Prefácio
de Hélio Bicudo
Dos filhos deste solo - Mortos e
desaparecidos políticos durante a ditadura militar: a
responsabilidade do Estado
Prefácio
Hélio Bicudo (*)
O livro Dos
filhos deste solo, de autoria de Nilmário Miranda e
Carlos Tibúrcio, conta mais uma história que se insere no
contexto da luta do povo brasileiro por uma democracia ainda não
alcançada.
Nilmário
Miranda e Carlos Tibúrcio representam bem essa luta porque
estiveram dentro dela desde os primeiros dias da instalação
no Brasil da ditadura dos generais.
Não é demais
lembrar, nesta oportunidade, que ambos - Nilmário e Tibúrcio
- conheceram as crueldades dos cárceres da ditadura militar,
mas não esmoreceram um instante sequer, dedicando suas v???????idas
à recuperação da memória daqueles tempos execráveis.
Alimentados
pela esperança que instiga os jovens a querer uma sociedade
justa e solidária, Nilmário foi deputado estadual em Minas
Gerais e, a partir de 1991, deputado federal, representando
seu Estado na Bancada Federal do Partido dos Trabalhadores.
Lá como aqui pôde
contribuir para o restabelecimento do Estado de Direito Democrático.
Não esqueceu, por um momento sequer, os companheiros que
tombaram diante do poder militar. Nunca se atemorizou e na Câmara
dos Deputados desenvolveu notável trabalho em prol dos
Direitos Humanos, voltando suas atividades para a recuperação
da memória de quantos foram eliminados pelas forças de
segurança do Estado.
Convém lembrar
que o projeto de resolução que criou a Comissão de Direitos
Humanos da Câmara dos Deputados é de sua autoria, tendo
exercido sua primeira presidência e, agora, num segundo
mandato. Nessa qualidade, foi membro da Comissão especial que
realizou o trabalho de reparação moral aos companheiros
mortos e desaparecidos durante a ditadura militar.
Carlos Tibúrcio
caminhou pelas mesmas trilhas de liberdade: tendo sido um dos
estudantes presos em Ibiuna (SP), quando ali tinha lugar o
Congresso da UNE (1968), participando da chapa encabeçada por
José Dirceu.
Perseguido,
atuou na clandestinidade até o final do período ditatorial.
Jornalista, vem
contribuindo para a concretização do ideal de liberdade que
alimenta a esperança na definitiva integração do Estado
Democrático de Direito.
Esses dois
lutadores pela Democracia juntaram seus esforços na pesquisa
e divulgação da história desses jovens – homens e
mulheres - que deram sua vida por um Brasil onde a Justiça
fosse o fruto da Paz.
Os filhos deste
solo, nas páginas do livro de Nilmário e Carlos, levantam-se
do chão e, clamando por uma Justiça que lhes foi negada,
apontam pelas responsabilidades de quantos, durante cerca de
vinte anos, prenderam ilicitamente, torturaram e mataram,
escudados numa impunidade que a interpretação oficial da Lei
de Anistia – a chamada lei de duas mãos – até hoje não
vem permitindo a submissão ao devido processo daqueles que
cometeram crimes contra a humanidade, decretando a impunidade
que até hoje se tem transformado num óbice à pacificação
da família brasileira.
A leitura dos
364 casos Dos filhos deste solo aponta, sem dúvida -
diante da imprescritibilidade dos crimes contra a humanidade,
em nada valendo a lei de anistia, equivocadamente interpretada
–, para que os responsáveis por esses crimes, muitos deles
retratado???????s nos dois volumes do Brasil: nunca mais,
possam ser levados a responder por eles.
Não temos dúvidas,
Dos filhos deste solo pode despertar, pelo realismo dos
relatos, por toda a documentação em que se fundamenta, mais
um libelo que, revolvendo as cinzas ainda não apagadas de um
passado recente, aponta para a realização de uma Justiça
que só em parte se fez, porque não basta só o
reconhecimento da culpa, mas, sobretudo, o esclarecimento da
verdade, com a conseqüente punição dos culpados.
Dos filhos
deste solo é relevante
contribuição para que surja a Justiça escondida por uma
legislação que, ainda pelo medo, vai na linha da impunidade.
(*) Hélio
Bicudo, jurista, é vice-presidente da Comissão
Interamericana de Direitos Humanos da OEA (Organização dos
Estados Americanos) e presidente do Centro Santo Dias de
Direitos Humanos. Foi deputado federal pelo PT-SP (1990-94 e
1995-98).
É autor de Direitos
humanos e sua proteção, entre outros livros.
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