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Ditadura Militar no RN
Ditadura
Militar de 1964 no Rio Grande do Norte
Emmanuel
Bezerra dos Santos
Repressão no RN
Emmanuel
Bezerra
Meus primeiros contatos que se
fundiriam em relação de amizade
e, depois, como pessoa de partido, com Emanuel,
aconteceram nos idos de 1967/1968 em pleno
efervescer do movimento estudantil no Brasil
e, particularmente em Natal, onde, aqui,
de forma organizada e pujante confrontamos
a repressão da Ditadura e muitas
vezes resistimos nas ruas aos passos de
ganso, ao estilo nazista, da polícia
militar. Todos nos lembramos desses acontecimentos,
até com nostalgia, pois esses fatos
são praticamente a nossa iniciação
revolucionária; os nossos primeiros
instantes de prática política
efetiva da luta geral por um mundo melhor,
por uma sociedade igualitária, onde
inexista a ganância do capital que
sufoca o direito do homem.
Nessa época e no curso desses acontecimentos
Emanuel já era presidente da Casa
do Estudante de Natal e uma das lideranças
incontestáveis do Movimento Estudantil.
Todos que participavam do movimento tinham
respeito por ele. Um respeito existente
por conta de sua capacidade intelectual,
de sua condição de argüir
mas, principalmente, um respeito vindo de
tudo no que ele acreditava, com todas as
forças de seu ser. E no que ele acreditava
da maneira mais eloqüente e na forma
mais pura da dialética marxista de
destrinchar a história, era na Revolução.
E era essa crença que lhe dava o
fervor e a vontade de estudar a cada momento,
da maneira mais cientí?ca possível
e com uma persistente e inigualável
disciplina, em seus diversos matizes, a
revolução. Mas também
não residia nele só a vontade
de estudar a revolução, mas
de fazê-la, de lutar, de contribuir,
de combater. Esta era sua natureza; foi
assim que o conheci. Como ele diz em um
de seus poemas: “meu sonho, uma grande
rosa; minha poesia, Luta”.
Depois do famigerado AI-5, vimo-nos forçados
a entrar na clandestinidade. Não
havia outra opção, porque
para nós a opção era
continuar o trabalho político. E
isso significava um empenho de corpo e alma;
uma entrega total; uma renúncia completa
a tudo que não fosse o trabalho político.
A saída de Emanuel foi esta, a opção
lógica de quem estava na luta. A
clandestinidade, a dedicação,
a tenacidade, a busca incessante da melhor
perspectiva possível para a revolução
brasileira e a preparação
longa e intensiva de suas condições
objetivas.
A assinatura do AI-5 em dezembro de 1968
manifesta-se à nação
brasileira como o apogeu e o recado do sistema
dirigido pelos generais de que não
estavam no poder por brincadeira, e é
então que todos, perseguidos e visados
pelos órgãos de repressão
do regime se vêem obrigados a entrar
na clandestinidade a ?m de continuar a luta
num enfrentamento historicamente difícil
e doloroso, momento circunstancial em que
era preciso “estar ganho ideologicamente”.
Foi assim nesse ambiente de completo autoritarismo
em que a ditadura não permitia qualquer
ação ou manifestação
de protesto que nos meados de 1971 vou encontrar
Emanuel, em Maceió, dirigindo e organizando
o partido naquele momento.
Morei e convivi com Emanuel perto de um
ano e oito meses. Nosso aparelho era praticamente
a sede do partido em Maceió, pois
toda a propaganda e todo trabalho teórico
e a sistemática operacional da organização
eram feitos a partir de nosso aparelho.
Por motivos de segurança tínhamos
que periodicamente mudar de local.
No que se refere a sobrevivência vivíamos
franciscanamente, pois nosso sustento (alimentação,
vestuário, manutenção
de aparelho) estava a mercê de doações
da pequena-burguesia, uma pequena-burguesia,
diga-se de passagem, amedrontada e intimidada
pela propaganda e uma violenta repressão,
pois até aquele momento histórico
nossa organização não
tinha projetos de conseguir receita através
de apropriações. Os simpatizantes
e os quadros eram quem mantinham a organização.
Nossa convivência era a melhor e mais
salutar possível. Não abríamos
mão da disciplina e das tarefas do
partido. Para que eu pudesse estar cada
vez mais preparado para o dia a dia da organização,
Emanuel discutia comigo os problemas gerais
da revolução brasileira; a
situação da esquerda no Brasil,
suas diversas organizações
e o contexto das variadas linhas políticas;
a crise geral do capitalismo e suas contradições
principais e, em particular, as questões
centrais de nosso partido. Em Emanuel era
uma constante a discussão de como
a revolução se daria, daí
a gradação de conhecimento
e posições alinhada a uma
grande vontade ideológica e política
de realizá-la.
Foi dessa forma a minha relação
e vivência diária com Emanuel
no período que passei em Alagoas.
Para mim uma fase rica em aprendizado e
um privilégio por ter convivido com
ele.
Em 1973 fui para Recife. A essa altura as
ações armadas eram escassas.
As organizações revolucionárias
estavam praticamente esfaceladas; muitas
deixaram de existir. A repressão
era implacável; o DOI-CODI atuava
à maneira da Gestapo, com o beneplácito
do Governo e uma infra-estrutura voltada
para prender, torturar, seviciar e matar
brasileiros; centenas, milhares de prisões
pelo país inteiro; os porões
do regime se amontoavam de presos sem garantia
alguma. E então Emanuel é
preso e assassinado.
Sua execução física
além de me marcar de modo particular,
marca também a história da
esquerda de nosso estado, não somente
pela sua grandeza e humanidade, mas acima
de tudo pela dimensão que sempre
soube dar na luta constante e incansável
contra a exploração do homem
pelo homem.
Edilson Romariz Machado
Ex-militante político - PCR
Maio/2008
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