OS
DIREITOS HUMANOS E A REFORMA AGRÁRIA
Belisário
dos Santos Jr.
Advogado,
membro da Comissão de Justiça e Paz e de outras entidades de
Direitos Humanos. É Secretário de Justiça e da Defesa da
Cidadania do Estado de São Paulo.
A
VISÃO ATUAL DOS DIREITOS HUMANOS
A
partir de Viena (Conferência Internacional dos Direitos
Humanos - 1993), ficou definitivamente estabelecido: os
direitos humanos são de todos (princípio da
universalidade) e sua implementação deve se dar de forma
integrada (princípio da indivisibilidade).
Não
mais será possível a efetivação de direitos ligados à
liberdade (direitos civis e políticos) sem a dos direitos
ligados à idéia de dignidade (direitos econômicos e
sociais) e ao conceito de solidariedade (direitos de terceira
geração, como os direitos culturais, direito à paz, ao
desenvolvimento, ao meio ambiente sadio e equilibrado).
De
outra parte, constata-se ter o saber humano produzido tecnologia
suficiente para produzir cada vez mais em menos espaço e com
custo menor (grãos, por exemplo). Mas, o mesmo saber humano não
foi capaz de reduzir os índices do mapa da fome. Assim, a América
Latina, neste final de milênio,
A
REFORMA AGRÁRIA: UMA POLÍTICA DE
DIREITOS HUMANOS E DESENVOLVIMENTO
É
cada vez maior o número daqueles que acreditam não haver divórcio
entre o social e o econômico na reforma agrária. Algumas
vozes, cada vez menos tímidas, preconizam a importância do
fortalecimento da agricultura familiar. Ousadamente, anunciam
que o setor familiar do meio rural brasileiro é importante para
a produção de alimentos e para a geração de renda e
empregos, apesar de não ter sido até hoje beneficiário preferencial
das políticas públicas.
Segundo
a FAO (Organização das Nações Unidas para a Agricultura e
Alimentação), “a reforma agrária não é uma finalidade em
si mesma; é um meio para o fortalecimento da agricultura
familiar”.
Não
é o caso de se entrar na discussão teórica da “modernização
da agricultura”, do “desenvolvimento capitalista no campo”
ou dos “sistemas econômicos não capitalistas”. A preocupação
é apenas assinalar que os assentamentos resultantes da reforma
agrária não são importantes apenas para os assentados, mas
para toda a sociedade; e que esta importância não vem só do
“resgate da dívida social”, mas do investimento social e
econômico, que é a verdadeira vocação da reforma agrária.
OBJETIVOS
ESTRATÉGICOS
Considerando
como exemplo processos de assentamento implantados nos últimos
meses no Estado de São Paulo, em parceria com o Governo
Federal, notadamente no Pontal do Paranapanema, podemos dizer
que constituem objetivos estratégicos da reforma agrária: o
desenvolvimento econômico da região, a diminuição do
processo de exclusão, a regularização fundiária, a proteção
ao meio ambiente e a paz social. À reforma agrária deve ser
considerada dentro de urna agenda mais ampla de reformas
vinculadas ao integral cumprimento dos Direitos Humanos e suas
características de universalidade e indivisibilidade. Cidadania
é processo de inclusão e a meta é a implantação de um
cultura da solidariedade.
ASSENTAR
NÃO PODE SER APENAS DAR ACESSO À TERRA
Sempre
tendo em conta o exemplo assinalado, diga-se que junto com o
acesso á terra, devem ser previstos assistência técnica,
programas de empréstimo de sementes, obtenção de
financiamento, aproximação entre a produção e a comercialização,
parceria com a universidade e estímulo a outras secretarias de
estado a reforçarem a infra-estrutura da região. Onde antes só
havia gado, agora há gente (mais de 2.500 famílias). A instalação
de assentamentos no Pontal começa a dinamizar a economia da
região, como se vê do aumento da arrecadação de impostos, da
instalação de novos estabelecimentos comerciais, do aumento
de venda de alguns insumos e até de eletrodomésticos nos
municípios onde estão sendo implantados novos assentamentos.
E a aplicação prática do que se disse no início.
CONCLUSÃO
O
acesso à terra se conecta, nessa perspectiva, ao direito ao
desenvolvimento. Visto pela ótica da cidadania (via sempre de
dupla mão, direitos e deveres), o acesso à terra se
caracteriza pelo direito de homens e mulheres proverem seu próprio
sustento e pela obrigação de serem produtivos, para seu
grupo familiar e para a sociedade. Acesso à terra, por esse ângulo,
significa interação dos direitos individuais à liberdade,
à vida, aos direitos sociais ligados à noção de dignidade e,
por último, aos direitos coletivos, como o respeito ao meio
ambiente sadio, somado à obrigação de acrescentar o conceito
de sustentabilidade à noção tradicional de desenvolvimento
econômico. Direito ao desenvolvimento, à paz, a um meio
ambiente equilibrado, são facetas dos direitos da
solidariedade, à medida em que informam a preocupação de
cada ser humano com o outro, e da coletividade com as próximas
gerações.
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