ENTREVISTA
Comportamento e Direitos
Humanos
Médico
psiquiatra e consultor de empresas na área comportamental, Paulo Gaudencio
fala para o Jornal da Rede sobre o seu trabalho de desenvolvimento dos
direitos humanos nas empresas e como isso pode se estender para toda a
sociedade.
Jornal
da Rede: Que
tipo de trabalho o senhor tem realizado?
Paulo
Gaudencio: Sou clínico há 40 anos e terapeuta de grupo. Desde 1972
tenho sido consultor de empresas, onde faço um trabalho de flexibilização
do papel profissional. Consegui industrializar o meu hobbie,
ou seja, ser remunerado fazendo o que gosto. E é essa a idéia que procuro
transmitir nas minhas atividades junto às empresas.
Jornal
Rede: No que concerne esse trabalho de flexibilização do papel
profissional?
Paulo
Gaudencio: A globalização provocou uma mudança tremenda no mercado de
trabalho e quem não acompanhar as transformações está fadado ao
fracasso. Hoje, é preciso produzir em grandes quantidades, garantindo a
qualidade. Assim, as empresas me contratam com o objetivo de aumentar a
produtividade. Como? Mudando os valores. É preciso que as organizações e
seus dirigentes se conscientizem de que a valorização e o desenvolvimento
dos recursos humanos tornaram-se o diferencial do negócio em termos de eficácia
e competitividade, na acirrada disputa pelo mercado global. Nesse sentido, a
interação emocional que busca a sinergia de uma equipe para vencer os obstáculos
impostos pelas relações humanas merece atenção especial daqueles que
enxergam no trabalho muito mais do que um simples exercício burocrático de
inserção na sociedade.
Jornal
da Rede: Quer dizer, então, que o indivíduo precisa buscar o prazer em
sua atividade profissional?
Paulo
Gaudencio: É preciso enfocar a transformação pessoal como a mola
propulsora do ganho de produtividade e aumento de vendas. As empresas sempre
souberam que a cabeça dos funcionários deveriam estar voltadas para uma
atuação prazerosa. Agora, começam a descobrir que também as emoções
dos indivíduos têm que estar direcionadas para esse mesmo fim. É preciso
viver o lado emocional no papel profissional, viver a agressividade de forma
normal, sabendo canalizar essa energia para a conquista do mercado. Ser
feliz no trabalho aumenta a produtividade, e é essa fórmula que está
levando as organizações a pensarem na realização do empregado em
primeiro lugar, pois isso vai garantir, consequentemente, a satisfação dos
clientes externos.
Jornal
da Rede: De que maneira o seu trabalho colabora para a instituição dos
direitos humanos nas empresas?
Paulo
Gaudencio: me empenho em obter o resgate da dignidade, transformando uma
empresa coisificante numa empresa dignificante, onde o indivíduo será
avaliado também pela sua competência profissional, sendo que este critério
de utilidade não será exclusivo. A empresa deverá apreciar o funcionário
capaz de equilibrar a razão e a emoção colaborando, assim, com a equipe e
a organização. Saber ouvir um empregado e valorizar sua opinião é um
exercício de cidadania. Isto é a prática dos direitos humanos.
Jornal
da Rede: O senhor acredita que as empresas estejam preocupadas em
defender e praticar os direitos humanos?
Paulo
Gaudencio: Na verdade, a questão dos direitos humanos sempre foi um
privilégio de classe. Não sou contratado por uma empresa para que as
pessoas sejam mais felizes. Sou porque os empresários sabem que é a forma
de ser eficiente, daí a importância de se trabalhar os valores pessoais e
a motivação inconsciente para a melhoria de produtividade e a prática da
criação. Se os empresários estão qualificando sua mão de obra não é
por bondade mas, sim, para produzir mais e melhor. No entanto, descobri, nos
últimos anos, que os empresários estão acordando para a sua
responsabilidade social. Felizmente, isto está começando a fazer parte de
seu patrimônio cultural e ninguém quer esperar o Governo tomar uma
atitude. Foi essa busca pela produtividade que fez com que diversas
empresas, por exemplo, optassem por tratar seus funcionários com problemas
de alcoolismo a demiti-los e contratar outros para substituí-lo. A busca
por uma maior eficiência resgata a defesa pela cidadania e direitos
humanos.
Jornal
da Rede: As conquistas obtidas através das atividades exercidas junto
à empresa se limitam ao ambiente de trabalho?
Paulo
Gaudencio: Quando eu inicio um trabalho em uma empresa, procuro
identificar, junto a turma de participantes, o que, no ambiente de trabalho,
faz com que eles se sintam bem ou mal. Começamos, então, a construir o
conceito de papel profissional para, em seguida, começar a falar de
conflitos conscientes e inconscientes. A discussão das emoções provoca
uma mudança racional, em nível consciente, que é rápida e efêmera. A
partir daí, tem início a dinâmica de grupo, processo mais profundo que
dura cerca de três anos, com reuniões mensais. Toda essa atividade envolve
um processo de conscientização, em que o indivíduo irá compreender
melhor seu papel na empresa, seus medos e anseios, fazendo com que ele se
sinta um cidadão realmente. O funcionário que se sente respeitado na
empresa, que aprende a Ter orgulho de sua cidadania, terá prazer em exercê-la
fora do ambiente de trabalho. Você acha que ele vai infringir normas de trânsito,
jogar lixo na rua? Não! Se o indivíduo muda na empresa, muda na vida.
Jornal
da Rede: Como chegar a uma sociedade que exerça os direitos humanos de
fato?
Paulo
Gaudencio: O desenvolvimento dos direitos humanos é uma questão de
educação. Educação na escola, no jornal, na televisão, na vida
cotidiana, na empresa. É um esforço que precisa ser feito em todas as
vertentes da sociedade. Se a gente conseguir realizar essa pequenas mudanças,
a gente muda o país. O professor escolar deveria ensinar não só matemática
e português, mas também cidadania. Infelizmente, o setor da educação é
o que está menos desenvolvido nesse sentido. Eu acredito muito na empresa
porque ela não só acordou para a necessidade de mudança, como está
patrocinando essa transformação.
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