Capítulo
3
Ética,
Cidadania e Segurança Pública
ÉTICA,
CIDADANIA E SEGURANÇA PÚBLICA são valores entrelaçados. Não
pode haver efetiva vigência da Cidadania numa sociedade que não
se guie pela Ética. Não vigora a Ética onde se suprima ou
menospreze a Cidadania. A Segurança Pública é direito do cidadão,
é requisito de exercício da Cidadania. A Segurança Pública é
também uni imperativo ético.
A
luta pela Ética, a construção da Cidadania e a preservação da
Segurança Pública não constituem dever exclusivo do Estado.
Cabe ao povo, às instituições sociais, às comunidades
participar desse processo político de sedimentação de valores tão
essenciais à vida coletiva.
Além
de oferecer reflexões para uma leitura individual, suponho que
este texto pode eventualmente servir de subsídio para o debate
dos temas aqui tratados. Esse debate pode ocorrer nas
universidades, escolas, comunidades, igrejas, agremiações políticas
e em muitos outros espaços sociais.
1.
INTRODUÇÃO (Objetivos deste texto)
Este
texto tem a finalidade de estimular reflexões e provocar debates
a respeito de um problema que tem preocupado as pessoas, as famílias,
as comunidades, todos aqueles que, de alguma forma, têm consciência
de sua responsabilidade social. Trata-se da questão da Segurança
Pública e do equacionamento dos desafios que lança. Trata-se
mais: de buscar o provimento do direito que a sociedade tem à
segurança, sem quebra da Cidadania e sem menosprezo à Ética.
Não
constitui pretensão nossa, nem esgotar o assunto, nem dizer a última
palavra.
Se
este texto provocar controvérsias, alimentar discussões,
oferecer pistas – teremos alcançado nosso propósito.
Apresentamos
nossa visão do que seja Cidadania, numa cartilha que escrevemos
(ABC da Cidadania) e que alcançou ampla circulação (duas edições
de 10 mil exemplares, esgotadas).
No
“ABC da Cidadania”, defendemos um conceito amplo do que deve
ser entendido por “cidadania”. A contribuição criativa que
demos ao exame do assunto foi acrescentar uma dimensão ao que já
foi escrito sobre cidadania. Além das dimensões de que tratam
outros autores, vislumbramos uma “dimensão existencial” na
cidadania. Assim, a cidadania tem cinco dimensões:
·
dimensão política;
·
dimensão civil;
·
dimensão social e econômica;
·
dimensão educacional;
·
dimensão existencial.
A
cidadania tem uma dimensão existencial. Isto quer dizer o
seguinte:
a
cidadania é condição para que alguém possa, realmente, “ser
pessoa”.
O
que significa “ser pessoa”?
Significa
ter sua dignidade humana respeitada.
A
dimensão existencial da cidadania nos remete a compreender que
para “ser cidadão” é preciso ser respeitado como “pessoa
humana”.
A
cidadania é um acréscimo à dimensão do “ser pessoa”. Ninguém
pode ser cidadão se não é pessoa, se não lhe reconhecem os
atributos próprios da dignidade humana.
O
conceito de “pessoa humana” ganha toda a sua dimensão existencial
quando aceitamos a idéia de “transcendência”, ou seja, a idéia
de que a pessoa humana, a vida humana ou a história humana transpõem
o tempo. Essa visão de “transcendência” depende do credo de
cada um, da filosofia que a pessoa adote.
Em
princípio, o ser humano é um ser transcendente: uma centelha de
I)eus (se somos crentes), ou unia centelha do mistério ou da
realidade da vida (se não professamos uma crença determinada).
De qualquer forma. a “pessoa humana” é uma centelha de valor
infinito.
Deixamos
em aberto a questão da crença porque esta é urna questão
pessoal, que cada um resolve de acordo com sua consciência.
3.
NOSSA VISÃO DO QUE E SEGURANÇA PÚBLICA
Todos
os seres humanos necessitam de segurança. Todos os seres humanos
têm o direito de serem protegidos do medo, de todas as espécies
de medo.
O
medo tem raízes profundas na alma dos seres. Radica-se no
inconsciente e é objeto constante da pesquisa científica, com
destaque para a Psicanálise.
Temos
medo do abandono, de passar necessidade e privações, medo das
agressões, da doença, da morte.
Uma
sociedade que se funde no “espírito de solidariedade” procurará
construir modelos de convivência que afastem o medo do horizonte
permanente de expectativas. Numa sociedade fraterna, o homem não
será “lobo” do outro homem.
Nossa
Constituição determina que a Segurança Pública é dever do
Estado, direito e responsabilidade de todos. Será exercida para a
preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e
do patrimônio.
Incolumidade,
como define o Aurélio, é a qualidade ou estado de incólume. Incólume,
de acordo com o célebre dicionário, entende-se como “livre de
perigo; são e salvo; intacto; ileso”.
A
redação do artigo constitucional, a nosso ver, foi absolutamente
infeliz porque não se pode colocar, lado a lado, pessoas e patrimônio,
estatuindo que a Segurança Pública preserve a “incolumidade
das pessoas” e a “incolumidade do patrimônio”. A
“pessoa humana” é sagrada. O “patrimônio” não é
sagrado, o patrimônio só se justifica no serviço que preste á
pessoa humana.
Antes
de tudo, com absoluta prioridade, sem qualquer bem ou valor que se
possa assemelhar a este, a Segurança Pública deve preservar a
incolumidade das pessoas.
O
provimento da Segurança Pública inscreve-se dentro de um quadro
de respeito à Cidadania. A Cidadania exige que se viva dentro de
um ambiente de Segurança Pública. Não pode haver pleno usufruto
da Cidadania, se trabalhamos e dormimos sob o signo do medo, do
temor, da ameaça de dano ou lesão a nossa individualidade ou à
incolumidade de nossa família.
O
“direito à segurança em geral” e o “direito à segurança
pública” são “direitos humanos fundamentais”. Não há
qualquer oposição entre “direitos humanos” e “segurança pública”,
como um certo discurso tendencioso pretende sugerir.
5.
SEGURANÇA PÚBLICA E RESPEITO IRRESTRITO AOS DIREITOS DE
CIDADANIA
O
Poder Público, com a participação da sociedade, há de prover a
“segurança pública” como caminho para o exercício da
Cidadania. No provimento da Segurança Pública deverá o Estado
estar atento ao conjunto dos “direitos humanos” e dos
“direitos do cidadão”. Não se justifica que, em nome de uma
pretensa exigência de segurança pública, sejam sacrificados
determinados “direitos humanos” ou determinados direitos
inerentes à Cidadania.
A
busca da Segurança Pública e a busca da Cidadania Plena deverão
constituir um projeto solidário do Poder Público e da Sociedade.
6. UNIÃO,
ESTADOS E MUNICÍPIOS EM FACE DA CIDADANIA E DA SEGURANÇA PÚBLICA
Tanto
a Segurança Pública quanto a Cidadania, são temas nacionais.
O provimento da Segurança Pública e o estabelecimento de condições
para o florescimento e o exercício da Cidadania cabem, antes de
tudo, à União e aos Estados da Federação.
No
desenho estabelecido pela Constituição Federal, o Município tem
o dever de prestar os serviços públicos de interesse loca].
A
Segurança Pública, em princípio, não se inscreve no rol dos
“serviços públicos de interesse local”. A defesa da
Cidadania também não se limita, em principio, aos horizontes
municipais.
Entretanto,
nem por isso, o Município está descomprometido com a luta pela
Segurança Pública e pela Cidadania.
A
Segurança Pública e a Cidadania, numa primeira abordagem, são
interesses sociais que transcendem o “interesse local”.
Mas
se assim é, numa primeira abordagem, cabe um aprofundamento da
questão.
A
Segurança Pública e a Cidadania, por envolverem o cotidiano das
pessoas, acabam repercutindo no âmbito daquelas relações face a
face, diretas, paroquiais que dão aos dois temas certas feições
de “interesse local”.
Por
esta razão, cabe ao Município suplementar a ação federal e
estadual para garantirá população local “segurança pública”
e “cidadania”.
7. ESTE
CAPÍTULO NÃO ESGOTA O TEMA; PELO CONTRÁRIO, PRETENDE SUSCITAR
REFLEXÕES COMPLEMENTARES
Há
muito que se discutir e pensar a respeito da Segurança Pública.
Aos
Poderes Públicos, em suas diversas esferas, que papel cabe
desempenhar, nesta matéria?
Que
pode e deve ser feito pelos Poderes Municipais, no sentido de
cooperar para a fruição plena da Cidadania pelos habitantes das
comunas?
Que
pode e deve ser feito pela comunidade, pelas organizações não
governamentais, pelas igrejas, pelas lideranças populares, pelas
organizações de bairro, em prol da Segurança Pública e da
Cidadania, no âmbito local?
Quais
são as mais prementes urgências da Segurança Pública e da
Cidadania, no país, no Estado, no Município, no bairro?
A
iluminação pública adequada pode contribuir para que haja um
ambiente de maior “segurança pública”? Uma crise nacional de
energia elétrica justifica a redução da iluminação pública
ou essa iluminação é uma prioridade social, em nome da Segurança?
Há
no seio da população a consciência de que todos são participes
numa política de Cidadania e Segurança Pública?
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