Emmanuel
Bezerra dos Santos
Militantes
políticos assassinado pela Ditadura Militar
Espanto,
horror, indignação, foram as sensações que experimentei, quando vi
esta foto de Emmanuel morto. Ao vê-la, as imagens começaram a fervilhar
na minha cabeça. Recuei até 04 de setembro de 1973, 8:30 horas, Largo
da Moema, São Paulo. Emmanuel, depois de ter tomado café em algum
daqueles botecos do Largo, espera seu companheiro Manoel Lisboa de
Moura em um "ponto".
Faz frio em São Paulo
naquela manhã. Emmanuel esfrega suas mãos, para se aquecer, apesar
de seu corpo está na temperatura normal, pois veste uma calça de veludo
e um blusão de lã. Sente-se bem, acabava de voltar do Chile, passando
pela Argentina, onde tivera contatos com exilados brasileiros. Sente-se
bem em ouvir a língua familiar das pessoas em torno. Sente-se bem
em estar no Brasil, na LUTA. Por isso espera ansiosamente o "Galego":
sabe o prazer que terá quando se encontrar com ele, quando apertar
sua mão e abraçá-lo. Tem muito o que conversar. Como andam as coisas
no Nordeste, como está o Partido?
Agora, lembrou-se de
São Bento, e pergunta a si mesmo: Mamãe o que estará fazendo? E o
velho? Talvez no mar, pescando. Olha os garis que preguiçosamente
varrem a sarjeta do Largo e pensa: essas pessoas ainda viverão num
país digno, ainda serão felizes. Imerso nesses pensamento, não percebe
a Veraneio que lentamente está dando a volta em sua direção. Olha
o relógio: 8:30 horas. E o Galego?
Subitamente, o carro
se detém diante dele e saltam 4 homens armados com metralhadoras e
gritam para ele. Não sabe o que dizem, não ouve nada, não pensa nada.
Apenas os vê. Sobressaltado. Pensa: estou cercado! Não há tempo para
nada: os "garis" largam suas vassouras e se agarram com
ele. É imobilizado, os "garis" já puxam suas mãos para trás
e colocam as algemas. Violentamente é arrastado para dentro do carro.
Ao entrar e antes de ser encapuzado e arremessado ao chão.
Emmanuel fita o homem
que está no banco da frente da Veraneio, testa larga e olhos frios,
que lhe diz, rindo: Flávio você está morto: você vai conhecer e viver
o inferno e arrepender-se de ter nascido... O automóvel parte velozmente...
Emmanuel morreu torturado; não quero imaginar e imagino sua agonia.
Seus olhos, são olhos de quem não queria morrer; olhos abertos, escancarados
para a vida. O olho esquerdo está semi - fechado, teimando em abrir-se
para denunciar seus algozes, que devem tê-lo esmurrado no olho que
está inchado.
Seus lábios também estão
intumescidos. Sua testa apresenta sinais de ferimentos, acima do olho
esquerdo. A base de seu nariz está visivelmente inchada. O lábio inferior,
cortado. Em volta de seu pescoço, desenha-se um colar da morte, como
se fôra feito a fogo.
Eis o que fizeram com
Emmanuel! Emmanuel!! Jamais esquecerei o seu rosto nesta fotografia,
como a querer dizer, gritar algo, mas que silencia na penumbra da
morte.
(Luciano de
Almeida). |