A
CONFIGURAÇÃO DE UM NOVO EDUCADOR
Constatamos, através das análises das representações dos
docentes do Ensino Superior que os profissionais da educação
estão preocupados e inquietos com a certeza de que as novas
tecnologias estão chegando às universidades e escolas em
geral. As preocupações centram-se no despreparo e no
desconhecimento desses novos meios e nas possibilidades de
aplicação que oferecem para a educação. Também surge como
preocupação a reflexão acerca dos paradigmas que permeiam a
utilização de novos meios didáticos na educação, já que
a diferença didática não está no uso ou não das novas
tecnologias, mas na compreensão das suas possibilidades. Mais
ainda, na compreensão da lógica que permeia a movimentação
entre os saberes no atual estágio da sociedade tecnológica.
Como parte de uma cultura baseada em uma configuração rizomática,
hipertextual e virtual, surge a Internet. Neste contexto, não
podemos deixar de abordar a forma como as redes
comunicacionais se desenvolveram ao longo da história e as
transformações pelas quais foram responsáveis para
compreender o impacto que as novas tecnologias da informação
e comunicação, incorporadas pela Internet (rede das redes),
têm sobre a educação e mais especialmente as possibilidades
de interação na formação docente para a utilização
dessas novas tecnologias.
As possibilidades de configuração do profissional da educação
pela interação virtual, num processo de interlocução de
saberes coletivos que se formam e transformam pela navegação
nas infomarés da informação, deve ser uma perspectiva
abordada. Uma formação que não pode acontecer pela adição
da educação mais as novas tecnologias, uma formação que
esteja embasada e refletida pela teoria e prática do educador
.
Redes comunicacionais e informação: a emergência da
velocidade
Historicamente, o ser humano descobre lentamente o mundo em
que vive. Paulatinamente, põe a natureza a seu serviço e a
transforma em escrava. Para a eficiência dessa exploração,
nasce a tecnologia que corrobora para a aceleração dos meios
e das técnicas. O indivíduo deixa, então, de ser caminhante
e passa a ser viajante. Encurta as distâncias através das
redes que nascem, crescem e proliferam cada vez com maior
velocidade.
A necessidade de ir e vir com mais velocidade transforma o
indivíduo em passageiro. Ele(a) não mais viaja. Não vê a
paisagem do seu mundo. Ele(a) só sai e chega. É passageiro
do mundo. No entanto, a busca pela velocidade não cessa aí,
ela continua. A presença do ser humano hoje é mais que física,
a viagem não o põe mais como passageiro, é holograma que
navega pelo cyberspace1
, é virtual.
O homem
primeiro montou sobre a besta de carga,
Depois sobre as carruagens munidas de eixos,
Depois sobre o frágil barco do mastro ambicioso,
Depois, quando foi preciso vencer o escolho, a lâmina
A onda e o furacão, o homem montou sobre a flama,
Ele subia ao mar, ele sobe ao céu (VICTOR HUGO apud Hetkowski,
1997.)
Anteriormente à Internet já vivenciamos a construção e a
existência de muitas redes técnicas que trouxeram consigo
inovações importantes para o mundo das comunicações e do
trabalho. A existência de tais redes sempre acontece no cerne
de necessidades sociais que caracterizam determinadas épocas
da história do indivíduo. Com a ferrovia, a rodovia, a
telegrafia, a telefonia e finalmente a teleinformática, a
redução do lapso de tempo permitiu instalar uma ponte entre
lugares distantes: doravante eles serão virtualmente
aproximados.
As trilhas e caminhos solitários, percorridos por mensageiros
e mercadores da idade média foram paulatinamente deixando
nascer novas formas de chegar, de passar, de levar, de trocar
e de voltar. As estradas de ferro, foram abrindo caminhos
antes desconhecidos pelo homem, cortando paisagens e
transformando para sempre a concepção existente de distância
e de cartografia. Os postes que enfileiram-se à distancias
cada vez maiores levam informações codificadas a lugares
nunca antes imaginados. O telégrafo permite que a informação
viaje por cabos suspensos e a invenção do telefone traz para
ainda mais perto o que está longe. As distâncias são
percorridas em fração de segundos pela voz do outro lado da
linha.
Os espaços nacionais cortados pelas linhas do telefone não são
fronteiras suficientes para a viagem das informações, dos
bens e das pessoas. A globalização do mundo pós-moderno
trouxe consigo o desejo de distancias ainda menores, sendo
percorridas quase em tempo real. Das telecomunicações e das
redes de informações emerge um mundo que é ao mesmo tempo
tribal e global, real e virtual.
Como é possível observar através da história, o conceito
de redes não é uma produção recente. As redes foram
aparecendo da necessidade da circulação das mercadorias e
das informações. Redes que disseminam-se através da navegação,
das ferrovias, das estradas e que para sua expansão contaram
com duas estratégias fundamentais: a circulação e a
comunicação, "duas faces da mobilidade que pressupõem
a existência de redes, uma forma singular de organização"
(CORRÊA, 1995).
Assim , podemos afirmar que a existência das redes ao longo
da história do ser humano, representam a busca pela diminuição
das distâncias. Talvez até, a busca pela possibilidade da
onipresença. As redes são sinônimo de poder. Onde há
informação, mercadorias e velocidade, há poder.
No mundo contemporâneo, a busca pela diminuição do lapso de
tempo é marcada pela aceleração do ritmo da inovação em vários
campos:
1) avanços na
engenharia de sistemas elétricos já permitem a transmissão
de grandes blocos de energia a longas distâncias; 2) graças
a associação das técnicas de telecomunicações às de
tratamento de dados, as redes de telecomunicações adquirem
uma potência muito maior - as distâncias se contraem e se
anulam pelo fato da instantaneidade das transmissões, e as
informações produzidas a cada segundo são tratadas e
encaminhadas num tempo cada vez mais reduzido - tal é o
sentimento dos bits, kilobits e megabits" (CORRÊA,
1995).
A existência dos bits2
é um dos fatores que caracteriza essa emergência da veiculação
rápida da informação é também o que caracteriza a
potencialidade da Internet.
INTERNET: navegação não-linear - interações
individuais e coletivas
A virtualidade de ambientes, de pessoas, de fatos, de lugares,
de desejos, de projetos e de usos coletivos que a Internet
pode proporcionar, ultrapassa ainda os limites da nossa
compreensão. No entanto, as qualidades de instantaneidade e
de simultaneidade das quais são dotadas as redes de
telecomunicações dão uma nova configuração das interações
e da utilização possíveis. Na verdade, essa nova rede
constitui-se uma resposta contemporânea à necessidade de
acelerar a velocidade de circulação de dados e de saber. "As
redes não vêm arrancar territórios 'virgens' de sua
letargia, mas se instalam sobre uma realidade complexa que
elas vão certamente transformar, mas elas vão igualmente
receber a marca" ( CORRÊA, 1995).
A Internet surge para possibilitar a interconexão de diversas
outras redes, que por sua vez são compostas de diversas máquinas,
e com isso, permitir a troca de informações, as discussões
sobre experiências e resultados de pesquisas, o acesso a
informações disponíveis em bancos de dados nacionais e
internacionais. A Internet constitui-se, na verdade numa
meta-rede, uma vez que a sua função foi a de interligar
todas as outras redes existentes no mundo, como a Bitnet,
Eunet, Janet, de tal forma que os diversos computadores
pudessem falar entre si, mesmo utilizando sistemas
operacionais diversos" (PRETTO, 1996).
Hoje, concebemos a vida como uma teia emaranhada de nexos e
nodos que se entrelaçam, se encontram, apontando caminhos ora
bifurcados, ora congruentes. É nessa mesma definição que
podemos caracterizar a Internet, como uma teia, uma floresta
de fios e circuitos, mas que ultrapassam a configuração técnica
pela interação com o humano. Nessa teia de relações
encontram-se homens, subjetividades, informações,
conhecimentos e tecnologias que guardam singularidades, que
impulsionam o indivíduo tribal na busca do coletivo global.
Ao contrário do que acontece com a descoberta de Gutemberg,
que é linear e não possibilita a interação, a impressão,
a marca do leitor, a navegação pela "rede das
redes" ocorre pela lógica do CAOS, ou seja, não há uma
lógica preestabelecida, um mapa predeterminado a ser seguido.
A instabilidade é a ordem, o acaso, a descoberta, o novo, a
busca. Esse universo maquínico, não é no entanto, frio e
desumano como se pressupõe o mundo moderno, é repleto de
relações humanas e entre os humanos, de produções
individuais que se coletivizam e de produções coletivas que
se individualizam a medida que enchem a tela de nossos
microcomputadores e se tornam cheias de significados. "A
tela do computador se constitui numa janela eletrônica, onde
a trilogia homem-mundo-máquina se deparam, se informam e
constróem suas arquiteturas cognitivas através dos pixeis3,
onde o lugar não tem território determinado, ele é
ilimitado, vasto e desafiador" (HETKOWSKI, 1997). É
uma relação diferente com a informação, uma relação que
é perpassada pela interatividade, na qual nos é permitido
ouvir e sermos ouvidos, ainda que por partícipes seletos; nos
é permitido deixar a nossa marca.
As relações lineares podem ser estabelecidas, representadas,
com uma linha reta num gráfico, essa porém, não é a
representação que se pode fazer das informações
disponibilizadas na Internet, estas se assemelham mais a uma
teia de trocas virtuais, e as relações se assemelham a um
rizoma neuronal capaz de produzir conhecimentos novos pelas
interações vividas. "Os sistemas lineares têm uma
importante virtude modular: podem ser desmontados e novamente
montados - as peças se encaixam. Os sistemas não-lineares não
podem, em geral, ser solucionados e não podem ser somados uns
aos outros" (GLEICK, 1990). A não linearidade da
rede significa que o fato de navegá-la de pontos diferentes,
modifica os resultados, altera os caminhos, a história pode
ter sempre suas partes alteradas, começo, meio e fim podem
estar em pontos diferentes a cada nova interação. É o
cybernauta4
quem determina a rota, quem dá as coordenadas que constituem
cada caminho da infomaré5.
Pela navegação não-linear que as redes codificam, os
resultados das pesquisas são imprevisíveis, a quantidade de
nodos estabelecidos entre assuntos diversos favorecem o
estabelecimento de relações entre disciplinas e/ou assuntos
distintos, é como navegar por um labirinto cujas paredes se
modificam a cada passo e em cada nodo surge uma multiplicidade
de opções em relação aos objetivos que se têm e a direção
que se deseja transitar. As interações são possibilidades
indefinidas de tempo-espaço.
Na rede a territorialidade é simbólica e os processos
comunicacionais ocorrem de acordo com os desejos, anseios e
necessidades dos participantes do cyberspace.
Há, no entanto, algumas preocupações para a utilização de
tanta informação disponibilizada nessa ordem desordenada da
qual emerge a Internet. POSTMAN (1994), alerta "que
qualquer instituição educacional, se tiver que funcionar bem
na administração da informação, deve ter uma teoria sobre
seu propósito e sentido, deve ter os meios para dar expressão
clara à sua teoria e deve fazê-lo, em grande parte, com a
exclusão de informação". Informação pela informação
não é conhecimento, e nem transforma-se em conhecimento ao
acaso. Tendo em vista a forma acelerada pela qual a informação
é produzida no mundo contemporâneo, vale dizer que a
premissa principal é a exclusão da informação de acordo
com os objetivos pelos quais direciona-se a educação.
É penoso constatar que a evolução dos tipos de redes como
respostas as necessidades dos acontecimentos históricos e
sociais, parecem não terem refletido nas escolas. A
necessidade de mudança caracterizada pelas transformações
pelas quais o mundo moderno tem passado, encontram pouca
ressonância entre as paredes tão sólidas e impenetráveis
da escola. Uma ilha em meio ao turbilhão de metamorfoses que
evoluem a sua volta.
A tecnologia está impregnando a educação não formal. As
casas de muitos de nossos alunos6
já estão conectadas a rede mundial. A emergência é que a
escola encontre seu papel nesse meio e passe a fazer parte
desse mundo. O portal pelo qual se espera que essa efetivação
aconteça é pelo conhecimento do professor das possibilidades
que interatuam nesse espaço virtual.
Essa interação professor x tecnologia, talvez, e só talvez,
venha a encurtar a distância que a história tem registrado
entre as classes sociais menos favorecidas e o acesso a
tecnologia. Quanto mais longe da tecnologia, mais acentuadas
serão as desigualdades de oportunidades entre as elites e as
populações desfavorecidas.
O professor no arcabouço da teia: nova percepção do
mundo
A visão dualítica entre o velho e o novo constitui morada
histórica na instituição oficialmente encarregada da tarefa
de transmissão cultural - a escola. O professor, parte
integrante dessa instituição tão conservadora e
tradicional, igualmente caracteriza-se como tal. A
impermeabilidade e heterogeneidade tem cegado e impedido o
docente e a escola de perceber e abrir-se para a inovação. "É
precisamente essa instituição - anacrônica, impermeável,
imutável - que se vê particularmente envolvida no turbilhão
das atuais transformações. Que estão alterando radicalmente
e profundamente a nossa paisagem cultural e social"
(SILVA, 1997).
A apropriação da cultura tecnológica e, principalmente da
cultura informática passa pela percepção do educador de que
a educação não pode constituir-se em uma ilha, não pode
estar isolada das necessidades sociais e históricas que a
engendram e permeiam. Os problemas na educação, assim como
todas as coisas na vida, acontecem de forma sistêmica, não
existem isoladas de uma realidade sócio-política-histórica.
A percepção dessa realidade é que precisa ser alterada para
a compreensão dos problemas que envolvem o processo
ensino-aprendizagem na escola. Portanto, a percepção da
complexidade que envolve a realidade e problemáticas
educacionais é primordial para uma visão do conjunto. É
essa visão global que nos permitirá compreender o grau de
importância da aproximação docente da tecnologia. É só
através do acesso, da participação de projetos virtuais que
o uso reflexivo desse meio tecnológico acontecerá.
Participando e conhecendo, o docente poderá orientar para a
busca de informações e fará o escalonamento de que informações
e experiências vivenciadas no cyberspace são realmente
merecedoras de crédito e significativas para os objetivos
educacionais.
Através da utilização da rede o professor pode participar
de listas de discussões temáticas pelo mundo todo. Os
assuntos são os mais diversos e há a possibilidade de se
criar listas novas com assuntos que digam dos nossos
interesses particulares, que na rede, se tornam coletivos.
A excessiva individualidade, característica marcante do
profissional da educação que tem dificuldades em socializar
os materiais e textos que produz, são postos em cheque pela
ética da rede. Quando disponibiliza informações elas já não
são somente suas, fazem parte do mundo virtual. Essa
predisposição a socialização dos conhecimentos e produções
que podem ser vivenciadas na rede pode criar uma cultura nova
entre os docentes: a entre-ajuda e a fraternura. Apesar de ser
um aparato mecânico, a sua essência está nas possibilidades
de interação que permite e nas novas formas de partilhar que
pode influenciar.
Para que se efetive esse esforço coletivo, o professor
precisa buscar a superação do individualismo pedagógico, no
qual ele busca soluções isoladamente para resolver as questões
do processo ensino-aprendizagem. "O individualismo que
caracteriza tão exacerbadamente a cultura ocidental,... e
consequentemente o trabalho do professor, é uma grande limitação
para as respostas que têm sido dadas à necessidade mais
característica do nosso tempo: a socialização das consciências"
(WACHOWICZ, 1996, p.134). A construção de uma inteligência
coletiva ultrapassa as barreiras do individualismo pedagógico
e busca soluções para a sua efetivação através da
tecnologia. A Internet, hoje, é exemplo máximo das
possibilidades existentes para a socialização das inteligências
através da configuração de uma rede de dados e da educação
a distância.
Assim como a percepção do mundo precisa migrar de uma
perspectiva dualísta para uma global, também a percepção
do funcionamento cognitivo precisa migrar de seqüencial e
linear para paralelo e distribuído. Essa mudança, implica em
preparo do professor, em acesso aos conhecimentos de sua área,
das concepções de aprendizagem e da utilização dos meios
tecnológicos.
Do individual ao coletivo: um novo espaço a ser
navegado
A troca de materiais e experiências, pode transformar o
trabalho do professor em uma prática mais rica, mais
reflexiva e cheia de possibilidades. Também pode no entanto,
transformá-lo em um simples copista das informações que são
disponibilizadas, sem que ao menos se dê ao trabalho de filtrá-las
para incluí-las em seu efetivo docente. Com a utilização da
Internet na educação "não é mais apenas um grupo
próximo e presente que faz escolhas, que toma decisões em
função de metas restritas a seus interesses. A inteligência
dos parceiros distribuída na rede de conexões de modo síncrono7
ou assíncrono8
pode regular e auto-regular reciprocamente. Nos possíveis
caminhos do projeto escolhido, de modo cooperativo, poderá se
configurar uma combinatória apoiada na operacionalidade
descentrada das inteligências de cada sujeito que integra a
coletividade" ( FAGUNDES, 1997,p.17).
Outra facilidade, que pode estender-se para todas os graus de
ensino, são as trocas constantes entre professores e alunos
que podem comunicar-se antes do encontro em sala de aula, ou
seja, a educação a distância. Esses encontros virtuais
podem fortalecer as relações afetivas, melhorar o processo
de pesquisa e de busca para a solução dos problemas. Isto é,
a escola pode, através da rede, assumir novas tarefas como
proporcionar o desenvolvimento da inteligência coletiva,
preservando a individualidade do educando e do educador que
aprendem a interagir coletivamente. Pois, são as "organizações
do passado, da sociedade industrial que eram estruturadas para
desempenhar tarefas de natureza hierárquica, de comando e de
controle. Tudo era segmentado, fragmentado e especializado.
Hoje, devido à competitividade e à complexidade, a
hierarquia foi substituída pela formação de grupos de
identificação e solução de problemas em torno de projetos
específicos" ( LITTO, 1997, p.87).
No momento atual, a realidade brasileira para a utilização
da Internet resume-se, com raras exceções9,
as universidades e escolas particulares. Mesmo porque, para a
viabilização e disseminação da utilização da rede
mundial nas escolas é preciso ter claro o projeto educacional
que estará alicerçando este potencialmente maior uso dos
novos recursos tecnológicos. "Isto porque, não basta
apenas colocar os velhos conteúdos, velhas formas de ensinar,
nos novos meios de transmissão de informações para termos a
garantia de promovermos estas transformações na educação"
(PRETTO, 1996).
O que precisa ser explicitado é que não são os meios que
efetivarão as mudanças na educação. Os responsáveis pelas
transformações serão os educadores, aqueles capazes de
permitir ao aluno ir muito além da informação, ultrapassar
a barreira do que já está posto e construir o seu
conhecimento. Também os educandos que, conhecendo as novas
tecnologias, tendo acesso a elas até mesmo antes dos
educadores, pressionarão os docentes para que estes utilizem
as novas tecnologias.. Nessa construção de significados é
que a verdadeira educação se efetiva e ela passa,
essencialmente pela transformação do modo de ver e de pensar
do professor em relação ao processo de ensino-aprendizagem.
Essa construção de novos significados está relacionada,
também, ao reconhecimento pelo professor de que ele é um
educando. Que aprende e precisa aprender a cada novo instante.
Ver-se como aprendiz é fator preponderante para a superação
de uma postura docente de aluno que aprende e de professor que
ensina, de indivíduo que constrói e repassa em detrimento de
uma coletividade pensante. As novas tecnologias têm
conseguido subverter, muitas vezes, esse ordem tão enraizada
de professor que ensina e aluno que aprende, já que em muitos
casos eles têm mais conhecimentos informáticos do que o
professor.
A superação
de alguns fatores se fazem imprescindíveis para a configuração
de uma nova educação: "comunicação unidirecional,
impedimento da ação e da operação, acesso direto as fontes
bloqueado, sequencialidade linear, hierarquia, autoritarismo,
controle pela recompensa e punição, descontextualização,
barreiras espaciais, fragmentação temporal..." (
FAGUNDES, 1997, p.17).
Formação do educador e tecnologia: emergência de um
profissional analista-simbólico
A formação do profissional capaz de mediar a interação
aluno-computador ganha cada vez mais espaço nos cursos, seminários
e encontros desenvolvidos por todo o mundo. A causa disso é
que está ficando cada vez mais claro que sem esse
profissional devidamente capacitado, o potencial, tanto do
aluno quanto do computador, certamente será sub-utilizado.
No entanto essa
formação profissional, segundo VALENTE, (1993), não pode
ocorrer através de um treinamento. Ela deve ser propiciada
através de cursos de formação. O diferença fundamental
entre treinamento e formação é que no primeiro caso
treinamento implica na adição de alguma técnica. Não
implica necessariamente, em uma mudança de atitude ou de
valores de trabalho. Já o curso de formação deve ter como
objetivo uma mudança, ou pelo menos propiciar condições
para que haja uma mudança, na maneira do profissional da
educação ver a sua prática, entender o processo de
ensino-aprendizagem e assumir uma nova postura como educador.
Formar um professor para o uso da informática em educação não
significa a soma da informática e educação, mas a integração
das duas áreas. Ainda segundo VALENTE, formar um professor
que seja capaz de usar a informática como recurso de ensino e
aprendizagem, não significa adicionar ao seu conhecimento as
técnicas ou conhecimentos de informática. É necessário que
o educador domine o computador afim de integrá-lo à sua
disciplina. Assim, o profissional deve dominar o computador,
processo que exige mudanças na maneira de pensar o processo
ensino-aprendizagem.
Epistemologicamente,
já se sabe que um profissional verdadeiramente conhecedor de
sua área, não é aquele que somente determina o conteúdo
produzido, mas principalmente aquele que toma essa área pelos
princípios teóricos que são determinantes para se alcançarem
os produtos elaborados; ou seja, aquele que conhece a história
da produção do conhecimento em sua área, a ponto de
explicar os fatos novos que a ela se agregam continuamente.
Também pode chamar-se a essa capacidade, de domínio da
estrutura teórica da disciplina (Wachowicz, 1996, p.134).
O domínio da estrutura teórica da área educacional ou
disciplina em que o educador atua não deve ser adicionado aos
conhecimentos de informática, não é isso mais aquilo. O que
deve ocorrer, é a percepção da disciplina sendo
desenvolvida, trabalhada através da informática como meio e
não como um fim.
Para chegar a essa percepção há necessidade da configuração
de um educador analista simbólico, que para LITTO, (1997)
caracteriza-se como o profissional que trabalha com a manipulação
de símbolos, ou seja, dados, palavras, representações orais
e visuais. Para isso o profissional deve ser capaz de três
tipos de atividades: 1) identificação de problemas (onde os
profissionais identificam os problemas referentes a sua prática);
2) solução de problemas ( onde os profissionais buscam as
soluções para os problemas; e 3) agenciamento estratégico (
onde os profissionais agenciam as condições humanas e
matarias para a solução dos problemas, melhorando assim, a
sua atuação).
Considerando que essas características se encontrem em
pessoas diferentes ressalta-se uma vez mais a importância da
produção intelectual coletiva que pode acontecer com mais
facilidade através de projetos coletivos via Internet. Pois,
identificar os problemas na educação são questões que vão
deste a estrutura física das escolas, até problemas
relacionados ao ensino e a aprendizagem. Essa vastidão que
encontra-se na intersecção destes problemas não evoluirá
nem se resolverá enquanto o educador continuar a pensar na
sua prática e nos problemas a ela concernentes de forma
individual.
A compreensão da teoria que alicerça o trabalho
desenvolvido, ou seja, o domínio da estrutura teórica da
disciplina, deve estar acompanhada pela compreensão dos
processos de aprendizagem pelos quais o homem passa para
(re)produzir o conhecimento. Só assim o educador efetivamente
será um profissional analista-simbólico, capaz de detectar
os problemas de aprendizagem em sua classe, de propor
alternativas didáticas para a superação do mesmo e de
buscar cada vez mais e sempre fontes novas e inovadoras para
transformar a sua prática.
Assim, a "formação supõe uma competência técnica
que não esteja desvinculada da realidade em que se insere,
consciente da problemática criada na escola e na sociedade
pelo advento das novas tecnologias, que integre os diferentes
aspectos da tarefa docente: pedagógico, técnico científico,
sócio-político-cultural" (STAHL, 1997, p.303).
Dessa forma, uma das tarefas emergentes para o professor será
a de ajudar a fazer sentido o labirinto de fontes de informações
que estão sendo disponibilizadas na rede cada vez em maior
quantidade.
Tomando a teoria à serviço da fundamentação de sua prática
e a didática para o desenvolvimento de um ambiente de
aprendizagem, o educador estará a caminho de uma práxis
eficiente e eficaz. Porém é a Ciência Pedagógica que deve
fundamentar essa prática, ou seja essa didática, que tem
suas bases na Filosofia da Educação, na Sociologia da Educação,
na Psicologia da Educação e na Economia da Educação deve
estar presente em qualquer curso de capacitação, inclusive e
principalmente nos que falam das novas tecnologias da comunicação
e da informação.
A emergência e velocidade da informação veiculadas pelas
redes de informação não permitem mais que a escola fique à
margem dos processos tecnológicos que invadem a vida
cotidiana. A tecnologia se construiu e se constrói através
da história, pelas necessidades sociais de superação de
limitações e pela hegemonia do poder.
Além de propiciar o acesso às novas tecnologias a escola
precisa promover discussões, tanto docentes quanto discentes,
para as implicações que elas trazem à nossa vida em
sociedade, para a configuração dos conhecimentos individuais
e coletivos, para a criação de ambientes virtuais e conexões
infinitas de informações. Informações estas que não se
configuram em conhecimento produzido para todos.
As possibilidades de atuação, de poder de crítica e de
escolha do que é realmente significativo para a aprendizagem,
a concepção do que seja aprendizagem que deve embasar a prática
docente deve advir da formação do profissional da educação,
que hoje se redesenha como formação continuada. Essa formação
pode acorrer além dos cursos, quando soubermos partilhar as
nossas ansiedades, os nossos medos, as nossas interrogações
e lançarmos mão de meios como a Internet para a concretização
de coletividades virtuais que somam, discutem, divergem,
buscam soluções e compartilham saberes.
Além das características de um analista-simbólico, existem
exigências postas pela comunidade comunicacional, informática
e globalizada que segundo LIBÂNEO (1998), inclui: maior
competência reflexiva, interação crítica com as mídias e
multimídias, conjunção da escola com outros universos
culturais, conhecimento e uso da informática, formação
continuada (aprender a aprender), capacidade de diálogo e
comunicação com os outros, reconhecimento das diferenças,
solidariedade, qualidade de vida, preservação ambiental.
Assim, a realidade informacional contemporanea implica em
novas atitudes docentes que vê o ensino como mediação, a
interdisciplinaridade como prática, ensinar a pensar, buscar
a perspectiva crítica dos conteúdos, desenvolver capacidade
comunicativa, reconhecer o impacto das novas tecnologias,
atender a diversidade cultural, atualização científica
através de educação continuada, integrar docência e
afetividade e desenvolver comportamento ético. A tarefa para
a formação docente não é fácil, porém não é impossível.
Tudo pode aquele que se permite olhar com um novo olhar.
Dessa forma, aproveitar as novas tecnologias como um meio para
o desenvolvimento de uma educação voltada as exigências
atuais e futuras implica em conhecê-las, em desmitificá-las,
desnudá-las perante nossas dúvidas. Essa aproximação e
apropriação só acontece pelo conhecimento. É preciso
conhecer para ver. Só enxergamos as possibilidades quando
conseguimos ver, através da nossa teoria, a aplicabilidade prática.
Portanto, evidencia-se que a formação docente já não pode
acontecer desarticulada da contextualização das novas
tecnologias.
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Ou Ciberespaço, ou espaço virtal – para LÉVY, (1997), é
um único computador cujo centro está em toda a parte e a
circunferência em nenhuma, um computador hipertextual,
disperso, vivo, pululante, inacabado, virtual, um computador
de Babel.
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