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Posse coletiva da terra: um estudo jurídico sobre o apossamento de seringueiros e quilombolas.

José Heder Benatti

 

Introdução.

Na Amazônia, além da vasta riqueza e heterogeneidade em termos de fauna, flora, hidrografia, minerais, clima, encontra-se também uma diversidade de etnias e grupos sociais (índios, remanescentes de quilombo, seringueiros, castanheiros, babaçueiros, roceiros, vazanteiros, vaqueiros, pescadores, ribeirinhos) que são importantes segmentos de camponeses que souberam usar a floresta amazônica sem destruí-la.

Porém, as políticas desenvolvidas na Amazônia brasileira nesses últimos trinta anos, com o intuito de "incorporá-la" ao território nacional, desconheceram o espaço regional, excluindo com isso toda uma história, cultura, economia e relações jurídicas desenvolvidas e aplicadas na região. À essas políticas somou-se uma concepção centralizadora e militarista de ocupação da região, que causou sérios problemas na estrutura agrária e fundiária amazônica, facilitou ainda mais a concentração dos imóveis rurais e aumentou os conflitos na disputa pela terra.

A realidade tem nos mostrado que existe um conflito entre a visão oficial, que considera apenas a sua concepção, ou seja, o seu sistema legal estatal, com a diversidade de concepções sobre o apossamento de terra na Amazônia. As políticas governamentais para tentar resolver o grave problema fundiário acabaram criando dois cenários na Amazônia:

a) de um lado a prioridade do governo em tentar dirimir os conflitos causados, principalmente, pela ocupação recente, sempre nos moldes conservadores de regularização fundiária, onde cada família receberia seu lote individual;

b) de outro, os apossamentos dos seringueiros, remanescentes de quilombos, ribeirinhos, com seus apossamentos singulares, que foram desprezados pelas políticas oficiais e que precisam ser reconhecidos e regularizados.

É exatamente sobre esse segundo grupo que apresentaremos nosso estudo jurídico, pois compreendemos que será possível estimular mudanças doutrinárias e administrativas na definição dos critérios necessários para que as populações tradicionais consigam a regularização de suas posses e mantenham o mesmo sistema de uso da terra que até hoje possibilitou a preservação da cobertura florestal de suas áreas. Por outro lado, o respeito aos usos e costumes desses grupos sociais não representa a "conservação" do passado, mas sim, a "sobrevivência" de pressupostos que irão construir o futuro mais justo social e ambientalmente equilibrado, pois serão a base para um desenvolvimento sustentável.

 

 

1 - Posse Agroecológica: o apossamento dos seringueiros e dos remanescentes de quilombo.

 

Para chegar a esse conceito, ou à compreensão do significado de posse agroecológica, iremos analisar as fontes materiais do Direito que lhes deram origem. Faremos isso, a partir de uma visão histórica, pois é exatamente dos fenômenos sociais que emerge a norma jurídica.

A necessidade de estudar o fenômeno social da posse no contexto amazônico, apresentando uma nova noção sobre este instituto jurídico, está fundamentada na compreensão de que existe uma deficiência na legislação substantiva que trata do tema. Além de se mostrar deficiente, essa legislação pretende ser demasiadamente uniforme em sua aplicação para a vastidão territorial e para a diversidade cultural e ecológica do País e, em particular da Amazônia.

A partir desse quadro, iremos fazer o estudo do surgimento da posse agroecológica, examinando sua origem histórica, fundamentos e seus elementos. Desde já alertamos ao leitor, que a posse agroecológica não é um "modelo" fechado, que pode ser enquadrado em todas as situações de apossamentos existentes na Amazônia, muito pelo contrário, pretendemos apresentar neste trabalho, os seus princípios elementares; ou seja, as proposições básicas da posse agroecológica, que poderão ser enriquecidas com análises posteriores.

Do mesmo modo, o estudo do fenômeno social da posse sob o contexto amazônico, não nos leva a concluir que estamos diante de um novo sistema legal, em oposição ao estabelecido pelo Estado. A posse agroecológica é também o resultado de uma análise crítica dos dispositivos legais vigentes, nos quais constatamos que um mesmo espaço social é articulado e regido de forma juridicamente diferente pelo direito estatal e pelo direito extra-estatal.

 

2 - Fundamentos da Posse Agroecológica.

 

Atualmente na Amazônia se encontram vários segmentos de camponeses, cada qual tendo um relacionamento muito peculiar com a terra, e eles podem ser divididos em dois grandes grupos de migração: o primeiro é o dos camponeses que imigraram para Amazônia atraídos pela política federal dos "terras sem homens para homens sem terra", e que chegaram nesses últimos 35 anos, seja de forma "espontânea", seja através dos assentamentos oficiais.

O segundo grupo é o dos camponeses que se encontravam na Amazônia antes de 1960: os que surgiram durante a escravidão, após a segunda metade do século XVIII e os que migraram de 1850 a 1912, e durante a II Guerra Mundial, na chamada Batalha da Borracha.

O primeiro grupo se expressa através de uma modalidade de apossamento e de uso dos recursos naturais compatíveis com a posse agrária, enquanto que o segundo grupo tem em sua representação de apossamento a posse agroecológica. O segundo grupo é composto pelos ribeirinhos, seringueiros e remanescentes de quilombos, e são atualmente denominados de "povos da floresta", ou seja as populações tradicionais que passaremos a analisar.

Dois elementos contribuíram na formação do apossamento das populações tradicionais: a difusão cultural e defesa da área de uso comum.

 

2.1- A difusão cultural indígena na formação da posse agroecológica.

 

Provavelmente a formação do campesinato na Amazônia ocorreu na segunda metade do século XVIII, num processo de formação de base indígena, um vez que em virtude da ação dos missionários e da política pombalina, forçou-se a destribalização dos índios e, consequentemente, eles foram levados a se integrarem cada vez mais à sociedade rural que o envolvia.

Foram com a presença das comunidades indígenas que os imigrantes (os negros escravos trazidos da África e os nordestinos) puderam se adaptar rapidamente na Amazônia. A forma de caçar, pescar, a agricultura de corte-e-queima, sistemas de manejos, hábitos alimentares, são todas "heranças" de costumes indígenas, que estão muito mais bem adaptados ao meio ambiente local do que os usos trazidos de fora. Atualmente, todas essas técnicas e costumes estão inseridas nas práticas cotidianas dos ribeirinhos, seringueiros e nos remanescentes de quilombos.

Essa assimilação se deu através da difusão cultural, que é a forma mais comum nestes casos, e ocorre quando o grupo social imigrante tem que se adaptar as novas condições ambientais existentes no local da migração. E o processo de adaptação será mais rápido se os migrantes encontrarem grupos sociais habitando o local anteriormente, que já estejam adaptados ao seu meio. "A difusão de novas práticas é facilitada em qualquer população pela prática de exogamia e pelo intercâmbio econômico com outras populações. Tais processos fazem com que continuamente novos valores e idéias sejam incorporados pelas populações, mantendo o processo de mudança cultural como um elemento fundamental do processo adaptativo."

 

2.2 - O papel da disputa pela terra como fator de estruturação da posse agroecológica.

 

Com a experiência indígena em se relacionar com o meio ambiente amazônico, inserida na realidade camponesa, dentro de um momento histórico e econômico determinado, a posse agroecológica começa a se estruturar. Inicialmente, a fixação de limites nesses apossamentos ainda era vaga e imprecisa, por outro lado, suficiente para o arranjo espacial e delimitação dos direitos de cada um sobre o espaço disponível. Tal configuração foi possível porque para a maioria das grandes propriedades rurais existente o que interessava não era a terra em si, pois valia pouco, mas o que elas produziam e seus esforços eram dirigidos para o controle da produção e comercialização. Os direitos de propriedade da terra eram precários e de legalidade questionável, de qualquer modo, o que acabava valendo na prática era o controle e o poder de coerção que o "senhor" da terra detinha sobre a produção e o comércio. Logo, o controle sobre o acesso à terra praticado pelos grandes proprietários era frágil, possibilitando que os camponeses, aos poucos, fossem estruturando suas condições materiais de subsistência com base no agroextrativsmo.

Mas é durante o enfraquecimento econômico do latifúndio que a posse agroecológica vai se organizar, exatamente no momento da fragmentação das grandes explorações agrícolas ou extrativistas, que tinham sua economia sustentada na monocultura e nos mecanismos de imobilização da força de trabalho, como por exemplo, a escravidão.

O componente da posse agroecológica, que é responsável pelo desencadeamento da coesão do grupo, é a área de uso comum, pois é em defesa dela que surgem normas de caráter consensuais para garantir a manutenção desses espaços. "Uma certa estabilidade territorial foi alcançada pelo desenvolvimento de instituições permanentes, com suas regras de alianças e sucessão, gravitando em torno do uso comum dos recursos básicos."

O grau de controle dos recursos naturais exercido pela coletividade, será maior ou menor, ou será controlado por um grupo familiar ou por vários ramos familiares, dependendo do grau de coesão e solidariedade existente no grupo, e de como foi historicamente organizada a posse agroecológica.

Se por um lado, a defesa do acesso e uso comum dos recursos naturais vai estruturar a coesão social do grupo, por outro lado, é o conflito que possibilitará a definição dos limites da área que o grupo mantém sob o seu domínio.

Num primeiro momento, é organizada toda a base de sustentação social da posse agroecológica. O acesso à terra para o exercício das atividades agrícolas e extrativistas se dá sob a mediação de um certo grau de coesão e solidariedade, que é construído nos momentos de litígios externos e de extrema adversidade ao grupo social. Essa reciprocidade, ajuda mútua entre os camponeses, se fortalece nos momentos de conflitos com grupos sociais que tentam desestruturar a sua forma peculiar de apossamento.

Mas é a partir de 1970 que a posse agroecológica começa a se consolidar politicamente e os camponeses iniciam a reivindicação de seus direitos em defesa de seu apossamento. Isto ocorre quando se vêem ameaçados por outros grupos sociais que tem uma relação diferente com a terra. O convívio dessas duas concepções é incompatível no mesmo espaço físico, pois uma terá que desaparecer para que a outra se consolide. Nessa situação, o conflito se torna intenso e violento, já que o objeto da disputa é o mesmo, porém com destinações bem distintas.

A finalidade da terra para seringueiros, ribeirinhos, remanescentes de quilombos é inconciliável com a destinação dada pelas grandes empresas mineradoras, empresas agropecuárias e, na maioria das vezes, pelos grandes projetos governamentais. Nesses momentos de conflito, a definição da faixa de terra necessária para que esses segmentos de camponeses desenvolvam suas atividades agroextrativistas, torna-se essencial para estruturar os vínculos de solidariedade e forjar uma coesão social capaz de enfrentar seus adversários, como também para garantir o controle sobre sua área.

 

3 - Uma Nova Concepção de Apossamento: a posse agroecológica.

 

Para que se configure a posse civil há necessidade do elemento subjetivo e que o possuidor tenha o título do bem; ao passo que a posse agrária completa-se apenas com o fato objetivo da exploração da terra pelo possuidor. Na posse agroecológica, o fato objetivo é o uso sustentável da terra, pois para "ter" posse é preciso interagir com o meio.

Essa forma coletiva de apossamento dos recursos naturais e a presença de práticas de trabalho familiar com base no agroextrativismo, são características da posse agroecológica.

A delimitação dos direitos dos camponeses sobre áreas que são utilizadas para o cultivo e moradia familiar, enquanto outras porções de terra são reservadas para uso comum, ocorrem dentro de uma lógica espacial na qual que não há a necessidade que essas áreas (uso comum e familiar) sejam adjacentes e permanentes. Nem mesmo que suas atividades laboriais e de moradia estejam confinadas em parcelas fixas. Além disso, a distribuição dos roçados, casas e a área de uso comum, segundo uma certa divisão espacial da área, ocorre baseada num consenso do grupo, e não em ações isoladas.

Dentro dessa realidade, existem duas modalidades de apossamentos: da comunidade, que é de uso coletivo, no qual se manifesta o sistema de uso comum da terra, e o de apossamento familiar, apoiados na unidade de trabalho familiar (que pode ser entendido como "privado").

Área de uso comum é "um bem não sujeito à apropriação individual em caráter permanente. Nestes espaços combinam-se as noções de propriedade privada e de apossamento de uso comum, onde encontra-se um grau de solidariedade e coesão social, formadas a partir de normas de caráter consensuais que garantem a manutenção destes espaços". São áreas cujos recursos são abertos, inalienáveis e indivisíveis. O acesso à terra para o exercício de atividades estritamente familiares, em parcelas da área de uso comum, só é permitido pelo conjunto de moradores para fazer casa, roça ou extrativismo, mas não para apropriar-se da área de uso comum em si.

Logo, área de uso comum são os rios, lagos, varadouros (caminhos reais), praias, barrancos e matas administradas pelo conjunto de moradores da área, onde se desenvolve o usufruto coletivo. São áreas abertas, não são de domínio privado e nem estão disponíveis à apropriação individual, mas esses "espaços abertos" estão vinculados ao mercado, pois seus produtos são vendidos e comercializados com as comunidades próximas.

A posse agroecológica é, fisicamente, a somatória dos espaços familiares e das áreas de uso comum da terra.

A posse agroecológica se materializa, enquanto espaço ecológico e social, distintos e interligados, em três conjuntos: casa, roça e mata.

Casa: entendemos como casa o espaço físico familiar que é utilizado como moradia, onde também se realizam as atividades domésticas, incluindo as áreas circundantes, que são a horta, o sítio (local onde se desenvolvem as culturas permanentes e se plantam as árvores frutíferas) e os espaços destinados à preparação da farinha (casa de farinha) e à criação de animais domésticos de pequeno porte. Em alguns casos, a casa de farinha desempenha mais a função de espaço social, pois é utilizada por mais de uma família e como local de reunião.

Roça: é o espaço físico familiar onde se desenvolvem as atividades produtivas agrícolas, que na maioria das vezes são de subsistência e que se distinguem da produção extrativista.

Os espaços considerados de apropriação familiar são aqueles relacionados ao produto do trabalho, como é o caso da casa, da roça e da capoeira. São espaços identificados com uma determinada família, fruto pleno de seu trabalho.

Mata: espaço físico onde se encontram as árvores silvestres, a floresta, a fauna. Na mata se desenvolvem as atividades extrativistas, como a coleta de frutos, castanhas, cipós, madeiras e a exploração do látex. Na mata se pratica a caça de subsistência.

Na mata, ou floresta, encontramos também as áreas de pousio (ou capoeira) que são espaços abertos anualmente na floresta para semear ou plantar por um ou dois anos. Em seguida essas áreas são deixadas em repouso durante um período, que pode ser longo o suficiente, para que a floresta as invada novamente, possibilitando a recuperação dos nutrientes do solo. Eventualmente, na capoeira, ainda existe algum produto que pode ser colhido. Na maioria dos casos é a mandioca.

 

4 - Os Elementos e o Conceito da Posse Agroecológica.

 

Os principais elementos da posse agroecológica, devido a sua própria origem, advém da posse agrária, acrescidos de outros que lhe são peculiares, a saber:

a) Na posse agroecológica o trabalho também é valorizado como forma de adquirir a terra, consequentemente, é um fato social que têm transcendência econômica, pois a atividade agrária desenvolvida pelo possuidor constitui em um valor econômico. Além de visar uma função econômica e social, ela também tem por fim tutelar os interesses culturais e ambientais;

b) Por ser um fenômeno possessório, ela só existe como uma ação concreta, um fenômeno real, visível e tangível. A posse agroecológica é dinâmica, exige a efetiva exploração da terra, porém a compreensão de exploração da terra está ligada a atividade agroextrativa, centrada no uso sustentável dos recursos naturais;

c) Posse agroecológica ocorre somente sobre um bem, não sobre um direito. Seus atos possessórios são exercidos sobre imóveis agrários e não sobre direitos ou bens móveis. Uma de suas características essenciais está exatamente no fato de que ela ocorre através da vinculação à terra, desenvolvida por meio de atividades agrárias, mas se manifesta através de uso coletivo dos recursos naturais, com a presença de práticas de trabalho familiar, baseadas no agroextrativismo. Há uma conjugação entre o apossamento familiar com o apossamento coletivo;

d) Outro elemento importante da posse Agroecológica é a área de uso comum, pois é em torno dela e para garantir o acesso e uso comum dos recursos naturais, que se estruturam a coesão e a cooperação do grupo social que dela se utiliza. Com o intuito de assegurar a área de uso comum são estabelecidas normas de caráter consensual, fundamentadas em uma legitimidade que o grupo vai construindo no processo histórico de apossamento da área;

e) A distinção entre o que é respeitado pelo grupo como sendo de uso comum e os espaços considerados de utilização familiar, se dá pelo trabalho. Toda atividade agrária (seja agrícola ou extrativa) que demanda trabalho e manutenção da área, para que nela se possa desenvolver uma atividade é considerada como posse familiar. Logo, casa, roça, capoeira, estrada de seringa ou castanha são espaços identificados a uma determinada família, pois são resultados de seu trabalho.

Com base nos elementos acima descritos, definimos posse agroecológica como sendo a forma que um grupo de famílias camponesas (ou uma comunidade rural) se apossa da terra, levando em consideração neste apossamento as influências sociais, culturais, econômicas, jurídicas e ecológicas. Fisicamente, é o conjunto de espaços que inclui o apossamento familiar conjugado com área de uso comum, necessários para que o grupo social possa desenvolver suas atividades agroextrativas de forma sustentável.

Em nenhum momento podemos confundir a posse agroecológica com posse comunal, composse ou condomínio.

A posse comunal da terra tem um sentido público, no qual não pode haver apossamento individual, não existe a noção de uso privado ou familiar. Na relação comunal, as atividades produtivas são realizadas em comum, sendo que o produto é distribuído de forma comunal e a terra não é vista como uma mercadoria que pode ser dividida e apropriada individualmente. Na posse agroecológica existe o apossamento familiar, enquanto que a área de uso comum não tem um sentido pleno de mercadoria, pois se trata de uma área imobilizada, para os fins que o grupo social lhe confere.

Embora na composse cada um dos compossuidores possa exercer o poder de fato sobre a coisa, desde que não exclua dos demais o direito de dar a mesma utilização, não é possível, no entanto, que concomitantemente ocorra o uso coletivo com a presença de apossamento individual. Na composse, nenhum compossuidor pode ter posse exclusiva sobre qualquer parte da coisa comum, pois se trata de posse em comum do mesmo bem. A posse agroecológica tem como característica a simultaneidade da forma coletiva de apossamento e o poder de fato individual sobre a coisa.

Tampouco a posse agroecológica é um condomínio, pois esse somente ocorre em propriedade. O condomínio é o domínio exercido conjuntamente com outrem. Em outras palavras, são direitos de propriedades exercidos coletivamente sobre um mesmo bem. O condomínio possui as mesmas regras gerais da composse, anteriormente descritas. O jurista José Carlos Moreira Alves afirma que a composse está "para a posse da coisa como o condomínio esta para a propriedade...".

A posse civil, agrária, indígena e agroecológica têm vidas próprias e características intrínsecas, as quais lhes garantem autonomia factual e jurídica entre si e com os demais institutos jurídicos.

É interessante notar que, se por um lado as posses possuem autonomia jurídica e formação social distintas entre si, por outro, possuem características comuns, que as interligam, sendo cada posse a percepção parcial de um todo. Esse conjunto de conceitos sobre posses irá se constituir nas manifestações sociais e jurídicas contemporâneas sobre o fenômeno da posse.

 

5 - Conclusão.

 

Nesse conjunto de proposições foram apresentadas as diferenças com os padrões do direito estatal brasileiro, inclusive questionando o modelo tradicional de assentamento em lotes agrícolas padronizados, sem consideração da especificidade e diversidade do meio natural amazônico, e propondo a utilização coletiva da terra.

Destacamos ainda, que a junção entre a questão fundiária e a questão agroecológica propõe novos critérios de apossamento da terra, centrados no uso sustentável dos recursos naturais; consequentemente, se tem uma leitura diferenciada de morada habitual, cultura efetiva, benfeitoria e módulo rural .

As áreas ocupadas por esses segmentos de camponeses são os espaços onde se localizam as casas e roças, além dos espaços utilizados para caça, pesca e as atividades de extrativismo vegetal. Logo, a noção de área apossada corresponde às terras utilizadas para garantir a reprodução peculiar do modo de vida desses camponeses.

 

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José Heder Benatti é advogado, professor de direito agrário da Universidade Federal do Pará, Pesquisador associado do Núcleo de Altos Estudos Amazônicos - NAEA e Diretor-Executivo do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia - IPA

 

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