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REDE BRASILEIRA DE EDUCAÇÃO EM DIREITOS HUMANOS

Educar para os direitos humanos:
O Grande Desafio Contemporâneo  

Luiz Perez Aguirre#

            “A educação deve orientar-se para o pleno desenvolvimento da personalidade humana e do sentido de sua dignidade, e deve fortalecer o respeito pelos direitos humanos e pelas liberdades fundamentais”. Pacto Internacional de direitos econômicos, sociais e culturais”. Art. 13, § 1.

            Em todos os âmbitos da vida social, as liberdades fundamentais e os direitos humanos aparecem claramente como coluna vertebral das relações entre pessoas e grupos constituindo garantia única e salvaguarda de qualquer intento de democratização.

            Comprovamos que o recurso que atualmente menos se usa em educação é a liberdade, limitada de muitas maneiras. A verdadeira força educadora de nossas sociedades está na comunidade que dialoga entre si e não na sociedade que tem medo e se recolhe nas muralhas em que cada um se defende. Descobrimos que isto serviu de base e serve atualmente às forças obscurantistas que fundamentam a segurança no equilíbrio do medo ou do terror. O medo segrega angústia e paralisa o ser humano, despojando-o de sua faculdade para exercer o direito de ser livre.

            Em que se parecem a angústia e a coragem? Em que ambas são contagiosas... Os processos educativos impetrantes nos formaram como um povo angustiado e impotente ante forças hegemônicas estranhas aos nossos genuínos direitos e interesses. Não há Messias para isto, mas há respostas. A situação se modifica a custo, procurando descobrir que, por traz deste sistema educativo que gera angústia, há um enorme desprezo pelo ser humano e sua dignidade. Desprezo do educador pelo aluno e vice-versa, desconhecimento das dinâmicas autênticas do processo, no qual os que educam são educados, pois – como bem disse Paulo Freire – ninguém educa a ninguém, os seres humanos se educam em comunhão!

            O desafio está em que temos que aprender a pensar com liberdade e temos que nos convencer de que temos o direito a pensar de forma diferente dos demais e que esse direitos não nos autoriza a desprezar a quem pensa diferente de nós. O valioso estará nessa diferença que nos fortalece, complementa e enriquece  como sociedade e como povo.

            O futuro é agora. Não podemos esperar o amanhã para gestá-lo. Se não entendemos a solicitação de uma nova postura, não poderemos assumir a responsabilidade que nos toca, porque é imperioso começar a ser, a fazer e a comprometer-se com as solicitações e com a convocação da hora presente de nossos povos.

            Esta hora requer criar uma cultura verdadeiramente educativa. Alguém chegou a dizer que o passado nos oprime e amarra. Temos uma forma de vencê-lo: tornando-o conhecimento, experiência, reflexa. Não podemos dedicar uma etapa à reflexão e outra à ação, uma a conhecer os direitos Humanos e outra a defendê-los, tudo tem que ser simultâneo, em um tempo dialético. Este tempo está nos esperando.

Uma educação integral promove e defende os direitos humanos

            O trabalho pelo advento do respeito aos direitos humanos e da paz se concretiza numa ação educativa permanente e prática sobre os próprios gestadores do processo pedagógico.

            Educar para os direitos humanos quer dizer educar para saber que existem também “os outros”, tão legítimos quanto nós, seres sociais como nós, a quem devemos respeitar, despojando-nos de nossos preconceitos e projeções de nossos próprios fantasmas etc.

            Educar para os direitos humanos quer dizer aceitar a pluralidade cultural e, ao mesmo tempo, educar na identidade, na semelhança fundamental que nos transforma a todos os irmãos. Quer dizer convencer-se de que o ser humano necessita da interação humana para desabrochar. Implica convencer-se de que tal educação não pode ser ministrada setorialmente ou a alguns grupos. A educação autêntica deverá ser integral em sua visão e global em seu método.

            Educar para os direitos humanos é assumir o primeiro direito fundamental, sem o qual os outros não tem sentido, é o de ser pessoa. A educação levará a pessoa a ser, superando as concepções de comportamento ligadas ao ter  e poder, e estabelecendo condutas que garantam aqueles direitos e deveres em virtude dos quais todo ser humano possa crescer e4m humanidade, ser mais, inclusive sem Ter mais.

            Todo ser humano se converte em educador que promove os direitos humanos quando tem clareza crítica e equilibrado tato ao questionar costumes e comportamentos pessoais e coletivos baseados na auto-defesa frente aos demais, substituindo-os com a atitude de respeito, responsabilidade e colaboração.

Cinco notas do processo educativo em direitos humanos.

1ª ) A complexidade da noção de direitos humanos, dinâmica e dialética.

2ª ) A concepção escolar dos direitos humanos.

            Para a maioria, os Direitos Humanos são entendidos de forma restritiva e reduzidos à luta pela integralidade da vida, contra a tortura e similares. Não existem diferenças entre direitos formais e substanciais.

            Isso obriga a modificar nossos métodos de sensibilização. Antes de encarar o processo educativo, é necessário devolver aos Direitos Humanos toda a sua riqueza e seu caráter pluridimensional.

            Não se pode respeitar os Direitos Humanos sem ter a íntima convicção de que cada ser humano pode e deve, em todo o momento, ser agente de sua história.

            Não existe melhor pedagogia que a do testemunho, da confrontação dos atos, e ela só é crível no momento em que se enquadra no plano real e imediato.

            É assim que se chega a fazer perceber os valores da solidariedade e suas dificuldades, seja a nível local, nacional ou internacional. Daí também a necessidade de encontrar formas de articulação entre a educação formal e a desescolarizada.

            Deve-se evitar fazer do processo educativo formal uma “vitrina” em que a vida e o debate estão ausentes, ou cair em outro extremo, convertendo a ação numa espécie de feira em que cada escola ou organização de direitos humanos defende sua coleção de espelinhos...

3ª ) Que deve prevalecer? O texto, a declaração, o vivido e sentido? O texto, que pode apresentar outras realidades, será inoperante se não houver esforço de se chegar à autocrítica pessoal para mover a vontade e traduzí-la em ação.

4ª ) Os progressos realizados pelos Direitos Humanos na Educação são frágeis e lentos, porque estes direitos pressupõe uma exigência que desemboca inexoravelmente em uma opção de essência política. Não só os governos repressivos se opõe a qualquer intento de educação em prol dos direitos humanos, mas também os sistemas repressivos na própria educação, vigentes em muitos estados democráticos.

5ª ) A educação em prol dos direitos humanos é um projeto utópico, ilusório? É possível superar uma concepção idealista da educação.

            Permanência e mutação, ordem e mudança criativa serão sempre dimensões dialéticas dos genuínos processos educativos em direitos humanos. Garantir e respeitar esta dialética implicará na conciliação necessária entre liberdade e tolerância, ordem e criatividade.

A conclusão é um começo

            Oficialmente, todos os regimes e governos estão de acordo e os debates sobre educação para os direitos humanos acabam sendo um aflitivo festival de cinismo e hipocrisia.

            O discurso sobre Direitos Humanos se caracteriza por abuso de linguagem. Conceitos fundamentais como ‘”povo”, “desenvolvimento”, “liberdade”, e “paz” não têm o mesmo sentido quando empregados nos decretos e leis. Assistimos à uma ocupação da linguagem, a um emprego totalitário da linguagem que, pondo “em moda” os Direitos Humanos, usa-os com fim de torná-los triviais e neutralizar seu conteúdo.

            O ponto de partida de nossa ação educativa será tomar consciência desta duplicidade da linguagem e do pensamento. É necessário deter esta apropriação indébita.

            Os direitos humanos se converteram em maquiagem de sociedades que querem ocultar a nudez do despojado e o grito do pobre violado na sua dignidade.

            E ficamos perplexos, vendo os Direitos Humanos nos escaparem como areia entre os dedos. Que fazer? Lutar contra o desalento e a resignação. Clarificar em comunhão as nossas idéias e purificar nossa linguagem. Por um ato de vontade, agir.

            “Todas as flores, de todas as manhãs, estão nas sementes de hoje”.

            # Sacerdote Jesuíta. É assessor latino-americano do Serviço Justiça e Paz, SERPAJ.

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