DECLARAÇÃO
DE TEL AVIV
SOBRE
RESPONSABILIDADES E NORMAS ÉTICAS NA UTILIZAÇÃO DA
TELEMEDICINA
(Adotada pela 51ª
Assembléia Geral da Associação Médica Mundial em Tel Aviv,
Israel, em outubro de 1999)
Introdução
1. Durante muitos
anos, os médicos têm utilizado a tecnologia das comunicações,
como o telefone e o fax, em benefício de seus pacientes.
Constantemente se desenvolvem novas técnicas de informação
e comunicação que facilitam o intercâmbio de informação
entre médicos e também entre médicos e pacientes. A
telemedicina é o exercício da medicina à distância, cujas
intervenções, diagnósticos, decisões de tratamentos e
recomendações estão baseadas em dados, documentos e outra
informação transmitida através de sistemas de telecomunicação.
2. A utilização
da telemedicina tem muitas vantagens potenciais e sua demanda
aumenta cada vez mais. Os pacientes que não têm acesso a
especialistas, ou inclusive à atenção básica, podem
beneficiar-se muito com esta utilização. Por exemplo, a
telemedicina permite a transmissão de imagens médicas para
realizar uma avaliação à distancia em especialidades tais
como radiologia, patologia, oftalmologia, cardiologia,
dermatologia e ortopedia. Isto pode facilitar muito os serviços
do especialista, ao mesmo tempo em que diminui os possíveis
riscos e custos relativos ao transporte do paciente e/ou a
imagem de diagnóstico. Os sistemas de comunicações como a
videoconferência e o correio eletrônico permitem aos médicos
de diversas especialidades consultar colegas e pacientes com
maior freqüência, e manter excelentes resultados dessas
consultas. A telecirurgia ou a colaboração eletrônica entre
locais sobre telecirurgia, faz com que cirurgiões com menos
experiência realizem operações de urgência com o
assessoramento e a ajuda de cirurgiões experientes. Os contínuos
avanços da tecnologia criam novos sistemas de assistência a
pacientes que ampliarão a margem dos benefícios que oferece
a telemedicina a muito mais do que existe agora. Ademais, a
telemedicina oferece um maior acesso à educação e à
pesquisa médica, em especial para os estudantes e os médicos
que se encontram em regiões distantes.
3. A Associação
Médica Mundial reconhece que, a despeito das conseqüências
positivas da telemedicina, existem muito problemas éticos e
legais que se apresentam com sua utilização. Em especial, ao
eliminar uma consulta em um lugar comum e o intercâmbio
pessoal, a telemedicina altera alguns princípios tradicionais
que regulam a relação médico-paciente. Portanto, há certas
normas e princípios éticos que devem aplicar os médicos que
utilizam a telemedicina.
4. Posto que este
campo da medicina está crescendo tão rapidamente, esta
Declaração deve ser revisada periodicamente a fim de
assegurar que se trate dos problemas mais recentes e mais
importantes.
Tipos de
Telemedicina
5. A possibilidade
de que os médicos utilizem a telemedicina depende do acesso
à tecnologia e este não é o mesmo em todas as partes do
mundo. Sem ser exaustiva, a seguinte lista descreve os usos
mais comuns da telemedicina no mundo de hoje.
-
5.1 Uma interação
entre o médico e o paciente geograficamente isolado ou
que se encontre em um meio e que não tem acesso a um médico
local. Chamada às vezes teleassistência, este tipo está
em geral restringido a circunstâncias muito específicas
(por exemplo, emergências).
-
5.2 Uma interação
entre o médico e o paciente, onde se transmite informação
médica eletronicamente (pressão arterial,
eletrocardiogramas, etc.) ao médico, o que permite vigiar
regularmente o estado do paciente. Chamada às vezes
televigilância, esta se utiliza com mais freqüência aos
pacientes com enfermidades crônicas, como a diabetes,
hipertensão, deficiências físicas ou gravidezes difíceis.
Em alguns casos, pode-se proporcionar uma formação ao
paciente ou a um familiar para que receba e transmita a
informação necessária. Em outros casos, uma enfermeira,
tecnólogo médico ou outra pessoa especialmente
qualificada pode fazê-lo para obter resultados seguros.
-
5.3 Uma interação
onde o paciente consulta diretamente o médico, utilizando
qualquer forma de telecomunicação, incluindo a internet.
A teleconsulta ou consulta em conexão direta, onde não há
uma presente relação médico-paciente nem exames clínicos,
e onde não há um segundo médico no mesmo lugar, cria
certos riscos. Por exemplo, incerteza a relativa à
confiança, confidencialidade e segurança da informação
intercambiada, assim como a identidade e credenciais do médico.
-
5.4 Uma interação
entre dois médicos: um fisicamente presente com o
paciente e outro reconhecido por ser muito competente
naquele problema médico. A informação médica se
transmite eletronicamente ao médico que consulta, quem
deve decidir se pode oferecer de forma segura sua opinião,
baseada na qualidade e quantidade de informação
recebida.
6. Independente do
sistema de telemedicina que utiliza o médico, os princípios
da ética médica, a que está sujeita mundialmente a profissão
médica, nunca devem ser comprometidos.
PRINCÍPIOS
Relação Médico-Paciente
7. A telemedicina
não deve afetar adversamente a relação individual médico-paciente.
Quando é utilizada de maneira correta, a telemedicina tem o
potencial de melhorar esta relação através de mais
oportunidades para comunicar-se e um acesso mais fácil de
ambas as partes. Como em todos os campos da medicina, a relação
médico-paciente deve basear-se no respeito mútuo, na
independência de opinião do médico, na autonomia do
paciente e na confidencialidade profissional. É essencial que
o médico e o paciente possam se identificar com confiança
quando se utiliza a telemedicina.
8. A principal
aplicação da telemedicina é na situação onde o médico
assistente necessita da opinião ou do conselho de outro
colega, desde que tenha a permissão do paciente. Sem dúvida,
em alguns casos, o único contato do paciente com o médico é
através da telemedicina. Idealmente, todos os pacientes que
necessitam ajuda médica devem ver seu médico na consulta
pessoal e a telemedicina deve limitar-se a situações onde o
médico não pode estar fisicamente presente num tempo aceitável
e seguro.
9. Quando o
paciente pede uma consulta direta de orientação só se deve
dar quando o médico já tenha uma relação com o paciente ou
tenha um conhecimento adequado do problema que se apresenta,
de modo que o médico possa ter uma idéia clara e justificável.
Sem dúvida, deve-se reconhecer que muitos serviços de saúde
que não contam com relações pré-existentes (como centros
de orientação por telefone e certos tipos de serviços) em
regiões afastadas são considerados como serviços valiosos
e, em geral, funcionam bem dentro de suas estruturas próprias.
10. Numa emergência
em que se utilize a telemedicina, a opinião do médico pode
se basear em informação incompleta, porém nesses casos, a
urgência clínica da situação será o fator determinante
para se empregar uma opinião ou um tratamento. Nesta situação
excepcional, o médico é responsável legalmente de suas
decisões.
Responsabilidades
do Médico
11. O médico tem
liberdade e completa independência de decidir se utiliza ou
recomenda a telemedicina para seu paciente. A decisão de
utilizar ou recusar a telemedicina deve basear-se somente no
beneficio do paciente.
12. Quando se
utiliza a telemedicina diretamente com o paciente, o médico
assume a responsabilidade do caso em questão. Isto inclui o
diagnóstico, opinião, tratamento e intervenções médicas
diretas.
13. O médico que
pede a opinião de outro colega é responsável pelo
tratamento e por outras decisões e recomendações dadas ao
paciente. Sem dúvida, o tele-consultado é responsável ante
o médico que trata pela qualidade da opinião que dar e deve
especificar as condições em que a opinião é válida. Não
está obrigado a participar se não tem o conhecimento, competência
ou suficiente informação do paciente para dar uma opinião
bem fundamentada.
14. É essencial
que o médico que não tem contato direto com o paciente (como
o tele-especialista ou um médico que participa na televigilância)
possa participar em procedimentos de seguimento, se for necessário.
15. Quando pessoas que não são médicas participam da
telemedicina, por exemplo, na recepção ou transmissão de
dados, vigilância ou qualquer outro propósito, o médico
deve assegurar-se que a formação e a competência destes
outros profissionais de saúde seja adequada, a fim de
garantir uma utilização apropriada e ética da telemedicina.
Responsabilidade
do Paciente
16. Em algumas
situações, o assume a responsabilidade da coleta e transmissão
de dados ao médico, como nos casos de televigilância. É
obrigação do médico assegurar que o paciente tenha uma
formação apropriada dos procedimentos necessários, que é
fisicamente capaz e que entende bem a importância de sua
responsabilidade no processo. O mesmo princípio se deve
aplicar a um membro da família ou a outra pessoa que ajude o
paciente a utilizar a telemedicina.
O Consentimento
e Confidencialidade do Paciente
17. As regras
correntes do consentimento e confidencialidade do paciente
também se aplicam às situações da telemedicina. A informação
sobre o paciente só pode ser transmitida ao médico ou a
outro profissional de saúde se isso for permitido pelo
paciente com seu consentimento esclarecido. A informação
transmitida deve ser pertinente ao problema em questão.
Devido aos riscos de filtração de informações inerentes a
certos tipos de comunicação eletrônica, o médico tem a
obrigação de assegurar que sejam aplicadas todas as normas
de medidas de segurança estabelecidas para proteger a
confidencialidade do paciente.
Qualidade da
Atenção e Segurança na Telemedicina
18. O médico que
utiliza a telemedicina é responsável pela qualidade da atenção
que recebe o paciente e não deve optar pela consulta de
telemedicina, a menos que considere que é a melhor opção
disponível. Para esta decisão o médico deve levar em conta
a qualidade, o acesso e custo.
19. Deve-se usar
regularmente medidas de avaliação da qualidade, a fim de
assegurar o melhor diagnóstico e tratamento possíveis na
telemedicina. O médico não deve utilizar a telemedicina sem
assegurar-se de que a equipe encarregada do o procedimento
seja de um nível de qualidade suficientemente alto, que
funcione de forma adequada e que cumpra com as normas
recomendadas. Deve-se dispor de sistemas de suporte em casos
de emergência. Deve-se utilizar controles de qualidade e
procedimentos de avaliação para vigiar a precisão e a
qualidade da informação coletada e transmitida. Para todas
as comunicações da telemedicina deve-se contar com um
protocolo estabelecido que inclua os assuntos relacionados com
as medidas apropriadas que se devem tomar em casos de falta da
equipe ou se um paciente tem problemas durante a utilização
da telemedicina.
Qualidade da
informação
20. O médico que
exerce a medicina à distancia sem ver o paciente deve avaliar
cuidadosamente a informação que recebe. O médico só pode
dar opiniões e recomendações ou tomar decisões médicas,
se a qualidade da informação recebida é suficiente e
pertinente para o cerne da questão.
Autorização e
Competência para Utilizar a Telemedicina
21. A telemedicina
oferece a oportunidade de aumentar o uso eficaz dos recursos
humanos médicos no mundo inteiro e deve estar aberta a todos
os médicos, inclusive através das fronteiras nacionais.
22. O médico que
utiliza a telemedicina deve estar autorizado a exercer a
medicina no país ou estado onde reside e deve ser competente
na sua especialidade. Quando utilizar a telemedicina
diretamente a um paciente localizado em outro país ou estado,
o médico deve estar autorizado a exercer no referido estado
ou país, ou deve ser um serviço aprovado internacionalmente.
História Clínica
do Paciente
23. Todos os médicos
que utilizam a telemedicina devem manter prontuários clínicos
adequados dos pacientes e todos os aspectos de cada caso devem
estar documentados devidamente. Deve-se registrar o método de
identificação do paciente e também a quantidade e qualidade
da informação recebida. Deve-se registrar adequadamente os
achados, recomendações e serviços de telemedicina
utilizados e se deve fazer todo o possível para assegurar a
durabilidade e a exatidão da informação arquivada.
24. O especialista
que é consultado através da telemedicina também deve manter
um prontuário clínico detalhado das opiniões que oferece e
também da informação que se baseou.
25. Os métodos
eletrônicos de arquivamento e transmissão da informação do
paciente, só podem ser utilizados quando se tenham tomado
medidas suficientes para proteger a confidencialidade e a
segurança da informação registrada ou intercambiada.
Formação em
Telemedicina
26. A telemedicina
é um campo promissor para o exercício da medicina e a formação
neste campo deve ser parte da educação médica básica e
continuada. Deve-se oferecer oportunidades a todos os médicos
e outros profissionais de saúde interessados na telemedicina.
RECOMENDAÇÕES
27. A Associação
Médica Mundial recomenda que as associações médicas
nacionais:
-
27.1 Adotem a
Declaração da Associação Médica Mundial sobre as
Responsabilidades e Normas Éticas na Utilização da
Telemedicina;
-
27.2 Promovam
programas de formação e de avaliação das técnicas de
telemedicina, no que concerne à qualidade da atenção
relação médico-paciente e eficácia quanto a custos;
-
27.3 Elaborem
e implementem, junto com as organizações especializadas,
normas de exercício que devem ser usadas como um
instrumento na formação de médicos e outros
profissionais de saúde que possam utilizar a telemedicina;
-
27.4 Fomentem
a criação de protocolos padronizados para aplicação
nacional e internacional que incluam os problemas médicos
e legais, como a inscrição e responsabilidade do médico,
e o estado legal dos prontuários médicos eletrônicos, e
-
27.5 Estabeleçam
normas para o funcionamento adequado das teleconsultas e
que incluam também os problemas da comercialização e da
exploração generalizadas.
28. A Associação
Médica Mundial segue observando a utilização da
telemedicina em suas distintas formas.
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