VIOLÊNCIA
Para Ouvidor, campineiro
tem razões para criticar polícia
Os motivos são a incompetência,
ineficiência da polícia em relação ao assassinato do prefeito
Antonio da Costa Santos, o Toninho do PT, há quase cinco meses. O caso
agora está com o DHPP
Adélia Chagas
Diante da ineficiência, da incompetência
e da postura obscura da polícia para esclarecer o assassinato do
prefeito Antonio da Costa Santos, o Toninho do PT, a população de
Campinas tem todo direito de pensar o que bem quiser. Dessa vez, quem
fala não é a viúva do prefeito, Roseana Moraes Garcia, ou a Comissão
de Acompanhamento do Inquérito, que pedem o afastamento dos policiais
de Campinas desde dezembro, mas o Ouvidor da Polícia, Fermino Fechio
Filho.
A crítica foi feita em entrevista à Agência
Carta Maior . Fecchio foi obrigado a acompanhar depois de um
delegado e mais quatro investigadores do 4o Distrito Policial de
Campinas terem matado quatro adolescentes de 19 a 25 anos em um condomínio
fechado na praia Martin de Sá, em Caraguatatuba (litoral norte de São
Paulo), no dia 2 de outubro do ano passado, por volta das 4h30. Como há
suspeita de execução, o caso passou a ser acompanhado pela Ouvidoria,
responsável por apurar denúncias contra policiais. Dois dos quatro
mortos eram suspeitos de participar do assassinato do prefeito.
Se a morte de Toninho há quase cinco
meses não foi esclarecida, o episódio de Caraguatatuba muito menos. O
ouvidor desconfia desde os primeiros passos dos policiais do 4o DP, que
deixaram Campinas sem avisar o seccional da cidade litorânea. Mas, como
diz Fechio Filho, isso é só o começo de uma história mal contada.
Três horas depois da ação, os quatro
policiais relataram o caso na delegacia de Caraguatatuba e entregaram as
quatro supostas armas usadas e duas das vítimas. Supostas, porque um
exame de balística provou que as balas não conferem com as das armas
entregues. Relataram que houve confronto e resistência. No entanto, a
prova pericial não comprova a troca de tiros e que os rapazes estariam
esperando os policiais, a porta da casa não foi arrombada.
Fechio Filho aponta outra contradição.
Os quatro policias, quando foram chamados para necropsia, contaram que
havia mais um homem na operação, um carcereiro. Outro fator que também
desmente a versão oficial: o relato inicial dos quatro não confere com
as fotos do local -- também não preservado. Os colchões da casa,
segundo Fechio Filho, foram destruídos. Os policiais contaram que deram
12 tiros, mas o exame aponta 18.
“Parece não ser interessante ter os
suspeitos vivos”, diz o ouvidor. “Por quê até agora eles não
resolveram o caso?”, questiona. “E pior, nem o secretário, nem o
governador cobraram nada”, complementa. Ele lembra ainda que os dois
outros mortos eram inocentes. Para apurar o caso foi aberta uma sindicância.
Os dois rapazes -- que morreram -- eram
acusados de envolvimento na morte do prefeito de Campinas, porque havia
suspeita que o calibre da arma usada para o seqüestro de um menino de
nove anos na cidade era o mesmo da pistola que assassinou Toninho. O seqüestro
foi em 14 de setembro, quatro dias depois da morte do prefeito. Um exame
de balística detectou depois que as balas disparadas contra o carro
onde estava o garoto podem ter sido da mesma nove milímetros usada no
crime do prefeito.
Caso não
é esclarecido há cinco meses
A novidade mais recente do assassinato do
prefeito, Antônio da Costa Santos, o Toninho do PT, foi anunciada na última
semana de janeiro. Depois de tantos pedidos o novo secretário de
Segurança Pública do Estado, Saulo de Castro Abreu Filho, resolveu
tirar a presidência do inquérito dos policiais de Campinas e passar
para a equipe do DHPP.
A troca foi um pedido feito em dezembro
pela comissão de acompanhamento do inquérito -- formada por
integrantes do governo de Campinas e pela prefeita petista Izalene Tiene.
Na época, o então secretário de Segurança Pública de São Paulo,
Marco Vinício Petrelluzzi, atendeu parcialmente o pedido. Anunciou o
envio da equipe do DHPP para trabalhar com os policiais da 1a seccional
de Campinas, mas manteve o inquérito com a supervisão do delegado
seccional de Campinas, Osmar Porcelli.
O DHPP assumiu o caso em Campinas depois
da execução, em 19 de janeiro, do prefeito Celso Daniel. A comissão
reuniu-se com o delegado-geral, Marco Antonio Desgualdo, e insistiu no
pedido. Familiares de Toninho e a comissão exigiram o reforço do DHPP
depois de quatro dos três acusados do crime do Toninho serem soltos por
determinação da Justiça por falta de provas. O Ministério Público
alegou também que o inquérito não era consistente e por isso não
seria relatado.
A desconfiança da polícia da população
não é só devido a falta de resolução do caso do prefeito. Em 1999,
a passagem da CPI do Narcotráfico por Campinas deixou os moradores
estarrecidos com as acusações contra empresários, advogados,
delegados e investigadores. O comentário de que Campinas era rota de tráfico
ganhou dimensão real e a polícia local perdeu credibilidade.
A Secretaria de Segurança Pública nega
uma intervenção na cidade, mas os comandos das polícias civil e
militar foram substituídos em fevereiro de 2000. Mais de um ano depois
da passagem da CPI por Campinas. O delegado da 1a seccional, Porcelli,
responsável pela investigação do caso até a substituição pelo DHPP,
é de São Paulo. O seu superior, Eduardo Hallage, diretor do Deinter
(Departamento de Polícia Judiciária do Interior-2), também.
O ocorrido na CPI voltou ganhar relevância
agora. Um dos investigadores presos na época Antônio Lázzaro Constâncio,
o Lazinho, forneceu informações para a primeira prisão dos quatro
garotos mortos no Litoral. Eles foram detidos e depois soltos. Quem
efetuou a primeira prisão dos quatro foi outro investigador também
preso na CPI, Fernado de Arruda, e solto em setembro por um erro
processual.
No dia da prisão de Lazinho na CPI,
Toninho estava na primeira fila e aplaudiu de pé. Detalhe, Lazinho
trabalha em São Paulo. Segundo Porcelli, Lazinho ajudou porque tem
sangue de policial e muitas fontes em Campinas, já que mora lá. “Mas
todas as informações foram checadas”, diz Porcelli. A defesa de
Porcelli em relação a Lazinho é o mesma da secretaria de Segurança Pública.
Não há nenhum processo contra o investigador e por isso ele pode
trabalhar normalmente. Lazinho foi citado na CPI por abuso de
autoridade, formação de quadrilha e envolvimento com o narcotráfico.
O relatório foi entregue ao Ministério Público Estadual (MPE).
Os aplausos à prisão de Lazinho não
foram a única atuação do prefeito. Uma semana antes da CPI passar por
Campinas, Toninho esteve em Brasília para entregar documentos aos
deputados sobre supostas relações do narcotráfico com o empresariado
da cidade. O fato de policias acusados não serem afastados é outra crítica
do ouvidor. “Se há denúncia precisa ser afastado, não é necessário
ter inquérito”, diz. “Há outros policiais acusados que deixaram as
delegacias e foram para cidades vizinhas como Souzas.”
A equipe do DHPP está desde dezembro
refazendo o trabalho dos policiais de Campinas, de acordo com o deputado
estadual Renato Simões (PT-SP). “Também estão sendo investigadas
todas as hipóteses, não apenas de tentativa de assalto seguida de
morte, única tese da polícia de Campinas.”
Por isso, provas consideradas como peça-chave
da investigação, antes descartadas, foram novamente investigadas. Um
Vectra prata roubado e com placa clonada visto por testemunhas perto do
local do crime, devolvido para seguradora pela polícia, voltou a ser o
centro do inquérito em vez das duas motos que teriam sido usadas pelos
quatro acusados. Novas testemunhas foram ouvidas.
“É preciso lembrar que é inglório o
trabalho dos policiais do DHPP, porque quanto mais se distância do
fato, mas vão se perdendo as provas. Se essa nova equipe não chegar a
uma conclusão a culpa vai ser dos policiais de Campinas”, analisa
Fechio Filho.
>>topo
Idéias
novas versus idéias antigas
O ouvidor lembra que em horas de comoção,
como ocorreu com a morte do prefeito Celso Daniel, aparecem idéias
novas sem a sociedade ter abandonado as antigas. Cita como exemplos o
retorno do debate da pena de morte e a mentalidade que as entidades de
direitos humanos atrapalham o trabalho da polícia. “As entidades não
atuam no roubo de cargas, que só aumenta. Tem que haver uma política
de segurança pública, mas não adianta tratar do assunto só na hora
do afogadilho”, diz.
Na sua opinião, várias medidas podem
ser tomadas, como as estatísticas dos crimes e o acompanhamento por
parte das autoridades, para saber se o problema foi resolvido ou não.
“É uma visão gerencial de levantar quantos homicídios ocorreram,
quantos casos viraram inquérito e se foi feita a perícia do cadáver.
A polícia sempre constituiu um poder paralelo no Estado e não gosta de
prestar contas.” Cita como medidas urgentes a informação diária dos
policiais sobre as ocorrências para os prefeitos poderem intervir.
No que se refere a atuação da polícia,
tão questionada, para Fechio Filho, os maus bons profissionais com
aliança com seqüestradores, por exemplo, têm impedido o trabalho dos
honestos. Lembra que a corregedoria da polícia até recentemente só
atuava em casos da capital e também não tem condições de fazer
correições. “Não adianta só anunciar as medidas, têm que dar
condições de trabalho.”
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