que o Estado criasse uma legislação, efetivamente, capaz de tal prestação; uma legislação que concedesse tanto um advogado, como a isenção de custas processuais aos pobres. Mas é com a Proclamação da República que surgem as primeiras regulamentações sobre o patrocínio oficial da assistência judiciária pelo Estado.

A primeira Constituição Republicana, de 24 de fevereiro de 1891, não elevou a assistência judiciária à matéria constitucional, mantendo-se omissa sobre o assunto. No entanto, esta Carta já fazia alusão à uma plena defesa que deveria realizar-se com todos os recursos e meios essenciais a ela. (CF/1891, art. 72, § 16).

Alguns anos após a promulgação desta Constituição, uma legislação infraconstitucional veio a organizar a assistência judiciária no Distrito Federal. Serviu este sistema de exemplo a ser seguido, posteriormente, por alguns estados-membros, como Rio Grande do Sul, São Paulo, Minas Gerais e Bahia.

“A maioria dos defensores trabalha mesmo, se dedica, tem todo empenho”

(Dra. Benedita – Diretora da CAJE).

No século XX, no início da década de 30, foi criada a Ordem dos Advogados do Brasil e assistência judiciária passou a não ser mais “recomendada” ao advogado; elevou, então, à categoria de obrigação a este profissional, a ser cumprida sob pena de multa.

A prestação da assistência judiciária tornou-se matéria constitucional a partir da Carta Política de 1934, que a incluiu entre os Direitos e Garantias Individuais dos cidadãos (art. 113).

“n. 32. A União e os Estados concederão aos necessitados assistência judiciária, para esse efeito, órgãos especiais, e assegurando a isenção de emolumentos, custas, taxas e selos.”

“Apesar de às vezes questionada, eu entendo como necessária a atuação da D.P. em casos coletivos”

(Dra. Jacirema – ex-Presidente da ADPEL).

Como podemos observar esta Constituição trouxe à assistência judiciária importantes inovações, entre outras:

1.      a competência concorrente9 da União e dos Estados para a concessão deste préstimo;

2.      a criação de órgãos especiais e organizados com a finalidade desta prestação; e

3.      a primeira alusão constitucional à justiça gratuita, através da “isenção de emolumentos, custas, taxas e selos”.

Em 1935, cumprindo o que determinava esta Constituição, o Estado de São Paulo criou o primeiro serviço governamental de assistência judiciária no Brasil. Este órgão contava com advogados assalariados, pagos pelo poder público.

“O trabalho desses abnegados advogados é fundamental

3para a tramitação dos processos”

(José Gualberto Sá – Promotor de Justiça).

Concomitantemente, a OAB permanecia, embora precariamente, prestando a assistência judiciária gratuita nos Estados que não possuíam órgãos oficiais para tal fim.

A Constituição do Estado Novo, que foi outorgado no período de ditadura de Getúlio Vargas, não previa a assistência judiciária em seu texto (como é de se esperar de uma Constituição Ditatorial, fruto de um período de quebra do período democrático). Não obstante, o Código d3e Processo Civil, de 1940, prescreveu em si esse patrocínio passando este preceito a ser infraconstitucional.

A assistência judiciária volta ao texto da Constituição de 1946 (art. 141):

“§ 35. O poder público na forma que a lei estabelecer, concederá assistência judiciária aos necessitados”.

Como vemos o texto assegura aos necessitados essa prestação, a ser concedida pelo poder público. No entanto, não especifica quem a prestará: se o Estado ou a União, permanecendo concorrente esta competência.

Esta omissão quanto à competência de quem deverá patrocinar a assistência aos necessitados, assim como, a omissão quanto aos meios de propiciá-la, fez com que cada Estado-membro tomasse posicionamento diante do tema. Vários Estados, a partir de então, criaram órgãos oficiais específicos para a prestação desta assistência. E, outros vários Estados passaram a credenciar advogados especiais para o serviço, sem se deter à criação de órgãos específicos.

“Com o defensor, nós evitamos que presos primários cheguem aos presídios e convivam com outros já peregrinos e com isso fica difícil sua recuperação”.

(Edval Amorim – Delegado de Polícia)

Em 1950, foi publicada a Lei Federal nº 106011, que condensou toda a legislação, antes dispersa, sobre o assunto. De grande importância, esta lei significou um avanço substancial neste matéria, embora tenha confundido dois conceitos técnicos completamente diferentes: assistência judiciária e justiça gratuita.

É preciso fazer a diferenciação entre esses dois importantes conceitos, por assistência judiciária, como nos ensina José Roberto Castro, devemos entender a faculdade legal concedida àquele com insuficiência de recursos de obter o apoio do Poder Jurisdicional, nos casos de violação de seus direitos; ou ainda, devemos entendê-la como o órgão estatal encarregado de prestar a concessão de advogado a esse necessitado. E por justiça gratuita, consequência da assistência judiciária, compreendamos a isenção de custas, taxas, emolumentos e honorários aos carentes.

Retomemos nossa evolução histórica e iremos perceber que a Constituição de 1967, assim como a Emenda C3onstitucional nº 01/69, mantiveram a mesma orientação da Carta de 1946.

O fato é que a situação mostrou-se sempre insatisfatória. Muitos Estados acabaram por não criar órgãos específicos para esta prestação e a União se sentia sem responsabilidade para com o assunto. A única solução foi que, nos Estados que não mantivessem órgãos oficiais, obrigava-se o poder público a pagar advogados dativos, designados pelo juiz. Entretanto, isso só ocorria nos processos criminais.

“O número de defensores não é suficiente para atender

uma população tão grande”.

(Orlandina Costa – Delegada de Polícia)

Mas estas eram soluções apenas paliativas, o certo é que o clamor por uma legislação realmente eficaz só veio a ser atendido com a promulgação da Constituição Cidadã de 1988. É com a Carta Política que surge a instituição Defensoria Pública, essencial à função jurisdicional do Estado e incubida da orientação jurídica e defesa em todos os graus da comunidade carente. Até então, o que existia era a “assistência judiciária” como sendo o direito do cidadão sem recursos de obter do Estado (o que também comporta um dever do Estado de conceder) a tutela jurisdicional gratuita.

Justo se faz reconhecer o avanço trazido pela atual Carta, que caminhou em passos longos pela concretização de antigos anseios populares, qual seja, o de institucionalizar o órgão afeito à defesa da comunidade necessitada, judicial e extrajudicialmente, na busca de seus direitos, enfim, de sua cidadania. É nesse molde que, a Defensoria Pública se torna uma “Instituição tipicamente social”.

ACERCA DA LLEGISLAÇÃO

QUE TRATA DO ASSUNTO

A Lei Nº 1.060 e a assistência judiciária

Esta lei, editada em 1950, e ainda em vigor em relação à matéria que disciplina a concessão da justiça gratuita, constituiu um substancial avanço, determinando a quem compete a concessão da assistência judiciária, isto é, prescrever a competência da União e dos Estados-membros.

A Lei Federal Nº 1.060 avança, ainda, ao conceituar os beneficiários da assistência judiciária, como “todo aquele cuja situação econômica não lhe permita pagar as custas do processo e os honorários de advogado, sem prejuízo do sustento próprio ou da família”. (art. 2º, parágrafo único). Compreende-se assim o necessitado no sentido legal, sem entender-se, evidentemente como “indigente”.

As legislações que, atualment9e, tratam da Defensoria Pública continuam a usar a expressão “necessitado” para a designar a clientela desta instituição. No entanto, em vista da conjuntura que hoje nos encontramos, não podemos mais conceituar “necessitados” só tendo em vista a situação financeira do indivíduo.

“O defensor público é realmente o primo pobre do Estado, aquele que ganha menos, que não tem garantias e os direitos que os outros têm”.

(Raimundo Brandão – Sub-Secretário de Justiça)

Nos dias atuais, a idéia de necessitado deve abandonar o conceito individualizado e transpor-se ao terreno da coletividade, onde os indivíduos devem ser encarados como membros de setores postos à Margem da Sociedade.

E ao nos indignarmos quem são os necessitados, tal resposta nos salta aos olhos, são os sem-terra, os sem-casa, os favelados, os presos, os ex-presidiários, os homossexuais, as prostitutas, os negros, os menores abandonados, os menores infratores, os economicamente fracos, os desempregados, os aposentados, os idosos, os índios, as vítimas, enfim, todos esses que carregam sobre os ombros uma carga de preconceito e vivem divorciados do direito estatal, formadores de uma ordem: os excluídos.

Esta nova compreensão do termo “necessitado” se faz imprescindível para que a DP, verdadeiramente, atue como a intermediária entre o Poder Público e a Pessoa como membro da sociedade, capacitando os despossuídos a pleitear seus direitos fundamentais perante os órgãos competentes.

É importante salientar que até o presente momento este benefício da assistência gratuita, infelizmente, em nossa prática forense, mostra-se inadequado ao fim colimado, e desta forma, incompatível com um moderno Estado Democrático de Direito.

A CONSTITUIÇÃO E A ASSISTÊNCIA JURÍDICA INTEGRAL

A Constituição Federal DE 1988, TROUXE IMPORTANTES INOVAÇÕES SOBRE O TEMA.

O ART. 134 desta carta prevê, sob a forma de direito subjetivo público, a institucionalização da Defensoria Pública na forma do art. 5º, LXXIV. Este último artigo dispõe:

“LXXIV. O Estado prestará ‘assistência jurídica integral’ e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos”. (grifos nossos).

Podemos percebe3r que o constituinte abandonou a antiga expressão “assistência judiciária” adotando agora a “assistência jurídica integral” em substituição àquela. Talvez essa sutileza passe de3spercebida para alguns, mas a adoção desta nova expressão vislumbra uma nova forma de encarar os trabalhos a serem realizados pela Defensoria Púbica.

É notório que a Assistência Judiciária adsteve-se, até hoje, a promover em Juízo os direitos da carente, abrindo, inclusive, espaço para o uso pejorativo dos termos “o assistencialismo do Estado”. Nas palavras do Procurador Pedro Egydio de Carvalho, esta “restrição desemboca no que chamamos atendimento casuístico, incapaz por sua índole hermética, de gerar consequências para o grupo a que pertence a pessoa atendida naquela causa.

E foi exatamente assim que se comportou a Assistência Judiciária, patrocinando o entendimento individual e descomprometido com a realidade social em que o indivíduo necessitado estava inserido.

“Nós entendemos que a D.P., com um apoio maior do governo, tem condições de dar um grande salto de qualidade na questão do atendimento, às pessoas carentes do Estado do Ceará”.

(Paulo Duarte – Secretário de Justiça)

A expressão “assistência judiciária integral” veio, então, como grande avanço à prática anterior à Carta Magna de 1988. O autor, acima citado, assim compreende o assunto:

“o adjetivo composto – “jurídico integral”- é revelado de uma dupla finalidade do dispositivo em exame: a) a assistência transcende o Juízo, não se contenta em ser judiciária: é jurídica, isto é, efetiva-se onde estiver o Direito; b) a assistência é integral, ou seja, não se esgota na parte, na unidade, mas visa integrar as seções e facetas de um todo, visa em uma palavra, coordenar os diversos grupos sociais, desintegrados do conjunto por sua marginalização”.

A Defensoria Público figura nessa nova percepção de realidade, como agente mestre dessa construção. É instituição responsável pela intermediação do Estado e daqueles grupos denominados de excluídos, com o intuito de quebrar o hiato existente entre esses setores.

Em consonância com essa “assistência judiciária integral” o art. 134, “caput”, da CF/88 disciplina:

“A Defensoria Pública é instituição essencial à função Jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a ‘orientação jurídica’ e a defesa, em todos os graus, dos necessitados, na forma do art. 5º, LXXIV”.

Podemos notar que amparo legal para a transformação da realidade assistencialista em que hoje nos enco3ntramos, nos foi dado a partir da previsão de um ideal de Defensoria Pública incumbido, não só na defesa dos necessitados, e sim de um “orientação jurídica” aos necessitados.

A chave da inovação se expressa no vernáculo “orientação”. Como vemos se rompe a estrutura autoritária do profissional do direito, verso a vitimização do carente. Extrapola-se, com tal dispositivo, a arcaica mitificação do Direito, que não se restringe só à Defensoria Pública, como a todas as instituições no mundo jurídico. É o eterno e crescente afastamento entre a Justiça e o povo, isto é, a especialização cada vez maior dos profissionais e rebuscamento das legislações em contraposição à crescente alienação do povo relativa à sua cidadania.

“A D.P. é um órgão que ainda não encontrou por parte da sociedade o devido respaldo para que possa desenvolver sua importante função”.

(Mário Mamede – Deputado Estadual)

Por “orientação jurídica” devemos compreender uma ação conjunta entre o defensor e a pessoa, ultrapassando o serviço meramente defensivo. Atingir-se-ia, assim, uma postura de assessor jurídico público, atuando não só no Judiciário, mas muito além dele, através da construção constante de uma verdadeira cidadania popular. Acima de tudo sairia o defensor de seu pedestal de neutralidade, descendo realmente à situação social em que se insere sua clientela e tornando-se, assim, um legítimo ator político.

A DEFENSORIA E AS GARANTIAS CONSTITUCIONAIS

Na posição da ator político, a Constituição Cidadã conferiu ao defensor prerrogativas e exigências como consequência natural ao novo papel que este deve ocupar na sociedade. Dentre tais garantias insere-se a da inamovibilidade e a vedação ao exercício da advocacia por parte do defensor público fora das atribuições da instituição.

Na letra da lei: