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                                      Estadual pela Verdade, Memória e 
                                      Justiça RN 
                                      Centro 
                                      de Direitos Humanos e Memória Popular 
                                      CDHMP 
                                      Rua Vigário Bartolomeu, 635 Salas 
                                      606 e 607 Centro 
                                      CEP 59.025-904 Natal RN 
                                      84 3211.5428 
                                      enviardados@gmail.com 
                                    
                                       
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                                      RN | Mortos 
                                      Desaparecidos Políticos RN | 
                                      Repressores 
                                      RN 
                                     
                                       
                                    
                                    Militantes 
                                      Reprimidos no Rio Grande do Norte 
                                      Raimundo Ubirajara de Macedo 
                                      Livros 
                                      e Publicações 
                                    No 
                                      Outono da Memória 
                                      O Jornalista Ubirajara Macedo 
                                      Conta a História da Sua Vida 
                                      Nelson Patriota, 2010 
                                    10. 
                                      Boemia e jornalismo  
                                    Aquilo 
                                      que, para alguns, pode parecer incompatível, 
                                      sempre me pareceu perfeito. Falo da relação 
                                      entre jornalismo e boemia, uma realidade 
                                      que acompanha a atividade jornalística 
                                      entre nós desde que passamos a fazer 
                                      nossos próprios jornais, em prensas 
                                      um pouco mais modernas do que aqueles engenhocas 
                                      inventadas por Gutemberg no século 
                                      XVI. Boemia e jornalismo formam um par perfeito 
                                      porque nos bares, como nos salões 
                                      de beleza e nas colunas sociais, “tudo 
                                      se sabe, tudo se comenta”, como dizia 
                                      o experiente colunista social Ibrahim Sued. 
                                      Era, e continua sendo, nos bares, onde os 
                                      jornalistas se encontram após um 
                                      árduo dia de coleta de notícias, 
                                      checagem de fontes, confrontação 
                                      de dados. Em que lugar, portanto, um jornalista 
                                      deve ir após esgotar as suas fontes 
                                      diretas nas entrevistas? Aos bares, naturalmente. 
                                      Como numa cumplicidade, é lá 
                                      onde o jornalista conhece detalhes que escaparam 
                                      às suas fontes; é lá 
                                      onde ele vai saber de coisas que ainda estão 
                                      em processo embrionário, por assim 
                                      dizer. Ali é onde começam 
                                      a circular os rumores que, muitas vezes, 
                                      se antecipam aos acontecimentos, sobretudo 
                                      quando tratam de escândalos políticos, 
                                      sociais ou policiais.  
                                     
                                      Não foi por obra e graça do 
                                      acaso que bares e restaurantes sempre se 
                                      entenderam bem com as empresas jornalísticas. 
                                      Basta lembrar, por exemplo, o Bar do Lourival, 
                                      localizado praticamente defronte do Diário 
                                      de Natal. A Tribuna do Norte, por estar 
                                      situado num bairro boêmio por formação, 
                                      viu proliferar em seu entorno uma concorrida 
                                      oferta de bares, restaurantes e... bordeis. 
                                      O Bar do Olívio, o Bar das Bandeiras 
                                      e a Peixada Potengi são apenas três 
                                      nomes que se destacaram nessa geografia 
                                      de gama tão diversificada quanto 
                                      a clientela que servia.  
                                     
                                      Para mim, nada pareceu mais normal na vida 
                                      do que sair da redação de 
                                      um jornal, após um dia estafante 
                                      e produtivo, e ir ao Bar do Lourival degustar 
                                      uma cervejinha gelada na companhia de alguns 
                                      companheiros. Além de podermos checar 
                                      informações e tendências 
                                      de acontecimentos no mundo político, 
                                      econômico ou desportivo, a gente como 
                                      que irrigava os laços de amizade, 
                                      nas trocas de impressões impessoais, 
                                      chegando, porém, às pessoais. 
                                       
                                     
                                      Conheci Lourdinha Pereira, minha companheira 
                                      definitiva, na redação do 
                                      Diário de Natal, onde ela ia buscar 
                                      sua filha Viveca, que era diagramadora, 
                                      como disse antes. Mas foi no convívio 
                                      dos bares que nossas afinidades afloraram, 
                                      consolidando-se. Nesse tempo, encerrado 
                                      o expediente de trabalho do sábado, 
                                      costumávamos nos encontrar no Bar 
                                      do Lourival, de onde saíamos para 
                                      o “Tric-Tric” ou outro bar da 
                                      moda, naquela época. Lá, saboreávamos 
                                      um delicioso camarão, acompanhado 
                                      de um chope geladíssimo. Essa convivência 
                                      foi aprofundando nossa relação 
                                      e, sem que nos déssemos conta, uma 
                                      relação de amor foi se consolidando. 
                                      Costumávamos ter a agradável 
                                      companhia dos colegas Remo Macedo, Luís 
                                      Gonzaga Cortez, Thaís Marques, Ângelo 
                                      Ramos, Margareth Martins. Outros companheiros 
                                      de redação eventualmente se 
                                      somavam ao grupo, como Vicente Serejo, Jânio 
                                      Vidal, Cassiano Vidal e Aluísio Lacerda. 
                                     
                                      Nas noites de sexta-feira, íamos 
                                      para a Casa da Música Popular Brasileira, 
                                      um local aprazível e descontraído 
                                      localizado na Praia dos Artistas (Rua 25 
                                      de Março), onde se podia apreciar 
                                      uma boa música e dispor de um espaçoso 
                                      dancing que deixava toda a clientela muito 
                                      à vontade. Por isso, eu e Lourdinha 
                                      não nos cansávamos de frequentar 
                                      a casa. E tinha vezes em que a gente varava 
                                      a noite, ficando até às 7h 
                                      da manhã seguinte. Na casa da MPB 
                                      a gente dançava e também conversava 
                                      muito com os amigos, e quase não 
                                      se falava em política. Não 
                                      que política não combinasse 
                                      com boemia; mas os tempos eram pesados, 
                                      de chumbo. Não convinha, portanto, 
                                      dar chance ao azar...  
                                     
                                      Dessa época, recordo um episódio 
                                      envolvendo a reunião, em Natal, da 
                                      Sociedade Brasileira para o Progresso da 
                                      Ciência – SBPC. Algumas personalidades 
                                      do encontro foram convidadas pelo empresário 
                                      Teodorico Bezerra para conhecerem a fazenda 
                                      dele em Tangará. Alguns nomes do 
                                      Diário também receberam o 
                                      mesmo convite, entre eles, eu, Margareth 
                                      Martins, Luiz Gonzaga Cortez, Remo Macedo 
                                      e Thais Marques.  
                                     
                                      Tivemos um fim de semana diferente e agradável. 
                                      Quando lá chegamos, no fim da tarde 
                                      do sábado, fomos recepcionados pelo 
                                      anfitrião e pelo genro dele, Hélio 
                                      Nelson. Tivemos um lauto jantar, além 
                                      da oportunidade de privar da companhia do 
                                      experiente empresário e político 
                                      sertanejo, do seu genro e de outros parentes 
                                      deles.  
                                     
                                      No outro dia, chegaram os cientistas. Eram 
                                      tantos que ocuparam dois ônibus. Ao 
                                      desembarcarem dos veículos, os convidados 
                                      foram recepcionados por duas bandas de música 
                                      – uma masculina e outra feminina –, 
                                      constituídas de filhos dos funcionários 
                                      da fazenda, que se alternaram na execução 
                                      de um repertório de dobrados, marchas 
                                      e choros, tudo tocado com muito garbo e 
                                      entusiasmo. 
                                     
                                      Passamos o domingo conversando com alguns 
                                      nomes importantes do meio intelectual e 
                                      científico do país e retornamos 
                                      a Natal no domingo à tardinha. Comida 
                                      e bebida fartas em todas as refeições. 
                                       
                                     
                                      Um detalhe que não me passou despercebido 
                                      foi que a fazenda do “majó” 
                                      Teodorico abrigava escolas de ensino regular 
                                      e também de música. O que 
                                      contrastava com a imagem que se comentava 
                                      dele no meio jornalístico: a de um 
                                      capitalista empedernido, que só pensava 
                                      em fazer dinheiro e explorar a mão 
                                      de obra dos seus peões. 
                                     
                                      Na verdade, não foi exatamente isso 
                                      que eu pude observar, nesse dia e meio em 
                                      que privei da companhia do “majó”. 
                                      Notei, por exemplo, que ele tinha seus laivos 
                                      de nobreza e que era sensível ao 
                                      problema social. A prova era que não 
                                      faltava nem escola nem boa alimentação 
                                      para os peões e para os filhos deles, 
                                      conforme pude apurar junto a pessoas do 
                                      lugar.  
                                     
                                      Outro traço da personalidade de Teodorico 
                                      era o do viajante curioso e contumaz. Ele 
                                      sentia grande prazer em mostrar as fotos 
                                      das viagens que fazia sozinho pelo mundo 
                                      afora. Vendo uma foto sua no Egito, perguntei: 
                                      como o senhor se comunicava com os egípcios? 
                                      Lacônico, ele respondeu: “Quem 
                                      tem boca vai a Roma, meu filho”. Essa 
                                      verdade eu constatei também nas muitas 
                                      viagens que empreendi pelo mundo com Lourdinha 
                                      e, às vezes, amigos do Clambom. 
                                    ^ 
                                      Subir 
                                    < 
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