12.
o valor da prova no sistema interamericano
Um
ponto importante no trâmite da denúncia perante a Comissão é
a demonstração de fatos alegados.
Os
critérios de avaliação das provas sobre os fatos narrados na
denúncia, pela Comissão, são geralmente mais flexíveis no
que nos sistemas jurídicos dos Estados.
No
direito brasileiro, por exemplo, há regras rígidas para que um
testemunho seja válido, sendo impedidos de testemunhar os
menores de dezesseis anos; o interessado no objeto de litígio;
o ascendente, o descendente ou o colateral até o terceiro grau
de alguma das partes, por consangüinidade ou por afinidade, e
os cônjuges, além de outros (40)
Na
jurisprudência do sistema interamericano a prova
circunstancial, os indícios e as presunções têm valor probatório.
Desta forma, não aplicam-se as particularidades dos tribunais
nacionais e nem os critérios das justiças penais de cada país.
12.1
Critérios adotados perla jurisprudência internacional
A
Corte Interamericana ao pronunciar-se sobre os critérios de
valoração de provas, no caso Velásquez
Rodriguez, sentença de 29 de julho de 1988, estabeleceu que
a)
critérios
internacionais são menos formais do que os sistemas jurídicos
nacionais:
“
128. Para um tribunal internacional, os critérios de valoração
da prova são menos formais do que nos sistemas legais internos.
Quando no requerimento de prova, tais sistemas reconhecem gradações
diferentes que dependem da natureza, caráter e gravidade do litígio.”
(tradução nossa) (41).
b)
as provas
circunstanciais, os indícios e as presunções também são legítimas
para fundamentar a denúncia, assim como a prova direta
(testemunhal e documental):
“130.
A prática dos tribunais internacionais e internos demonstra que
a prova direta, seja testemunhal ou documental, não é a única
que pode ser legitimamente considerada para fundamentar a sentença.
A prova circunstancial, os indícios e as presunções podem ser
utilizados sempre que dele se possa inferir conclusões sobre os
fatos”. (tradução nossa) (43)
c)
as justiças
penais internas dos países diferem do direito internacional dos
direitos humanos, na medida em que a finalidade deste último não
é impor penas aos culpados das violações mas amparar as vítimas,
dispondo sobre as reparações dos danos que foram causados
pelos Estados responsáveis.
“
132. O procedimento perante a Corte, como tribunal internacional
que é, apresenta particularidades e características próprias
não sendo por isso aplicáveis, automaticamente, todos os
elementos dos processos perante os tribunais interno.”(tradução
nossa) (43)
“134.
De fato, a proteção internacional dos direitos humanos não
deve ser confundida com justiça penal. Os Estados não
comparecem perante a Corte como sujeitos de ação penal. O
Direito Internacional dos direitos humanos não tem por objeto
impor penas às pessoas culpáveis por violações, e sim
amparar as vítimas e dispor sobre a reparação dos danos que
tenham sido causados pelos Estados responsáveis por tais
atos.” (tradução nossa) (44)
Neste
sentido, o Regulamento da Corte, permite receber e considerar o
testemunho de qualquer pessoa que detenha alguma informação
relevante para o caso que esteja pendente, mesmo que a mesma não
esteja qualificada para declarar formalmente um testemunho no
processo:
“Art.
38. 2 Em todo caso, a Corte sempre poderá, se considerar útil,
ouvir a título informativo uma pessoa que não está
qualificada para prestar declarações como testemunha. (45)
Assim,
a Corte tem plenos poderes para receber qualquer prova que
considere aproapriada, incluindo um testemunho de uma pessoa
cuja identidade deve manter-se em sigilo. Tal testemunho pode
servir não para fundamentar uma alegação, e sim como
testemunho direto dos fatos que se encontram sob exame. Desta
forma, é necessário que a amplitude e especificidade dos critérios
de exame e avaliação das provas, adotado pela jurisprudência
do sistema interamericano, sejam consideradas quando for
apresentada uma denúncia
d)
O Estado denunciado tem a obrigação de cooperar com a
obtenção de provas, nos casos em que o demandante alegar a
impossibilidade de obtenção da mesma:
“
135. Diferentemente do direito penal interno, nos processos
sobre violações de direitos humanos, a defesa do Estado não
pode apoiar-se na impossibilidade do demandante de apresentar
provas que, em muitos casos, não puderam ser obtidas sem a
cooperação do Estado”(Tradução nossa) (46)
“136.
É o estado que tem controle dos meios para aclarar fatos
ocorridos dentro de seu território. A Comissão, ainda que
tenha faculdades para realizar investigações, na prática
depende, para poder efetuá-las dentro da jurisdição do
Estado, da cooperação e dos meios proporcionados ao
governo.” (tradução nossa) (47)
“Neste
sentido, o artigo 34 (3), do Regulamento da comissão, referente
ao esgotamento dos recursos internos, dispõem que:
“
3. Quando o peticionário alegar a impossibilidade de comprovar
o requisito indicado neste artigo, caberá ao Governo contra
qual foi dirigida a petição demonstrar à Comissão que os
recursos internos não foram previamente esgotados, a menos que
a isso se deduza claramente dos antecedentes constantes na petição.”
Logo,
conforme estabelecido pela jurisprudência do sistema
interamericano, o Estado denunciado é que tem o ônus de provar
quais os recursos internos que não foram esgotados e a eficácia
dos mesmos.
e)
qualquer pessoa poderá testemunhar, independentemente do
fato de ter antecedentes penais, ou seja, o testemunho não deve
ser considerado como não idôneo, ou sem subjetividade, por razões
de ordem ideológica, ou de parentesco, entre outras.
“143.
Algumas circunstâncias podem, certamente, condicionar o apego
à verdade de uma testemunha. O Governo, entretanto, não
demonstrou com fatos concretos que as testemunhas faltaram com a
verdade, se limitando a fazer observações do caráter geral
sobre a suposta falta de idoneidade ou imparcialidade das
mesmas, que não são suficientes para comprometer depoimentos
coincidentes e coerentes no fundamental, em vista dos quais o
julgador não pode rejeitá-los” (tradução nossa) 48
“144.
Por outra parte, alguns dos argumentos do Governo carecem de
fundamentação no âmbito da proteção dos direitos humanos. Não
é admissível que se insinue que as pessoas que, a qualquer título,
recorram ao sistema interamericano de proteção aos direitos
humanos, estejam incorrendo em deslealdade a seu país, nem que
se possa extrair deste fato qualquer sanção ou conseqüência
negativa.
Os
direitos humanos representam valores superiores que ‘não
nascem do fato de ser nacional de determinado Estado, e sim que
têm como fundamento os atributos da pessoa humana.’ (Declaração
Americana dos Direitos e Deveres do Homem, Considerando e Convenção
Americana, Preâmbulo)”.(49)
“145.
Tampouco é sustentável que a circunstância de ter
antecedentes penais ou processos pendentes seja por si só
suficiente para negar a idoneidade das testemunhas para depor
perante a Corte.” (tradução Nossa) (50)
12.2
Outras provas admitidas pelo sistema interamericano: recortes de
jornais, vídeos, declarações, cópias de documentos oficiais
A
jurisprudência internacional, no que se refere aos critérios
de valoração de provas confere aos recortes de jornais e
outros materiais de imprensa valor probatório, pois podem ser
utéis para demonstrar ou contextualizar uma determinada situação.
Além disso, relatam fatos públicos e notórios.
Porém,
é importante que as provas apresentadas sejam eficazes. Por
exemplo, um vídeo de dois minutos de duração sobre um
testemunho pode causar um impacto maior, ou ter mais valor, do
que cem páginas escritas. Neste sentido, tudo o que for alegado
na denúncia será demonstrado através de provas. Deve-se levar
em conta que o objetivo é demonstrar a responsabilidade do
Estado por violação aos direitos humanos e não a
responsabilidade de uma pessoa em particular.
Os
meios de prova a serem apresentados para a Comissão podem ser:
fotos, vídeos fitas cassetes, declarações testemunhais, cópias
de documentos oficiais, etc. Assim, sempre causa forte impacto a
apresentação de uma prova importante como, por exemplo, a
declaração de uma vítima, (ainda que seja em gravação ou em
vídeo) durante a audiência da Comissão, quando estão
geralmente presentes os comissionados. Esse é o único momento
em que os membros da Comissão, conjuntamente, têm contato
direto com o caso. Daí o seu peso e a sua importância.
O
Estado não pode alegar em sua defesa que os peticionários não
apresentam todas as provas, pois estas estão, presumidamente,
em seu poder. Neste sentido. O Estado tem a obrigação de
colaborar com a investigação dos fatos. Este é um princípio
básico no procedimento junto ao sistema interamericano. Por
exemplo, se o Estado tem conhecimento de relátorios internos
(relatórios militares) deverá mencionar tal fato por escrito.
O Estado tem o dever de levar tal prova ao procedimento em trâmite
perante a Comissão, assim como tem a obrigação de investigar
todos os fatos denunciados.
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