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REDE
BRASILEIRA DE EDUCAÇÃO EM DIREITOS HUMANOS |
ENFOQUES
METODOLÓGICOS NO ENSINO E
APRENDIZAGEM DOS DIREITOS HUMANOS.
(*)
Letícia Olguin
Antes de entrar de cheio no tema da metodologia do ensino e
aprendizagem dos Direitos Humanos parece conveniente realizar algumas
considerações que possibilitem uma melhor delimitação do problema.
Em primeiro lugar; deve-se assinalar que a incorporação do
ensino dos Direitos Humanos, nos diversos países que formam o conjunto
contemporâneo das nações dó mundo, se encontra em sua etapa inicial.
Cabe destacar, neste sentido, que a experiência, que se leva a cabo no
nosso país (Costa Rica), é a primeira que se realiza na América
Latina e Caribe. Desta circunstância se depreende que o conteúdo desta
apresentação seja eminentemente teórico, conceitual, e que a referência
empírica se circunscreva a experiências parciais que, por não serem
generalizáveis, despertam importantes inquietudes, mas proporcionam
poucas respostas. Este fato, se bem constitua uma certa desvantagem,
converte o tema que estamos enfocando num desafio à nossa capacidade de
educadores criativos, reflexivos e críticos.
Em segundo lugar, se coloca que a decisão de incorporar o
ensino dos Direitos Humanos no sistema educativo formal corresponde ao
âmbito da administração curricular. Mas é necessário lembrar que
assim como outras modificações curriculares, requererá uma análise
das características que impõem à ação docente a administração da
educação. Não haverá conflito, necessariamente, mas é
imprescindível estarmos atentos para evitar contradições entre certos
enunciados curriculares e sua possibilidade de colocá-los em prática,
em virtude da dinâmica operatória dominante das instituições
educativas.
Ante a pergunta de como abarcar o ensino e aprendizagem dos
Direitos Humanos no sistema educativo, alinham-se diversas respostas
que podem ser agrupadas em duas grandes categorias. Por um lado estão
todas aquelas que podem denominar-se de incorporação dos conteúdos.
Estas consideram que é suficiente a inclusão desta temática em alguma
das disciplinas existentes, ou, no máximo, o estudo de uma disciplina
específica, para que os educandos logrem os objetivos que, sobre este
aspecto, orientam a ação do sistema educativo. Duas objeções podem
ser formuladas a esta postura. Uma delas consiste em que atrás desta
posição, existe uma concepção meramente declaratória, nominalista,
dos Direitos Humanos, que os reduz a um conjunto de informações cuja
formulação é suficiente para assegurar sua existência real. A
segunda objeção se fundamenta na difundida critica que se faz dos
sistemas educativos em relação ao enciclopedismo curricular O conjunto
de temas ou disciplinas reforça este enciclopedismo e torna mais
questionável a ação das instituições de ensino.
A outra categoria de resposta a este problema de inclusão pode
denominar-se de integração dentro do currículo existente e parte do
princípio de que a informação sobre os Direitos Humanos é pouco
significativa no processo de ensino-aprendizagem nos níveis de
educação primária ou secundária. Neles o importante é a prática,
a vivência dos Direitos Humanos, mais que sua fundamentação
filosófica, sua concepção jurídica e sua evolução histórica.
Trata-se em síntese, de um processo de formação de atitudes que, como
se analisará mais adiante, requer elementos cognitivos, afetivos e
manifestações comportamentais. A informação necessária não é
relativa aos Direitos Humanos, mas concernente aos objetivos ou
situações em que estes se põem em vigência. Portanto, desta
perspectiva não é necessária somente a inclusão de um conteúdo
especial sobre os Direitos Humanos, mas deve se efetuar uma mudança de
enfoque. Em outros termos, com os conteúdos atuais é possível
lograr-se perfeitamente processos de ensino-aprendizagem que promovam e
fortaleçam o exercício pleno dos Direitos Humanos; somente se requer
uma nova forma de ver ou fazer as coisas. Esta colocação se refere, em
particular; ao ensino primário e secundário.
1. DEVEM SER METODOLOGIAS QUE ESTIMULEM A PARTICIPAÇÃO DOS
ESTUDANTES: Como todos sabem, a participação apresenta diferentes
níveis, mas é possível agrupá-los em três grandes categorias. Uma
participação ativa, que é a que têm os sujeitos que participam da
execução de uma atividade, é a mais difundida e a que implica em
menor compromisso pessoal; sem ela seria praticamente impossível a vida
em sociedade. Uma participação consultiva, na qual os indivíduos são
tomados em conta por quem deve assumir as decisões; se realiza alguma
forma de consulta, de pesquisa, entre os que serão afetados pela
decisão; se recolhem opiniões, desejos, aspirações ou necessidades
para que a decisão adotada seja menos conflitiva. Uma participação
decisória, na qual os sujeitos envolvidos tomam decisões como
pessoas comprometidas com as conseqüências da resolução que se põe
em prática. Este último nível é o desejável e o único que
possibilita o desenvolvimento das atividades que interessa promover.
Esta característica é a que pode entrar em conflito com o modo em que
operam as instituições educativas, visto que as decisões que afetam
aos estudantes abarcam quase todo o espectro de decisões que se tomam
nela; não há âmbitos alheios aos estudantes numa escola.
2. DEVEM SER METOLOLOGIAS QUE POSSIBILITEM A CONTRADIÇÃO. Há
uma interpretação deficiente do estilo de vida democrático quando se
pensa que unicamente o critério da maioria é o correto e válido. É
imprescindível que, antes de se chegar a uma votação, se possa
discutir amplamente as características das alternativas que se
apresentam, se expressem sem temor os diferentes pontos de vista. Por
outro lado, é conveniente que se aceite, como adequada, mais uma
alternativa, de maneira a não criar situações rígidas.
3. DEVEM SER METODOLOGIAS QUE ABRAM JANELAS PARA O MUNDO.
Muitas vezes a urgência para desenvolver todos os temas propostos pelo
currículo faz com que os mesmos se apresentem descontextualizados,
desarraigados do contexto social e cultural no qual tiverem lugar. O
estudo de qualquer das disciplinas que integram os planos de estudo
apresentam magníficos exemplos do desenvolvimento e da prática dos
direitos Humanos. Os conteúdos literários e artísticos, o material
histórico e geográfico, as ciências naturais proporcionam numerosos
testemunhos da luta pela liberdade de pensamento e de expressão; de
cooperação pessoal, institucional e internacional nas investigações,
e na solução de problemas; de respeito pelas distintas
idiossincrasias, em síntese, da essência mesma dos direitos humanos.
4. DEVEM SER METODOLOGIAS QUE PROCUREM SISTEMATICAMENTE O
DESENVOLVIMENTO DO PENSAMENTO. Em poucas oportunidades os docentes
refletem sobre as operações lógicas que põem em jogo as alternativas
metodológicas ante as quais devem optar. No máximo se leva em conta o
raciocínio, como se fosse a única forma de pensamento e se crê que as
demais se darão por acréscimo. Como ilustração de outras
alternativas pode-se mencionar o método de desenvolvimento lógico
idealizado pelo grupo de trabalho que dirige J. Dumazedir. Parte da
hipótese de que o pensamento é um processo contínuo, que, em sua
dinâmica, passa por uma série de fases ou etapas de maneira regular,
sistemática. Sempre que se pensa, se segue um mesmo caminho,
independentemente do conteúdo do pensamento. A investigação, a
reflexão, a critica necessitam destas operações lógicas - ou de
outras que outros autores podem haver estabelecido como constitutivas do
pensamento - para poder concretizar-se. A metodologia que se adote deve
tê-las presentes.
5. DEVEM SER METODOLOGIAS QUE
FORTALECEM OS VÍNCULOS DO ESTUDANTE COM O GRUPO DE PARES; COM A
INSTITUIÇÃO; COM A COMINIDADE; COM PAÍS E MUNDO: Os Direitos Humanos
tomam sentido na relação de um sujeito com outros seres humanos; quer
dizer, nas relações sociais. A metodologia adotada deve permitir a
identificação de relações sociais cada vez mais amplas, a partir do
espaço imediato do estudante, conformado por seu grupo de colegas, até
perspectivas cada vez mais abarcadoras da humanidade em conjunto.
6. DEVEM SER METODOLOGIAS TOTALIZADORAS - Como se mencionara
anteriormente, o ensino-aprendizagem dos direitos humanos não é o
recurso exclusivo de uma disciplina ou um grupo de matérias. É a
totalidade do processo educativo a responsável para alcançar
objetivos. Para tanto, a metodologia deverá aplicar-se à totalidade do
processo educativo, pressupondo-se que
adequada aos diferentes estágios de desenvolvimento pessoal
que apresentam os alunos durante o ensino primário e secundário. Não
é uma metodologia para empregar na classe, mas um enfoque metodológico
que impregnará toda a impulsão da instituição educativa. (Isto toma
necessário que os docentes analisem sua prática em classe à luz dos
direitos humanos e realizem uma profunda autocrítica de suas
convicções).
7. DEVEM SER METODOLOGIAS GLOBALIZADORAS. Foi assinalado que o
ensino aprendizagem dos direitos humanos constitui um processo de
formação e desenvolvimento de atitudes e que estas têm componentes
cognitivos e comportamentais. as metodologias, que se adotem, deverão
atender, simultaneamente, a estes três componentes e não limitar-se a
alguns deles. A quantidade de cada um deles variará, seguramente, para
estar de acordo com o conteúdo especifico que se estará tratando. Mas
é importante que os três tipos de componentes da atitude estejam
presentes para que o ensino-aprendizagem seja efetivo.
8. DEVE SER UMA METODOLOGIA REALISTA. O ensino dos direitos
humanos deve verificar-se a partir da realidade em que estejam inseridos
os participantes do processo. É a vivência cotidiana e a prática
diária, a referência às relações reais estabelecidas pelo educando,
o que permitirá a formação das atitudes desejadas.
(*) Texto publicado
originalmente pelo Servicio Paz y Justicia (Uruguay).
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