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Violência e direitos humanos
 

Fermino Fecchio Filho 

Nestes 20 anos de existência, o Centro Santo Dias de Direitos Humanos pôde testemunhar o quanto a violência no Brasil - e particularmente em São Paulo - tem-se constituído um enorme obstáculo à concretização do desejo de milhares de pessoas: viver em paz e que seus direitos humanos fundamentais, inscritos nos tratados e convenções internacionais e acolhidos na Constituição, sejam efetivamente respeitados.

A população brasileira tem sentido a violência na própria carne - e os meios de comunicação registram isso no dia-a-dia -, afetando e impedindo o desfrute dos direitos humanos mais elementares.

A ação dos criminosos cresce em ousadia e violência, como cresce, também, a violência praticada pela própria polícia.

É notória a incompetência das autoridades públicas em enfrentar o problema e garantir a segurança das pessoas.

O povo percebe que o Poder Público está perdendo essa guerra contra o crime.

Geralmente apregoada como prioridade pelos candidatos em tempos de campanha eleitoral, depois de empossados os eleitos a questão da segurança pública volta sempre à sua lastimável condição de miserabilidade: não há verbas, falta gente, não existem viaturas, existe superlotação nos presídios, escasseia o salário. 

Na verdade, o que falta mesmo é uma política de segurança pública que determine quais as providências essenciais para solucionar os problemas. Uma política que coordene a ação dos órgãos que, por Constituição, são obrigados a buscar a solução desses problemas. Uma política que cobre as responsabilidades do Ministério Público, do Poder Judiciário, dos encarregados do sistema prisional e das várias organizações policiais (federal, civil e militar).

Esse tem sido o objetivo do Centro Santo Dias de Direitos Humanos nos últimos anos. Aliado às demais entidades de direitos humanos, o Centro Santo Dias procura formular propostas, descobrir novos métodos, buscar outros caminhos que possibilitem alterar radicalmente essa situação de violência e morte instalada em toda a sociedade brasileira, de Norte a Sul do país.  

2. O combate à impunidade e o Poder Judiciário 

O Centro Santo Dias de Direitos Humanos mantém um determinado empenho no combate à impunidade, que é sem dúvida um dos principais fatores realimentadores da violência.

Nos países democráticos, além de uma sociedade civil organizada e consciente de seus direitos de cidadania, os remédios judiciais são os meios mais eficazes para garantir o respeito aos direitos humanos. Caso já tenham ocorrido violações, são as forma de assegurar reparação às vítimas e punição aos agressores, tal como preceituam as leis.

Foi o que o Centro Santo Dias sempre procurou fazer nesses vinte anos de existência: bateu às portas dos tribunais brasileiros em mais de três centenas de casos violentos, usando todos os recursos legais disponíveis para bem assistir aos seus representados. Denunciou a violação de seus direitos. Assegurou a defesa das vítimas ou a reparação a seus familiares ea responsabilização dos autores das agressões.

Entretanto, muitas vezes essas medidas não bastaram. Nove casos de violência policial ganharam foro externo. Esses casos, de violações, devidamente autorizados pelos familiares das vítimas, o Centro Santo Dias levou-os ao conhecimento da Comissão Interamericana de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos (OEA). Para exigir o cumprimento de obrigações internacionais que o governo brasileiro assumiu o compromisso de cumprir, livremente, sem qualquer ofensa a sua soberania nacional. E que, infelizmente, para todos nós, brasileiros, descumpriu.

Foi grande o esforço empreendido pelo Centro Santo Dias de Direitos Humanos, em esgotar todos os recursos possíveis e imagináveis junto ao governo brasileiro para reparar situações de injustiça praticadas contra cidadãos brasileiros, não no exterior mas dentro do território nacional, sob os olhos das autoridades constituídas.

É doloroso para o Centro Santo Dias recorrer a tribunais internacionais para fazer prevalecer, ao menos publicamente, o direito de cidadãos brasileiros contra violações perpetrados por agentes do próprio poder constituído no Brasil.

É importante ressaltar também que não foi fácil aos familiares das vítimas enfrentar a humilhação e o dissabor de recorrer a tribunais estrangeiros para resgatar o bom nome e a honra de seus entes queridos, covardemente assassinados justamente por aqueles que deveriam legalmente garantir-lhes a vida e a segurança pessoal.

Finalizando, é preciso assinalar que este tem sido e será, para o futuro, o nosso compromisso: recorrer a quem quer que seja, remover céus e terra, para que sejam respeitados os direitos de quem nos procura, sobretudo dos marginalizados e excluídos. 

Fermino Fecchio Filho é vice-coordenador do Centro Santo Dias de Direitos Humanos da Arquidiocese de São Paulo
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