Movimento
Nacional de Direitos Humanos (MNDH) elabora
estudo e relatório de impacto em Direitos
Humanos em Grandes Projetos
CAPITALISMO VERDE?
MNDH produz instrumentos de monitoramento
dos impactos dos grandes projetos sob a ótica
dos Direitos Humanos
Em
2003, durante a I Conferência Nacional
de Meio Ambiente, em Brasília, indígenas
e quilombolas denunciavam o desrespeito aos
direitos humanos da Aracruz Celulose –
uma gigante do setor de produção
de papel que atua na região sul do país
-, enquanto o governo Lula tecia homenagens
à mesma no Rio de Janeiro, pelo cumprimento
de suas responsabilidades sociais. Situações
como as denunciadas em Brasília mais
de cinco anos atrás estão sendo
pesquisadas e documentadas em uma publicação
intitulada: Estudo e relatório de impacto
em Direitos Humanos em Grandes Projetos: o caso
do eucalipto.
O projeto é de iniciativa do Movimento
Nacional de Direitos Humanos (MNDH) Nacional
e está sendo executado pelo Centro de
Defesa dos Direitos Humanos da Serra (CDDH-Serra).
Trata-se de um dos “estudos de caso”
que estão servindo como referência
para o projeto maior do MNDH que visa elaborar
uma metodologia, ainda em construção,
de novos instrumentos de monitoramento quanto
aos impactos dos grandes projetos sob a ótica
dos Direitos Humanos, denominado Estudo e Relatório
de Impacto em DH (EIDH/RIDH). Os outros três
estudos de caso estão voltados para áreas
de monocultivos de eucalipto no Rio Grande do
Sul (em parceria com o Movimento de Mulheres
Camponesas - MMC), da soja no Baixo Parnaíba/MA
(com a Sociedade Maranhense de Direitos Humanos
– SMDH) e da cana-de-açúcar
no Triângulo Mineiro/MG (Com a Ação
Franciscana de Ecologia e Solidariedade). A
Coordenadoria Ecumênica de Serviço
(CESE) e o Processo de Articulação
e Diálogo entre agências ecumênicas
européias e parceiros brasileiros (PAD)
figuram como co-patrocinadores da iniciativa.
Vastas áreas de mata atlântica
foram e continuam sendo derrubadas para a implantação
de empreendimentos industriais, em especial
para extração de celulose e produção
de papel, sob a justificativa de atender a uma
grande demanda de mercado. Como contrapartida
ambiental, esses empreendimentos sustentam que
realizam reflorestamento através do plantio
de eucalipto, na verdade um monocultivo que
tem ocupado vastas extensões de terra
em todo o território brasileiro. De fato,
a escala e demanda internacional é tal
que constitui efetivo fator de destruição
da biodiversidade e de ameaça aos direitos
de comunidades tradicionais. Ainda assim, esta
“onda verde” vem revestida de um
caráter ambientalista, ancorado no manto
da responsabilidade social.
O
plantio de eucalipto como alternativa compensatória
pela exploração da natureza para
produção de bens de consumo teve
início na década de 1990 e tem
sido assumido por muitos empreendimentos como
uma forma de desconstruir a visão de
que o desenvolvimento econômico é
maléfico ao meio ambiente. Mas, segundo
Gilsa Barcelos, coordenadora do projeto executado
pelo CDDH-Serra, a crescente ocupação
do setor florestal brasileiro por plantações
de eucalipto tem gerado conseqüências
negativas para a economia e para os pequenos
agricultores locais. “O capitalismo verde
constitui uma estratégia esperta de empresas
que divulgam uma imagem de compromisso com a
questão ambiental”, desabafa. O
CDDH-Serra, juntamente com movimentos sociais
locais que, há alguns anos se articula
no movimento Rede Alerta Contra o Deserto Verde,
resiste às investidas de grandes complexos
celulósicos instalados na região
sul do país.
“As
estruturas do Estado, em prol do ‘desenvolvimento’
são omissas ou cúmplices dessa
lógica de uso dos recursos naturais”,
declara Gilsa e lembra a necessidade de leis
mais duras de controle ambiental e de responsabilidade
social dos empreendimentos, e que essas leis
sejam cumpridas de fato. “Por enquanto,
a esperança permanece no processo de
organização da sociedade civil
local, na formação de redes de
solidariedade entre povos impactados, ambientalistas
e ONGs”, diz a coordenadora do projeto.
O resultado do trabalho renderá a produção
de um relatório para a Anistia Internacional
sobre a criminalização de quilombolas.
A previsão de prazo para conclusão
do trabalho é até o final de junho.
Responsabilidade Social? O caso Aracruz
Celulose
“A expressão ‘responsabilidade
social’ pode assumir conteúdos
bem diferentes, a depender do sujeito e do contexto
onde é discutido”, observa Gilsa.
Para o CDDH-Serra, o caso do Grupo Aracruz Florestal
(mais tarde, Aracruz Celulose), que chegou à
região sul do Brasil em 1967, tem um
conteúdo bem questionável, pois
a visão predatória das empresas
de celulose não se sustenta nem ambiental
nem socialmente. Desde a chegada do grupo, foram
inúmeras as transformações
e conseqüências para a população
local. “Avalia-se que só em território
indígena houve a derrubada de 30.000
hectares de Mata Atlântica para dar lugar
às fábricas da empresa e ao seu
plantio de eucalipto”, conta Gilsa Barcelos.
Segundo a coordenadora do projeto Estudo e relatório
de impacto em Direitos Humanos em Grandes Projetos:
o caso do eucalipto, o avanço da indústria
e do plantio da monocultura de eucalipto provocou
uma enorme perda de territórios por parte
das populações tradicionais: indígenas
(Guarani e Tupiniquim) no município de
Aracruz; e de remanescentes de quilombos nos
municípios de São Mateus e Conceição
da Barra.
“Com
a perda da maior parte do seu território
e a impossibilidade de praticar a agricultura
tradicional, houve, no período, uma grande
migração de índios e quilombolas
para as cidades mais próximas em busca
de trabalho”, esclarece. Os poucos integrantes
que decidiram permanecer no local tiveram que
presenciar diversas intervenções
sobre a sua riqueza. A caça, a agricultura
e o peixe desapareceram; rios foram manilhados,
assoreados e muitos deram lugar às obras
de engenharia da empresa.
Recentemente, depois de muita resistência
e até a realização de um
tribunal internacional com apoio de outros movimentos
e organizações, os índios
conseguiram recuperar parte de suas terras (18
mil hectares) que estavam de posse da empresa.
Só aguardam a homologação
por parte da Presidência da República.
Apesar da legislação brasileira
reconhecer o seu direito ao território
tradicional, para que os quilombolas consigam
recuperar as suas terras muita luta terá
que ser travada.
Racismo Ambiental e Institucional no
norte do Espírito Santo
Em
2006, a Aracruz chegou ao ápice do racismo
ambiental quando comunicou em outdoor: A Aracruz
trouxe o progresso. A Funai, os índios.
Um processo de recorrentes desrespeitos aos
direitos humanos que encontra no estado um aliado.
“O Estado capixaba (governo e prefeituras)
tem sido, historicamente, um aliado da Aracruz
Celulose”, afirma Gilsa Barcelos, que
acredita no agravamento dessa situação
com a formação do Movimento Paz
no Campo (MPC).
O MPC é organizado por fazendeiros em
aliança com a Aracruz e, segundo Gilsa,
recebe todo o apoio estatal. “Atualmente,
a tensão se dá por um processo
violento de criminalização quando
o serviço de segurança da empresa
se alia à polícia militar para
acuar e ameaçar lideranças e quilombolas
que vivem do carvão”, afirma.
Gilsa define o início do racismo institucional
na região no final da década de
1970, quando as populações (indígenas
e quilombolas) foram invisibilizadas pelo Governo
do Estado, que diagnosticou as terras dessas
populações como improdutivas e
desabitadas.
A CESE
A Coordenadoria Ecumênica de Serviço
(CESE) há mais de 35 anos está
dedicada à missão de “fortalecer
organizações da sociedade civil,
especialmente as populares, empenhadas nas lutas
por transformações políticas,
econômicas e sociais que conduzam a estruturas
em que prevaleça democracia com justiça”.
Desde a sua fundação, a CESE apoiou
com recursos técnicos e financeiros mais
de 9 mil iniciativas populares em todo o Brasil,
viabilizando projetos nas áreas de: direitos
humanos, desenvolvimento econômico, saúde
popular, educação, comunicação
e cultura, diaconia ecumênica (serviço
social das igrejas), meio ambiente e desenvolvimento
institucional.
Em 2008, a instituição vivenciou
o aumento do número de projetos apoiados
na área ambiental, o que reflete uma
preocupação cada vez maior de
grupos urbanos e rurais, especialmente a juventude
do campo, em realizar ações de
defesa do meio ambiente. Os projetos que desenvolvem
ações que garantam os direitos
de Índios e mulheres também continuaram
em curva ascendente – como já verificado
em anos anteriores. E destaque também
para projetos urbanos que chegaram em melhor
qualidade em 2008, o que resultou em maior índice
de aprovação para apoio.
No entanto, uma meta em especial, ambicionada
pela instituição há algum
tempo, foi ultrapassada em relação
ao previsto: o apoio a projetos no centro-oeste.
Uma parte do país era pouco atingida
devido ao pequeno número de projetos
enviados à instituição,
pleiteando apoio. A realização
de ações da CESE como: roda de
diálogo no Mato Grosso do Sul, várias
visitas a projetos e a parceiros, presença
por intermédio do Programa de Apoio Estratégico
(PAE), carta da CESE a 80 grupos estimulando
o envio de projetos não só ajudou
a CESE a conhecer novos grupos, bem como ultrapassar
a meta em 1,5% que foi prevista no qüinqüênio,
para a região.
A CESE é uma entidade ecumênica
composta por Igrejas que se unem no compromisso
de afirmar a vida com base na promoção,
garantia e defesa de Direitos, Justiça
e Paz. Com escritório nacional sediado
em Salvador/BA, a instituição
atua em todo o país visando fortalecer
organizações da sociedade civil,
especialmente as populares, empenhadas na luta
pela promoção da plena cidadania.