Jornal
de Natal, 30.07.01 – pág. 9 (1º caderno)
Monitoramento
da violência necessita de
apoio do governo do Estado e da UFRN
Paulo
Augusto
O
mapeamento da violência registrada no Rio Grande do Norte poderá
tornar-se uma atividade comum no Estado, contando com a
possibilidade de medidas para prevenção e redução de sua incidência,
com a formação de um banco de dados que o Centro de Direitos
Humanos e Memória Popular planeja implementar, em parceria com a
universidade e os órgãos da administração pública.
Na
semana passada, o vice-prefeito de Recife, Luciano Rosas Siqueira
(PC do B) esteve em Natal demonstrando como funciona o trabalho de
mapeamento na capital pernambucana, a partir de um trabalho
conjunto com diversas secretarias do município.
A
partir da verificação de que a maior incidência de óbitos no
Recife se dá por homicídios, fato registrado principalmente
entre adolescentes e jovens adultos, entre 15 e 29 anos, seguido
de altas taxas de violência infligida à criança e à mulher, a
Prefeitura do Recife criou o Comitê de Promoção de Direitos
Humanos e Prevenção à Violência, com o objetivo de tecer
diretamente sobre as fontes dessas incidências.
Segundo
o vice-prefeito Luciano Siqueira, o comitê tem como função
primordial articular, mobilizar, sugerir e apoiar projetos de
promoção social desenvolvidos pelas secretarias municipais,
integrando as ações para uma política de promoção e garantia
dos direitos humanos e prevenção à violência.
De
acordo com o coordenador do Centro de Direitos Humanos, economista
Roberto Monte, a questão dos Mapas da Violência está sendo
discutida no Brasil inteiro.
“Agora
você tem que contextualizar esses mapas da violência. Ele
acontece num contexto de construção de sistemas nacionais de
proteção aos direitos humanos. Ou seja, trata-se de um subsídio
que vai nortear os programas estaduais de Direitos Humanos, os
conselhos estaduais, as ONG’s. Na verdade, você tem que
raciocinar isso como um paradigma. E eu vejo que, com a entrada
dos mapas da violência, a partir de agora se começa a ter
efetivamente a participação nessa discussão da academia e de
pesquisadores”, diz Roberto, indicando a necessidade do trabalho
conjunto com a universidade e órgãos estaduais que já trabalham
com a questão.
“Porque
no mapa da violência, para você entrar, tem que ter
perquisadores. Qualquer tipo de mapa da violência tem que ter por
trás um grande aparato. Essa luta pelos direitos humanos até
agora sempre foi uma luta de pessoas e de grupos. A partir de
agora, eu acho que a coisa pode ficar mais ampla. A sociedade,
enquanto estrutura, como os próprios aparelhos do Estado, têm
que, a partir de agora, efetivamente, participar desse tipo de
coisa, porque, com um mapa da violência, pode-se definir políticas
públicas. E grupos, como uma ONG, por exemplo, não fazem política
pública. Ele pode até influir”.
Com
o trabalho a ser realizado, ampliando as atividades que já são
feitas pelo Centro de Direitos Humanos, no monitoramento das ocorrências
de violência no Estado, passa-se a querer entender a gênese da
violência, aprofundando suas causas e seus efeitos.
“É
como alguém que faz uma pesquisa do Ibope. Ou o tipo de pesquisa
para saber a evolução de candidato A, candidato B, seu nível de
rejeição. Com isso, convidamos o vice-prefeito de Recife,
Luciano Rosas Siqueira, para ele expor para a gente o que é isto,
já que os nossos dados, em geral, são muito fora do nordeste. A
gente sempre fala de Rio, são Paulo, e precisamos falar de coisas
que estão acontecendo aqui perto. A gente pegou um dia desses um
mapa da violência que aconteceu aonde? Em Osasco, São Paulo.
Quer dizer, é o mapa da violência que acontece em outros Estados
da Federação, já que é um tipo de preocupação que está
pipocando no Brasil inteiro”.
Segundo
Roberto Monte, em breve o RN contará com a Rede Estadual de
Direitos Humanos, voltada para pensar e agir os direitos humanos,
em todo o território potiguar.
Podemos
dar como exemplo todas as ocorrências que se verificaram
recentemente em Macau. E a partir de agora a gente está querendo
Ter essa visão estadual, com a participação de atores locais.
Hoje tem as próprias Comissões de Justiça e Paz que não
funcionam muito a contento. Queremos dar uma nova roupagem para
esse tipo de necessidade. Há um trabalho localizado na região
Oeste, no Seridó, na região Salineira e, a partir de agora, pode
haver a possibilidade de Ter efetivamente uma rede estadual. Temos
um projeto de, dentro da rede, agregar núcleos locais, de bairro.
De modo que você está em Macau, e acontece aquela confusão
todinha, e está todo mundo lá. É que se precisa Ter um dreno,
com uma nucleação da luta pelos direitos humanos, partindo de
alguns atores e de alguns instrumentais. Então, esse mapeamento
vai aparecer em função disso”.
No
Recife, o trabalho de mapeamento da violência, realizado pelo
Comitê de Promoção de Direitos Humanos e Prevenção à Violência,
criado através do decreto 18.815/01, em abril último, priorizou
inicialmente as mortes por homicídio, violência à criança e
adolescente e à mulher. Para tanto, partiu para a caracterização
dos bairros mais violentos, classificando os tipos de violência
que mais se destacam. No mapeamento, deverão ser levados em conta
dados como sexo, cor, vítima, infrator e idade, entre outros.
O
trabalho inicial, feito com apoio de dados do Sistema de Informações
de Mortalidade (SIM), do Datasus do Ministério da Saúde, com
estudo de três categorias indicadoras de situação de violência:
óbitos, por acidentes de transporte, como indicativos da violência
cotidiana nas ruas e nos âmbitos de convivência; óbitos por
homicídios e outras violências que acabam em morte; e suicídios,
como indicadores de violência e lesões auto-infligidas.
Na
trabalho do Comitê, formado por representantes das secretarias de
Assuntos Jurídicos, Políticas Sociais, Planejamento, Serviços Públicos,
saúde, Educação, tendo como coordenador o vice-prefeito,
procura-se articular a população através de seminários nas
seis regiões político-administrativas do Recife.
Para
maior dinamismo e resultados satisfatórios, foi proposta uma
articulação junto ao governo do Estado e às prefeituras dos
municípios que compõem a região Metropolitana, para desenvolver
uma política conjunta de prevenção à violência e à promoção
dos Direitos Humanos.
Os
estudos que servem de base ao trabalho revelam que a mortalidade
entre os jovens não só aumentou como está mudando sua configuração,
a partir do que se denomina como novos padrões de mortalidade.
O
relatório afirma que as epidemias e doenças infecciosas que eram
as principais causas de morte entre os jovens, há cinco ou seis décadas,
foram substituídas, progressivamente, pelas denominadas “causas
externas” de mortalidade, principalmente os acidentes de trânsito
e os homicídios. Os dados do SIM permitem verificar esta forte
tendência. “Em 1980, as causas externas já eram responsáveis
por mais da metade (52,9%) do total de morte de jovens do país.
Em 1996, mais de 2/3 dos jovens (67,4%) morreram por essas causas
externas e, fundamentalmente, por homicídios e outras violências
semelhantes”, sublinha o documento.
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