As subscritas organizações
e clãs ciganas reunidas no encontro
"O Povo Cigano: O Outro Filho da Mãe
Terra". Conclave Continental do Povo
Cigano das Américas, celebrado em
Quito (Equador) entre 12 e 16 de março
de 2001 no início do "Foro das
Américas pela Diversidade e a Pluralidade"
CONSIDERAÇÕES:
- Que os distintos clãs
ciganos se encontram vivendo em vários
países da América desde a
época colonial e nesse sentido nossa
presença, como povo, é preexistente
a conformação de muitas Repúblicas
atuais,
- Que coletivamente o povo
cigano não é um povo adverso
nem recém chegado nem estrangeiro,
pois tem uma ampla trajetória e presença
em quase tosos os países do continente
americano,
- Que temos realizado incomensuráveis
contribuições, não
reconhecidas pela sociedade não cigana,
aos processos de conformação
das nacionalidades dos distintos países
do continente,
- Que o povo cigano nunca
pretendeu dominar ou impor sua cultura a
outros povos, e contrariamente sempre se
caracterizou por ser respeitoso a diversidade
e pluralidade,
- Que a população
cigana na América ultrapassa a cifra
de três milhões de pessoas
e leve em conta que sobre esta significativa
presença demográfica há
o fato de sermos obrigados a nos manter
invisíveis,
- Que através da
história, tanto antes como hoje,
nosso povo tem sido vítima privilegiada
de práticas e procedimentos racistas,
discriminatórios, xenófobos
e intolerantes que tem levado ao restante
dos povos e culturas a nos considerarem
com os piores e mais pejorativos qualificativos,
- Que quando se fala da
diversidade dos povos e culturas do continente
americano sistematicamente se omite e silencia
a existência do povo cigano,
- Que somos um povo com
história milenar, tradições
e idioma próprios e por isso com
plenos direitos de exercício da livre
determinação,
- Que pese que nosso povo
não tem dentro de sua opção
civilizatória a conformação
de um projeto estatal próprio, e
isto não é impedimento para
que possa estar apropriadamente representado
nas instâncias internacionais e no
sistema das Nações Unidas.
Em favor do anteriormente
exposto, as organizações e
clãs ciganas das Américas
expressamos nosso indeclinável compromisso
militante para trabalhar ativamente sobre
os seguintes princípios:
Demandas:
1. Propugnar para que os
Estados e Governos das Américas reconheçam
o direito de livre determinação
para o povo cigano.
2. Propender para que os
Estados e Governos do continente reconheçam
, promovam e garantam os direitos coletivos
do povo cigano.
3. Defender, recuperar e
valorizar a história e as tradições
étnicas e culturais do nosso povo
assim como proteger os direitos patrimoniais
consuetudinários e o patrimônio
cultural e intelectual do povo cigano.
4. Evitar qualquer forma
de discriminação negativa,
de racismo, de xenofobia, de intolerância
e de exclusão para o povo cigano.
5. Realizar a promoção
e difusão ante a sociedade dos não-ciganos
dos conhecimentos e saberes tradicionais
do povo cigano, e igualmente seus valores
étnicos e culturais.
6. Propender para que os
Estados e Governos das Américas apliquem
taxativamente as normas jurídicas
internacionais que de alguma forma protegem
os direitos do povo cigano.
7. Lutar pela ampliação
dos espaços de autonomia e auto-governo
do povo cigano,buscando o reconhecimento
de suas próprias autoridades e validando
a existência de uma jurisdição
especial, o CRIS ROMANÓ - nossas
leis.
8. Propiciar a abertura
de espaços interculturais necessários
a fim de garantir a autonomia de opção
civilizadora própria do povo cigano
nas Américas.
9. Exigir dos Estados e
Governos do continente americano que consultem
adequadamente ao povo cigano antes da elaboração
dos Planos de Desenvolvimento, com a finalidade
de trazer propostas, especialmente as que
afetem suas vidas, cultura, identidade e
necessidades fundamentais, e para que se
possam dispor recursos necessários
para o pleno desenvolvimento de suas instituições,
sua economia e para a capacitação
e educação.
10. Propugnar para que os
Estados e Governos da região garantam
e implementem programas de educação
bilíngüe e intercultural apropriadas
para o povo cigano, assim como promover
o aceso de seus jovens e mulheres a educação
média e superior em condições
favoráveis e que garantam sua permanência.
11. Exigir que os Estados
e Governos das Américas implementem
modelos alternativos de atenção
em saúde para o povo cigano que garantam
um adequado acesso aos serviços de
saúde que deveriam ser favoráveis,
compatíveis, auto-sustentáveis,
eficazes, eficientes, manter a qualidade,
e cujas ações se orientem
a fortalecer a promoção, prevenção,
tratamento e reabilitação
da saúde.
12. Cuidar para que os planos
e programas estatais de saúde tenham
em conta os conhecimentos, práticas
e usos dos distintos meios de diagnósticos
e tratamento próprios do povo cigano.
13. Reivindicar aos Estados
e Governos para que promovam e garantam
a segurança alimentar e o melhoramento
substancial de qualidade de vida do povo
cigano.
14. Propender para que os
Estados e Governos do continente garantam
a liberdade de consentimento informando
ao povo cigano, através de suas autoridades
e instituições representativas,
cada vez que se prevejam o desenrolar de
projetos, medidas legislativas ou administrativas
susceptíveis de afetá-los
diretamente.
15. Assegurar que o povo
cigano tenha acesso eqüitativo, permanente
e apropriado aos meios massivos de comunicação
social.
16. Exigir o acesso de representantes
do povo cigano às diferentes instâncias
de participação criadas pelas
instituições governamentais
e poderes públicos.
17. Contribuir para a criação
e consolidação daquelas instituições
e instâncias próprias que o
povo cigano requer,para avançar no
processo de reconhecimento de seus direitos
coletivos.
18. Viabilizar a geração
dos mecanismos e instâncias necessárias
que propiciem o estabelecimento de contatos,
relações e intercâmbios
fluídos e permanentes entre os ciganos
das Américas e entre estes e o restante
da comunidade cigana internacional.
19. Propender para que existam
as garantias necessárias para que
a forma de vida nômade e itinerante,
que conservam muitos clãs ciganos
das Américas, possam ser mantidas
no tempo que se traduz na exigência
aos Estados e Governos para que possam adequar
lugares especiais para que se instalem os
acampamentos e normas especiais que facilitem
o livre trânsito através das
fronteiras internacionais no continente.
20. Pedir aos Estados e
Governos da região que reconheçam
o status de refugiados dos membros do povo
cigano e desenvolvam políticas públicas,
programas e ações adequadas
com a finalidade de atender aos ciganos
que por razões políticas,
sociais, culturais, étnicas, religiosas,
econômicas e de qualquer outra classe,
se vejam necessitados de refugiar-se ou
a imigrar ao continente americano.
Em razão destas legítimas
demandas é que: PARA A ORGANIZAÇÃO
DAS NAÇÕES UNIDAS, ONU, QUE:
1. Iniciem um amplo e profundo
processo de democratização
de toda sua estrutura com a finalidade de
evitar que as instâncias mais relevantes
do sistema das Nações Unidas
terminem controladas por um número
reduzido, mas poderoso, de Estados que na
maioria das ocasiões tomam decisões
controversas e sem o respaldo do consenso
da comunidade internacional.
2. Elaborem instâncias,
mecanismos e procedimentos que possibilitem
que no sistema das Nações
Unidas possa participar plenamente e em
condições de igualdade frente
aos Estados, o povo cigano. Como primeiro
passo para isso propomos o estabelecimento
de um "Foro Permanente para o Povo
Cigano" que no nível mais elevado
possível, com uma composição
mista e eqüitativa e com um mandato
amplo que inclua os direitos civis, políticos,
econômicos, sociais, culturais, ambientais,
sanitários, educativos, lingüísticos,
de gênero, de desenvolvimento, prevenção
de conflitos etc.
Facilitem o diálogo entre
os Estados membros da ONU, o povo cigano
as agências e organismos especializados
do sistema de Nações Unidas
sobre temas e interesses que afetem a nosso
povo.
3. Iniciem o processo para
que com a participação ampla
e eqüitativa de delegados de nosso
povo se redijam, discutam e aprovem uma
" Declaração das Nações
Unidas para os Direitos do Povo Cigano"
que sirva de instrumento internacional que
garanta, com bases aceitáveis, todos
os direitos de nosso povo.
4. Reconheça e institucionalize
no sistema das Nações Unidas
e nos Estados membros da ONU o dia 8 de
abril como "Dia Internacional do Povo
Cigano", em recordação
da celebração, em Londres
(Inglaterra) entre 7 e 9 de abril de 1971,
do "Primeiro Congresso da União
Cigana Internacional" , que marcou
o início do movimento associativo
contemporâneo de nosso povo.
5. Como parte das reuniões
e atividades preparatórias da "Conferência
Mundial Contra o Racismo, a Discriminação
Racial, a Xenofobia e Outras Formas de Intolerância",
O Escritório do Alto Comissionado
para os Direitos Humanos, propicie e facilite
a realização de um" Encontro
Continental do Povo Cigano das Américas",
no qual possamos unificar critérios
, construir consensos e desenvolver estratégias,
a partir das distintas realidades de nosso
povo que se apresentam no continente.
6. Nos diferentes processos
em instâncias do sistema das Nações
Unidas não se continue "invisibilizando"
ao povo cigano das Américas e, contrariamente,
envolva-o ativamente nas reflexões
e discussões sobre os temas que direta
ou indiretamente o afetam.
PARA A ORGANIZAÇÃO
DOS ESTADOS AMERICANOS, OEA, PARA QUE:
7. Constitua uma instância
permanente que incorpore a existência
do povo cigano nas Américas e realize
a relação com nosso povo em
um plano de igualdade.
8. Propicie o ativo envolvimento
do povo cigano das Américas em todo
o processo concernente a reflexão
e discussão do "Projeto de Declaração
Interamericana de Direitos dos Povos Indígenas",
como quer em seu artigo 1 expressa explicitamente
que as disposições legais
desse "Projeto de Declaração"
se fazem extensivas ao povo cigano, em sua
condição de povo clã-social(isto
é, idêntico ao sócio-tribal)
9. Com participação
adequada do povo cigano se realize um amplo
estudo sobre a situação que
atualmente apresenta em matéria de
direitos humanos, civis e coletivos.
AOS ESTADOS E GOVERNOS DAS
AMÉRCIAS, PARA QUE:
10. Que reconheçam
plenamente nossa existência como povo
e garantam o exercício dos nossos
direitos coletivos e civis. Em razão
de sua projeção transnacional
e de sua ampla mobilidade geográfica,
o povo cigano deve ser reconhecido explicitamente
pelos Governos e pelos Estados do continente,
como um povo que é também
americano por tradição e presença
histórica.
11. Desenvolvam com uma
ampla participação e com o
livre consentimento e apoio prévio
de nosso povo, instrumentos legais e normativos
que garantam seus direitos coletivos e civis,
assim como também sua integridade
étnica e cultural.
12. Aos que ainda não
o fizeram ratifiquem o Convênio 169
de 1989 da Organização Internacional
do Trabalho, OIT, "Sobre Povos Indígenas
e Tribais em Países Independentes"
e aos que já o fizeram cumpram integralmente
com suas disposições legais
tendo em conta que estas igualmente se fazem
extensivas ao nosso povo.
13. Em todo o processo referido
na "Conferência Mundial Contra
o Racismo, a Discriminação
Racial, a Xenofobia e Outras Formas de Intolerância"
se garantam uma ampla e apropriada participação
de delegados do povo cigano dos países
do continente.
14. Acolham solidariamente
em seus respectivos territórios aos
refugiados pertencentes ao povo cigano que,
fugindo de perseguições e
guerras que ocorrem em outros lugares do
planeta, chegam ao continente americano
buscando segurança e garantias para
refazer suas vidas.
PARA AS ORGANIZAÇÕES
NÃO-GOVERNAMENTAIS E AS AGÊNCIAS
DE COOPERAÇÃO PARA QUE:
15. Em seus projetos e programas
de ação e intervenção
tenham em conta as necessidades e problemáticas
atuais do povo cigano das Américas.
16. Se comprometam com as
organizações ciganas das Américas
a apoiar, com seus recursos financeiros
e técnicos, todas aquelas iniciativas
e projetos encaminhados para concretizar
as principais demandas de nosso povo.
AOS POVOS INDÍGENAS
E AFRODESCENDENTES, ASSIM COMO AOS OUTROS
POVOS TRADICIONAIS QUE SE TENHAM ARRAIGADO
NO CONTINENTE:
17. Apóiem solidária
e fraternalmente aos desejos, demandas e
reivindicações de nosso povo,
encaminhadas para conseguir que saiamos
da invisibilidade a que nos têm submergido
e se reconheçam e respeitem, plena
e integralmente, todos nossos direitos coletivos.
18. Em atos diversos de
mútuo e recíproco conhecimento
e "descobrimento" reconheçam
o povo cigano das Américas como o
outro filho da Terra Mãe, e dizer,
como um povo que apesar de não ser
nativo nem originário das terras
tem antiga presença e trajetória
que o levou a compartilhar estruturalmente
os mesmos problemas que enfrentam os indígenas
e afro-descendentes.
19. Reconheçam que
o povo cigano é um agente social
nas Américas que mesmo em sua invisibilidade
está intervindo para ajudar na construção
de sociedades diversas, plurais e inclusivas,
mais democráticas, livres e justas.
20. O povo cigano das Américas
valoriza profundamente as demandas e reivindicações
elaboradas pelos povos indígenas
e afro-descendentes assim como por outros
povos tradicionais que vivem no continente,
como os que abriram caminhos que hoje nosso
povo está transitando. É por
isto que, de certa forma, o povo cigano
é herdeiro do trabalho organizativo,
não utilizado por estes povos e por
conseguinte, também os faz seus.
Finalmente, às organizações
e clãs ciganas das Américas
comunicamos a conformação
de uma instância de coordenação
a nível continental:
o " Conselho de Organizações
e Clãs Ciganas das Américas"
que terá como missão fundamental
contribuir para a consolidação
do movimento associativo do nosso povo no
continente e em todo o mundo, chegando ao
processo de vizibilização
do povo cigano no contexto da comunidade
internacional.
Em continuidade se firma
em Quito (Equador) no dia 16 de março
de 2001 pelos delegados das
Organizações e Clãs
Ciganas das Américas presentes:
AMERICAN ROMANI UNION (EE.UU)
ASOCIACION IDENTIDAD CULTURAL
ROMANI DE ARGENTINA, AICRA
ASOCIACION NACIONAL DEL
PUEBLO ROM (GITANO) DEL ECUADOR, ASOROM
FORO ROMANÓ DE CHILE
PROCESO ORGANIZATIVO DEL
PUEBLO ROM DE COLOMBIA, PROROM
ROMANO LIL (CANADÁ)
SA ROMA INC (EE.UU)
WESTERN CANADIAN ROMANI
ALLIANCE, WCRA P.S: agregado
EMBAIXADA CIGANA DO BRASIL
PHRALIPEN ROMANI, (BRASIL)
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