Questionário
sobre a
Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948)
André
Augusto Arraes Coêlho de Lucena
Débora Raquel Arraes Coêlho de Lucena
Vinícius de Medeiros Dantas
1.
Comente a realidade e o contexto histórico ensejadores do
surgimento da Declaração Universal dos Direitos Humanos de
1948.
2.
Já que a mencionada Declaração
foi elaborada à luz de uma nova perspectiva histórica,
quais os direitos humanos por ela mencionados ? Compare-os
com os das Declarações de Direitos anteriormente
elaboradas.
3.
Qual a concepção contemporânea de Direitos Humanos ?
4.
Qual o significado prático de se qualificar os direitos
humanos como universais, indivisíveis, interdependentes e
inter- relacionados ?
5.
Qual o valor jurídico, a natureza e a eficácia normativa
da Declaração Universal de 1948 ?
6)
Na sua concepção, qual o real valor da Declaração ?
Quais seus efeitos práticos?
7.
Compare e comente a vedação da prática de tortura na
Declaração de 1948 e na Constituição Federal de 1988.
8.
Relacione o artigo XII da Declaração com os ditames
constitucionais referentes à matéria de que trata (
direito à intimidade ).
9.
Comente o direito à liberdade de expressão, de acordo com
o artigo XIX da Declaração. Quais os outros direitos por
ele abrangidos ?
10.
Qual a ética universal consolidada com a aprovação unânime
da Declaração de 1948 ? Houve algum tipo de resistência
por parte de alguma Nação quanto a seus princípios ?
Referências
Bibliográficas
1.
Comente a realidade e o contexto histórico ensejadores do
surgimento da Declaração Universal dos Direitos Humanos de
1948.
Diante
da necessidade de se proteger os direitos humanos em âmbito
internacional, surgem o Direito Humanitário, a Liga das Nações
e a Organização Internacional do Trabalho como primeiros
marcos desse processo, cujos adventos rompem com a concepção
de que apenas o Estado seria sujeito de Direito
Internacional, passando, agora, o indivíduo a também o
ser. Rompem com a noção de soberania absoluta, uma vez que
passam a ser admitidas intervenções no plano nacional em
defesa da proteção dos Direitos Humanos.
Dando
prosseguimento a esse contexto, após a Segunda Guerra
Mundial, houve um fortalecimento indiscutível do processo
de internacionalização dos Direitos Humanos, acarretado
por diversos fatores, como a certeza de que a proteção de
tais direitos constitui tema de legítimo interesse
internacional, não podendo, pois, ficar à mercê, apenas
da jurisdição doméstica de cada Estado; a necessidade de
reconstrução dos direitos humanos como padrão ético,
frente ao repúdio internacional à barbárie do Holocausto,
destacando-se, porém, a maciça expansão de organizações
internacionais com propósitos de cooperação
internacional.
Em
1945, por exemplo, com a vitória dos Aliados, houve a criação
das Nações Unidas com suas agências especializadas,
demarcando o surgimento de uma nova ordem internacional e de
um novo modelo de conduta nas relações internacionais, com
o objetivo principal de manter a paz e a segurança
internacionais e de desenvolver a cooperação entre os
povos, na busca de soluções dos problemas econômicos,
sociais, culturais e humanitários, promovendo o respeito
aos direitos humanos e as liberdades fundamentais.
A
Carta das Nações Unidas de 1945 consolida o movimento de
internacionalização dos direitos humanos, a partir do
acordo de Estados, tornando esses direitos propósito e
finalidade das Nações Unidas.
Deste modo, a relação de um
Estado com seus nacionais passa a ser uma problemática
internacional, objeto de
instituições internacionais e do Direito Internacional.
Embora
a Carta das Nações Unidas seja enfática em determinar a
importância de se defender, promover e respeitar os
direitos humanos e as liberdades fundamentais, ela não
define o conteúdo dessas expressões, deixando-as em
aberto. O alcance e significado da expressão: “direitos
humanos e liberdades fundamentais”, só foi definida três
anos após o
advento da Carta das Nações Unidas, através da Declaração
Universal dos Direitos Humanos em 1948, que fixou um código
comum e universal dos direitos humanos. Enfim, tal Declaração
surge como uma interpretação autorizada dos artigos 1º
(3) e 55 da Carta da ONU, no sentido de melhor esclarecer
quais seriam os direitos humanos e as liberdades
fundamentais e, desse modo, tornar mais eficaz o respeito
aos mesmos .
2.
Já que a mencionada Declaração
foi elaborada à luz de uma nova perspectiva histórica,
quais os direitos humanos por ela mencionados ? Compare-os
com os das Declarações de Direitos anteriormente
elaboradas.
A
Declaração de 1948 menciona duas categorias de direitos:
os direitos civis e políticos e os direitos econômicos,
sociais e culturais, combinando desse modo o discurso
liberal ao social da cidadania e conjugando o valor da
liberdade ao da
igualdade.
Nos
artigos iniciais (até o art. XXI), a Declaração trata dos
"tradicionalmente chamados direitos e garantias
individuais, certamente impregnados de conotações mais
modernas":
entre vários outros, direitos relativos à participação
política do cidadão e à proteção do indivíduo na
aplicação da lei por parte do Estado. Já do art. XXII ao
art. XXVII, ela menciona o direito à satisfação dos
direitos econômicos, sociais e culturais indispensáveis à
dignidade da pessoa humana e ao livre desenvolvimento de sua
personalidade; direitos relativos a trabalho, salário e
sindicatos; a educação, cultura, e lazer, etc. Por fim,
nos três últimos artigos da Declaração é expressa a
necessidade de uma ordem social e internacional para a plena
realização dos direitos e liberdades nela estabelecidos
(art. XXVIII); trata-se de deveres da pessoa para com a
comunidade (art. XXIX) e proíbe a interpretação da mesma
para justificar qualquer destruição a direitos e
liberdades nela estabelecidos (art. XXX).
Quanto
à classificação dos direitos presentes na Declaração,
segundo Jack Donnell, pode-se dizer que ela consta das
seguintes categorias de direitos.
1)
Direitos pessoais, a exemplo dos direitos à vida, à
nacionalidade, ao reconhecimento perante a lei, e proteção
contra tratamentos ou punições cruéis, degradantes ou
desumanas ( arts. 2º a 7º e 15 ).
2)
Direitos judiciais, a exemplo do acesso a remédios
por violação dos direitos básicos, da presunção de inocência,
da irretroatividade das leis penais ( arts. 8º a 12 ).
3)
Liberdades civis, como as liberdades de pensamento,
consciência e religião, de opinião e expressão, de
movimento e resistência ( arts. 13 e de 18 a 20 ).
4)
Direitos de subsistência, especialmente os direitos
à alimentação e a um padrão de vida adequado à saúde e
ao bem estar próprio e da família ( art. 25 ).
5)
Direitos econômicos, como os direitos ao trabalho,
ao repouso e ao lazer, e à segurança social ( arts. 22 a
26 ).
6)
Direitos sociais e culturais, como os direitos à
instrução e à participação na vida cultural da
comunidade ( arts. 26 e 28 ).
7)
Direitos políticos, como os direitos a tomar parte
no Governo e a eleições legítimas com sufrágio universal
e igual ( art. 21 ) .
Comparando
os direitos mencionados pela Declaração de 1948 com os
mencionados pelas declarações anteriores, pode-se notar,
nessas últimas, a grande dicotomia existente entre o
direito à liberdade e o direito à igualdade.
As
declarações dos séculos XVIII e XIX, como a Declaração
de Direitos do Homem e do Cidadão de 1789 e a Declaração
Americana de 1776, privilegiam a garantia formal das
liberdades, como princípio da democracia burguesa. O que
pode ser explicado no fato da burguesia, desencadeadora da
revolução liberal, só estar oprimida politicamente e não
economicamente. Logo, em tais declarações há um primado
absoluto dos direitos civis e políticos, ou seja, do valor
da liberdade, não havendo previsão de direitos sociais,
econômicos e culturais que dependessem da intervenção
estatal, uma vez que, à época, procurava-se limitar o
poder absoluto dos reis, bem como assegurar os privilégios
conseguidos pela classes emergentes, e, para tal, era necessário
controlar o poder estatal, que deveria estar em consonância
com a legalidade, como também respeitar os direitos
fundamentais, e isso só seria possível através da emergência
de um Estado liberal, em que a não intervenção do Estado
significaria liberdade. Daí a ênfase dada à liberdade.
No
entanto, com o passar do tempo e com o desenvolvimento
industrial e conseqüente surgimento de uma classe operária,
as liberdades formais se tornaram insuficientes, na medida
que a nova classe operária era oprimida não só
politicamente, como também economicamente. Daí as declarações
desse período ( em especial o período após a Primeira
Guerra Mundial ), como a Declaração do Povo Trabalhador e
Explorado de 1917, procurarem dar primazia ao discurso
social da cidadania, ao valor da igualdade, destacando,
dessa forma, um grande elenco de direitos econômicos,
sociais e culturais e uma nova visão do Estado como agente
de processos transformadores, sendo, portanto, essencial a
sua atuação como garantia dos direitos à prestação
social.
Enfim,
a união dos direitos civis e políticos com os econômicos,
sociais e culturais, em uma única declaração, só se
concretiza com o posterior advento da Declaração Universal
dos Direitos do Homem .
3.
Qual a concepção contemporânea de Direitos Humanos ?
No
que se refere à concepção contemporânea de direitos
humanos, pode-se dizer que esses passam a ser considerados
como uma unidade interdependente
e indivisível, em que o valor liberdade se conjuga
com o valor igualdade. São considerados universais e não
submetidos às peculiaridades sociais, culturais, morais,
políticas e econômicas de cada povo ou a valores
religiosos e filosóficos, na medida que se argumenta ser
uma exigência do mundo contemporâneo a existência de
normas universais pertinentes ao valor da dignidade humana .
São
aqueles inerentes ao ser humano pelo simples fato desse
pertencer ao gênero humano. São direitos que se referem a
faculdades naturais, inatas, inalienáveis e imprescritíveis
do ser humano, sendo indispensáveis à sua segurança
pessoal e ao seu progresso social .
E
que, pelo fato de serem inatos à espécie humana, são,
portanto, anteriores a toda e qualquer forma de organização
política ou social. No entanto, entre os direitos humanos
existem aqueles que são inatos, cuja validade independe da
aceitação, como também da repulsa do sujeito de direito (
como o direito à vida ), e existem aqueles que foram
percebidos devido à convivência social de um povo e
aprimorados ao longo da evolução cultural. Porém, vale
ressaltar que há alguns direitos que escapam à regra,
tendo seu gozo individual dependendo unicamente da vontade
do sujeito, sendo, desse modo, renunciáveis, não se
caracterizando como fundamentais, a exemplo do direito de
propriedade privada e do desfrute do lazer .
Além
do supracitado, pode-se dizer que são direitos cuja proteção
não deve ter por limite apenas a jurisdição doméstica de
cada Estado, logo quando essa se mostrar incapaz. Diante da
salvaguarda desses direitos, deve-se acionar os instrumentos
internacionais de proteção, uma vez que a defesa de tais
direitos constitui uma preocupação mundial .
Muitos
estudiosos dos direitos humanos costumam classificá-los em
três lineamentos. O primeiro corresponde aos direitos civis
e políticos; o segundo aos econômicos, sociais e culturais
e o terceiro aos direitos de solidariedade, a exemplo do
direito ao desenvolvimento , à paz e ao patrimônio comum
da humanidade. E como já foi dito, esses três lineamentos,
na visão contemporânea, são interdependentes, indivisíveis
e universais .
Enfim,
apesar do justo reconhecimento que tais direitos alcançaram
contemporaneamente, pode-se dizer que restam muitos ainda
que deverão se infiltrar nesse campo, como também inúmeros
que irão emergir como frutos da dinâmica social e cultural
humanas.
4.
Qual o significado prático de se qualificar os direitos
humanos como universais, indivisíveis, interdependentes e
inter- relacionados ?
O
caráter universal dado aos direitos da Declaração, de
modo que tais direitos buscam a sua fundamentação na
“dignidade inerente a todos os membros da família
humana”, e não em valores de caráter religioso ou filosófico,
contribui bastante, uma vez que são direitos concernentes a
todos, no que diz respeito à efetivação da busca de soluções
para as violações maciças e flagrantes dos direitos
humanos; a fixação de um parâmetro mundial de conduta em
torno de valores básicos universais, bem como contribui
para que seja reconhecida a inegável interação entre os
direitos humanos e para que, em caso de violação dos
mesmos, possa haver a intervenção da comunidade
internacional na jurisdição doméstica dos Estados,
rompendo, assim, as fronteiras nacionais e dinamitando a
concepção absoluta da soberania em prol da salvaguarda
desses direitos .
Na
prática, essa qualificação declara possível e necessária
uma sociedade que conjugue o exercício da liberdade do
indivíduo com a autoridade estatal. Autoridade que assegure
o pleno desenvolvimento da personalidade humana e das aptidões
físicas, morais e intelectuais de cada um, bem como o
respeito à dignidade inerente à pessoa humana. Além
disso, a qualificação dos direitos humanos como
universais, indivisíveis, interdependentes e
inter-relacionados acarreta, na prática, um fortalecimento,
uma expansão, uma cumulação de tais direitos, na medida
que se passa a
conceber que uma geração de direitos humanos não mais
substitua outra, e sim, encontra-se em perfeita dinâmica de
interação com as demais, sendo-lhes complementar. Essa
interdependência ocorre de tal forma, que se considera sem
efetividade os direitos civis e políticos, caso não se
reconheçam os direitos econômicos, sociais e culturais, ao
passo que estes direitos são considerados sem significação,
caso não se garantam os direitos civis e políticos, ou
seja, não há direito à liberdade sem que haja direito à
igualdade, não há liberdade quando a justiça social se
faz ausente .
5.
Qual o valor jurídico, a natureza e a eficácia normativa
da Declaração Universal de 1948 ?
A
Declaração Universal não surgiu com o propósito de
possuir força de lei, na medida que não constitui um
tratado (um acordo internacional), e sim, apenas uma resolução
da Assembléia Geral das Nações Unidas cujo propósito
seria esclarecer a expressão “direitos humanos e
liberdades fundamentais”, bem como promover o
reconhecimento universal dos mesmos. E como tal Declaração
veio atender aos objetivos da Carta das Nações Unidas no
que concerne ao reconhecimento e promoção dos direitos
humanos e à concretização de ações nesse sentido, os
Estados membros da ONU têm a obrigação de respeitar os
direitos proclamados por essa Declaração.
Por
outro lado, há aqueles que afirmam ter a Declaração força
jurídica vinculante, uma vez que, segundo essa corrente,
tal Declaração já integra os costumes internacionais e os
princípios gerais do Direito Internacional, como também
todo ou parte do conteúdo da Declaração já fora
incorporado aos textos constitucionais de vários Estados; várias
resoluções da ONU adotadas em âmbito internacional têm
por base o conteúdo da Declaração, assim como várias
decisões proferidas por Cortes Nacionais têm a Declaração
Universal como fonte de direito. Nessa concepção, os
dispositivos da Declaração se aplicam a todos os Estados e
não apenas àqueles signatários da Declaração Universal,
uma vez que tais dispositivos integram o direito costumeiro
internacional, independente da intenção dos seus redatores
em 1948.
Enfim,
para essa corrente, a despeito da intenção com que foi
elaborada a Declaração de 1948 e do fato da mesma não
assumir a forma de um tratado, pode-se dizer que ela possui
força jurídica vinculante, devido à ampla aceitação por
parte das Nações no que se refere aos seus efeitos
normativos, como também a ampla aceitação da mesma como
integrante do direito costumeiro internacional ou como texto
interpretativo da Carta das Nações Unidas .
6)
Na sua concepção, qual o real valor da Declaração ?
Quais seus efeitos práticos?
Por
sua tamanha aceitação, nunca anteriormente vista em
qualquer acordo internacional, a Declaração Universal dos
Direitos Humanos foi um marco histórico para o mundo
ocidental, de importância talvez inimaginável. Não
significou o respeito aos direitos inerentes à pessoa
humana, mas o início de uma caminhada que conduzirá a uma
nova concepção da relação dos homens entre si. Na minha
concepção, quanto ao seu valor a Declaração conserva a
originalidade dos objetivos que levaram a sua criação, ou
seja, não impõe obrigação legal, não possui força de
lei, na medida que originou-se de uma simples resolução da
Assembléia Geral das Nações Unidas, e não de um tratado,
de um acordo internacional. Surgiu com o objetivo, apenas,
de interpretar a expressão “direitos humanos e liberdades
fundamentais” presente na Carta da ONU e que, até então
estava em aberto, bem como com o objetivo de promover os
direitos humanos através da reformulação da essência dos
mesmos com a fusão do valor igualdade ao valor liberdade,
através da afirmação de uma ética universal e da
simbolização de um ideal a ser alcançado por todos os
povos e todas as nações, e não, através da força legal.
Porém,
na prática, muitos dos direitos presentes na Declaração
foram incorporados aos Textos Constitucionais de vários
Estados adquirindo, pois, força vinculante, como também a
Declaração tem servido de fonte para várias decisões
judiciais nacionais. E no âmbito internacional, a Declaração
tem inspirado o surgimento de vários mecanismos
de proteção internacional dos direitos humanos, bem
como servido de referência para várias resoluções das Nações
Unidas e de parâmetro para a “deslegitimação” de um
Estado na ótica internacional, na medida que um Estado
violador da Declaração não merece aprovação por parte
da comunidade internacional.
7.
Compare e comente a vedação da prática de tortura na
Declaração de 1948 e na Constituição Federal de 1988.
A
Declaração de 1948 veda a prática de tortura através
de seu artigo V, que diz: “Ninguém será submetido a
tortura, nem a tratamento ou castigo cruel, desumano ou
degradante.” Por cruel
pode-se entender que
tem vontade ou se agrada em praticar o mal; e por desumano,
que desconsidera a condição humana. Já o termo
degradante nos parece remeter à questão da honra. Na verdade, esse artigo não possui valor jurídico, assumindo um
papel meramente moral, em que busca o alcance de um ideal
comum a todo o universo humano, faltando sua observância e
efetivação dentro do ordenamento jurídico de cada Estado-
membro.
Na
introdução da Declaração Universal, percebe-se a convocação
que o elaborador faz a todo o indivíduo e órgão da
sociedade para promover o respeito a esses direitos e
liberdades, bem como assegurar seu reconhecimento e sua
observância no campo efetivo.
Já
a Constituição Federal de 1988 não nega que sofreu influência
do artigo V da Declaração Universal, pois apresenta alguns
artigos que tratam da tortura, como é o caso do artigo 5º,III,
que se apresenta quase que como uma cópia do artigo V da
Declaração Universal e do
artigo 5º,XLIII, que criminaliza a tortura,
declarando a sua prática como um crime inafiançável e
insuscetível de graça ou anistia. A Constituição também
se refere à tortura no artigo 5º, XLVII, que proíbe penas
cruéis, caso em que se enquadra a prática de tortura, e no
artigo 5º,XLIX, assegurando aos presos o respeito à
integridade física e moral.
Percebemos
que a Carta de 1988 alarga o âmbito dos direitos e
garantias fundamentais, indispensáveis para a realização
do princípio democrático que essa Carta Magna visou. Ao
contrário da Declaração, a Constituição de 1988
apresenta seus direitos fundamentais atribuídos do status
jurídico que lhes é devido, apresentando no artigo 5º, §
1º, a previsão da aplicabilidade imediata das
normas definidoras de direitos fundamentais,
constando, pois, uma inovação relevante. É importante
frisar que não há consenso a respeito do alcance desse
dispositivo.
Os
direitos fundamentais foram inclusos no rol das “cláusulas
pétreas”(“garantias de eternidade”) do artigo 60, §
4º, da Constituição Federal, fazendo com que os preceitos
relacionados aos direitos fundamentais tivessem sua supressão
e erosão impedidas pela ação do poder constituinte
derivado. Constata-se que, na Constituição de 1988, os
direitos fundamentais aumentam, de forma antes nunca vista,
o elenco dos direitos protegidos que demonstram estar em
consonância com a Declaração Universal de 1948.
8.
Relacione o artigo XII da Declaração com os ditames
constitucionais referentes à matéria de que trata (
direito à intimidade ).
O
artigo XII da Declaração Universal invoca a proteção da
lei no caso de interferência na vida privada, na família,
no lar ou na correspondência ou no caso de ataque à honra
ou à reputação. Como já vimos, esse ou qualquer outro
artigo da Declaração Universal não possui aplicabilidade
e efetividade, devido a ser ela desprovida de força
vinculante e, portanto, não constar dentro do ordenamento
jurídico do Estado-membro,
servindo apenas como base para algum artigo, referente aos
direitos humanos, que se incorpora à determinada Constituição
nacional ou como referência na prática dos tribunais do
respectivo Estado.
A
Constituição Federal de 1988 apresenta vários artigos que
refletem o citado artigo. O artigo 5º, X, refere-se ao
direito da intimidade da vida privada, considerando invioláveis
a vida privada, a intimidade, a honra e a imagem das
pessoas, assegurando, no caso de violação, o direito à
indenização, quer seja por dano material ou moral. A
inviolabilidade do sigilo da correspondência é uma das
garantias constitucionais presente no artigo 5º, XII.
“A
forma, a celebridade e o renome, como aspectos da reputação,
merecem a proteção jurídica sempre que um ou outro desses
atributos constitua um fato lícito. Daí fala-se em boa ou
má reputação de uma pessoa física ou jurídica.” Essa
citação caracteriza o direito à reputação, segundo René
Ariel Dotti.
A
tecnologia, hodiernamente, se apresenta como uma das grandes
vilãs no tocante a interferências e ataques à vida
privada, pois a captura da voz e da imagem pelas filmadoras,
câmeras de fotografia e gravadores caracterizam uma
verdadeira espionagem, devassando a vida privada e a
intimidade das pessoas. Para ir de encontro a essa
transgressão, o ordenamento jurídico aplica ao infrator o
pagamento de uma indenização .
O
artigo 5º,XII, também garante o sigilo das comunicações
telegráficas, de dados e das comunicações telefônicas,
salvo no último, por ordem judicial, nas hipóteses e na
forma que a lei estabelecer para fins de investigação
criminal ou instrução processual penal, como reza o
referido artigo, para o qual a Declaração não apresentou
rascunho.
A
Constituição Federal no seu artigo 5º, XI, defende a
inviolabilidade do domicílio, tema não discutido pela
Declaração Universal .
9.
Comente o direito à liberdade de expressão, de acordo com
o artigo XIX da Declaração. Quais os outros direitos por
ele abrangidos ?
O
artigo XIX da Declaração Universal, além do direito à
liberdade de expressão, abrange o direito à liberdade de
opinião, o direito à informação, o direito a informar e
o direito a ser informado. O direito de uma pessoa à
liberdade de expressão gera muita polêmica, na medida em
que é limitado pelo direito do outro à intimidade, à
preservação de sua honra, imagem e dignidade.
No
momento histórico que essa Declaração foi promulgada,
esse artigo não passou de uma mera ilustração, pois,
nesse período, dominava a ideologia da Guerra Fria, em que
os países dominados pelos satélites ideológicos, EUA e
URSS, na prática não tinham direito à liberdade de
expressão e por conseguinte, nem à liberdade de opinião e
nem à informação, pois as informações circulavam
secretamente, controladas por órgãos militares, que no
caso eram a OTAN e o Pacto de Varsóvia. Durante esse longo
período da Guerra Fria, podemos concluir, literalmente, que
a Declaração Universal foi suplantada por uma verdadeira
Ditadura Ideológica, em que o direito à liberdade de
expressão e às demais liberdades fundamentais foram
gravemente feridos. Na URSS, por exemplo, existia uma forte
restrição cultural, em que o
cidadão russo era privado de exercer a sua aptidão
artística.
Após
a Declaração, também houve um período de ditaduras na
América Latina, em que os direitos humanos e as
liberdades fundamentais defendidas pela Declaração foram
ceifadas pela raiz.
A
Constituição Cidadã de 1988 inova ao incorporar uma gama
relevante de direitos e garantias fundamentais. Como
exemplo, podemos citar o artigo 5º, IX, estabelecendo a
liberdade de expressão, quer seja à atividade intelectual,
artística, científica ou comunicativa, não se fazendo
necessário a observação de censura ou licença. Na
Constituição, percebemos que o direito à liberdade de
expressão tem uma aplicação imediata, conforme dita o parágrafo
1º, referente ao artigo 5º. No entanto, a Declaração
Universal, no que se refere a esse direito, não apresenta a
menor aplicabilidade, pairando no âmbito de um ideal comum.
A
Carta Constitucional de 1988 edifica em bases sólidas a
liberdade de opinião (CF art. 220, § 2º ), com a vedação
da censura, quer seja de natureza política, ideológica ou
artística. O direito à informação é assegurado pelo
artigo 5º, XIV, compreendendo o direito a informar e o
direito a ser informado, podendo a fonte da informação ser
ocultada, quando o exercício profissional assim necessita.
Podemos
deduzir que, dentro da liberdade de opinião e expressão,
está a liberdade de pensamento, que se encontra no artigo 5º,
IV e no artigo 220 da referida Constituição. Essa
Constituição também garante o direito de informar e ser
informado, já que é conseqüência lógica das liberdades
de opinião e de expressão asseguradas a todas as pessoas
naturais e jurídicas .
10.
Qual a ética universal consolidada com a aprovação unânime
da Declaração de 1948 ? Houve algum tipo de resistência
por parte de alguma Nação quanto a seus princípios ?
A
ética universal, consolidada com a aprovação unânime
da Declaração de 1948 seria um conjunto de princípios
difundidos universalmente, pelos quais todos os indivíduos
devem pautar as suas condutas e que têm por base uma moral
fundada na dignidade humana, ou seja, é aquela que procura
adotar uma concepção comum dos direitos e liberdades
fundamentais do homem para que esses sejam plenamente
respeitados; é aquela que fundamenta a “emergência
de uma cultura global que objetiva fixar padrões mínimos
de proteção dos direitos humanos”.
Enfim, essa ética universal é um conjunto de princípios
aprovados pela maior parte da comunidade internacional com o
objetivo de alertar, de forma global, os Estados para a
importância de se manter relações amistosas entre as nações,
de modo que, unidas, zelem pela liberdade humana e promovam
o progresso social e a melhoria de vida dos indivíduos,
através da defesa dos direitos humanos.
Quanto
à resistência aos princípios da Declaração, pode-se
dizer que há Nações que resistem a tais princípios, na
medida que são adeptas ao movimento do relativismo cultural
e, portanto, rejeitam a concepção universal dos direitos
humanos implantada pela Declaração de 1948, uma vez que
acreditam que cada sociedade possui sua concepção de
direitos, a qual está estritamente relacionada a fatores
políticos, econômicos, culturais, sociais e morais. Nessa
linha de raciocínio, tais nações vêem no pluralismo
cultural uma barreira para a formação de uma moral
universal, devendo-se, então, respeitar as peculiaridades
morais e culturais de cada povo. Acreditam também que a idéia
de uma moral universal é mais uma forma de imperialismo do
Ocidente que tenta universalizar as suas próprias crenças
e que tal idéia levaria a uma destruição do pluralismo
cultural, bem como da pluralidade de valores existentes no
mundo .
Como
exemplo de povos que resistem aos princípios universais da
Declaração, pode-se citar os muçulmanos, para os quais a
aceitação de tais princípios torna-se problemática,
frente uma época de crescente onda de fundamentalismos
religiosos e seculares. Não conseguem aceitar os princípios
de igualdade dos sexos, de irrestrita liberdade religiosa,
de livre consentimento dos nubentes para validação do
casamento e outros, uma vez que são guiados pela palavra
sagrada do Corão e pelos preceitos da Sharia, e não pela
ótica universal da Declaração .
Enfim,
apesar da resistência dos relativistas culturais aos princípios
da Declaração, vale ressaltar que esses constituem minoria
e que o consenso de universalidade dos direitos humanos já
fora ratificado pela maior parte da comunidade
internacional, para quem “a natureza
universal de tais
direitos não admite dúvidas”.
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