Comitê
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Outono da Memória
O Jornalista Ubirajara Macedo
Conta a História da Sua Vida
Nelson Patriota, 2010
21.
A minha família
Tudo
na nossa vida passa, menos a família.
Quando volto os olhos para trás,
vejo que a minha família sempre esteve
ali, às vezes silenciosa, quase ausente
da minha vida, mas sempre ao meu alcance.
Como a dizer que não queria incomodar;
que me via tão absorto em meus afazeres,
que podia perceber que eu não necessitava
dela naquele momento. Isso podia até
durar, e teve vezes que durou. Como quando
eu me engajei nas forças armadas,
na minha primeira mocidade; ou quando me
vi sozinho em São Paulo, cansado
de uma vida estéril. Foi aí
que me decidi: era hora de voltar para a
minha terra, não importando em que
condições, porque perto da
família tudo se arranjava. E a motivação
que existia por trás dessa atitude
não era outra senão reatar
os laços com a minha família
primeira: meus pais e irmãos, de
quem eu sentia uma falta que crescia a cada
dia que passava. A família me atraía
com uma força magnética irresistível,
força que suponho que também
eu exercia sobre essa mesma força
que me arrebatava e desfazia a aura de uma
cidade que eu julgava que jamais deixaria...
Os fatos essenciais da minha existência
aconteceram entre a família que me
antecedeu a aquela que construí.
Sobre a primeira, venho escrevendo, aqui
e ali, no curso destas memórias compartilhadas.
Sobre a família que nasceu de mim,
suas origens estão bem delimitadas:
meu casamento com Doralice Augusta Varela
(que se tornaria Macedo após a cerimônia
matrimonial), gerou frutos que vêm
se desdobrando em novos frutos. Tivemos
três filhos: Júlio Mário,
Rosana e Isabela.
A esta altura destas reminiscências,
estão todos casados, com filhos e,
agora, um bisneto. Ou seja, já sou
bisavô! Seu nome é Frederico.
É neto de Rosana.
A título de um brevíssimo
retrato de cada um, começo por Júlio
Mário, que vejo assim como um filho
pródigo, desgarrado, pois mora há
30 anos em Foz do Iguaçu, Paraná.
Dele, recebi quatro netos. Reconheço
que ele herdou muito de mim: certa inquietação
aliada ao espírito de aventura e
uma têmpera para encarar os desafios
da vida sem esmorecimento. Quando eu procuro
meu rosto no passado, encontro um retrato
que confunde o rosto que eu tive com o rosto
que Júlio Mário tem hoje.
Creio que isso acontece devido à
distância que nos separa há
tantos anos. É evidente que se trata
de uma barreira flexível –
ora sou eu, ora é ele que a atravessa.
Sempre arranjamos um jeito de nos rever
e, se tudo correr sob os auspícios
da boa fortuna, não tardará
para que ele volte para a terra potiguar,
aposentado, centrado e maduro para a retomada
dos laços com suas raízes.
Acho que é essa a época ideal
para um homem voltar à sua terra:
depois de realizar as coisas importantes
que a consciência lhe ditou por indispensáveis,
mas que só podem ser realizadas fora,
porque a família exerce às
vezes uma influência inibidora que
pode produzir resultados indesejáveis.
Longe dela, porém, a gente pode testar
nossa verdadeira natureza, exercitá-la
e cultivar o que ela nos oferece de melhor.
Acho que, no caso de Júlio Mário,
as coisas sucederam assim. Me refiro às
questões básicas da vida:
amor, trabalho, formação etc.
Em cada um desses pontos, ele cresceu. Então,
já pode voltar.
Júlio Mário foi fuzileiro
naval em Foz do Iguaçu, exerceu a
função de diretor de um hotel
de base dos fuzileiros, depois, foi convidado
a continuar, já agora como funcionário
civil. Está de licença por
motivos de saúde. Agora aos 56 anos,
está fazendo planos para voltar para
Natal. É um bom vivedor, gosta de
vez em quando de uma cervejinha, um uísque,
festas de um modo geral.
Rosana trilhou caminhos retilíneos
que só confirmaram a essência
de sua natureza interior: certa tendência
para a introspecção, a vida
interior, o diálogo consigo mesma.
A escolha que ela fez de cursar Letras,
com especialização em inglês,
conhecimento que ela pratica na governadoria
do Estado, onde trabalha como cerimonialista.
Creio que esse curso também se soma
ao seu processo de intensa vida interior,
que ela enriquece escrevendo coisas que
estão, por enquanto, em processo
embrionário. Sei que ela gosta de
escrever, isso é que é o mais
importante. Sei também que isso se
reflete positivamente na sua vida real,
vida equilibrada, pautada pela prudência
e a evitação dos extremos.
Nos últimos anos, Rosana abraçou
a fé evangélica. Como tudo
que ela escolhe, voltou-se intensamente
para essa crença. Apesar de haver
diferenças sensíveis entre
católicos, como eu, e evangélicos,
como ela, nossos diálogos não
sofreram qualquer prejuízo com a
opção evangélica que
ela fez. Sabemos, hoje, que o essencial
é o que os nos une: o amor e o sentimento
de família, que compartilhamos juntamente
com nossos outros filhos, netos e, agora,
um bisneto. A isso se somam, naturalmente,
a legião de amigos que vimos formando
no curso das nossas vidas, e que ajudam
a gente a viver cada vez melhor.
Resumindo, vejo Rosana hoje como uma pessoa
bem resolvida: tem dois filhos maravilhosos,
Vanessa e Marcos – ambos formados
em biologia marinha e já trabalhando
nessa área. Rosana tem o seu trabalho
e está em paz consigo mesma e com
o mundo. Tem dois hobbies: música
e leitura.
Minha filha Isabela trabalha também
na governadoria do Estado na área
administrativa. Tem um único filho,
Tiago, formado em Administração
de Empresa.
Isabela tem uma natureza mais dinâmica,
mais aberta às coisas da vida moderna.
Como a internet, por exemplo. Aliás,
foi através da internet que ela conheceu
João Pereira, com quem vive muito
bem.
Ele já veio para Natal aposentado,
depois de ter trabalhado por vinte e oito
anos na Suíça.
Isabela tem traços que puxou de mim:
gosta de boa música e de vida social,
ao contrário de Rosana que parece
ter puxado mais à mãe: mais
reservada. Vejo essas características
como muito saudáveis, pois enriquecem
o nosso convívio com suas diferenças.
Viveca e Virna são as filhas da minha
companheira Lourdinha. Viveca é formada
em sociologia e é funcionária
da Caixa, coordenadora da carteira de habitação;
tem dois filhos, Igor e Natália.
Ambos cursam Direito e são muito
estudiosos. Considero-os como netos. Quero
bem a eles e eles querem bem a mim, como
meus netos são em relação
a Lourdinha.
Virna é bacharel em Direito e auditora
fiscal do trabalha no Ministério
do Trabalho e Emprego, Coordenadora do Grupo
Especial de Repressão ao Trabalho
Escravo (Grupo Móvel). Está
sempre viajando para o Norte, onde há
muitos casos de trabalho escravo. Tem duas
filhas: Lívia, formada em Direito,
casada e morando em Marabá, Pará.
E Luíza, que faz medicina em Berlim,
Alemanha, onde reside há quatro anos.
Sobre Virna, tem um fato recente de que
me orgulho especialmente: ela foi agraciada
com a medalha da Ordem ao Mérito
do Trabalho, no Grau de Oficial, comenda
conferida em diploma, através de
decreto de 18 de novembro de 2008 do presidente
da República Federativa do Brasil,
Grão-Mestre da Ordem do Mérito
do Trabalho Getúlio Vargas.
A solenidade foi realizada durante comemoração
pelos 78 anos de criação do
Ministério do Trabalho e Emprego,
no dia 26 de novembro de 2008, no auditório
do Memorial JK, em Brasília, DF,
ocasião em que o ministro do Trabalho
e Emprego Carlos Lupi fez a entrega de medalhas
a 33 agraciados, personalidades que se destacaram
na área de políticas públicas
voltadas para o mundo do trabalho. Essa
premiação é concedida
como forma de reconhecimento ao trabalho
e pela importância do serviço
prestado no controle social das políticas
públicas de trabalho, emprego e renda
em benefício dos brasileiros.
Dei
uma educação liberal aos meus
filhos respeitando a vontade de cada um,
sem impor minha vontade ou preferências.
Sigo nas pegadas de meu pai que, embora
muito conservador e católico, nunca
exigiu que um filho ou filha tivesse os
mesmos gostos que ele.
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