EDUCAÇÃO
E DIREITOS HUMANOS
A experiência de Caxias do Sul
Marisa
Formolo Della Vecchia
A
Educação Cidadã é o paradigma que sustenta a concepção dos
Direitos Humanos na educação. A educação se faz com a participação
da escola, mas vai além, está nos movimentos sociais, nos meios de
comunicação social, no modo de produção, nas relações de
trabalho e renda, nas pastorais sociais...
A
educação cidadã, enquanto um ato político, perpassa todas as
diretrizes de um governo e se faz nas ações das diferentes unidades
administrativas. Neste sentido, deve ser construída a educação
popular nas diferentes áreas de atuação do governo. Entendemos que
“A
transformação social é percebida como processo histórico, em que a
objetividade e a subjetividade se prendem dialeticamente e a
conscientização não é apenas conhecimento ou reconhecimento, mas
opção, decisão, compromisso”
Essa
concepção de educação exige uma leitura do mundo e da palavra, em
que cada pessoa possa dizer sua palavra. Palavra que nasce da
compreensão e uso do conhecimento produzido nas ciências, nas artes,
nas religiões e da compreensão cotidiana da vida.
A
escola que queremos é a que trabalha a educação como prática
social transformadora. Essa escola pública e de qualidade não faz
parte da tradição educacional. É uma escola em construção.
Pressupõe uma concepção de educação libertadora, através da
reestruturação curricular, gestão democrática, formação e
valorização profissional, avaliação emancipatória e princípios
de convivência fundados na ética do coletivo, que reconhece a
individualidade de sujeito, que se educa, educando.
A
escola que queremos é a que trabalha a educação como prática
social transformadora. Essa escola pública e de qualidade não faz
parte da tradição educacional. É uma escola em construção.
Pressupõe uma concepção de educação libertadora, através da
reestruturação curricular, gestão democrática, formação e
valorização profissional, avaliação emancipatória e princípios
de convivência fundados na ética do coletivo, que reconhece a
individualidade de sujeito, que se educa, educando.
A
nossa escola cumpre o papel político de participar na transformação
social. Para tanto, é necessário minimizar a crise do modelo de
desenvolvimento neoliberal; criar o desejo de um novo projeto social
com os desafios de uma concepção dos direitos coletivos (econômicos,
sociais e culturais), construindo o desenvolvimento para todos.
Viabilizar uma escola onde as crianças, adolescentes e adultos tenham
a alegria de fazer pensando, criando e recriando; reelaborando o saber
interdisciplinar e multicultural com vistas ao desenvolvimento humano
pleno é o desafio da
educação cidadã.
Acreditamos
que esta escola, enquanto centro cultural da comunidade, é um espaço
político-pedagógico, que precisa ter nos professores - militantes e
técnicos - pessoas que desejem uma sociedade nova, resgatando a luta
e a crença em um mundo humanizado. Esta escola está sendo construída
aqui em Caxias do Sul e em outras cidades, de forma responsável e
comprometida com todos os atores envolvidos no processo.
A
Educação Cidadã, proposta nos princípios da democracia e da inclusão
social, propõe a sistematização da prática, a práxis.
Na
escola, a educação cidadã pressupõe:
1)
o direito de todos ao acesso, a permanência e a aprendizagem
do conhecimento
2)
o conhecimento escolar vai além do saber elaborado pelas ciências,
artes, religiões... o ponto de partida é o conhecimento da realidade
social, econômica e cultural, e como resultado a consciência
crítica que exige uma ação de transformação social.
3)
gestão democrática com a participação de pais, alunos,
professores e funcionários;
4)
novos valores de convivência onde a solidariedade e o coletivo
superem o individualismo e a competição;
5)
valorização e formação em serviço do professor e funcionários
e
6)
a avaliação seja emancipatória.
Nessa
perspectiva a educação e os direitos humanos pressupõem a educação
a serviço de um novo projeto socio-econômico e cultural, isto é,
uma nova cultura dos direitos humanos. A educação para os direitos
humanos precisa se tornar educação com direitos humanos, como um
todo integrador da dignidade humana.
Temos
tratados direitos humanos como direitos civis, políticos, econômicos,
sociais e culturais em diferentes níveis de exigências, abrindo espaços
para a impunidade. É preciso rever a concepção de direitos humanos.
Hoje, propõe-se que os compreendamos como independentes e indivisíveis.
É necessário esta revisão tanto para as ONGs e os Estados.
Precisamos avançar na construção de uma concepção integral que
leve a práticas coletivas na defesa dos direitos humanos, sem separá-los.
A
dicotomia dos direitos humanos e a prevalência de uns sobre os outros
tem dado rumos diferentes, segundo as convivências políticas dos
Estados. A Assembléia da ONU de 1951, criou pactos separando os
direitos civis e políticos, dos econômicos, sociais e culturais. Nos
primeiros implica na ausência do Estado e nos demais a ação direta
do Estado, através das políticas básicas e complementares.
"Não
há direito à vida, à liberdade e à segurança, não há igualdade
frente a lei ou direito ao devido processo, sem direito ao
trabalho, à saúde, à educação, a um salário mínimo, a
alimentação, a moradia e a um nível significativo de vida e
vice-versa, por uma simples
razão: o conjunto desses direitos têm a mesma finalidade: a
dignidade humana.
A
falsa idéia de que os direitos civis e políticos não têm custo
econômico tem sustentado os pactos feitos entre os países na defesa
dos Direitos Humanos. Esta falsa idéia serve e serviu para sustentar
o projeto capitalista no mundo, não obrigando o Estado a assumir a
igualdade dos direitos na economia, cultura e organização social.
Na
declaração sobre o direito ao Desenvolvimento das Nações Unidas,
em 1986, a ONU admite...
“todos
os direitos humanos e das liberdades fundamentais são indivisíveis e
interdependentes; deve dar-se igual atenção e urgente consideração
para a aplicação, promoção e proteção dos direitos civis, políticos,
econômicos, sociais e culturais.”
A
Comissão Interamericana reafirma a relação indissolúvel entre as
condições de vida materiais e culturais e a urgência dos direitos
políticos e civis.
“...
uma violação persistente e
prolongada dos direitos econômicos, sociais e culturais acaba provocando
situações de violência que terminam por afetar o exercício
dos direitos civis e políticos”
“não
podemos esquecer que em muitos países os direitos civis e políticos
são violados no marco das lutas pelos direitos econômicos,
sociais e culturais, por exemplo, direito ao trabalho, a terra, a
moradia, a educação...”
As
maiores barreiras para a vigência dos direitos econômicos, sociais e
culturais e o direito ao desenvolvimento são:
1.
Ajuste estrutural
Destaca-se
a relativa diminuição da soberania nacional e do controle interno
sobre os processos e recursos econômicos locais e o crescimento
correspondente ao nível de influência direta dos organismos
financeiros internacionais sobre as decisões políticas nacionais.
A
dívida externa
É
um mecanismo que mantém a dominação dos países ricos sobre os países
pobres. Cria o empobrecimento interno, recessão e retira os recursos
que poderiam garantir os direitos fundamentais das pessoas que são:
saúde, educação, moradia, trabalho, ambiente sustentável. Tira a
soberania nacional e o subjuga ao FMI.
2.
As instituições financeiras
A
ONU estabelece os programas de agente econômico através de dois
organismos fundamentais: o FMI e o Banco Mundial. As políticas
fiscais no contexto da aplicação de programa de estabilização e
ajuste tem relação direta com os direitos econômicos, sociais e
culturais.
3.
Redistribuição de renda
O
Brasil é dos países que tem a pior distribuição da renda per
capital.
A
concentração de renda é portanto criadora das desigualdades e
inviabiliza a universalização dos direitos.
4.
Concepções errôneas acerca do Estado
O
Estado mínimo do projeto neoliberal é débil e quando privatizado
serve a poucos. Propomos um Estado forte, democraticamente
participativo e capaz de inverter as prioridades sociais.
5.
O crescimento econômico como panacéia
O
crescimento é necessário, mas não é por si mesmo uma garantia de
prosperidade e crescimento para o conjunto da sociedade. O índice de
Desenvolvimento Humano (IDH) enquanto indicador de qualidade de vida
para todos é o que melhor demonstra a qualidade do desenvolvimento.
6.
Privatização dos Direitos Humanos
O
Banco Mundial não esconde4 a sua proposição a favor da privatização
e a redução da participação do Estado na economia, reduzindo sua
atuação na política pública.
7.
Concepções errôneas do termo desenvolvimento
O
desenvolvimento humano nunca tem sido prioritário nos países em
geral, principalmente nos países ricos.
O
termo desenvolvimento tem sido usado para indicar, apenas crescimento
econômico, que acaba criando profundas desigualdades sociais em todo
o globo.
É
preciso pensar num desenvolvimento auto-sustentável e solidário.
Tais
pautas de desenvolvimento não devem sustentar-se, sob pena de se
perpetuar a injustiça social e a exclusão da maioria.
8.
Vontade política deficiente
A
falta de vontade política na matéria de direitos econômicos,
sociais e culturais é insuficiente pois a legislação existente
sustentaria todas as medidas necessárias para evitá-las.
9.
Destruição do meio-ambiente
Os
fatores ecológicos afetam mais os países em desenvolvimento porque
os desenvolvidos transferem para os primeiros a maioria das suas indústrias
poluentes.
10.
Gastos militares e conflitos armados
“A
violação sistemática dos
Direitos econômicos, sociais e culturais sucumbe a verdadeira
seguridade nacional e pode colocar em perigo a paz e a seguridade
internacional. Por ser o Estado o responsável pela violação desses
direitos, não deverá invocar a seguridade nacional como medida para
justificar a adoção de medidas destinadas a suprir toda oposição a
tal violação para impor práticas repressivas contra a população”.
11.
Dualidade de critérios a respeito dos Direitos Humanos
O
direito internacional concede a mesma importância aos direitos
sociais, econômicos e culturais que os civis e políticos, mas, na prática,
presta maior atenção aos últimos.
Conclusões
O
Estado mínimo não é democrático, pois é regido pela lei do
mercado globalizado. Não consegue garantir os direitos sociais, políticos
e econômicos a todos.
Na
lógica do Banco Mundial e o FMI, lógica de mercado, o custo dos
direitos sociais deve ser racionalizado. E dentro desta ótica os
Estados ricos sugam os pobres. A comunidade internacionalmente a ONU,
são responsáveis por essa permissividade.
A
sociedade não conhece seus direitos. A educação na Escola, nos
movimentos sociais, nos MCS, etc. não tem sido persistente e forte
para assumir a formação política na defesa dos direitos de todos.
As
ONGs têm o papel de vigiar o Estado, usar as vias jurídicas, todos
os recursos disponíveis (jubileu 2000) criando ações destinadas a
sensibilizar a opinião pública sobre os direitos econômicos,
sociais e culturais. É preciso recriar a legislação, tornando
essencial, a garantia dos direitos dos excluídos, isto, é
fundamental à carta de direitos dos empobrecidos com condições para
a inclusão social.
Nesta
via a escola é fundamental. Não a que temos. A que estamos
construindo.
Tratar
do tema Direitos Humanos na escola envolve basicamente o estudo do
Estatuto dos Direitos das Crianças e Adolescentes e a visão dos
direitos dos cidadãos, enquanto direitos civis, políticos, sociais,
econômicos e culturais; a Reestruturação Curricular com gestão
democrática e novos valores de convivência. Como e quem faz isto?
Depende do plano de trabalho na Escola. Se o professor trabalha no
Currículo por Atividades ele poderá abordar os direitos em qualquer
área de conhecimento que estiver trabalhando. O trabalho por área ou
por disciplina precisará de um plano integrado, fazendo as interfaces
do estatuto, na metodologia crítica, dialógica e problematizadora.
Temos
constatado que é preciso que o professor se deixe encharcar da
compreensão crítica da estrutura sócio-econômica e cultural neste
contexto e fluirá, pela sua posição política a luta pelos direitos
humanos, enquanto coletivos e individuais. Reeducar politicamente o
educador é condição para que a escola seja cidadã e possamos
estudar a questão dos direitos na escola, inter-disciplinarmente.
Precisamos do educador militante da transformação social.
A
escola enquanto espaço e fronteira do projeto neoliberal reproduz a
cultura social e política da seletividade social e cultural. Age como
funil, construindo a lógica da exclusão.
“A
Escola somente se constituirá em fronteira avançada dos direitos se
ela como instituição social tiver coragem de se redefinir não
apenas em seus conteúdos, mas sobretudo se definir em sua estrutura rígida
e seletiva, ser democrática não apenas em sua gestão, mas em seus
processos na organização de seus tempos e espaços. Superar a
cultura seletiva que ainda legitima essa estrutura excludente. Essa é
a ESCOLA POSSÍVEL. Ela já está acontecendo no profissionalismo e
dedicação de inúmeros coletivos de professores que transgridem a
escola peneradora antipopular. A ESCOLA POSSÍVEL está se
tornando possível na medida em que continuar sendo fronteira avançada
dos direitos”.
“Os
direitos avançam na medida em que construímos e legitimamos uma
cultura pública e espaços públicos. Nossa tradição se apega a
uma cultura privada e a espaços privados. Estes são destacados como
os espaços do progresso, da eficiência, da dignidade. Os espaços públicos
são apresentados como pobres, ineficientes e indignos. É urgente
revertes esse imaginário para avançar na construção da cidadania e
dos direitos.”