DECLARAÇÃO
DE MARBELLA
SOBRE O PROJETO
GENOMA HUMANO
(Adotada pela 44ª
Assembléia Geral da Associação Médica Mundial, Marbella,
Espanha, setembro de 1992)
PREÂMBULO
O Projeto Genoma Humano está baseado na suposição de que a
informação contida no gene nos permitirá diagnosticar um número
muito grande de doenças genéticas no útero ou até mesmo antes
disso; nos permitindo tomar decisões antes de procriação.
A chave para a compreensão de doenças genéticas está na
identificação e caracterização dos genes mutação. Daqui em
diante, a pessoa pode dizer que a compreensão de toda a biologia
humana está incluída na identificação de 50.000 a 100.000
genes nos cromossomos do corpo humano.
O Projeto Genoma Humano pode nos permitir identificar e
caracterizar os genes envolvidos nas principais doenças genéticas;
mais tarde, será possível identificar e caracterizar os genes
envolvidos em doenças com um componente genético junto com
outros fatores como Diabetes, Esquizofrenia e Alzheimer. Nestas
doenças o gene cria uma predisposição para a doença em lugar
de ser a própria causa. Estas doenças causam problemas sociais
severos e se é possível diagnosticar a predisposição antes do
aparecimento da doença, pode ser possível prevenir isto através
de mudanças no estilo de vida, por modificação de dieta e
exames periódicos.
Na segunda metade do século 20 uma revolução de conceitos
aconteceu quando se começou a pensar em doenças em termos de
bioquímica. Uma nova revolução está acontecendo agora quando
se localiza no gene as informações de todos os processos bioquímicos
nas células do corpo.
PROBLEMA POLÍTICO
Há muitos razões éticas importantes para se adquirir informação
genética tão depressa quanto possível, de forma que possamos
entender melhor muitas doenças. No entanto, esta informação
pode ser frustrante a menos que ao mesmo tempo desenvolvamos meios
terapêuticos e informemos ao público das várias opções genéticas,
de forma que o indivíduo possa escolher o melhor.
Outra pergunta é se os esforços investidos estão justificados
comparando com outros meios de alcançar esses objetivos com menos
custo. O projeto deve aspirar um inventário ou é preferível
começar passo por passo um projeto menos pretensioso e apressado?
CRIAÇÃO DO
PROJETO
O
Projeto de Genoma Humano é considerado um projeto formidável,
semelhante ao programa espacial, não havendo entre o investimento
e seu retorno. O custo calculado do projeto é 3 bilhões de dólares
durante 15 anos, i.e., 200 milhões por ano. Este custo pode não
parecer extraordinário quando nós sabemos que a Fundação de
Fibrose Cística nos Estados Unidos gastou 120 milhões nos últimos
quatro anos só para esta doença. Assim, o aspecto financeiro não
deve sustar desenvolvimento do projeto.
Outro fator perturbador é que em alguns países - aloca-se
recursos para pesquisa clínica em embriões humanos. Tendo se
gastado tanto para identificar os genes poderia se ter resultados
sem a necessidade de alocar recursos para pesquisa clínica
baseado naqueles resultados.
Está em conflito a proteção do sigilo e a necessidade da
colaboração científica.
A
cartografia dos genes humanos tem de ser anônimo, mas a informação
adquirida tem de ser aplicada a todo ser humano sem qualquer
distinção individual de cor ou raça. A informação deve ser de
propriedade de todos e não deve ser usada no interesse de negócios.
Assim nenhuma patente deve ser dada para o genoma humano ou parte
dele.
DISCRIMINAÇÃO GENÉTICA
NO EMPREGO E NO SEGURO PRIVADO
Há
um conflito entre o potencial crescente de novas tecnologias na
revelação da heterogeneidade genética e o critério a ser usado
no emprego e no seguro privado. Pode ser desejável, quanto a
fatores genéticos, adotar o mesmo consenso tácito que a
discriminação de raça em emprego ou seguro privado.
A cartografia genética pode se tornar uma fonte de estigmatização
e discriminação social, e a "população de risco"
pode se transformar em uma "população defeituosa".
EUGENIA E O PERIGO
DO USO DE GENES PARA INTERESSES NÃO MÉDICOS
A eugenia está baseada na suposição que os genes têm uma
importância decisiva e no modo de mudar a distribuição deles na
população no seu aspecto reprodutivo. De acordo com este
conceito o bem comum justifica as limitações na liberdade do
indivíduo. O poder de informação aumentará da maneira como for
usado. Há ainda temor de programas de eugenia governamentais para
"melhorar a raça", e o uso de tecnologia médica não
para fins não médicos.
RECOMENDAÇÕES
Não
são unânimes as posições éticas levantadas no Projeto Genoma
Humano, não tanto pela própria tecnologia, mas pelo seu uso
formal. Devido ao poder deste instrumento novo, devem ser
examinados seus aspectos éticos, legais e sociais quando o
programa ainda está em seu começo.
Alguns opositores têm medo que o investigador queira
"brincar de Deus", ou interferir nas leis de natureza.
Se nós nos livramos de uma oposição inflexível para o Projeto
Genoma Humano, podemos avaliar os aspectos éticos com os mesmos
parâmetros que nos guiamos sempre que examinamos um novo método
diagnóstico e terapêutico. O critério principal permanece na
avaliação do risco-benefício, o respeito pela pessoa como um
ser humano e o respeito à privacidade e à autonomia.
Há necessidade de declarar as diretrizes éticas e legais gerais
para prevenir a discriminação e o estigma genético da população
de risco.
AS DIRETRIZES BÁSICAS
SÃO:
-
- O serviço genético
deve ser facilmente acessível a todos a fim de prevenir sua
exploração por só por quem tem recursos, aumentando assim a
desigualdade social.
-
- Há necessidade
de informação internacional e transferência de tecnologia e
conhecimentos entre todos os países.
-
- Deve-se
respeitar o resultado de pessoas examinadas e o direito delas
sobre sua e sobre o uso da informação obtida.
-
- Deve-se dar
informação total ao paciente ou ao seu representante legal.
O segredo médico deve ser mantido e a informação não deve
ser passada a um estranho sem o seu consentimento. Até mesmo
se os membros da família do paciente estiver em risco, o
segredo médico deve ser mantido, a menos que possa haver um
dano sério e este dano possa ser evitado revelando-se a
informação; a confidência só pode ser quebrada como último
recurso quando todas as tentativas de convencimento de passar
a informação por ele ao paciente, tenha falhado; até mesmo
neste caso, a informação genética pertinente deve ser
descoberta.
-
- A revelação de
informação para uma terceira pessoa ou o acesso de dados genéticos
pessoais só deve ser permitido com o consentimento
esclarecido do paciente.
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