Caderno 12:
Aplicação da Lei no
caso de Grupos Vulneráveis Crianças e Adolescentes
Índice do Capítulo:
Perguntas-chave para os Encarregados da
Aplicação da Lei
A Situação Especial da Criança na
Sociedade *
Introdução * A Convenção sobre os
Direitos da Criança
A Administração da Justiça
Juvenil * Instrumentos Internacionais * Finalidade e Âmbito das Medidas * As Implicações na Prática de Aplicação da
Lei
A Captura de Crianças e
Adolescentes * Princípios
Gerais * Os Direitos durante e após a
Captura
A Detenção de Crianças e
Adolescentes * Princípios
Gerais * Proteção Específica
Uso de Força e Armas de Fogo contra Crianças e
Adolescentes
A Criança em Situações de Conflito
Armado * Medidas de Proteção
Pontos de Destaqu????;?u?Te do Capítulo
Perguntas Para Estudo * Conhecimento *
Compreensão * Aplicação
Perguntas-chave para os
Encarregados da Aplicação da Lei
* Por que a criança deve ser
considerada e tratada de modo diferente do adulto?
* Quais são os perigos que ameaçam
o bem-estar da criança?
* Por que os Estados devem adotar
uma legislação especial em relação à criança?
* Qual é a finalidade de um sistema
separado para a administração da justiça juvenil?
* Quando a criança pode ser privada
de sua liberdade?
* Quais são os direitos da criança privada de sua liberdade?
* Qual é a situação da criança
em casos de conflito armado?
* Em que situações a força ou
armas de fogo podem ser empregadas contra a criança?
* Quais são as implicações relativas à criança para a prática de
aplicação da lei?
* Quais são as implicações relativas
à criança no treinamento para a aplicação da lei?
A Situação Especial
da Criança na Sociedade
Introdução
A criança precisa de cuidados
e proteção especiais, sendo dependente do auxílio
do adulto, principalmente em seus primeiros anos
de existência. Não é suficiente para a criança
que apenas os mesmos direitos humanos e liberdades
de um adulto lhe sejam concedidos. Em muitos lugares
do mundo, a situação das crianças é crítica, proveniente
de condições sociais inadequadas, catástrofes,
conflitos armados, exploração, analfabetismo,
fome e deficiências físicas. As crianças, por
si sós, não são capazes de lutar efetivamente
contra essas condições ou mudá-las para melhor.
Portanto, a comunidade internacional exortou os
governos a adotar uma legislação que reconheça
a situação especial e as necessidades das crianças,
criando um arcabouço jurídico que propicie proteção
adicional que leve a seu bem-estar. No nível internacional,
a Assembléia Geral das Nações Unidas adotou, por
unanimidade, em 20 de novembro de 1989, a Convenção
sobre os Direitos da Criança (CDC),
que reconhece a necessidade de cuidados e proteção
especiais, incluindo a proteção jurídica adequada
para a criança, tanto antes como após o nascimento.
A
Convenção sobre os Direitos da Criança
Nos termos da Convenção, criança
é todo ser humano menor de 18 anos, salvo se,
nos termos da lei que lhe for aplicável, atingir
a maioridade mais cedo (CDC, artigo 1º ).
A principal preocupação
da CDC é com o
interesse superior da criança.
Todas as medidas prescritas na Convenção tomam
este princípio como ponto de partida. A CDC
não deixa dúvida de que as crianças podem desfrutar
dos mesmos direitos humanos e liberdades dos
adultos. Certos direitos fundamentais, como
o direito à vida, liberdade e segurança pessoal,
o direito à liberdade de pensamento e expressão
e o direito a reuniões e associações pacíficas
são reiterados firmemente na Convenção. Além
disso, esta também procura a proteção contra violência, negligência e exploração da
criança (CDC, artigos 32 a 36).
A CDC, além disso,
define as razões e as condições pelas quais
a criança pode ser legalmente privada de sua
liberdade, assim como os direitos da criança
acusada de uma infração penal (CDC, artigos
37 e 40). Estes dispositivos serão apresentados
em detalhes nas seções de Captura
e Detenção.
A CDC é um tratado
e, como tal, cria obrigações legais aos Estados
Membros para assegurar que seus dispositivos
sejam implementados em sua totalidade em nível
nacional. As medidas que podem ser tomadas para
esta finalidade incluem (mas não se limitam
a elas) a adaptação da legislação vigente pertinente
à criança ou a adoção de uma nova legislação
nos termos dos dispositivos estabelecidos na
Convenção.
A Administração
da Justiça Juvenil
A comunidade internacional, mediante vários instrumentos jurídicos,
reconheceu a situação especial das crianças e
adolescentes que se deparam com a lei como infratores.
Por causa da sua idade, as crianças e adolescentes são vulneráveis à violência, negligência
e exploração,
necessitando de proteção contra essas ameaças.
Medidas especiais para a prevenção da delinqüência juvenil devem ser tomadas com o objetivo de retirar as crianças e adolescentes do sistema de justiça penal
e redirecioná-los à comunidade.
A administração da
justiça juvenil não constitui uma série diferente de direitos pertinentes às crianças e adolescentes , mas
sim um conjunto de disposições que visa oferecer
proteção adicional aos direitos de pessoas adultas,
que, é claro, também se aplicam às crianças
e adolescentes.
Os
Instrumentos Internacionais
Os seguintes instrumentos
internacionais governam a administração da justiça
juvenil:
* Convenção sobre
os Direitos das Crianças (CDC);
* Regras Mínimas das Nações Unidas para a Administração da Justiça Juvenil
(Regras de Beijing);
* Diretrizes das
Nações Unidas para a Prevenção da Delinqüência
Juvenil (Diretrizes de Riad);
* Regras das Nações
Unidas para a Proteção das Crianças e Adolescentes
privados de sua Liberdade (RNUPCA);
* Regras Mínimas
das Nações Unidas para a Elaboração de Medidas
não Privativas de Liberdade (Regras de Tóquio).
Entre os instrumentos
mencionados, somente a CDC é um tratado. Os
outros podem ser considerados instrumentos que
oferecem instruções normativas, mas não constituem
obrigações legais aos Estados, exceto a ponto
de reiterarem obrigações que fazem parte do
direito internacional ou são encontrados em
tratados multilaterais.
Finalidade
e Âmbito das Medidas
O objetivo do sistema da justiça juvenil é o de ampliar o
bem-estar das crianças e ad????;?u?Tolescentes
e assegurar que qualquer reação ao infrator
juvenil seja proporcional às circunstâncias
da criança e ao delito. Os infratores juvenis
devem ser retirados do sistema de justiça penal
e redirecionados aos serviços de apoio da comunidade
sempre que possível.
Os instrumentos internacionais
listados anteriormente foram elaborados especificamente
para:
· proteger os direitos
humanos da criança e adolescente; ·
proteger o bem-estar da criança e
adolescente que se depara com a lei; · proteger a criança e adolescente
contra a violência, a negligência e a exploração; e · introduzir medidas
especiais para prevenir a delinqüência juvenil.
A
Convenção sobre os Direitos da Criança é primordial na administração da justiça juvenil, propiciando uma ampla
série de medidas que visam proteger os interesses diretos da criança e buscam,
entre outros, evitar que ela entre em conflito com a lei. A CDC faz com que os Estados Partes (artigos 33 a 36) tomem
medidas que combatam a violência, a
negligência e a exploração para com as
crianças. Devem especificamente:
* adotar
normas que combatam o consumo de drogas e previnam a utilização de crianças no
tráfico de drogas (artigo 33);
* proteger contra todas
as formas de violência e exploração sexuais, incluindo
atividade sexual ilícita, exploração de crianças
na prostituição ou práticas sexuais ilícitas, e
exploração de crianças na produção de espetáculos
ou material pornográfico (artigo 34);
* adotar medidas
nacionais, bilaterais e multilaterais para impedir o rapto, a venda ou tráfico
de crianças independente de sua finalidade ou forma (artigo 35); * proteger contra todas as formas de exploração prejudiciais a
qualquer aspecto do bem-estar da criança (artigo 36).
As
Regras de Beijing desenvolvem
e ampliam aqueles artigos da CDC que tratam de
tópicos como a captura, detenção, investigação
e ação penal, julgamento e sentença, e o tratamento
institucional e não institucional de infratores
juvenis.
As
Diretrizes de Riad concentram-se
na prevenção da delinqüência juvenil mediante
a participação de todas as camadas da sociedade
e a adoção de uma abordagem voltada à criança.
As diretrizes estão fundamentadas na crença
de que a prevenção da delinqüência juvenil é
uma parte essencial da prevenção do crime na
sociedade. O instrumento define, para isso,
o papel da família, da educação, da comunidade
e da mídia para as massas, e ainda estabelece
o papel e a responsabilidade da política social,
da legislação, da administração da justiça juvenil,
da pesquisa e desenvolvimento e coordenação
de políticas.
Uma das premissas subjacentes
das Diretrizes é de que a conduta do jovem que
não condiz com as normas sociais gerais deve
ser considerada como parte do processo de amadurecimento,
que tende a desaparecer espontaneamente com
a transição a idade adulta (artigo 5 e).
As Diretrizes exortam
os Estados a elaborar e implementar planos abrangentes,
em todos os níveis de governo, para a prevenção
da delinqüência juvenil. Para que essas ações
de prevenção sejam efetivas, deve haver uma
estreita cooperação entre todos os setores relevantes
da sociedade (incluindo os vários níveis de
governo, o setor privado, cidadãos representantes
da comunidade, os conselhos de direitos da criança
e do adolescente, organizações de aplicação
da lei e instâncias judiciais). Deve haver pessoal
especializado em todos os níveis.
As Regras das Nações Unidas para
a Proteção de Crianças e Adolescentes Privados
de sua Liberdade
(RNUPCA) é um instrumento elaborado para assegurar
que as crianças e adolescentes privados de sua
liberdade sejam mantidos em instituições somente quando houver uma necessidade
absoluta de fazê-lo. As crianças e adolescentes
detidos devem ser tratados humanamente, com
consideração por sua condição e com respeito
total a seus direitos humanos,pois, ao serem
privados de sua liberdade, são altamente vulneráveis
a abusos, vitimização e violações de seus direitos,
sendo esta mais uma razão para que sua detenção
permaneça uma medida a ser tomada em último
caso.
As Regras 17 e 18 deste
instrumento são de importância particular aos
encarregados da aplicação da lei, pois dizem
respeito às crianças e adolescentes detidos
ou que aguardam julgamento. Elas enfatizam,
novamente, que a detenção preventiva de menores
deve ser evitada ao máximo, e limitada a circunstâncias
excepcionais. Quando a detenção preventiva for inevitável, sua duração deve
ser limitada absolutamente ao mínimo possível,
através da atribuição da prioridade máxima ao
andamento expediente destes casos (Regra 17).
Os direitos estipulados
no artigo 7o das Regras de Beijing (as salvaguardas
básicas de procedimentos para assegurar que
se respeite o direito das crianças e adolescentes
a um julgamento justo) são reiterados na Regra
18 da RNUPCA. Além disso, a Regra 18 estipula
o direito da criança e adolescente à oportunidade
de executar trabalho remunerado, à possibilidade
de continuar a educação e treinamento, e ser
propiciado com materiais educacionais e de recreação.
As
Regras Mínimas das Nações Unidas para Medidas
Não Privativas de Liberdade (Regras de Tóquio)é
um instrumento que trata de infratores juvenis
em geral, em todos os estágios dos processo
- independentemente do fato de serem suspeitos,
acusados ou sentenciados. Formula princípios
básicos para promover o uso de medidas não-custodiais,
bem como de salvaguardas mínimas às pessoas
sujeitas a alternativas de encarceramento. Recomenda
que o sistema de justiça penal deva disponibilizar
uma ampla variedade de medidas não privativas
de liberdade, desde disposições pré-processuais
até disposições pós-sentenciais, de maneira
a propiciar uma maior flexibilidade que seja
consistente com a natureza e gravidade do delito,
com a personalidade e antecedentes do infrator,
com a proteção da sociedade e para evitar o
uso desnecessário do encarceramento. As medidas
não-custodiais vão de encontro ao objetivo principal
do sistema de justiça juvenil: retirar as crianças
e adolescentes, que venham a deparar-se com
lei, do sistema de justiça penal e redirecioná-los
à comunidade. As medidas devem, é claro, ser
previstas na legislação nacional para que sua
aplicação seja legal.
As Regras de Tóquio
estipulam exatamente que medidas custodiais
são permitidas, as condições e as salvaguardas
legais para sua aplicação, e as normas para
a supervisão eficaz. As medidas não-custodiais
devem, evidentemente, ser incorporadas de forma
adequada pela legislação nacional como uma condição
anterior a sua aplicação legítima.
Implicações
para a Prática da Aplicação da Lei
Já é aceito, por todos
os países e todas as sociedades, que um delinqüente
juvenil é um tipo diferente de infrator, que
requer proteção e tratamento especiais. Isto
é um fato reconhecido, em nível internacional,
pela existência de instrumentos internacionais
especificamente elaborados para proteger os
direitos e interesses do infrator juvenil.
É extremamente
importante que os encarregados da aplicação
da lei, como o primeiro contato que a criança
e adolescente terão com o sistema judiciário
juvenil, ajam com conhecimento e adequadamente
de maneira a proteger e ampliar o bem-estar
da criança e adolescente infrator.
As
Regras de Beijing
são bastante explícitas a respeito da necessidade
de especialização, por parte das organizações
de aplicação da lei, em relação a menores. A
Regra 1.6 afirma que os serviços de justiça
juvenil deverão ser sistematicamente desenvolvidos
e coordenados, tendo em vista aperfeiçoar e
apoiar a capacidade dos funcionários que trabalham
nestes serviços, incluindo seus métodos, modos
de atuação e atitudes. A Regra 12 chama a atenção
para a necessidade de uma formação especializada
para todos os encarregados da aplicação da lei
que participam na administração da justiça juvenil.
As unidades da aplicação da lei, especializadas
em todos os aspectos da delinqüência juvenil
seriam, portanto, indispensáveis, não só para
a implantação dos princípios específicos das
Regras de Beijing, mas, também, de forma generalizada,
para melhorar a prevenção e controle da criminalidade
juvenil e o tratamento do infrator juvenil.
O redirecionamento
das crianças e adolescentes do sistema de justiça
penal e seu redirecionamento à comunidade requerem,
por parte dos encarregados da aplicação da lei,
um tipo de atitude e ação bastante diferentes
daquelas atitudes e ações apropriadas para infratores
adultos. A criação e manutenção de uma relação
com grupos comunitários, com conselhos de direitos
da criança e do adolescente e com funcionários
do judiciário designados à justiça juvenil,
requerem habilidades e conhecimentos específicos
dos encarregados da aplicação da lei. Para que
se considere a delinqüência juvenil como um
problema transitório, da passagem da idade infantil
à idade adulta, o qual necessita de aconselhamento,
entendimento e medidas preventivas de apoio,
é necessário que se tenha uma abordagem mais
profunda do que aquela oferecida no treinamento
básico de aplicação da lei.
É essencial que se
tenha um entendimento pormenorizado da criança
e adolescente para que as medidas não-custodiais
sejam aplicadas com sucesso, bem como a capacidade
de aplicá-las em estreita cooperação e coordenação
com outras agênc????;?u?Tias principais, de
modo a atingir-se a reabilitação e reforma do
delinqüente juvenil. O principal objetivo de
tais medidas será o de prevenir a reincidência,
ao invés de infligir punição por um delito cometido.
Tais abordagens requerem dos encarregados da
aplicação da lei uma visão ampla e um entendimento
detalhado não só dos direitos e da situação
especial das crianças e adolescentes, mas também
da situação especial e dos direitos das vítimas
da criminalidade juvenil, bem como da necessidade
de proteger e satisfazer a sociedade. São muitos
interesses diversos que requerem igual proteção.
Os interesses específicos dos jovens não podem
ser subordinados a outros nem deixar de receber
prioridade sem justificativa plena.
Captura de Menores
Princípios
Gerais
A Convenção sobre os Direitos
da Criança (CDC) define criança como sendo todo
ser humano menor de 18 anos, salvo se, nos termos
da lei que lhe for aplicável, atingir a maioridade
mais cedo (
artigo 10 ).
As Regras
Mínimas das Nações Unidas para a Administração
da Justiça Juvenil (Regras de Beijing) definem a criança e adolescente como sendo uma
criança ou jovem que, perante os respectivos
sistemas jurídicos, é passível de ser tratada
por um delito de uma forma diferenciada daquela
de um adulto
(Regra 2.2 (a)). De acordo com as Regras de
Beijing, um infrator juvenil é
uma criança
ou jovem acusado de haver cometido um delito
ou considerado culpado de ter cometido um delito
(Regra 2.2(c)).
Os instrumentos mencionados
não regulamentam decisivamente a idade
de responsabilidade criminal,
deixando esta decisão para ser tomada no nível
nacional. Apesar disto, as Regras de Beijing
declaram que
a idade não deve ser fixada em um nível demasiadamente
baixo - levando em conta a maturidade emocional,
mental e intelectual
(Regra 4).
No comentário desta
Regra, se reconhece que: A
idade mínima de responsabilidade criminal difere
muito, devido a fatos históricos e culturais.
A abordagem moderna seria considerar se uma
criança pode corresponder às expectativas dos
componentes morais e psicológicos da responsabilidade
criminal; ou seja, se uma criança, em virtude
de seu discernimento e entendimento individual,
pode ser responsabilizada por comportamento
essencialmente anti-social.
Como já foi dito anteriormente,
o principal objetivo da administração da justiça
de menores é o de retirar o infrator juvenil
do sistema de justiça penal e redirecioná-lo
à sociedade. As normas pertinentes à captura
(e detenção) das crianças e adolescentes refletem
este objetivo geral.
A CDC contém dispositivos,
bastante explícitos, com esta finalidade:
* nenhuma criança será
privada arbitrária ou ilegalmente de sua liberdade;
* a captura, detenção
ou aprisionamento de uma criança ou jovem deverão
estar em conformidade com a lei e serão usados
somente como medidas de última instância, e pelo
mais breve período de tempo apropriado;
* qualquer criança privada de sua liberdade deverá ter direito
ao acesso
imediato à assistência
jurídica, ou a outra assistência adequada, assim
como o direito de impugnar a legalidade da privação
de sua liberdade (artigo 37).
Direitos
durante e após a Captura
Sempre que uma pessoa
for capturada, a razão deve ser pela "suspeita da prática de um delito ou por ação de uma autoridade"
(Conjunto de Princípios, Princípio 36.2).
Toda pessoa capturada,
deverá ser informada, no momento de sua captura,
das razões da captura e deverá ser prontamente
informada de qualquer acusação contra ela
(PIDCP, artigo 9.2; Conjunto de Princípios,
Princípio 10).
A pessoa capturada
deverá ser levada a um local de custódia e deve
ser trazida prontamente perante um juiz ou outro
agente oficial autorizado por lei a exercer
poder judicial,
que decidirá sobre a legalidade e necessidade
da captura (PIDCP, Artigo 9.3; Conjunto de Princípios,
Princípios 11 e 37).
Estes dispositivos
sobre captura e detenção repetem-se na CADH
(artigo 7o) e na CEDH (artigo 5o). A CADHP não
contém nenhum destes dispositivos. Não há uma
definição clara do que se entende por prontamente. Em muitos Estados o período máximo permitido antes que uma pessoa capturada
seja trazida perante um juiz ou autoridade similar
é limitado a 48 horas; em outros Estados este
período é limitado a 24 horas. Este período
é mais comumente chamado de custódia
policial.
Precede o que é chamado de detenção
preventiva.
Com relação à captura do infrator juvenil, os
encarregados da aplicação da lei devem observar
outras disposições adicionais:
os pais ou tutores da criança ou adolescente capturado deverão
ser imediatamente notificados da captura
(Regras de Beijing, Regra 10.1); um juiz ou autoridade competente
deverá examinar, sem demora, a possibilidade de liberar a criança ou
adolescente (Regras de Beijing, Regra
10.2);
as crianças e adolescentes
em detenção preventiva deverão ser mantidos separados
dos adultos
(Regras de Beijing, Regra 13.4).
Os dispositivos seguintes
são aplicados eqüitativamente aos adultos e às
crianças e adolescentes infratores que forem capturados:
Uma pessoa detida
sob acusação criminal tem o direito de ser julgada
em prazo razoável ou de aguardar julgamento
em liberdade
(Conjunto de Princípios, Princípio 38).
As autoridades
responsáveis pela captura, detenção ou prisão
de uma pessoa devem, no momento da captura e
no início da detenção ou da prisão, ou pouco
depois, prestar-lhe informação e explicação
sobre seus direitos e sobre o modo de exercê-los
(Conjunto de Princípios, Princípio 13).
A presunção da inocência,
assim como os dispositivos pertinentes ao direito
a um julgamento justo, são aplicáveis igualmente
ao infrator juvenil. Não há necessidade de repeti-los
em seus detalhes nesta seção.
A Detenção de
Crianças e Adolescentes
Princípios Gerais
Nenhuma criança será privada de liberdade de forma ilegal ou arbitrária.
A captura, detenção ou prisão de uma criança devem
estar em conformidade com a lei, e serão utilizadas
????;?u?Tunicamente como medida de último recurso
e terão a duração mais breve possível.(CDC, artigo 37 b).
As crianças e
adolescentes acusados serão separados dos adultos
e trazidos a juízo tão rápido quanto possível
(PIDCP,
artigo 10.2 b).
As crianças e adolescentes
detidos têm os mesmos direitos dos adultos,
listados por completo no capítulo Detenção. Em reconhecimento
a sua vulnerabilidade particular, existem várias
disposições adicionais para que se dê a proteção
de que precisam.
Enquanto que os adultos
detidos acusados de um delito têm direito a
serem julgados sem demora injustificada
(PIDCP, artigo 14.3 c), o artigo 10.2 (b), o
mesmo instrumento, na verdade, estipula um espaço
de tempo mais definido para crianças e adolescentes,
por meio da redação trazidos
a juízo tão rápido quanto possível.
O objetivo deste dispositivo é assegurar que
o período em que as crianças e adolescentes
fiquem em custódia e detenção preventivas seja
o mais breve possível. Deve-se observar que
o termo juízo
não significa
necessariamente o sentido formal de um julgamento
por um tribunal criminal; também inclui mais
propriamente decisões tomadas por órgãos não-judiciais
autorizados a lidar com crimes cometidos por
menores.
Proteção
Específica
A proteção adicional
a crianças e adolescentes privados de liberdade
é também codificada na Convenção
sobre os Direitos da Criança,
nas Regras Mínimas das Nações Unidas para a Administração da Justiça
Juvenil
(Regras de Beijing) e nas Regras
da Nações Unidas para a Proteção das Crianças
e Adolescentes Privados de Liberdade.
O artigo 37 da Convenção sobre os Direitos da Criança (CDC) é de relevância particular no tratamento das crianças e adolescentes
detidos. Sob este dispositivo da Convenção (que
cria obrigação legal aos Estados Partes dela),
é declarado que:
* a
tortura e os maus-tratos de crianças e adolescentes
são proibidos (bem como a pena de morte e a
prisão perpétua);
* é proibido
privar crianças e adolescentes ilegal ou arbitrariamente
de sua liberdade;
* as crianças
e adolescentes privados de sua liberdade devem
ser tratados humanamente, com respeito por sua
dignidade humana e de uma forma que leve em
conta as necessidades especiais de pessoas de
sua idade;
* as crianças
e adolescentes detidos devem ser mantidos separados
dos adultos detidos;
* as crianças
e adolescentes têm o direito a manter contato
com suas famílias, a ter pronto acesso à assistência
jurídica, e a impugnar a legalidade de sua detenção
perante um tribunal ou outra autoridade competente.
As disposições estabelecidas
na CDC são reiteradas e expandidas nos outros
dois instrumentos mencionados acima. As Regras
de Beijing concentram-se principalmente nos
direitos das crianças e adolescentes, relacionados
aos procedimentos durante a captura, detenção
preventiva e durante todos os estágios do processo
penal. Estes incluem (Regra 7):
* a
presunção da inocência;
* o
direito a ser notificado das acusações contra
si;
* o
direito a permanecer calado;
* o direito à assistência jurídica;
* o direito à presença de
um dos pais ou tutor;
* o direito a contestar e acarear testemunhas;
* o
direito ao recurso a uma autoridade superior.
Os mesmos dispositivos
podem ser encontrados no artigo 40.2 (b) da
CDC, a qual, sendo um tratado, cria obrigações
legais aos Estados Partes para que adotem legislação
em conformidade com ela.
As Regras de Beijing
estipulam que a privacidade da criança e adolescente
deve ser respeitada sempre, de modo a evitar
dano causado por publicidade indevida ou pelo
processo de rotulação. Em princípio, nenhuma
informação que possa levar à identificação da
criança ou adolescente pode ser divulgada (Regra
8). Também concentram-se no redirecionamento
- enfatizando que se deve levar em consideração
a possibilidade de se tratar de casos de menores
sem ter de recorrer a um julgamento formal.
As organizações de aplicação da lei devem ter
a autoridade para tratar dos casos e devem ser
instadas a fazê-lo, sempre que possível, sem
recorrer aos procedimentos formais (Regra 11).
Recomenda-se a especialização
para tratar de menores, dentro das organizações
de aplicação da lei, mediante a criação de unidades
ou departamentos especiais ou de treinamento
adicional dos encarregados da aplicação da lei
que lidem com os infratores juvenis (Regra 12).
O Uso de Força
e Armas de Fogo contra as Crianças e Adolescentes
Tanto os Princípios Básicos sobre o Uso de Força e Armas de Fogo como
o Código de Conduta para os Encarregados da Aplicação
da Lei (ou qualquer outro instrumento internacional)
propiciam alguma orientação sobre o uso dessas
medidas contra crianças. Pode-se concluir com
segurança que as mesmas regras e disposições para
os adultos podem ser aplicadas igualmente com
crianças ou adolescentes. O capítulo sobre O
Uso de Força e Armas de Fogo fornece
uma visão geral, clara e detalhada destas regras.
No entanto, tendo em
vista a posição vulnerável da criança - e a
necessidade de uma proteção e tratamento especiais
- é cabível concluir que se deve restringir
ao máximo o uso de força e armas de fogo contra
as crianças. Pela sua idade e imaturidade, elas
dificilmente representam a ameaça que justificaria
o uso dessas medidas extremas, ao mesmo tempo
que o impacto seria provavelmente maior contra
a criança do que contra o adulto, sendo este
uma pessoa madura. Deve-se fazer com que os
encarregados da aplicação da lei pesem seriamente
as conseqüências face à importância do objetivo
legítimo a ser alcançado. Também devem ser encorajados
a buscar alternativas adequadas ao uso de força
e armas de fogo contra as pessoas, especialmente
crianças.
A Criança em
Situações de Conflito Armado
As situações de conflito
armado geram efeitos bastante devastadores nas
crianças, como, por exemplo, as conseqüências
terríveis da separação de famílias, de crianças
tornando-se órfãs, do recrutamento de soldados
ainda crianças e da morte ou ferimentos de crianças
civis. É difícil medir quais serão os efeitos
da guerra no futuro desenvolvimento psicológico
e físico das crianças que a ela foram expostas.
A história recente nos fornece exemplos vívidos
para que possamos entender as conseqüências terríveis
da guerra nas crianças. Elas sempre necessitarão
de proteção e de tratamento especiais em situações
de conflito armado.
Medidas
de Proteção
O artigo 38 da Convenção
sobre os Direitos da Criança exorta
os Estados Partes a respeitar as normas de direito
internacional humanitário que lhe são aplicáveis
em situações de conflito armado e que são relevantes
à criança. Também ordena que os Estados Partes
tomem todas as medidas possíveis para assegurar
que as
pessoas que não tenham atingido a idade de quinze
anos não participem diretamente nas hostilidades,
e que
os Estados Partes não recrutem pessoas menores
de 15 anos para as forças armadas. Caso recrutem
entre as idades de quinze a dezoito, que dêem
preferência aos mais velhos. Finalmente, os
Estados Partes devem utilizar todos os meios
possíveis para assegurar a proteção e os cuidados
com as crianças atingidas por um conflito armado.
A situações reconhecidas
de conflito armado não internacional são governadas pelo artigo 30 comum às quatro Convenções
de Genebra de 1949, e, nos casos de conflito
armado não internacional de alta intensidade,
também pelo Segundo Protocolo Adicional de 1977.
O último estabelece, em seu artigo 4º, garantias
fundamentais para o tratamento humano de pessoas
que não participem, ou não mais, das hostilidades.
O artigo 4.3 (a)
ao (e)
estipula as medidas especiais aplicáveis ou
relevantes às crianças, pertinentes a:
* educação (a);
* reencontro de famílias temporariamente separadas (b);
* idade mínima para a
participação nas hostilidades ou recrutamento para as forças armadas
(c); * proteção para as crianças
combatentes capturadas com menos de quinze anos de idade (d); * deslocamento temporário de
crianças por razões relacionadas ao conflito armado (e).
Podem-se encontrar disposições
similares com relação ao conflito
armado internacional (ao
qual as quatro Convenções de Genebra de 1949 e
o Primeiro Protocolo Adicional de 1977 se aplicam)
nos artigos 77 e 78 do Primeiro Protocolo. De
acordo com o artigo 24 da Quarta Convenção de
Genebra de 1949, os Estados envolvidos no conflito
devem tomar
as medidas necessárias para assegurar que as crianças
menores de quinze anos, que estejam órfãs ou separadas
de suas famílias por causa da guerra, não sejam
deixadas à sua própria sorte, e
que a sua subsistência, o exercício da sua religião
e a sua educação sejam facilitados em todas as
circunstâncias.
Caso a criança
seja capturada, detida ou presa por motivos
relacionados ao conflito armado, elas devem
ser mantidas em instalações separadas dos adultos,
exceto
quando famílias forem mantidas juntas (Primeiro
Protocolo Adicional, artigo 77.4).
A menos que haja
razões imperativas para tal, nenhum Estado Parte
ao conflito poderá fazer com que crianças sejam
evacuadas, a não ser as crianças de seu próprio
país, para o estrangeiro. Caso
isso ocorra, todas as medidas necessárias devem
ser tomadas para facilitar o retorno das crianças
a suas famílias e país (Primeiro Protocolo Adicional,
artigo 78).
Pontos de Destaque
do Capítulo
* As crianças precisam
de cuidados e proteção especiais, sendo dependentes
da assistência dos adultos, especialmente durante
os primeiros anos de vida.
* As crianças e adolescentes têm os mesmos direitos e liberdades dos
adultos. As regras especiais propiciam proteção
adicional dos interesses deste grupo vulnerável.
* A Convenção sobre os
Direitos da Criança concentra-se primordialmente
em assegurar as melhores condições às crianças,
buscando protegê-las contra o abuso, negligência
e exploração.
* O objetivo da administração
da justiça juvenil é o de ampliar o bem-estar
das crianças e assegurar que qualquer reação ao
infrator juvenil seja proporcional às circunstâncias
da criança ou adolescente e do delito.
* Os infratores juvenis
deverão ser desviados do sistema de justiça penal
e redirecionados aos serviços de apoio da comunidade
sempre que possível.
* A criança ou adolescente
devem ser informados, na ocasião da captura, das
razões para tal ou das acusações contra eles.
* Os pais ou
tutores devem ser informados a respeito da captura
da criança ou adolescente, logo que seja feita.
* Quando a detenção preventiva
de um menor for inevitável, esta deve ser feita
pelo menor tempo possível e a prioridade mais
alta deve ser dada ao andamento do processo.
* As crianças e adolescentes capturados ou detidos têm os
mesmos direitos dos adultos, em qualquer forma
de captura ou detenção.
* As crianças e adolescentes
devem ser mantidos separados dos adultos, e menores
sob acusação devem ser mantidos separados dos
que já foram sentenciados.
* Quando possível, deve-se
preferir a aplicação das medidas não-custodiais
à prisão das crianças e adolescentes
* Embora não haja nenhum
dispositivo especial relativo ao uso de força
e armas de fogo contra as crianças e adolescentes,
os encarregados da aplicação da lei devem ser
levados a restringir seu uso somente em situações
que envolvem adultos.
* As crianças são extremamente
vulneráveis às situações de conflito armado.
* Não se deve permitir que as crianças menores de quinze anos participem
das hostilidades, nem que sejam recrutadas para
as forças armadas.
* Os Estados Partes a
um conflito devem tomar todas as medidas possíveis
para assegurar a proteção e cuidado das crianças
afetadas por um conflito armado.
* Caso as crianças sejam capturadas, detidas ou presas por motivos relacionados
ao conflito armado, devem ser mantidas separadas
dos adultos, exceto em casos onde as famílias
são mantidas juntas.
* Os encarregados da aplicação da lei responsáveis por menores
deverão receber treinamento e formação especiais
que os prepare de forma apropriada para seu trabalho.
Perguntas
para Estudo
Conhecimento
1. Qual é o objetivo da administração
da justiça juvenil?
2. Como a Convenção sobre os
Direitos da Criança define uma criança?
3. Quais são os direitos da criança e adolescente na captura?
4. Quais são os direitos da criança
e adolescente após a captura?
5. Qual é o principal princípio
subjacente à detenção preventiva de crianças e
adolescentes?
6. Em que situação um jovem pode
ser recrutado nas forças armadas?
7. Em que situação um jovem pode
participar das hostilidades?
8. Qual é o objetivo das medidas
não-custodiais?
Compreensão
1. Por que as crianças merecem
cuidado e proteção especiais de acordo com a
lei?
2. Por que os infratores juvenis devem ser desviados do sistema de
justiça penal?
3. Qual é a sua opinião sobre
o valor das medidas não-custodiais?
4. Por que a detenção preventiva
de crianças e adolescentes deve ser evitada?
5. Por que os encarregados
da aplicação da lei que lidam com crianças e
adolescentes devem receber treinamento adicional?
6. Quais são os outros grupos
sociais que podem ter um papel na prevenção
da delinqüência juvenil?
7. O que pode ser feito para limitar os efeitos prejudiciais do conflito
armado nas crianças?
Aplicação
1. Para encontrar alternativas
à maneira de lidar com delitos cometidos por
crianças e adolescentes, lhe é pedido que elabore
propostas para medidas não-custodiais. Forneça
detalhes das medidas propostas e das condições
nas quais elas seriam aplicadas.
2. Os encarregados da aplicação
da lei que lidam com crianças e adolescentes
devem receber treinamento adicional. Esboce
um programa de treinamento, definindo os tópicos
que serão abordados. Para cada tópico especifique,
pelo menos, os principais objetivos de aprendizado.
3. Foi pedido a sua força policial
que participe, regularmente, nas aulas de sociologia
na escola de segundo grau da comunidade. Os
alunos têm idades que variam entre 15 e 17 anos.
Seu comandante pediu que você desenvolvesse
algumas idéias que pudessem ser apresentadas
aos alunos.
a) Quais tópicos que você apresentaria
e debateria com os alunos?
b) Defina alguns objetivos
básicos a serem alcançados com o debate de cada
tópico escolhido em a).
4. Seu comandante pediu que
elaborasse uma campanha de divulgação e educação
para os jovens que alertasse para os perigos
do uso de drogas.
a) Prepare uma lista dos perigos
mais sérios do uso de drogas.
b) Considere e liste os argumentos
para dissuadir os jovens do uso de drogas.
c) Indique os principais meios de comunicação que usaria para veicular
a campanha.
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