Os Direitos( e Deveres) Humanos
como Valor Universal
Homero de Oliveira Costa/
prof. Ciência Política/UFRN
Um dos primeiros aspectos a ser
considerado quando tratamos dos Direitos Humanos como Valor Universal
hoje é a ampliação do seu significado.
Se, desde pelo me Nos a Declaração
Universal dos Direitos Humanos (l948), a prioridade era
quanto aos direitos civis e políticos (direito a igualdade perante a
lei, proteção contra torturas, liberdade de opinião, pensamento,
religião etc) que foram consagrados nas Constituições de diversos
países (inclusive o Brasil), a partir da década de l990, especialmente
depois da Conferência Internacional de Viena em 1993, vem sendo
reafirmada a indissolubilidade dos direitos humanos, abrangendo novas
dimensões, como os direitos econômicos, culturais e
sociais (direito a alimentação, moradia, seguridade social,
educação, garantia dos direitos as minorias étnicas e raciais etc).
A Conferência de Viena é uma
referência fundamental porque, como resultado do encontro, foi aprovada
uma Declaração de Princípios que é o primeiro documento
internacional a estabelecer a indissolubilidade entre democracia,
desenvolvimento e direitos humanos. Em seu artigo 8O.,
diz : A democracia, o desenvolvimento e o respeito pelos direitos
humanos e liberdades fundamentais são conceitos interdependentes que se
reforçam mutuamente, A democracia se baseia na vontade livremente
expressa pelo povo de determinar os próprios sistemas políticos,
econômicos, sociais e culturais e em sua participação em todos os
aspectos da vida.
Os direitos humanos e as liberdades
fundamentais, constituem um todo indivisível e como valores universais,
têm uma dimensão internacional : são direitos de todos e têm de ser
praticado em todos os Estados e Nações. E hoje podemos perceber como
uma violação dos direitos humanos em Uganda, Ruanda, Colômbia e
Brasil, por exemplo, repercutem internacionalmente, através de umarede
que congrega governos, imprensa.
Organizações não-governamentais etc.
ao mesmo tempo que, no atual contexto, atrocidades cometidas por
ditadores em seus países, não ficam mais impunes e circunscrita a
esses países, em nome de uma pretensa Soberania, como expressa o caso
exemplar da prisão do general Pinochet na Inglaterra, algo
inconcebível há alguns anos atrás. Nesse sentido, é de fundamental
importância a Corte Interamericana de Direitos Humanos, presidida por
um
brasileiro (Antonio Augusto Cançado Trindade) que tem por objetivo
aplicar aos Estados-partes (O Brasil, entre eles) a Convenção
Americana de Direitos Humanos, que entrou em vigor em julho de l978. Foi
através da Corte que Fujimori, condenado por ela por violações aos
direitos humanos, teve frustradas suas pretensões de um terceiro
mandato e, fugido, exilou-se no
Japão.
Mas, ao tratar dos direitos humanos num
sentido mais amplo, a questão central que se coloca hoje é: como
garantir os direitos humanos a imensa população de excluídos,
especialmente nos países capitalistas periféricos, submetidos a
modelos econômicos perversos, com a aplicação das chamadas políticas
neoliberais, que tem aprofundado as desigualdades sociais, com o
crescimento do desemprego, da violência, do racismo e da intolerância?
Sabemos que não basta está na
Constituição. No Brasil, a Constituição de 1988, em que pese seus
reveses posteriores, incorpora todos os princípios da Declaração dos
Direitos Humanos de l948 e o país ratificou em 1992 o Pacto dos
Direitos Civis e Políticos e o Pacto dos Direitos Econômicos, Sociais
Culturais, que garantem a todos condições de vida mais digna, mas o
que vemos é o desprezo constante de tais princípios por aqueles a quem
caberia zelar por eles. Basta ver os 88 milhões de pessoas situadas
abaixo da linha de pobreza , numa das sociedades mais injustas do mundo,
como expressam os índices de concentração de renda e de terra. Por
outro lado, é preciso considerar também os deveres, como disse
Maurizio Viroli num diálogo com Norberto Bobbio , ao afirmar que
falamos mais de direitos do que de deveres: o dever de defender a
liberdade comum, o dever de respeitar os direitos dos outros indivíduos
etc. E Bobbio, que escreveu um belo livro com o título de "A Era
dos Direitos", concorda
com Viroli, acrescentando que se ainda tivesse alguns anos de vida
(está com 93 anos), estaria tentado a escrever outro, chamado "A Era
dos Deveres"...
No final dos anos 90 do século passado,
por iniciativa da Unesco foi redigida a Carta dos Direitos e das
Responsabilidades dos Estados para acompanhar a Declaração Universal
dos Direitos do Homem e Bobbio escreveu um comentário enfatizando
que não existem direitos sem deveres correspondentes. Ao Estado
cabe o dever de buscar o bem comum ( e estamos muito longe disso
no Brasil), e aos indivíduos, que não possuem apenas direitos,
cabem também deveres : da tolerância,de respeitar o outro, de
superar o egoísmo pessoal .Sem isso, como construir uma sociedade
mais fraterna e igualitária? É esse, creio, o grande desafio :
lutar para que os direitos sejam respeitados, e ao mesmo tempo,
ter consciência dos deveres enquanto pessoa e cidadão. E cumpri-los.
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