Direito à
liberdade de reunião e associação
FLÁVIA PIOVESAN
Procuradora do Estado de São Paulo (Coordenadora do
Grupo de Trabalho de Direitos Humanos)
A Declaração de 1948 constitui um marco histórico
ao consagrar direitos universais, que devem ser
respeitados por todos os Estados, independentemente de
suas diferenças culturais, sociais, econômicas e políticas.
Ela afirma que os direitos humanos decorrem da
dignidade inerente à qualquer pessoa, sem discriminação.
A pessoa por ser pessoa é sujeito de direitos, não
importando sua raça, etnia, cor sexo, língua, religião,
opinião política, origem, condição social, ou
qualquer outra condição.
Com o objetivo de assegurar o respeito à dignidade
humana em todas as partes do mundo, a Declaração de
1948 consagra um universo de direitos que inclui tanto
os direitos civis e políticos (como as liberdades de
reunião, associação, expressão), como também os
direitos econômicos, sociais e culturais (como a saúde,
a educação, o trabalho). É o primeiro documento
histórico que conjuga estas duas categorias de
direitos, expressando que os direitos humanos compõem
uma unidade, a ser vivida em sua indivisibilidade e
interdependência . Isto é, não existe liberdade sem
igualdade e, por sua vez, não existe igualdade sem
liberdade.
Dentre os direitos assegurados pela Declaração
Universal de 1948, destaca-se a liberdade de reunião
e associação pacífica, prevista em seu artigo XX .
Vale dizer, a Declaração não apenas estabelece
universalmente o direito das pessoas se reunirem, de
forma episódica e temporária, como também o direito
de formarem associações, relacionando-se de forma
mais duradoura e permanente, na busca de objetivos pacíficos
.
Pertencer a associações é sempre um ato voluntário,
já que ninguém pode ser obrigado a integrar uma
associação, como dispõe a própria Declaração. É
ainda proibida a interferência arbitrária do Estado
no exercício destes direitos, que independem de prévia
autorização do Poder Público.
Os direitos de reunião e de associação possibilitam
a dinâmica de organização e articulação da
sociedade civil, mediante a participação ativa de
indivíduos. Permitem o intercâmbio de idéias, a
defesa de interesses, bem como ações conjuntas
destinadas à implementação de propostas e
reivindicações, doando um novo sentido de ação
coletiva e social.
As entidades, associações, sindicatos, organizações
e movimentos sociais fortalecem a tônica democrática
de uma sociedade. Os direitos de reunião e associação
despertam e estimulam o exercício da cidadania, que
viabiliza o direito a ter direitos. Reunidas e
associadas, as pessoas passam a compartilhar, com
maior intensidade, da busca de proteção de direitos,
destacando-se os movimentos pela proteção dos
direitos das mulheres, da população negra, das
pessoas portadoras de deficiência, dos idosos, das
crianças e adolescentes, pela reforma agrária, por
saúde, acesso à educação, melhores condições de
trabalho, moralidade na polícia, dentre tantos
outros.
Estes movimentos formam sujeitos coletivos, que somam
as diferentes vozes, potencialidades e ações de inúmeras
pessoas. Por isso emergem com mais força, fôlego e
vida, transcendendo a fragilidade de indivíduos
isolados.
As liberdades de reunião e de associação garantem a
existência da sociedade civil, que, por sua vez,
assegura a vigência de um regime democrático. O
exercício destas liberdades revelam assim a
capacidade de organização de uma sociedade civil e o
grau de amadurecimento democrático.
Os direitos de reunião e de associação, a existência
de uma sociedade civil e a vigência de um regime
democrático são pressupostos fundamentais ao exercício
pleno da cidadania, sem o qual os demais direitos
fundamentais não podem ser verdadeiramente
implementados .
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