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Potiguar
Dez
lembranças de Djalma Maranhão
Moacyr
de Góes
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01
Grande Ponto. 1952. Às cinco horas
da tarde.
- Você é Moacyr de Góes,
que faz política estudantil?
Diante
de mim, com a mão estendida, o sorriso
aberto no rosto redondo. Tanto alto como
largo. Djalma Maranhão. Direto ao
assunto:
-
Venha para o “cafeísmo”.
No meio estudantil só dá PSD
ou UDN, por influência dos pais. Tudo
pequeno burguês. O “cafeísmo”
tem uma tradição de lutas
populares. Precisamos de estudantes.
Nos
meus 22 anos voltei para casa, pensando.
Com café filho cooptado pelo Poder
o movimento popular no Rio Grande do Norte
estava de maré baixa. Pela “participação”
PSD e UDN se atropelavam no adesismo ao
Vice-Presidente da República. Café
escolhia Senadores da UDN (Dinarte) e do
PSD (Georgino) e indicava os suplentes do
PSD.
Dentro
do “Cafeísmo”, o racha:
Eider Varela liderava os ricos e os “novos
cafeístas”. Djalma Maranhão
liderava os pobres e sustentava as bandeiras
de Café Filho, quando jovem.
Fiquei
com a “velha guarda cafeísta”:
Djalma Maranhão, Leonardo Bezerra,
Oliveira Júnior, Augusto de Souza,
os herdeiros de Amaro Magalhães e
outros. Fui candidato a vereador em 1954.
Perdi. Djalma Maranhão se elegeu
Deputado Estadual.
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02
A
velha Casa de Tobias (Faculdade de Direito
do Recife, 1950 – 55) me abria a cabeça.
Mas eram as discussões com Djalma
Maranhão, no “Jornal de Natal”,
que me situavam no mundo. O cotidiano era
sempre analisado nos contextos municipal,
estadual, nacional e internacional. As leituras
do marxismo e a prática das lutas
populares faziam de Djalma Maranhão
um homem do seu tempo. Isso o distanciava
do fisiologismo da oligarquia nordestina.
Lembrando
Djalma Maranhão, eu entendo melhor
Gide quando diz que é pelo regional
que se alcança a universalização.
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03
Natal,
1956. Djalma Maranhão Prefeito nomeado
pelo Governador Dinarte Mariz. Eu, seu Chefe
de Gabinete. Um mês depois ele já
queria inaugurar obras.
Aturdido com a velocidade da administração,
eu reclamei:
- Djalma, vá mais devagar!
- Não posso. Não sei quanto
tempo Dinarte vai poder segurar os reacionários
que querem me tirar da Prefeitura. Tenho
que deixar uma marca de administrador.
E, na ansiedade, repetia o seu gesto conhecido:
com as costas da mão puxava a barba
do pescoço para cima e suspendia
as calças acima da barriga.
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04
Igreja
de Santa Terezinha, 1956. O Monsenhor Paulo
Heroncio pergunta ao Padrinho o nome da
filha para batizar. Djalma com a criança
nos braços e um sorriso iluminando
a face, responde:
- Clara Raissa.
O Padre pergunta ao Prefeito (os dois participaram
juntos da Revolução de 1930):
- Sabe rezar o Pai Nosso?
- Sei
- Então, reze.
Ele rezou.
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05
Redação
da “Folha da Tarde”, mais ou
menos na metade da campanha eleitoral de
1960, 9 horas da manhã.
Djalma Maranhão entra com o jornal
do dia anterior nas mãos e pergunta:
- Quem redigiu esta manchete?
Oliveira Júnior responde:
- Foi Moacyr.
Atrás da maquina de escrever eu me
preparei para o pior, pois conhecia as crises
da “ira bíblica”...
- A manchete está certa. É
assim mesmo. Não vamos ficar em cima
do muro. Jogo claro. Honrar as alianças.
Respirei fundo. Ainda me lembro. A manchete
dizia:
LOTT – JANGO – ALUIZIO –
WALFREDO – MARANHÃO –
GONZAGA. VOTE DO PRIMEIRO AO SEXTO.
“Do Primeiro ao Sexto” virou
slogan e depois nós fomos expulsos
do PSP (Partido de Café Filho) porque
não apoiamos Ademar de Barros.
Mais uma vez Djalma Maranhão, partia
para a práxis com os olhos voltados
para a esquerda brasileira, em sintonia
com o nacionalismo latinoamericano. Gide
tinha razão.
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06
Praia
do Forte. Início de 1961. Djalma
Maranhão eleito Prefeito de Natal
com 66% dos votos. Entardecer.
O largo braço de atleta pousado sobre
a direção do Jeep “Fura
Mundo” e o olhar no mar, Djalma vive
uma de suas costumeiras angústias:
- A educação vai ser a meta
número um do meu governo. Mas, como
asseguras escola para todos?
Como seu Secretário de Educação
discuto a questão.
Após algum tempo chegamos a duas
premissas: o orçamento municipal
teria que ser “furado” em favor
da educação e os Comitês
Nacionalistas teriam que discutir e apoiar
a propostas de educação como
movimento popular.
De repente ele girou a chave e arrancou
com o “Fura Mundo”:
- Vamos falar com o “nêgo Roberto”
(Roberto Furtado, secretário Municipal
de Finanças).
A campanha de Pé no Chão Também
se Aprende a Ler foi definida no Comitê
Nacionalista das Rocas, sob a presidência
do Presbítero José Machado,
e lançada às ruas pelo Prefeito
no dia 23 de fevereiro de 1961.
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07
1961. renúncia de Jânio e a
Campanha da Legislação pela
posse de Jango.
No
teatro Alberto Maranhão (onde se
instalara o Governo Aluizio Alves, quando
das obras do “Palácio da Esperança”),
Djalma Maranhão, tenso:
-
A direita vai radicalizar. Vem o golpismo.
Já conheço como termina este
filme.
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08
Acampamento
Escolar da Campanha de Pé no Chão,
bairro das Quintas, noite, reunião
do Círculo de Pais e Professores,
1962.
A mulher de mais de setenta anos entrega
uma rosa vermelha ao Prefeito:
-
Seu Djalma, ontem, pela primeira vez, eu
li uma carta do meu filho que trabalhava
em Brasília.
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09
Prefeitura,
1.º de abril de 1964, 22 horas.
O
exército invade o prédio.
Expulsa todos os presentes. Prende Evlin
Medeiros, Presidente do Sindicato de Construção
Civil e Vice-Presidente do Comando Estadual
do Trabalhadores. Djalma Maranhão
sai com um rádio debaixo do braço
– sua única arma.
Luiz
Ignacio Maranhão Filho e eu somos
os últimos a descer as escadas, vagarosamente.
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10
Escadarias
do Quartel da Polícia Militar, em
15 de julho de 1964, ao meio dia.
O Exército faz a troca de prisioneiros.
Djalma maranhão, com alguns companheiros,
vem do 16.º RI. Vários dos que
estavam na Polícia são transferidos
para o 16.º RI. Vou para o 16.º
RI com Vulpiano Cavalcanti, José
Arruda Fialho, Josemá de Azevedo,
Geniberto Paiva Campos, Francisco Floripe
Ginani, Carlos Alberto Galvão de
Siqueira Campos e Aldo da Fonseca Tinoco.
Nas
escadarias os dois grupos se encontraram.
Num
impulso gritei:
-
Meu Prefeito!
O
gesto com que me correspondeu ainda era
largo e generoso. Mas o seu sorriso já
era triste.
Foi
a última vez que vi meu amigo Djalma
Maranhão.
Rio,
Setembro de 1984
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