MOTIVO DA
INDICAÇÃO
Helena Greco,
80 anos, atua há vinte anos na luta pelos direitos humanos e,
atualmente, é idealizadora e titular da Coordenadoria de Direitos
Humanos e Cidadania da Prefeitura de Belo Horizonte, primeira
instituição pública no Brasil a propor políticas referentes a
direitos humanos. Desde a luta pela anistia, vem combatendo
incansavelmente todas as formas de opressão, do racismo a
qualquer tipo de discriminação e, atualmente, coordena, também,
o movimento Tortura Nunca Mais, de Minas Gerais.
HISTÓRICO
Criada em
1993, o objetivo da Coordenadoria de Direitos Humanos e Cidadania
da Prefeitura de Belo Horizonte é implementar políticas específicas
em favor do fortalecimento da cidadania e unificar projetos na área
de direitos humanos. Entre as atribuições da coordenadoria está
a criação de núcleos jurídicos, de comissões ou de
departamentos de direitos humanos nas administrações regionais,
a criação do SOS/Direitos Humanos - para os casos de violência,
discriminação e abuso de autoridade - e a elaboração de uma
política de comunicação alternativa para veicular e socializar
o binômio direitos humanos e cidadania. Pretende, também,
levantar e sistematizar documentação para montar um banco de
dados sobre a situação dos direitos humanos e a história de
luta pela cidadania em Belo Horizonte, trabalhando em conjunto com
o arquivo público municipal.
IMPORTÂNCIA
DA CANDIDATA PARA A EXISTÊNCIA DO PROJETO
Helena já
ocupava a função de coordenadora de Direitos Humanos
oficiosamente, enquanto a proposta da coordenadoria tramitava na Câmara.
A sua criação é conseqüência de duas décadas de luta em
defesa dos direitos humanos e da cidadania e foi um dos
carros-chefes da proposta da Frente BH Popular, que elegeu o
petista Patrus Ananias prefeito de Belo Horizonte. Mas é, acima
de tudo, uma conquista de Helena Greco, responsável também pela
criação da Comissão Permanente de Direitos Humanos, quando era
vereadora. É Helena quem toma a frente e dá a palavra final em
todas as ações e decisões da coordenadoria. Participa de todos
os seminários e palestras promovidos pela coordenadoria e é uma
líder para os que trabalham com ela ou compactuam com suas idéias.
E paga o ônus de defender uma causa polêmica. Sua casa já
sofreu sete ameaças de bombas. Graças ao trabalho da
coordenadoria, nos últimos três anos, o grau de organização e
de conscientização sobre os seus direitos aumentou
consideravelmente nas comunidades de baixa renda. Hoje, elas sabem
a quem recorrer, quando sofrem violência, de quem cobrar soluções.
CAPACIDADE
DO PROJETO DE OFERECER SOLUÇÕES
O projeto
prioritário da coordenadoria, que considera que as violações se
repetem porque a maioria das pessoas desconhece os direitos
fundamentais e coletivos, chama-se Direito Achado na Rua. "Os
excluídos não conseguem encontrar a justiça e a garantia de
defesa de seus direitos", justifica Helena. Por isso, o
projeto capacita membros da comunidade como juristas orgânicos,
treinados para defender o direito das pessoas, de grupos e de sua
comunidade. Os juristas orgânicos informam a população, que se
reúne num movimento organizado em torno das reivindicações da
população. Tratam, ainda, da resolução dos problemas levados
ao movimento, encaminhando-os às instituições competentes
(Defensoria Pública, quando se necessita de advogados; Ministério
Público, quando se trata de ações coletivas e representações;
Judiciário, no caso de habeas-corpus, habeas-data; Executivo,
para direito de petição; Legislativo, quando se trata de
projetos de interesse popular; policiais, para abertura de inquéritos,
e departamento de assistência judiciária da Faculdade de Direito
da UFMG, para ações coletivas). O Direito Achado na Rua trabalha
com as comunidades organizadas, como associações de moradores,
igrejas, movimentos, conselhos, comissões, grupos culturais,
entidades filantrópicas, escolas, postos de saúde. A
coordenadoria também criou um banco de dados, que organiza e
cataloga o acervo de informações existentes relativo à defesa
dos direitos humanos e à história de luta pela cidadania em Belo
Horizonte. Já foi solicitado que a assessoria jurídica da
coordenadoria tenha acesso ao sistema de comunicação do Fórum
Lafayete, o que permitiria o acompanhamento on line dos processos.
Está prevista, também, uma parceria com o Arquivo Público
Mineiro, que concentra documentação pertencente a todos os órgãos
do Estado. As Oficinas de Cidadania também integram os projetos
da coordenadoria. Elas promovem debates para conscientizar a
população de seus direitos e garantias individuais e coletivas e
formam agentes multiplicadores, que atuam dentro da própria
comunidade. Para que as oficinas sejam instaladas, equipes da
coordenadoria se reúnem com as comunidades e definem com elas os
assuntos prioritários a ser trabalhados, como violência
policial, violência contra a mulher, contra crianças, discriminação
racial, abuso de autoridade, questão da exclusão e da
marginalidade.
IMPACTO DO
PROJETO
O projeto
Direito Achado na Rua foi implantado na Regional Nordeste, que
atende uma população de cerca de 250 000 habitantes, distribuídos
em 78 bairros e dez vilas e favelas. Durante a implantação do
projeto foram realizadas cerca de 250 reuniões com associações
de bairros, grupos culturais, igrejas e outros movimentos,
atingindo um contingente de aproximadamente 3 500 pessoas. De
fevereiro a dezembro de 1995, a coordenadoria recebeu denúncias
de 143 crimes cometidos por policiais militares e 69 por policiais
civis. E, entre 1994 e 1995, registrou dez mortes a partir de
situações de violência praticadas por policiais militares e
civis. Todas as denúncias foram encaminhadas para a Promotoria de
Defesa da Pessoa Humana do Ministério Público e divulgadas para
a imprensa e para as entidades de direitos humanos nacionais e
internacionais. A principal realização da coordenadoria este ano
teve caráter internacional. Trata-se do Tribunal Popular: as
chacinas em julgamento. Um grande júri popular, montado na Praça
Afonso Arinos, no centro de Belo Horizonte, para julgar as sete
chacinas ocorridas no Brasil nos últimos anos: Carandiru, em São
Paulo; Vigário Geral, Acari e Candelária, no Rio de Janeiro;
Ianomâni, em Roraima; Corumbiara, em Rondônia, e Eldorado dos
Carajás, na Amazônia. Julgou também o caso Taquaril, em Belo
Horizonte, em que três crianças foram executadas na madrugada de
15 de março deste ano, depois de serem seqüestradas na região
central. Um telefonema do grupo Reação ã composto por policiais
civis ã reivindicou o massacre. O Tribunal Popular foi comandado
por um juiz-presidente, Celso Luiz Limonge, desembargador do
Estado de São Paulo e secretário-geral da Associação de Juízes
para a Democracia. A acusação ficou a cargo do ex-
procurador-geral da República, Aristides Junqueira, e o advogado
de defesa foi o presidente da Ordem dos Advogados de São Paulo,
Carlos Eduardo Pellegrini Di Pietro. Entre as testemunhas, Ananias
de Souza Pereira, sobrevivente do massacre de Corumbiara; Maria
Pereira da Silva, sobrevivente da chacina de Eldorado dos Carajás;
Yvonne Bezerra de Mello, artista plástica que desenvolve trabalho
com meninos e meninas de rua no Rio; Diolinda Alves de Souza, uma
das líderes do Movimento dos Trabalhadores Sem Terra, no Pontal
de Paranapanema, e Ana Maria da Silva, mãe de Acari. Entre os
jurados, a própria Helena Greco, o prefeito de Belo Horizonte
Patrus Ananias e Nilmário Miranda, deputado federal e membro da
Comissão de Direitos Humanos da Câmara Federal. O tribunal
considerou culpados por crime de lesa-humanidade o latifúndio, o
aparelho policial e os governos estaduais e federal. A
coordenadoria atuou, também, em projetos referentes a: n racismo
(em favor da implantação da convenção 111 da OIT - Organização
Internacional do Trabalho, que visa eliminar qualquer forma de
discriminação de raça e gênero); n trabalho infantil (com a
elaboração de um diagnóstico sobre a situação nas empresas
mineiras e a luta pela ratificação da convenção 138 da OIT,
que proíbe o trabalho para menores de 15 anos); n condição da
mulher (com a construção da Casa de Abrigo); Promoveu, ainda,
debates para esclarecer a questão da Aids e, nos últimos dois
anos, desenvolveu importantes campanhas nacionais: n contra a
aceitação como delegado de polícia do Rio de Janeiro do
torturador Roberto Blanco dos Santos, em 1994; n pela destituição
do torturador Ricardo Agnese Faiad, da 2a Subdireção de Saúde
do Exército, e pela anulação de sua promoção a general de
brigada, em 1994; n pela responsabilização criminal do general
de reserva Adyr Fiúza, ex-chefe do Centro de Informações do Exército,
em razão de suas declarações em favor da tortura; n contra a
concessão do título de Cidadão Honorário do Rio de Janeiro ao
coronel-bombeiro José Halfed Filho, agente do aparelho repressor
da ditadura militar, em 1994; n pelo reconhecimento do assassinato
de Hamilton Fernando Cunha, Arno Preis, Carlos Marighella e Carlos
Lamarca por agentes do Estado na época da ditadura militar.
PONTOS POLÊMICOS
As principais
críticas contra Helena Greco vêm de setores da Polícia Civil,
segundo os quais, a coordenadoria sob sua direção é um órgão
institucionalizado para defender bandido. Em função disso, a
vereadora Zazá Schettino (PTB) e o deputado Paulo Schettino (PTB)
ã ambos ligados à Polícia Civil ã chegaram a enviar um
requerimento ao ministro da Justiça, Nelson Jobim, pedindo a
inclusão de policiais civis na lista dos desaparecidos durante o
governo militar, para efeito de indenização de suas famílias. A
vereadora justificou o pedido, dizendo que os policiais estavam
apenas cumprindo seus deveres e cumprindo ordens superiores.
Helena Greco, contra a inclusão, afirmou que as famílias dos
policiais já tiveram pensão e enterraram seus mortos, o que não
aconteceu com os mortos e desaparecidos políticos. Em abril do
ano passado, a presença de Helena Greco foi cobrada no enterro de
um detetive da Polícia Civil, assassinado na perseguição de um
suposto traficante. Durante o enterro, tanto o atual secretário
estadual de Segurança, Santos Moreira, quanto a maioria dos
policiais indagavam o porquê da ausência de representantes das
entidades ligadas aos direitos humanos. Helena Greco rebateu o
comentário afirmando que a morte de um policial é um fato a
lamentar, mas ele tinha consciência do perigo que corria no exercício
de sua profissão. "A gente também não vai ao enterro dos
nossos companheiros da construção civil, massacrados por falta
de segurança no trabalho." Em favor de Helena, depõe Cecília
Coimbra, presidente do Tortura Nunca Mais, do Rio de Janeiro:
"Conheci Helena Greco há quinze anos, durante a militância
no Comitê Brasileiro pela Anistia e sempre tive muita admiração
pela pessoa e pela luta. Ela não só denunciou a situação das
pessoas que sofreram na época da ditadura, que estavam no país,
como as atrocidades cometidas às impedidas de voltar ao Brasil. O
trabalho dela incomodou as pessoas ligadas aos aparatos de repressão.
A luta de Helena continuou depois da anistia. Ela fundou o grupo
Tortura Nunca Mais, de Minas Gerais, dedicou-se ao resgate da história
e continua seu trabalho, denunciando a violência de hoje.
Mantemos contato freqüentemente, trocando documentos que
denunciam essa violência, que produzem resultados principalmente
perante as instituições internacionais. O trabalho de Helena não
é só pelos direitos humanos, é também pela democratização
deste país".
RECONHECIMENTO
Em março de
1979, Helena representou o Brasil no Congresso pela Anistia em
Roma. Em julho daquele ano, foi representante aclamada no
Congresso Nacional dos Comitês Brasileiros pela Anistia. Como
coordenadora do I Encontro da Mulher Mineira, promovido pelo
Movimento pela Anistia, foi convidada, ainda no mesmo ano, a ser
presidente de honra na solenidade de entrega do Primeiro Prêmio
Wladimir Herzog. No ano seguinte, foi eleita novamente
representante nacional dos movimentos pela Anistia Ampla, Geral e
Irrestrita e Direitos Humanos no II Congresso Nacional desses
movimentos em Salvador (BA). Em 1982, recebeu homenagem do
Congresso de Mulheres Negras, promovido pelo Movimento Negro
Unificado, em Minas. Em 21 de abril de 1994, recebeu o diploma da
Grande Medalha da Inconfidência do Estado de Minas Gerais, em
Ouro Preto. Em maio de 1995, recebeu a medalha Chico Mendes de
Resistência, no Rio de Janeiro e, em julho último, a Comenda e Mérito
Cultural Aloísio Pimenta, concedidos pelos grupos de teatro de
Minas Gerais.
VIDA DA
CANDIDATA
Helena Greco
nasceu em Abaeté, região oeste de Minas Gerais, em 15 de junho
de 1916. Aos 8 anos, mudou-se com a família para Belo Horizonte.
Foi alfabetizada por uma professora primária, a partir de um
livro de receitas. Cursou o grupo escolar Olegário Maciel, e o
secundário, no tradicional colégio de madres francesas Santa
Maria. Lá, contava com a ajuda de uma freira, que lhe passava
romances de Balzac e Tolstoi, escritores proibidos para moças
solteiras da época. Casou-se em 1933 com um primo, o médico J.
B. Greco. Até os 60 anos, dedicou-se ao marido e aos três
filhos, Heloísa, 44 anos, hoje sua companheira na coordenadoria,
Marília, 46 anos, e Dirceu, 50 anos, médico como o pai.
"Mesmo em casa, sempre me indignei com as injustiças, mas
fazia um trabalho mais assistencialista", conta. A partir da
década de 70, com os filhos ativistas do movimento estudantil da
Universidade de Minas Gerais, ela participou do primeiro ato público
contra a repressão em Minas na Faculdade de Medicina da UFMG, em
1975. Foi quando falou em público pela primeira vez. "De lá,
saímos direto para casa, eu e um grupo de mulheres, e começamos
imediatamente a articular o Movimento Feminino pela Anistia",
conta. "Minha geração tinha uma dívida com essa questão.
Mudei a minha vida a partir disso", lembra. Helena faz questão
de ressaltar o papel de seu marido em toda a sua trajetória como
ativista dos direitos humanos. "A casa vivia cheia de gente,
especialmente mulheres, e isso nunca o incomodou, pelo contrário",
diz. O marido atesta: "Tenho muito orgulho de Helena, que
sempre se indignou com as injustiças e soube levar sua luta
adiante". Hoje, ela mantém uma rotina de trabalho
surpreendente para quem alcançou os 80 anos. Trabalha diariamente
e toma a frente de todas as decisões. Helena trabalha em casa, na
parte da manhã ã depois dos apelos insistentes dos filhos para
que reservasse ao menos essa parte do dia para ficar em casa ã e,
por volta das 13h30 vai para a coordenadoria. "Não tenho
hora para retornar para casa", afirma. Ela faz questão de
frisar que está sempre disponível para participar de debates e
para o que mais for chamada. A filha Heloísa, junto com uma
equipe de assessores, se encarrega de organizar sua agenda.
"Não quero parar. Não quero ser símbolo. Quero apenas
continuar lutando por aquilo que acredito."
CURRÍCULO
Helena Greco
formou-se em Farmácia pela Faculdade de Farmácia da UFMG em
dezembro de 1937 e exerceu a profissão informalmente ao lado do
marido. Depois de iniciar o movimento pelos direitos humanos em
Minas, exerceu mandato parlamentar como vereadora de Belo
Horizonte pelo Partido dos Trabalhadores por duas vezes, de 1983 a
1992. Criadora e presidente da Comissão Permanente de Direitos
Humanos da Câmara Municipal de Belo Horizonte (1983-1992), é
idealizadora e titular da Coordenadoria de Direitos Humanos e
Cidadania da Prefeitura de Belo Horizonte e coordenadora da Comissão
Paritária de Mulheres da Prefeitura de Belo Horizonte. Ela
participa de uma série de comissões relacionadas aos direitos
humanos e à cidadania, como membro e como fundadora. Suas
atividades no setor político começaram em 1977, quando fundou e
presidiu o Movimento Feminino pela Anistia em Minas Gerais ã
cargo que ocupou até 1980. De 1981 a 1982, foi vice-presidente do
Comitê Brasileiro pela Anistia e membro da Comissão Executiva
Nacional dos Movimentos de Anistia e Direitos Humanos de 1979 a
1982. Foi coordenadora do Comitê de Apoio e Solidariedade aos
Movimentos Operários e Populares, de 1982 a 1984, e ajudou a
fundar o Movimento Tortura Nunca Mais, de Minas Gerais, que
coordena desde 1986. De 1992 a 1995, integrou o Conselho Estadual
de Direitos Humanos e o Conselho Municipal de Defesa da Criança e
do Adolescente. Desde 1992, Helena é membro do Fórum Estadual
pela Vida e fundou, no ano passado, o Fórum Permanente de Luta
pelos Direitos Humanos de Belo Horizonte. Em sua experiência
partidária, Helena Greco foi uma das primeiras assinantes do
Manifesto de Fundação do Partido dos Trabalhadores, em 1980; foi
membro da primeira Executiva Nacional, do primeiro Diretório
Nacional, da primeira Executiva Estadual e do primeiro Diretório
Estadual do partido. É membro efetivo da Comissão de Mulheres e
da Comissão Diretora Municipal do PT.
EXCELÊNCIA
DO TRABALHO
Patrus
Ananias, prefeito de Belo Horizonte e companheiro de Helena Greco
desde a época da luta pela anistia: "Sempre considerei dona
Helena a expressão de um dos poucos mistérios que talvez valham
a pena ser sondados: o mistério do bem. Nunca vi dona Helena numa
situação em que não estivesse exercendo à sua maneira aquelas
leis que um dos escritores do seu altar, Marcel Proust, dizia
trazermos todos no coração: as leis da bondade, do esforço
amoroso, da compreensão, da inteligência. Daí a força do tal
mistério: converter cada uma dessas leis numa espécie de sonho
civil compartilhado, numa opção de vida. E se ela sai por aí,
como faz no seu trabalho na Coordenadoria de Direitos Humanos, no
belo projeto de cidadania que desenvolve (Direito Achado na Rua),
denunciando injustiças, violências, visitando lugares de ameaça
à dignidade humana, comprando brigas aqui e ali, é porque ela
fez dessa experiência do bem, da generosidade, da compaixão, uma
política hoje sem volta em Belo Horizonte. À noite, ela se
dedica ao seu gabinete especialíssimo de culinária, ao marido,
aos seus livros, para só recomeçar no dia seguinte". Hélio
Bicudo, deputado federal: "Helena é um exemplo de luta da
mulher brasileira pelo restabelecimento da cidadania. Desde a
ditadura, ela se pôs a campo e se dedicou a essa luta, começando
com os comitês pela anistia. O êxito da campanha pela anistia no
país se deve a mulheres como ela, exemplares".
COMENTÁRIOS
DA CANDIDATA
"As
pessoas costumam dizer que, quando se lida muito com um problema,
fica-se calejado e acostuma-se com a situação. No meu caso é
diferente. A cada ato de violência cometido, seja como for e de
que forma for, fico perplexa como da primeira vez. Não há como
fugir do óbvio: a violência e a criminalidade são diretamente
proporcionais ao poder marginalizador desse sistema, que já foi
apelidado de capitalismo selvagem. A política centralizadora e
recessiva do neoliberalismo leva ao paradoxismo da exclusão
social e à situação de barbárie vigente: violência urbana e
policial constituem dois lados da mesma moeda; as relações de
convivência e o senso comum são rebaixados a níveis insuportáveis.
A violência, que perpassa todas as malhas da sociedade (inclusive
as mais finas), se apresenta como violência de classe. A convivência
permanente com o medo e a insegurança não é mais prerrogativa
exclusiva dos despossuídos históricos, vítimas das relações
de desigualdade e opressão: agora é reivindicada também pelas
classes médias. Está instalada uma espécie de guerra civil
fria, ou não-declarada, reciclagem da Lei de Segurança Nacional:
os inimigos internos agora são os tais despossuídos históricos
ã ou mais da metade da população ã, cada vez mais
estigmatizados como bandidos e suspeitos permanentes. O fenômeno
meninos e meninas de rua conseguiu efetivar a proeza absurda da
identificação cada vez maior das crianças com esses epítetos.
A política de segurança pública tem sido a da violência
policial explícita e a sua lógica é o primarismo perverso
resumido na fórmula åviolência combate violência¹, um fator a
mais de estímulo à criminalidade que pretende combater. Belo
Horizonte não escapa desse quadro. Cidade cujo processo de
crescimento foi caracterizado pela subserviência ao capital e à
propriedade, em detrimento da maioria da população, reflete
exemplarmente a situação de barbárie apontada: aumento dos níveis
de miserabilidade, aumento da criminalidade e da violência
urbana, aumento da violência policial ã ciclo odioso e
aparentemente auto-sustentado. As forças públicas em Belo
Horizonte transgridem sistematicamente os mais elementares
direitos humanos. Seqüestros, invasões de domicílio e
espancamentos são práticas rotineiras de tortura
institucionalizada. Essas arbitrariedades gozam da mais completa
impunidade, o que as potencializa e engendra uma outra questão,
talvez a mais perversa: a banalização das coisas mais terríveis,
como maus-tratos, violência generalizada, racismo, chacinas periódicas,
extermínio cotidiano. Fórmula mágica para erradicar de vez esse
processo não existe. Mas precisamos interromper o aviltamento das
relações de convivência e criar uma cultura que discuta o
desmantelamento das práticas que alimentam o círculo vicioso da
violência. Políticas que promovam a distribuição das riquezas,
de um lado, e a participação direta da população nas decisões,
de outro, podem levar à reversão do processo de alienação da
sociedade e apontar para a verdadeira cidadania. É esse o combate
que temos travado desde a luta pela anistia."
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