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                                  Expositores
                        Convidados
                                                
                         Convido
                        a tomar assento à mesa o Dr. Paulo Sérgio Pinheiro,
                        coordenador do Núcleo de Estudos da Violência, da
                        Universidade de São Paulo, expositor desta II Conferência
                        Nacional de Direitos Humanos; o Sr. deputado Nilmário
                        Miranda, ex-Presidente da Comissão de Direitos Humanos
                        da Câmara dos Deputados, também expositor; o Dr. Jaime
                        Benvenuto, coordenador do Movimento Nacional de Direitos
                        Humanos, o terceiro expositor deste evento; o Sr. secretário
                        de Segurança Pública do Estado do Amapá, Dr. Adamor
                        Oliveira; o cacique xavante Celestino, representante das
                        nações indígenas. E, numa homenagem, solicito uma
                        salva de palmas às nações indígenas aqui presentes.
                        Convido também a tomar assento à mesa o Sr. Edson
                        Cardoso, representante do Movimento Negro Unificado; o
                        Dr. Antônio Carlos Bigonha, representando a
                        Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão,
                        representando o Dr. Wagner Gonçalves; o Dr. Wanderley
                        Leal, representante da Associação Brasileira de
                        Criminalistas; o Padre Francisco Reardon, coordenador da
                        Pastoral Carcerária da CNBB; o Dr. Manoel Santino,
                        procurador-geral de Justiça do Estado do Pará; o Dr.
                        José Carlos Anete, representante da Coordenadoria Econômica
                        de Serviço, SESI, da Bahia; o Dr. Ivair dos Santos,
                        coordenador do Departamento de Direitos Humanos do
                        Ministério da Justiça. 
                        
                                                
                        Quero ainda registrar a presença dos deputados
                        Alcides Modesto, Luiz Eduardo Greenhalgh, Agnelo Queiróz
                        e Paulo Rocha. Saúdo os Srs. deputados e vereadores
                        representantes de Comissões de Direitos Humanos em todo
                        o Brasil, os representantes dos Conselhos Estaduais da
                        Defesa da Pessoa Humana e também os Srs. deputados Luiz
                        Alberto e Gilney Vianna, que já faziam parte da Mesa.
                        
                                                
                        Passo a palavra ao Dr. Paulo Sérgio Pinheiro,
                        que terá o tempo de 15 minutos para sua exposição
                        inicial. 
                        
                          
                        
                                                
                        O SR. PAULO SÉRGIO PINHEIRO - Sr. Presidente, autoridades presentes
                        à mesa, companheiros da sociedade civil, antes de começar
                        minha exposição, quero pedir licença para anexar um
                        homenageado à justíssima lista mencionada pelo
                        presidente, quero lembrar o senador Severo Gomes. Como o
                        Sr. ministro Nelson Jobim lembrava, no lançamento do
                        Programa Nacional de Direitos Humanos, S.Exa. foi um dos
                        principais relatores do art. 5º, com as suas 77 provisões
                        à nossa Carta de Direitos. Além disso, o senador
                        Severo Gomes foi o responsável pela implementação da
                        lei que cria o Parque Ianomami; S.Exa. foi decidido
                        combatente em prol da causa indígena. Então,
                        permito-me anexar o seu nome. 
                        
                                                
                        Fazer um balanço de um ano em 15 minutos é uma
                        proeza formidável. Vou tentar ficar rigorosamente
                        dentro desse prazo e espero que os outros oradores também
                        o façam. Esse é o problema de ser o primeiro orador.
                        
                                                
                        Em primeiro lugar, tentarei dividir a exposição
                        em quatro partes. Primeiro, o que é a gramática dos
                        direitos humanos; segundo, qual é o principal problema,
                        a meu ver, da implementação do Programa; terceiro, a
                        questão da violência policial; e, quarto, a dimensão
                        internacional do Programa.
                        
                                                
                        Fiquei muito contente em ouvir o deputado Pedro
                        Wilson citar tantas manifestações de solidariedade no
                        mundo, porque, no Brasil, só gostamos de solidariedade
                        quando estamos na ditadura. Depois que vem a democracia
                        esquecemos a solidariedade internacional. Foi muito
                        importante ter essa dimensão não-provinciana,
                        extremamente solidária no planeta.
                        
                                                
                        O primeiro ponto que gostaria de lembrar é o que
                        significa, num país autoritário, racista,
                        hierarquizado e com a pior distribuição de renda do
                        mundo, o Estado começar a falar a linguagem dos
                        direitos humanos. Não é uma pequena mudança. Quando
                        ouço companheiros do maior respeito responderem que
                        houve apenas uma mudança na retórica, discordo. A retórica
                        é implementação. A retórica é que sempre foi
                        cultivada por todos os políticos como uma arte
                        importantíssima, e é decisivo que o Estado, este
                        Estado que foi sempre autoritário, que jamais conjugou
                        a expressão direitos humanos, fale em direitos humanos.
                        Acho que esta é a principal mudança: ter um programa.
                        Quando, há um ano, todos os correspondentes
                        estrangeiros disseram que isso seria apenas mais uma
                        coisa escrita, que eram só palavras, também discordei.
                        As palavras iluminam a ação. E o que é mais
                        importante — o presidente também o disse aqui — é
                        o fato de que é um programa do Brasil. Não, o programa
                        não tem carteirinha. Há um ano, eu dizia aqui mesmo
                        que esse não é um pacto de confiança com o Governo,
                        mas um pacto de desconfiança da sociedade civil com o
                        Estado brasileiro, porque não é algo em que a
                        sociedade agora vai confiar, entregando-se 
                        simplesmente à implementação desse Programa. O
                        Programa é do Brasil, e tem de ser uma coisa viva.
                        
                                                
                        Por mais limitações que tenham ocorrido na
                        implementação do Programa neste ano, para que
                        caminhemos é melhor não subestimarmos a verbalização
                        desse compromisso. O problema, o desafio que temos, é
                        saber como essa nova concepção de direitos humanos
                        afetou ou vai afetar o sistema e o processo políticos
                        no Brasil, é saber como, não só o Executivo, mas também
                        os outros Poderes, vão poder traduzir isso em ações
                        concretas. 
                        
                                                
                        O segundo ponto, o maior dos obstáculos que vejo
                        é — como dizia muito corretamente o relatório
                        mundial da Human Rights Watch Americas, na parte sobre a
                        questão brasileira — a tensão entre o Governo
                        Federal e os  governos
                        dos estados. Este é o principal obstáculo, porque boa
                        parte dos governadores, boa parte dos responsáveis políticos
                        ou dos Poderes em várias Unidades da Federação
                        historicamente se omitiram e continuam se omitindo,
                        quando não se associam à prática das graves violações
                        aos direitos humanos. Evidentemente, há estados que
                        assumem esse compromisso, talvez seja um pouco suspeito,
                        mas como não sou paulista posso dizer que São Paulo
                        deu um passo adiante propondo o Programa Estadual de
                        Direitos Humanos. Foi o único estado até agora. Fiquei
                        seis meses fora do Brasil, pode ser que outro estado
                        tenha seguido o exemplo do Estado de São Paulo, mas, ao
                        que eu saiba, nenhum outro tomou essa decisão. Alguns
                        estados estão organizando conferências regionais, por
                        exemplo, recebi recentemente convite do Pará, que vai
                        realizar conferência com o patrocínio da sociedade
                        civil. Isso é uma coisa bastante estimulante. Mas é
                        importante termos claro que o Governo Federal assumiu
                        essa posição, e o Governo Federal, além das convicções
                        dos atuais governantes, o fez porque ele responde
                        perante a comunidade internacional sobre todos esses
                        horrores. Quando há um massacre em Eldorado de Carajás,
                        ou quando policiais funcionam como bandos de criminosos,
                        como no caso de Diadema e da Cidade de Deus, quem vai
                        responder, quem vai receber cara a cara essa situação
                        é o presidente da República e o Poder Executivo. Mas
                        os responsáveis por esses acontecimentos são as
                        instituições, são os agentes do Estado, até o rodapé
                        das instituições. Quando um bando de jovens meliantes
                        assassina um índio Pataxó, lá fora ninguém entende
                        muito bem, é como se o esporte nacional fosse queimar
                        pessoas nas ruas. Então, o Governo, o Executivo tem uma
                        responsabilidade imensa. Mas nós precisamos, nos nossos
                        estados, fazer com que essa responsabilidade se espalhe
                        do Executivo para o Legislativo e para o Judiciário,
                        que muitas vezes é o grande protegido de todo esse
                        debate.          
                        
                        
                                                
                        Agora há os movimentos dos juízes democráticos.
                        Juízes jovens e mesmo 
                        mais idosos têm criticado em todo o Brasil o próprio
                        Poder Judiciário. O presidente do Tribunal de Alçada
                        Criminal de São Paulo ainda outro dia dizia que, se a
                        sociedade civil não está contente com a prestação de
                        serviços do Judiciário, os juízes também não estão
                        nada contentes com o funcionamento daquele Poder.
                        
                                                
                        É preciso levarmos a responsabilização, uma
                        microrresponsabilização, a cada um dos Poderes. Não
                        adianta discursar apenas contra a falta de vontade política.
                        Eu concordo totalmente com o deputado Pedro Wilson: é
                        preciso haver vontade política. Mas é preciso ser uma
                        vontade política cobrada e traduzida em todos os níveis
                        de funcionamento do Estado. Não dá só para dizer:
                        "O governador não tem vontade política. O
                        Executivo não tem vontade política para aprovar as 22
                        propostas de lei do Programa". Olhem para o
                        Congresso e vejam como 
                        ele se comporta em relação a qualquer proposta
                        de reforma. Se levarmos em conta a
                        performance do Congresso neste ano, veremos que foi
                        ótima no que diz respeito ao que conseguimos com a
                        criminalização da tortura e o andamento da lei que
                        prevê o fim da competência da Justiça Militar para os
                        crimes comuns cometidos pelos policiais militares.
                        
                                                
                        Hoje é um ponto na agenda. Está nas mãos do
                        Senado Federal se essa excrescência do regime autoritário
                        vai continuar ou não, e vimos mágicas na votação do
                        primeiro projeto do deputado Hélio Bicudo, que o
                        ministro Nelson Jobim também assumiu. É preciso que
                        acreditemos que essas bandeiras são efetivamente
                        suprapartidárias. Eu estava fora, e foi para mim uma
                        surpresa extraordinária ver essa massa de votos. O PMDB
                        e o PSDB também compareceram, mas os que deram sustentação
                        efetiva ao projeto 
                        foram o PFL e o Partido dos Trabalhadores.
                        
                                                
                        É evidente que fomos muito incompetentes no
                        passado em relação a essas fontes institucionais da
                        impunidade e das violações. Hoje caminhamos um pouco.
                        Somos um pouquinho mais sofisticados e vemos a
                        responsabilidade de cada uma das instituições. Mas
                        acho que precisamos nos aperfeiçoar.
                        
                                                
                        Com relação 
                        à pressão sobre o Congresso, só posso falar
                        sobre os seis primeiros meses, entre maio e dezembro.
                        Entre janeiro e esta data, não posso falar nada, porque
                        eu não sei. Mas, entre maio e dezembro, a pressão
                        sobre os parlamentares foi desarticulada, incompetente e
                        fraca. No dia da votação decisiva do Projeto Hélio
                        Bicudo/ministro Nelson Jobim, algumas ONGs aqui em Brasília
                        estavam alertas e se mobilizando, mas não me consta que
                        tenhamos feito pressão organizada sobre o Congresso
                        Nacional. Pressão organizada não significa só fazer
                        passeata, distribuir panfletos e protestar. É preciso
                        um convencimento dos parlamentares. A maioria dos
                        parlamentares não tem a 
                        mais pálida idéia do que significa o Programa,
                        do que significam direitos humanos, do que é a Comissão
                        de Direitos Humanos da ONU, do que são os tratados. É
                        preciso, portanto, que tenhamos paciência e humildade
                        para convencê-los e transformá-los em aliados, porque
                        o problema é de todos nós.
                        
                                                
                        Só para terminar esse segundo ponto, quero
                        enfatizar que precisamos aprender a desagregar. Da mesma
                        forma que temos de fazer uma microcobrança em cada nível
                        da institucionalização do programa, temos de ter uma
                        desagregação precisa dos seus objetivos. Cito aqui
                        apenas um, algo sobre o que muitas vezes ficamos em silêncio,
                        as violações contra os cidadãos brasileiros de
                        orientação sexual diferenciada, a luta dos
                        homossexuais e dos gays.
                        O meu colega Eduardo Muylaert, secretário de Segurança
                        Pública, em 1986, disse a frase que aqui quero repetir:
                        "Assassinato de homossexual é contagioso. Se esses
                        crimes não são reprimidos imediatamente podem se
                        transformar em epidemia". É preciso que não
                        toleremos nichos de silêncio em relação a qualquer
                        violação. Para isso, precisamos ser cada vez mais
                        sofisticados e ter dados cada vez mais precisos.
                        
                                                
                        Passo para o terceiro ponto — e acho que devo
                        ter ainda alguns minutos —, a violência policial, já
                        incluída no temário do presidente.
                        
                                                
                        Acabamos de realizar em São Paulo o seminário:
                        "A Violência Sem Medo", promovido pela
                        Universidade de São Paulo com o apoio da Rede
                        Globo, em que duas medidas carros-chefes foram
                        propostas. Primeira, a necessidade de termos em todos os
                        estados um sistema de controle epidemiológico da violência.
                        O que é este termo pedante? É preciso termos cada vez
                        mais medidas sofisticadas para detectar a violência. Não
                        adianta dizer que em São Paulo a média dos homicídios
                        é cinqüenta por cem mil, quando no meu bairro é três
                        por cem mil e nas comunidades da Zona Sul ou da Zona
                        Leste, na faixa entre quinze e 24 anos, é de duzentos
                        homicídios por cem mil pessoas. Esse esforço, no
                        sentido de fazermos uma cobrança localizada às
                        instituições e de termos uma defesa precisa de todos
                        os grupos que sofrem as violações, não é nosso. O
                        Estado é que tem de fazer isso. Não temos de nos
                        submeter ao Estado. Temos de cobrar do Estado Federal e
                        dos estados da Federação que sejam cada vez mais
                        sofisticados no levantamento dos dados sobre a violência
                        criminal.
                        
                                                
                        Em segundo lugar, a conferência achou ótima a
                        apresentação do governador Mário Covas, que teve a
                        coragem de propor a revisão do pior capítulo da nossa
                        Constituição - o da Segurança Nacional - que tem duas
                        páginas. É preciso coragem política para enfrentar a
                        reforma da estrutura que a ditadura nos legou e que a
                        Constituinte foi incapaz de rever.
                        
                                                
                        Temos a proposta do governador Mário Covas;
                        temos a proposta do ex-deputado Régis de Oliveira, hoje
                        vice-prefeito de São Paulo; temos a proposta do
                        deputado Hélio Bicudo e temos a proposta da OAB-São
                        Paulo, coordenada pela advogada Maria Eugênia da Silva
                        Teles. São magníficos projetos, mas, — os Srs.
                        parlamentares talvez possam me desmentir —, nenhuma
                        reforma da estrutura policial será votada este ano. No
                        ano que vem, teremos eleições. Nesta legislatura,
                        portanto, não haverá — pode ser que a minha bola de
                        cristal esteja embaçada — votação da reforma do capítulo
                        da segurança pública no Brasil.
                        
                                                
                        O que fazer até lá, diante da epidemia? E
                        quando falo epidemia, significa que em várias capitais
                        brasileiras a taxa de violência fatal, de homicídios,
                        passou de uma endemia, quer dizer, uma curva que
                        conseguimos prever e projetar, para uma epidemia, ou
                        seja, deu saltos que não temos condições de prever.
                        
                                                
                        Diante disso, é preciso tomarmos uma atitude,
                        como propusemos em São Paulo. Vamos entregar a proposta
                        ao governador Mário Covas e ao Dr. José Gregori, para
                        que a comissão destinada a reexaminar o papel da polícia
                        a estude. É preciso um plano de gerenciamento imediato
                        da polícia em todo o Brasil. Não podemos continuar a
                        fazer de conta que as polícias militares e as polícias
                        civis agem em conjunto. Não. Elas não se falam, quando
                        não se dão tiros. E eu falo só de São Paulo. Não há
                        colaboração, não há investigação sofisticada. Os
                        institutos médicos legais estão sob a dependência das
                        Secretarias de Segurança. É preciso que eles tenham
                        idoneidade científica e independência. É preciso que
                        não se dupliquem os serviços nas duas polícias. Só
                        falo de São Paulo, repito. A Polícia Civil tem um
                        centro de informações, a Polícia Militar tem outro.
                        Temos de acabar com os serviços reservados de todas as
                        polícias militares no Brasil. 
                        Não é competência das polícias militares
                        terem P-2 ou serviços reservados.
                        
                                                
                        Vou contar uma anedota. No governo Montoro,
                        pedimos que as polícias encaminhassem ao gabinete do
                        governador a informação sobre todos os homicídios
                        praticados pelas polícias. Cada dia recebíamos uma
                        informação datada. Um dia, trocaram os envelopes. O
                        envelope que era para Roberto Gusmão, que era o secretário
                        do Governo, veio para mim, e eu abri. Qual a minha
                        surpresa, quando eu vi que ainda no governo Montoro, sem
                        nenhuma ciência do governador, a Polícia Militar ainda
                        investigava reunião de sindicatos trabalhistas. Eu
                        achei que estava lendo documentos de 1920, do governo
                        Arthur Bernardes. Estava lá: "O sindicalista tal
                        levantou a palavra...". Que dizer, algo que se via
                        na República Democrática Alemã antes da transição,
                        boletins detalhados que as pessoas faziam naquela época.
                        
                                                
                        As polícias militares não têm o dever de fazer
                        isso. É preciso que o movimento da sociedade civil
                        exija isso dos governos constituídos. Se o Governo
                        Federal quiser, que crie uma agência federal de informação.
                        Mas isso não é para estar nas mãos das polícias
                        militares dos estados, como continua a ocorrer.
                        
                                                
                        Há várias medidas imediatas, além do fim da
                        competência da Justiça Militar para as polícias
                        militares. É preciso estabelecer, na direção do
                        controle externo, não só o debate do controle externo
                        do Judiciário, mas o controle externo civil das polícias.
                        Não é possível que essas corporações, que têm o
                        imenso poder da violência física do Estado, não
                        estejam submetidas a um controle civil externo, como
                        acontece na maior parte das democracias desenvolvidas.
                        Em São Paulo há um embrião interessante, que são os
                        conselhos de segurança, que poderão vir a germinar uma
                        possibilidade nessa direção.
                        
                                                
                        O último ponto sobre o qual eu quero falar é a
                        dimensão internacional. Não o subestimemos, como o
                        presidente da Comissão muito claramente expôs na sua
                        abertura.
                        
                                                
                        A comunidade de direitos humanos tem dimensão
                        internacional, não só nas organizações não-governamentais,
                        como a Anistia Internacional, que estava aqui, e a Human
                        Rights Watch, além de outras, mas ela tem a dimensão
                        dos Estados.
                        
                                                
                        É preciso que o Brasil, como tem feito desde
                        1994, preste as informações, esteja elaborando os
                        relatórios, as convenções, os tratados. Lutamos muito
                        para ratificar esses tratados e convenções. É preciso
                        que a sociedade civil, junto com o Estado, esteja
                        prestando essa contribuição ao debate internacional. Não
                        adianta só ficar dizendo: "O Programa não
                        funcionou, porque nós não reconhecemos a jurisdição
                        da Corte Interamericana". Se a sociedade quer
                        efetivamente isso, é preciso pressionarmos, dialogarmos
                        competentemente com o Ministério das Relações
                        Exteriores. Não adianta ficar chorando pitanga. É
                        preciso nos organizarmos. Queremos que o Protocolo
                        Adicional da Convenção da Tortura, de 1984, seja
                        aprovado? Não adianta chorar. É preciso nos
                        organizarmos competentemente para que o Protocolo
                        Adicional da Convenção da Tortura seja aprovado.
                        Queremos uma solidariedade mais ativa com o Timor Leste
                        ? É preciso que pressionemos, é preciso que estejamos
                        presentes em todas as oportunidades em que o Governo 
                        toma decisões de política internacional.
                        
                                                
                        A vertente internacional não é só a da
                        solidariedade. Vários setores do governo brasileiro
                        ficaram nervosos, quando o embaixador Celso Lafer disse
                        que receber os refugiados da antiga Iugoslávia era um
                        dever de solidariedade da Nação brasileira. Todo o
                        mundo foi solidário conosco na ditadura. É preciso que
                        pensemos na situação do refugiado. Está nas mãos do
                        Senado brasileiro a aprovação da Lei dos Refugiados.
                        Temos, para dar tradução ao que o deputado Pedro
                        Wilson aqui falava, de acompanhar de forma competente a
                        maneira como as decisões são tomadas em relação à
                        nossa postura internacional, no Parlamento brasileiro e
                        no Executivo.
                        
                                                
                        Vou terminar, porque o presidente já foi muito
                        tolerante. Eu acho que esgotei o tempo, mas é uma
                        alegria enorme termos este auditório tão cheio. Mais
                        cheio, acho, que na abertura da última Conferência.
                        Isso é um sinal de competência.
                        
                                                
                        No que me toca, achei extremamente clara a
                        maneira como tudo aqui foi referido, apesar de que esta
                        não é uma reunião deliberativa, mas uma reunião onde
                        a expressão da vontade é essencial para que o Programa
                        Nacional de Direitos Humanos no próximo ano avance
                        ainda mais.
                        
                                                
                        Muito obrigado.                    
                        O PRESIDENTE (deputado
                        Pedro  Wilson) 
                        - Pediríamos a todas as entidades e
                        autoridades que pudessem indicar suas representações
                        nesta Conferência. 
                        
                                                
                        Acatando a oportuna sugestão do professor Paulo
                        Sérgio Pinheiro, gostaríamos de incluir, entre as
                        personalidades homenageadas nesta Conferência, in memoriam, o senador
                        Severo Gomes, pela relevante contribuição que prestou
                        à cidadania, aos direitos humanos e à nacionalidade
                        durante sua profícua carreira política.
                        
                                                
                        Convidamos a tomar assento à Mesa, representando
                        as comissões estaduais de direitos humanos, o deputado
                        Renato Simões, presidente da Comissão de Direitos
                        Humanos da Assembléia Legislativa do Estado de São
                        Paulo. Também convidamos a Dra. Maria Inês Bierrembach,
                        presidente do Conselho Estadual de Direitos Humanos do
                        Estado de São Paulo, representando os Conselhos
                        Estaduais; e o vereador Daniel Antônio, presidente da
                        Comissão de Direitos Humanos de Goiânia, representando
                        as Comissões Municipais.
                        
                                                
                         Queremos
                        registrar a presença do presidente do Grupo Gay
                        da Bahia, professor Luís Mott. Registramos a presença
                        de Luiz Renato, do Ministério Público do Espírito
                        Santo; Gilson Roberto, do Ministério Público de
                        Pernambuco; Sales Freitas, procurador de Justiça do
                        Estado de Roraima; Lúcia Barros, da Procuradoria Geral
                        do Estado do Mato Grosso; Manoel Santillo,
                        procurador-geral de Justiça do Pará; Sávio Rui Brabo
                        de Araújo, do Ministério Público do Pará; Bosco Sá
                        Vicente, do Ministério Público do Amazonas; Francisco
                        Raulino, do Piauí; Ariovaldo Perrone, do Ministério Público
                        do Rio Grande do Sul; Marco Aurélio, do Ministério Público
                        do Pará; César Augusto e Anselmo Agostinho, do Ministério
                        Público de Santa Catarina; Pedroso Teixeira Prado
                        Vieira, procurador de Justiça; Dr. Luiz Antônio Guimarães,
                        representando o procurador-geral de Justiça do Estado
                        de São Paulo, Dr. Luiz Antônio Marrey; Márcia
                        Domitila de Carvalho, da Procuradoria Geral da República.
                        Ainda mais, Marta Marília Tonin, da OAB do Paraná;
                        Herilda Balduíno de Sousa, da Comissão de Direitos
                        Humanos do Conselho Federal da OAB; Luiz Francisco
                        Caetano, da OAB de Goiás; Manoel Menezes Cruz, da OAB
                        de Sergipe; Lenise, da OAB de Goiás; Sara Mendes, da
                        OAB de Goiás; Maria Abadia, da Comissão de Direitos
                        Humanos da OAB; Dayse Benedito, da Subseção da OAB de
                        São Paulo; Almeida Castro, da OAB do Espírito Santo;
                        Ayda Mascarenhas e Edson Ulisses, da OAB de Sergipe;
                        Eduardo Duarte, da OAB Ceará; Valério Djalma
                        Cavalcante Sobrinho, da OAB Rio Grande do Norte; Sérgio
                        Vítor Tamer, da OAB do Amazonas.
                        
                                                
                        Concedo a palavra ao deputado Nilmário Miranda,
                        o segundo expositor nesta II Conferência Nacional de
                        Direitos Humanos.
                        
                          
                        
                          
                        
                                                
                        O SR. DEPUTADO NILMÁRIO MIRANDA - Bom dia a todos os participantes
                        e aos colegas da Mesa.
                        
                                                
                        Há um ano, saudamos aqui o lançamento do
                        Programa Nacional de Direitos Humanos. Afinal, tinha
                        sido o primeiro programa de direitos humanos da América
                        Latina e o terceiro do mundo. Havia planos semelhantes
                        na Austrália e nas Filipinas. E o fizemos sobretudo
                        pelo fato de o presidente Fernando Henrique Cardoso ter
                        convidado o nosso companheiro Paulo Sérgio Pinheiro
                        para fazer a coordenação da sua proposta. Ele fez
                        seminários em seis capitais e consultou mais de
                        duzentas entidades na minuta. Mas, não satisfeitos com
                        isso, nós convocamos a Conferência Nacional de
                        Direitos Humanos, a primeira, que também fez várias
                        propostas, muitas das quais foram acatadas a partir da
                        minuta do nosso companheiro Paulo Sérgio Pinheiro.
                        
                                                
                        Esta segunda Conferência é um momento muito
                        importante para a luta pelos direitos humanos no Brasil.
                        Trata-se de uma conferência autoconvocada, ela não tem
                        nenhum caráter oficial, mas dessa vez houve reuniões
                        preparatórias em muitos Estados do País, onde,
                        inclusive, se discute a proposta para a criação de
                        planos estaduais de direitos humanos.
                        
                                                
                        Não quero deixar também de, antes de avaliar o
                        plano, lembrar que a luta por direitos humanos é muito
                        antiga. Nessa fase da História do Brasil, há pelo
                        menos três grandes momentos que não gostaria de deixar
                        de citar. Lembro que o plano nasceu na luta contra a
                        ditadura, nos movimentos femininos pela anistia, na luta
                        pela anistia promovida pelos familiares dos presos, dos
                        mortos, dos desaparecidos, dos exilados, dos banidos e
                        dos torturados, junto com as 
                        igrejas e entidades da sociedade civil. E, após
                        a anistia, esse movimento se organizou nacionalmente na
                        defesa dos excluídos e contra a violação de direitos
                        humanos, de que era vítima a maioria da população.
                        
                                                
                        O segundo grande momento dos direitos humanos
                        deste século, creio, foi durante a Assembléia Nacional
                        Constituinte. O movimento demonstrou grande capacidade,
                        seja com emendas populares, seja usando todos os meios
                        possíveis e imagináveis 
                        para que nós tivéssemos assegurados os direitos
                        humanos na Constituição.
                        
                                                
                        O terceiro momento ocorreu em Viena, com a
                        internacionalização, a universalização dos direitos
                        humanos, quando o grupo que foi a Viena, aqui organizado
                        com o apoio do então ministro da Justiça, Maurício
                        Correia, começou a fazer uma agenda por direitos
                        humanos no Brasil. Foi quando começou a se falar em
                        Plano Nacional de Direitos Humanos. Quase todas as ações
                        legislativas e programas públicos depois delineados
                        começaram a nascer ali. Isso, infelizmente, foi
                        interrompido com a saída do ministro Maurício Correia
                        e só foi retomado  em 1995.
                        
                                                
                        Aqui no Congresso, na legislatura passada, 
                        importantes CPIs prepararam o avanço posterior.
                        Foi o período das CPIs da Prostituição Infantil, do
                        Extermínio de Crianças, da Pistolagem, da Violência
                        no Campo, da Violência contra a Mulher, do Sistema
                        Carcerário. Toda essa podridão que hoje está vindo à
                        tona já estava detectada ali. Foi o período da Comissão
                        Externa para colaborar com as famílias dos mortos e
                        desaparecidos políticos, logo depois da abertura da
                        vala de Perus.
                        
                                                
                        Depois dessas sucessivas grandes CPIs que
                        despertaram a consciência do Congresso e de uma parte
                        da sociedade política, é que foi criada aqui, pela
                        primeira vez, uma Comissão de Direitos Humanos na Câmara
                        dos Deputados, em 1995, o mesmo ano em que se conquistou
                        a Lei dos Mortos e Desaparecidos Políticos, a Lei n°
                        9140/95.
                        
                                                
                        Também não posso deixar de me referir ao Foro
                        Nacional contra a Violência no Campo, que vem
                        persistentemente levantando esse debate, articulando
                        instituições da esfera pública e da sociedade civil.
                        E quero referir-me também ao clamor que se criou contra
                        a Justiça Militar após o episódio do Carandiru. 
                        Acho que a partir desses episódios históricos
                        nasceu o Programa Nacional de Direitos Humanos. Como eu
                        disse da outra vez, pode não ser tudo o que queremos,
                        mas tudo o que está ali é nosso. Tudo ali vem de uma
                        luta histórica. Com esse plano nós podemos cobrar do
                        presidente Fernando Henrique Cardoso, que pode cobrar
                        dos estados, todos podemos cobrar do Congresso, do
                        Judiciário e do Ministério Público, e a comunidade
                        internacional e as associações internacionais podem
                        cobrar do Brasil uma atitude a partir dos compromissos
                        assumidos pelo Governo Federal.
                        
                                                
                        Também concordo com o 
                        nosso amigo Paulo Sérgio Pinheiro no sentido de
                        que conquistamos um conceito, uma concepção de
                        direitos humanos, da indissociabilidade dos direitos
                        civis e políticos dos direitos sociais, econômicos e
                        culturais (apesar de que, isto tem poucos reflexos na prática), 
                        e da universalidade dos direitos humanos. Pela
                        primeira vez na história do Brasil, o Estado assume que
                        é responsável pela proteção e garantia dos direitos
                        humanos. Isso não é pouca coisa. Os direitos estão
                        definidos na nossa Constituição, nas leis, nos
                        tratados e pactos internacionais.
                        
                                                
                        Até recentemente, aliás, até hoje, nós
                        estamos vendo o Estado na outra esfera. Governos
                        estaduais têm assumido de forma desavergonhada a defesa
                        dos maiores violadores dos direitos humanos. Basta
                        lembrar aqui o caso Carandiru, quando o governo de então
                        assumiu plenamente todas as mentiras forjadas em torno
                        do episódio. Sentimos muita vergonha quando vemos uma
                        pessoa com a trajetória do Almir Gabriel acobertar os
                        responsáveis pelo ocorrido em Eldorado do Carajás e
                        ainda patrocinar proposta de emenda à Constituição
                        Estadual para proteger os responsáveis por aquele
                        massacre.
                        
                                                
                        Lembramos também do governador Garibaldi Alves,
                        que teve uma trajetória tão bonita no Senado e nomeou
                        alguém como Maurílio Ferreira Pinto subsecretário de
                        Segurança Pública, e depois de ter sido forçado a
                        afastá-lo, readmitiu-o como diretor da INTERPOL. Uma
                        pessoa sobre a qual pesam veementes indícios de que
                        seja chefe de um grupo de extermínio, que está à
                        frente da polícia há vinte anos no Rio Grande do
                        Norte. O Marcelo Alencar, que foi advogado de presos políticos,
                        e hoje respalda a política do general Nilton Cerqueira,
                        de gratificar policiais pela quantidade de mortos que
                        fazem entre os civis, instituindo na prática a pena de
                        morte. Lembramos ainda o governador de Sergipe, que
                        agora começa a ceder a pressões e ameaça demitir o
                        melhor Secretário de Segurança que já houve no
                        estado, que é o Wellington Dantas, que fez a reforma
                        mais profunda que talvez já tenha sido feita em um
                        aparato policial no Brasil nos tempos modernos. 
                        
                                                
                        A partir do Programa Nacional de Direitos
                        Humanos, o Governo Federal pode se omitir, mas não pode
                        mais defender a impunidade e a violência praticada pelo
                        Estado.
                        
                                                
                        Em que se avançou neste ano? Acho que o avanço
                        ocorreu no campo dos direitos civis, tanto individuais
                        quanto coletivos. Esse avanço ocorreu mesmo com aquela
                        forma depauperada, digamos assim, da aprovação da
                        transferência para a Justiça Comum dos homicídios
                        dolosos cometidos por militares, quando nós saudávamos
                        a edição do Programa. O líder do governo no Senado,
                        senador Élcio Álvares, foi o responsável pela redução
                        do alcance do projeto para apenas os homicídios
                        dolosos. Mas depois ocorreram outras tragédias, como na
                        Cidade de Deus, Diadema e a podridão toda que veio à
                        tona com as CPIs e com as denúncias vindas de todo o País,
                        quando aprovamos de novo aqui na Câmara projeto
                        estendendo a jurisdição para a Justiça Comum do
                        julgamento de crimes de lesão corporal e tortura.
                        Infelizmente, a pressão de coronéis PM conseguiu
                        manter a extorsão e o achaque no âmbito da Justiça
                        Militar - talvez para que ela não acabe de vez.
                        
                                                
                        Após a tragédia de Eldorado do Carajás e de
                        Corumbiara, aprovamos aqui o rito sumário para a
                        reforma agrária, a inclusão do Ministério Público
                        nas ações de despejo no campo, a cautela nas liminares
                        para ação de despejo. Após o episódio de Diadema, nós
                        conseguimos aprovar a admissibilidade da  proposta de emenda à Constituição referente à federalização
                        dos crimes contra direitos humanos, que vai propiciar
                        uma discussão muito rica. O que são crimes contra
                        direitos humanos? Para que esta proposta 
                        seja aprovada aqui no Congresso vamos ter de
                        definir esses crimes, e contamos com a participação e
                        o apoio de toda a sociedade para isso.      
                        
                        
                                                
                        Foi aprovada a tipificação dos crimes de
                        tortura; a criação da Secretaria Nacional de Direitos
                        Humanos; foi tornado crime o porte ilegal de armas; há
                        um projeto de lei sobre lavagem de dinheiro; foi
                        aprovada a indenização a José Ivanildo, morto no
                        xadrez da Polícia Federal do Ceará, instituindo
                        importante jurisprudência; houve o convênio com o
                        SEDEC para avaliar o risco da violência em quatro
                        capitais; há  o
                        GAJOP, um convênio tímido, mas importante para
                        proteger vítimas e testemunhas; 
                        temos os convênios da Anistia Internacional, 
                        que permitiram a oferta de cursos para as polícias
                        de diversos estados. Tivemos um tímido programa de
                        bolsa-escola para crianças em situação de escravidão
                        no Mato Grosso do Sul, e um programa em Pernambuco, que
                        parece estar sendo desviado. Há ainda um compromisso
                        anunciado pelo Governo Federal, no valor de 400 milhões
                        de reais, para serem aplicados em prevenção e
                        tratamento do vírus da AIDS e há o projeto ampliando
                        as penas alternativas, que ainda está engatinhando na
                        sua tramitação.
                        
                                                
                        Queria lembrar também que, se mais não tivemos
                        — e aí concordo com o presidente Pedro Wilson —,
                        foi por falta de vontade política, porque o Governo tem
                        quase quatrocentos votos no Congresso Nacional para
                        garantir sua reeleição e  para aprovar certas reformas, 
                        até mesmo  contra
                        a sociedade,  e
                        parece não demonstrar 
                        o mesmo empenho quando se trata de aprovar
                        projetos duros, relativos aos direitos humanos. 
                        
                                                
                         Nunca
                        se falou tanto sobre direitos humanos no País. Podemos
                        dizer que saímos de um gueto. Entretanto, os índices
                        de violência estão crescendo em todos os lugares, 
                        assim como as taxas de homicídio e 
                        a prática de tortura. O sistema prisional chegou
                        a um ponto de tamanha desumanidade, que dispensa
                        qualquer comentário. Continuam a atuar os grupos de
                        extermínio, muitos deles incrustados no aparelho do
                        Estado. 
                        
                                                
                        Acho que é impossível dissociar isso da questão
                        do desemprego; da lentidão na reforma agrária e no
                        apoio à agricultura familiar; da não aprovação do
                        projeto de renda mínima, que depende do líder do
                        governo aqui no Congresso (o deputado Germano Rigotto, há
                        quatro anos está sentado em cima deste projeto); da ausência
                        de políticas compensatórias que mereçam esse nome.
                        Igualmente, ouvimos o Ministro da Saúde dizer que há
                        10 milhões de excluídos do sistema público de saúde
                        no Brasil. O Congresso tem estatísticas que mostram que
                        os gastos com saúde e educação reduziram-se no País.
                        Então, é impossível 
                        dissociar o crescimento da violência, por mais
                        que tentemos, da situação social e política. Por isso
                        é  que
                        podemos dizer que muitas vezes a nossa União Federal
                        viola os direitos no atacado e, depois, tenta protegê-los 
                        no varejo.
                        
                                                
                        Outro ponto que queria destacar é que a reforma
                        administrativa não modifica, tampouco melhora, as agências
                        governamentais que têm um papel importante na
                        implementação do Programa Nacional de Direitos
                        Humanos. Por exemplo, o INCRA é um verdadeiro entrave
                        à reforma agrária no País. 
                        E qual a reforma 
                        prevista para o INCRA? 
                        O Conselho de Defesa dos Direitos da Pessoa
                        Humana, que seria o principal órgão da esfera pública
                        federal para os direitos humanos, não se reúne há
                        seis meses, mesmo com toda a explosão de violência no
                        País. Não há um ministro que convoque este Conselho
                        que, se tivesse sido convocado, também seria uma
                        instituição inócua, sem poder, de pessoas de bem que
                        detectam os problemas, fazem belos, excelentes e
                        precisos relatórios, mas nada acontece a partir daí. E
                        esta é a principal instância federal da esfera pública
                        em direitos humanos. 
                        
                                                
                        A FUNAI deveria implementar a política de promoção
                        dos índios. Venceu em 1993 o prazo para a demarcação
                        das terras indígenas sem que ela tenha sido feita, e 
                        118  indígenas
                        foram assassinados 
                        em três anos. 
                        
                                                
                        Qual é a reforma da FUNAI, prevista na reforma
                        administrativa que está em votação esta semana no
                        Congresso Nacional ? Nenhuma. 
                        
                                                
                        Onde está a Fundação Cultural Palmares, que
                        deveria identificar os remanescentes de quilombos e
                        fazer a promoção social dos negros? 
                        
                                                
                         Todos
                        nós esperamos muito da Polícia Federal, em que,
                        segundo dados da própria instituição, 
                        faltam mais de duzentos delegados e sete mil
                        agentes. Mas continuam lhe transferindo novas atribuições,
                        embora ela continue desaparelhada. Sem falar do Ministério
                        Público Federal e da Justiça Federal, onde todas as
                        propostas de federalização vão esbarrar em limitações
                        materiais muito sérias.
                        
                                                
                        Também o Orçamento Geral da União depende do
                        Governo Federal, mas não prevê recursos mínimos para
                        implementar o Programa Nacional de Direitos Humanos, não
                        prevê recursos para o banco de dados, não prevê
                        recursos para vítimas e testemunhas, a não ser aqueles
                        recursos escassos alocados no GAJOP. Mesmo o Fundo
                        Penitenciário Nacional, que depende também da esfera
                        federal, apesar da receita de 100 milhões de reais por
                        ano - recursos estes de aplicação obrigatória na
                        reforma do sistema penitenciário - deixou de aplicar na
                        sua destinação 78% dos recursos, no ano passado. O
                        dinheiro foi desviado para outra coisa, enquanto
                        assistimos à podridão no sistema penitenciário do
                        Brasil. 
                        
                                                
                        Das sete medidas de implementação previstas no
                        Programa, só uma foi cumprida, e apenas pela metade.
                        Foi a criação da Secretaria Nacional de Direitos
                        Humanos. Mesmo estando entregue em boas mãos, nas
                        melhores mãos, do ponto de vista do poder, a criação
                        da Secretaria não alterou nada, 
                        uma vez que ela continua subordinada à estrutura
                        do Ministério da Justiça. Poderia ter sido ligada
                        diretamente à Presidência da República, mas como está,
                        não tem orçamento próprio, não tem recursos próprios,
                        não tem recursos humanos próprios. 
                        
                                                
                        Onde estão as campanhas publicitárias que
                        estavam previstas na implementação do Programa? Não
                        dependem nem de recursos do Governo. Bastava vontade política
                        para fazer campanhas, 
                        para trabalhar isso numa cultura política.
                        Sequer a edição do Programa Nacional de Direitos
                        Humanos foi publicada em escala suficiente. Vamos aos
                        estados, ninguém tem, ninguém conhece o Programa.
                        Simplesmente porque não foi produzido, não foi
                        distribuído sequer para os agentes públicos no nível
                        do município e do estado. E o Governo poderia ter feito
                        campanhas publicitárias e não fez.
                        
                                                
                        Ao mesmo tempo, estamos vendo o crescimento do 190
                        Urgente -
                        aquele programa vergonhoso da Manchete, que vive de
                        violar o direito à imagem das  pessoas pobres. Estamos vendo o crescimento do lixo americano
                        e japonês inundando a nossa televisão. E até a nossa
                        maior emissora de televisão está apresentando 
                        um seriado  chamado 
                        A
                        Justiceira.
                        
                                                
                         Que
                        estado recebeu o incentivo que estava previsto 
                        por ter implantado medidas favoráveis ao
                        Programa Nacional de Direitos Humanos? Quando o Ministério
                        da Justiça cumpriu o compromisso de fazer sequer um dos
                        relatórios? Deveria, em um ano, fazer três relatórios
                        — não fez nenhum — sobre a situação e a evolução
                        dos direitos humanos. E os relatórios dos estados para
                        o Ministério da Justiça, 
                        outra medida de implementação? Não foram
                        feitos também. E o banco de dados para monitorar a violência?
                        Como é que se sabe se cresceu, se diminuiu, se
                        melhorou, se piorou, se não há banco de dados, se não
                        há monitoramento? 
                        
                                                
                        Com relação ao reconhecimento da Corte
                        Interamericana  —
                        é bom que todos saibam — depende apenas da assinatura
                        do presidente da República, de mais ninguém. Não há
                        nada a ser feito a não ser a assinatura dele. E isto
                        permanece. Dezessete Estados latino-americanos já
                        reconheceram a Corte. E o nosso presidente não se
                        decidiu ainda. Seria uma medida boa para diminuir a
                        impunidade, pois permitiria levarmos até à Corte as
                        flagrantes e massivas violações dos direitos humanos
                        que ficaram na impunidade.
                        
                                                  
                        Teremos grandes desafios ao sairmos daqui. E o
                        primeiro deles, já estou vendo aflorar nos estados. É
                        o Plano Estadual dos Direitos Humanos. É o nosso maior
                        desafio. Ali é que é feita a segurança pública, é
                        nesta esfera  que
                        se pode fazer a reforma das polícias, a modificação
                        do art. 152.  Ali
                        está a ferida feia do sistema prisional. 
                        Quer dizer, isso depende muito de nós que
                        estamos aqui. São Paulo e Minas Gerais terão os seus
                        planos. Parece que outros estados também já estão
                        pensando nisso. E a propósito da questão do sistema
                        prisional, quero dar um viva à Campanha da Fraternidade
                        de 1997, pela coragem demonstrada pela Igreja Católica,
                        ao colocar esta chaga para fora.
                        
                                               
                        Na implementação do Programa Nacional de Direitos
                        Humanos, em seu segundo ano, não podemos aceitar o fato
                        de  que a
                        Comissão de Implementação nunca 
                        tenha se reunido, porque não houve convocação
                        do Ministro. Esta Comissão, formada pelas 
                        melhores pessoas,  se reunirá, pela primeira vez, um ano depois de anunciado o
                        Programa, amanhã à tarde, às 15h30min. E neste
                        segundo ano não podemos admitir que dela 
                        não façam parte 
                        pessoas do Movimento Nacional de Direitos Humanos
                        e de outras entidades nacionais, porque, mesmo que na
                        Secretaria Nacional de Direitos Humanos haja
                        companheiros nossos, ela deve lealdade ao Governo. E o
                        Governo continua sendo, pela ação ou pela omissão, um
                        dos maiores violadores de direitos humanos deste País.
                        Então, acho que qualquer implementação séria tem que
                        contar com a participação de pessoas independentes do
                        Governo, que não devem lealdade a governo algum.
                        
                                                
                        Acho que o terceiro desafio, concordando com o
                        nosso presidente no encerramento da sua belíssima fala,
                        é a questão da educação. Não basta a matéria de
                        direitos humanos entrar na Academia da Polícia Federal,
                        nas academias de polícias militares e civis, é preciso
                        entrar em toda a escola brasileira, do ensino
                        fundamental até à universidade. Da maneira correta,
                        acho que esta Conferência discutirá isto aqui também.
                        
                                                
                        Não acredito também que possamos avançar sem
                        vincular - o que é um velho sonho dos ativistas de
                        direitos humanos - 
                        nossa luta com alguns direitos sociais, pelo
                        menos na questão do desemprego. Enquanto permanecer
                        esta perspectiva sombria de desemprego no País, de
                        lentidão da reforma agrária, de não implantação da
                        Lei Orgânica da Assistência Social e enquanto perdurar
                        a crise da saúde, é muito difícil. Vai ser uma causa
                        perdida lutar pelo avanço dos direitos humanos. É
                        preciso enfrentar de forma conjugada também alguns
                        direitos sociais.
                        
                                                
                         O
                        presidente Pedro Wilson já deu sinais de alguns pontos
                        para uma agenda. No passado, toda vez que conseguimos
                        trabalhar com dois, três ou quatro pontos prioritários
                        conseguimos avançar nesses três ou quatro pontos.
                        Talvez esta Conferência também consiga traçar esses
                        pontos para agendar o Congresso, o Governo Federal, os
                        governos estaduais e a nós todos para esses novos avanços.
                        
                        
                                                
                         Talvez
                        possamos dar um passo aqui — isto dependerá,
                        evidentemente, de não se forçar a situação — no
                        sentido de sair alguma comissão, ainda que modesta,
                        para discutir pontos que serão levantados por esta
                        Conferência. 
                        
                                                
                         Também
                        no momento oportuno voltarei com esta proposta.
                        Refiro-me à omissão do Senado Federal, que não
                        homologa o Conselho Nacional de Comunicação Social,
                        que teria a capacidade, digamos, moral, 
                        de monitorar os programas de televisão e de rádio
                        no Brasil e de estabelecer sanções morais.  Poderíamos decidir, nesta Conferência, formar um grupo de
                        pessoas para escolher os dez piores programas de rádio
                        e televisão do Brasil, os que mais violam a dignidade
                        dos seres humanos através da mídia eletrônica. E no
                        dia 10 de dezembro, 
                        Dia Internacional de Direitos Humanos, quando se
                        atribui o prêmio nacional, daríamos um prêmio às
                        avessas, com base nessa lista suja dos violadores de
                        direitos humanos no Brasil. 
                        Aproveitaríamos também para chamar a atenção
                        do nosso Senado para a sua omissão imperdoável em não
                        homologar o Conselho Nacional de Comunicação Social.
                        
                                                
                        Obrigado.
                        
                          
                        
                                                
                        O SR. PRESIDENTE (deputado Pedro Wilson) - Registramos a presença
                        do vereador Ítalo Cardoso, presidente da Comissão de
                        Direitos Humanos da Câmara Municipal de São Paulo, bem
                        como da direção da ABONG - Associação Brasileira de
                        Organizações Não-Governamentais. Gostaria de
                        ressaltar também a participação do INESC nesta Conferência,
                        não só por sua presença, mas pela inestimável
                        colaboração na realização na sua realização.
                        
                                                
                        Ouviremos agora o terceiro expositor, Dr. Jayme
                        Benvenuto. Em seguida, por uma concessão especial desta
                        Mesa, uma vez que não constava da programação,
                        ouviremos o pronunciamento do cacique Celestino Xavante.
                        Depois, teremos um rápido informe das onze conferências
                        estaduais de direitos humanos, aqui representadas por
                        Aloísio Matias, da conferência do Rio Grande do Norte;
                        Pedro Montenegro, de Alagoas; Valéria Getúlio Brito,
                        do Distrito Federal; Oscar Gatica, da Paraíba; Roseana
                        Pereira, do Ceará; deputado João Leite, de Minas
                        Gerais; Irene Maria dos Santos, de Goiás; deputado
                        Nelson Pelegrino, da Bahia e Jayme Benvenuto, de
                        Pernambuco. Estes estados realizaram conferências
                        estaduais preparatórias à presente Conferência,
                        produziram contribuições no sentido do Plano Estadual
                        de Direitos Humanos ou da luta dos direitos humanos em
                        cada unidade.
                        
                                                
                         Encerraremos
                        assim a parte da manhã. Certamente essas indicações
                        serão muito importantes para os trabalhos de grupo com
                        que vamos retomar às 14h30min.
                        
                                                
                        
                        
                                                
                        Com a palavra o Dr. Jayme.
                        
                                                
                        O SR. JAYME BENVENUTO - Bom-dia a todos. Sr. Presidente da Mesa, a
                        quem saúdo, bem como a todos os demais integrantes da
                        Mesa. Senhoras e senhores, o Movimento Nacional de
                        Direitos Humanos tem procurado priorizar, ou melhor,
                        monitorar o Programa Nacional dos Direitos Humanos,
                        justamente por acreditar que se trata de 
                        uma medida extremamente positiva que foi tomada
                        pelo Governo Federal, obviamente com a participação da
                        sociedade civil. Consideramos que o Programa Nacional de
                        Direitos Humanos, lançado exatamente há um ano pelo
                        presidente da República, representa, sem nenhuma sombra
                        de dúvidas, um grande avanço para o Brasil, seja por
                        conter uma série de propostas há muito reclamadas por
                        centenas de organismos nacionais e internacionais de
                        proteção aos direitos humanos, seja em função do
                        processo amplamente participativo de sua elaboração. O
                        Programa Nacional de Direitos Humanos é uma conquista,
                        antes de tudo, da sociedade brasileira. É dela, mais do
                        que de qualquer outro ente social, 
                        a titularidade do direito de fazer valer o
                        programa na prática.
                        
                                                
                        Com base nesta titularidade, o Movimento Nacional
                        de Direitos Humanos, na qualidade de representante de
                        parcela significativa da sociedade brasileira - são 
                        ao todo cerca de 350 Centros de Promoção e
                        Defesa dos Direitos Humanos articulados ou filiados ao
                        movimento -  reputa
                        importante fazer algumas considerações em torno do
                        Programa.
                        
                                                
                        As considerações, obviamente, têm o objetivo
                        de contribuir para a concretização do Programa no mais
                        rápido espaço de tempo. O principal aspecto positivo
                        do Programa é precisamente a sua existência, a qual
                        vem  proporcionando,
                        em todo o País, a discussão em torno de uma série de
                        problemas e alternativas relacionadas aos direitos
                        humanos. Efetivamente, nunca se viu na história do País
                        uma discussão tão ampla e séria sobre os direitos
                        humanos com vistas à busca de soluções.
                        
                                                
                        Ainda que fiquemos na qualidade de representantes
                        de direitos humanos, esperando melhores respostas em
                        torno desse tema, não podemos deixar de reconhecer que
                        várias  propostas 
                        já foram ou estão sendo implementadas. É o que
                        acontece em termos, apenas exemplificativos, em relação
                        às seguintes propostas: 
                        atribuição por lei  à Justiça Federal de competência para julgar os crimes
                        contra os direitos humanos, muito embora falte
                        regulamentar o que são crimes contra os direitos
                        humanos; atribuição por lei à Justiça Comum da
                        competência para processar e julgar determinados crimes
                        cometidos por policiais militares no exercício da função;
                        a estruturação da Divisão de Direitos Humanos na Polícia
                        Federal, a qual já conta com uma delegacia
                        especializada para apuração dos crimes contra os
                        direitos humanos; a multiplicação e manutenção dos
                        Juizados Especiais Cíveis e Criminais em diversos
                        estados; o apoio à criação, 
                        nos estados,  de programas de proteção a vítimas e testemunhas de
                        crimes, através de ações desenvolvidas mediante convênio
                        estabelecido entre o Ministério da Justiça e o GAJOP,
                        filiado ao Movimento Nacional de Direitos Humanos que,
                        numa primeira fase, alcança cinco Estados: Ceará, Rio
                        Grande do Norte, Espírito Santo, Rio de Janeiro e
                        Bahia. Citamos também a aprovação do projeto de lei
                        que tipifica o crime de tortura, assim como 
                        o incentivo ao funcionamento nos estados e municípios
                        de vários serviços destinados a dotar os cidadãos dos
                        documentos fundamentais da cidadania; entre outras
                        propostas que, para não me alongar, não vou mencionar.
                        
                                                
                        Ao lado dos avanços colocados, alguns limites de
                        conteúdo podem ser atribuídos ao Programa. O primeiro
                        refere-se à quase absoluta desconsideração dos
                        direitos econômicos, sociais e culturais, os chamados
                        direitos de segunda geração (de acordo com a
                        classificação de direitos humanos em três gerações
                        relacionadas às etapas de reconhecimento ao longo da
                        história).
                        
                                                
                        O Programa Nacional de Direitos Humanos, ao
                        sistematizar as propostas elaboradas pela sociedade,
                        priorizou apenas os direitos civis e políticos, ou os
                        chamados direitos de primeira geração, uma vez que
                        foram reconhecidos primeiramente na história da
                        humanidade. Tal priorização fere inteiramente o princípio
                        da indivisibilidade dos direitos humanos, aprovado com a
                        participação ativa do Governo brasileiro na Segunda
                        Conferência Mundial dos Direitos Humanos, ocorrida em
                        Viena, em 1993.
                        
                                                
                        O princípio da indivisibilidade dos direitos
                        humanos quer significar que os direitos humanos não são
                        passíveis de hierarquização e de divisão.
                        
                                                
                        A classificação dos direitos humanos em três
                        gerações tem importância, portanto, meramente metodológica,
                        na medida em que resgata o seu processo de construção
                        histórica, não implicando em se atribuir maior ou
                        menor importância a quaisquer das gerações desses
                        direitos.
                        
                                                
                        Por trás de tal princípio, está a concepção
                        de que inexiste a possibilidade de vigência real de
                        direitos civis e políticos sem que vigorem também os
                        direitos econômicos, sociais e culturais e vice-versa.
                        
                                                
                        Em outros termos, o direito ao desenvolvimento, tão
                        buscado pela sociedade brasileira, impõe a vigência,
                        igualmente, de direitos de primeira e de segunda geração.
                        Do ponto de vista social, é injustificável que os
                        direitos econômicos e sociais estejam de fora de um 
                        programa que busca responder às principais violações
                        dos direitos humanos no Brasil.
                        
                                                
                        A situação da educação, da saúde, do
                        trabalho e da terra, urbana e rural, entre outras questões,
                        tem no Brasil contemporâneo a mesma carga dramática
                        das violências físicas cometidas pelas polícias
                        brasileiras, para citar um dos graves problemas
                        relacionados ao exercício dos direitos civis e políticos.
                        Exemplo gritante é o dos trabalhadores sem terra,
                        alijados do processo de desenvolvimento, em função de
                        uma estrutura de poder excludente, que vemos se
                        perpetuar às vésperas do século XXI. Para esse grande
                        contingente de populações vulneráveis a violências
                        centenárias, o PNDH não conseguiu ainda dar respostas
                        ainda que apenas  programáticas.
                        
                                                
                        Do ponto de vista jurídico-positivo, o Programa
                        Nacional de Direitos Humanos desconsiderou uma série de
                        dispositivos constitucionais que especificam a importância
                        dos direitos econômicos, sociais e culturais, a começar
                        pelo preâmbulo da Constituição Federal, que
                        estabelece a instituição de um Estado democrático, 
                        destinado a assegurar o exercício dos direitos
                        sociais e individuais à liberdade, à segurança, ao
                        bem-estar, ao desenvolvimento, à igualdade e à justiça
                        como valores supremos. Numa clara referência
                        consideramos a indivisibilidade dos direitos humanos. O
                        art. 3º, inciso III, da Constituição Federal, por sua
                        vez, estabelece a erradicação da pobreza e da
                        marginalização e a redução das desigualdades sociais
                        e regionais como um dos objetivos fundamentais da República
                        Federativa do Brasil. Como fazê-lo, perguntamos, a não
                        ser dando atenção especial para os direitos econômicos,
                        sociais e culturais?
                        
                                                
                        Um outro limite do Programa Nacional de Direitos
                        Humanos está relacionado aos mecanismos para o seu
                        monitoramento. Embora o Programa tenha previsto duas
                        formas de monitoração, de competência respectivamente
                        dos estados-membros e do Ministério da Justiça, tais
                        mecanismos ainda não conseguiram se converter em
                        instrumentos eficazes para a exigibilidade das
                        propostas. Em função da precariedade de funcionamento
                        desses mecanismos, muitas das propostas de curto prazo
                        do Programa ainda não se converteram em realidade.
                        
                                                
                        Entre as 62 propostas de competência federal,
                        destacamos as seguintes, que ainda carecem de existência
                        prática:  a
                        criação do cadastro federal de inadimplentes sociais,
                        visando ao incentivo do respeito aos direitos humanos
                        por parte dos estados e municípios; a criação dos
                        sistemas integrados de controle de armamentos e munições,
                        em parceria com os governos estaduais; o apoio, no
                        contexto da reforma do Estado, 
                        à proposta de modernização do Poder Judiciário;
                        o repasse de recursos do Fundo Penitenciário Nacional
                        aos estados, destinado a proporcionar melhorias no
                        sistema penitenciário dos estados, entre outras
                        propostas. Maior, no entanto, é a quantidade de
                        propostas que dependem de propositura ou de aprovação
                        por parte do Poder Legislativo Federal para serem
                        concretizadas. Esse fato demonstra que o Congresso
                        Nacional ainda não conseguiu incorporar na sua prática
                        a necessidade de viabilizar as propostas do Programa
                        Nacional de Direitos Humanos. 
                        
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                        p class="BodyText" style="text-align:justify;tab-stops:120.65pt 156.65pt 192.65pt 228.65pt 264.65pt 300.65pt 336.65pt 372.65pt 408.65pt 444.65pt">                       
                        Destacamos a seguir algumas dessas propostas: 
                        revisão da legislação regulamentadora dos
                        serviços privados de segurança; criação do Conselho
                        Nacional de Justiça, 
                        com a função de fiscalizar as atividades do
                        Poder Judiciário;  
                        reforma do Poder Judiciário; 
                        incentivos fiscais, creditícios e outros às
                        empresas que empreguem egressos dos sistemas penitenciários;
                        proibição de  todo
                        tipo de discriminação com base em origem, raça,
                        etnia, sexo, idade, credo religioso, convicção política,
                        ou orientação sexual; alteração 
                        da legislação penal para incentivar ações com
                        o objetivo de eliminar o trabalho infantil e punir a sua
                        exploração; tipificar o crime de exploração sexual
                        infanto-juvenil; regulamentar o art. 7º, inciso XX, da
                        Constituição Federal, que prevê a proteção do
                        mercado de trabalho da mulher através de incentivos
                        específicos; revogar as normas discriminatórias ainda
                        existentes contra a mulher, o índio e o negro; rever o
                        Estatuto do Índio; propor e aprovar o Estatuto do
                        Refugiado; reformular a Lei dos Estrangeiros e 
                        ratificar os atos internacionais, assinados pelo
                        Brasil, identificados no Programa Nacional de Direitos
                        Humanos.
                        
                                                
                        Entre as 47 propostas de competência exclusiva
                        dos estados, destacamos a seguir as que são mais
                        importantes e que ainda não foram concretizadas, com
                        raras exceções:  a
                        elaboração dos mapas da violência rural e urbana,
                        essenciais para a definição das políticas estaduais
                        de segurança pública e controle da criminalidade; a
                        elaboração de planos estaduais de direitos humanos,
                        estabelecendo prioridades a serem enfrentadas; o
                        estabelecimento de critérios para seleção, 
                        admissão, capacitação, 
                        treinamento e reciclagem de policiais; 
                        o afastamento do serviço 
                        dos policiais acusados de violência contra os
                        cidadãos; a criação de ouvidorias de polícia, com
                        representantes da sociedade civil, à exceção dos
                        Estados de São Paulo, Ceará e Pará, 
                        que já o fizeram; 
                        implementação de seguros de vida e de saúde
                        para policiais; criação de sistemas de proteção
                        especial às famílias dos policiais ameaçados em razão
                        de suas atividades; estabelecimento de programas de
                        cooperação e entrosamento entre as polícias civil e
                        militar e o Ministério Público. 
                        Isso também para ficar apenas nas principais
                        propostas que não foram implementadas pelos Estados.
                        
                                                
                        Entre as poucas propostas de competência dos
                        Estados que foram cumpridas, a maioria já havia sido
                        cumprida, antes mesmo do Programa Nacional de Direitos
                        Humanos ter sido lançado pelo Presidente da República.
                        É o caso, por exemplo, da criação de Conselhos de
                        Defesa de Direitos da Criança e do Adolescente, da criação
                        de Comissões de Direitos Humanos nas Câmaras
                        Municipais e nas Assembléias Legislativas, entre
                        outras.
                        
                                                
                        A propósito da dificuldade de estabelecer o
                        monitoramento do Programa, em termos gerais, a
                        responsabilidade pela presente situação deve ser
                        compartilhada entre todos os poderes públicos, 
                        nos níveis federal, estadual e municipal, que
                        demonstraram pouca sintonia para fazer valer as
                        propostas, articuladamente; destacando-se aí o Poder
                        Legislativo, responsável pelas propostas de alteração
                        legislativa, e as representações da sociedade, que não
                        vêm se mostrando capazes de exercer influência
                        decisiva para a adoção das propostas por parte dos 
                        poderes públicos, especialmente das que requerem
                        mudanças legislativas.
                        
                                                
                        A este respeito, o Movimento Nacional de Direitos
                        Humanos incluiu o acompanhamento dos projetos de lei em
                        tramitação no Congresso Nacional entre suas ações
                        prioritárias para os próximos anos. Em torno do Poder
                        Legislativo, deverá ser exercida doravante, sistemática
                        e forte pressão com vista à adoção, no prazo mais
                        curto possível,  dos
                        mecanismos democratizantes que constam 
                        do Programa Nacional de Direitos Humanos.
                        
                                                
                        Com vista a auxiliar no monitoramento do Programa
                        e, conseqüentemente, aumentar as possibilidades de
                        convertê-lo em realidade no prazo mais curto possível,
                        o Movimento Nacional de Direitos Humanos propõe o que
                        se segue:  primeiro,
                        a constituição de um grupo ou comissão formado por
                        entidades governamentais e não-governamentais,
                        vinculado ao Ministério da Justiça, destinado a
                        monitorar permanentemente o Programa Nacional de
                        Direitos Humanos. O referido grupo teria a competência
                        de detalhar as propostas previstas no Programa,
                        inclusive através da elaboração de projetos de lei a
                        serem encaminhados ao Congresso Nacional. Além disso,
                        seria responsável pela elaboração de 
                        relatórios semestrais em torno da situação dos
                        direitos humanos no País e dos esforços desenvolvidos
                        para a implementação do Programa. Por fim, realizaria  audiências públicas periódicas com a convocação de
                        autoridades federais e estaduais e a presença 
                        de representantes da sociedade civil, sempre que
                        for necessário o esclarecimento de situações
                        relacionadas a violações dos direitos humanos e a 
                        medidas de cumprimento do Programa Nacional de
                        Direitos Humanos.
                        
                                                
                         A
                        segunda proposta é a de se constituir 
                        um  organismo
                        estatal, na estrutura do Poder Legislativo, destinado a
                        implementar as deliberações do Brasil a nível
                        internacional (de modo a evitar o descumprimento dos
                        pactos, tratados e convenções, nos termos até então
                        vistos) e acompanhar a execução do Programa Nacional
                        dos Direitos Humanos no que se refere às propostas que
                        exigem alteração legislativa. Esta instância deve
                        cuidar ainda de compatibilizar as mudanças legislativas
                        com o Orçamento da União, de modo a possibilitar a
                        concretização das propostas aprovadas.
                        
                                                
                         Terceira
                        proposta: convocação, pelo Governo Federal, dos
                        governos estaduais e municipais, pelo menos os mais
                        importantes, com a finalidade de tratar da situação
                        dos direitos humanos no País e incentivá-los a adotar
                        as propostas constantes do Programa Nacional de Direitos
                        Humanos. Como resultado dessa convocação, deve ser
                        firmado um grande compromisso nacional para a superação
                        dos impasses vistos na área dos direitos humanos.
                        
                                                
                        Quarta: realização de conferências temáticas
                        de direitos humanos nacionais e estaduais, tendo em
                        vista a necessidade de impulsionar a implementação do
                        Programa Nacional de Direitos Humanos, mediante a
                        especialização das discussões e de suas conseqüentes
                        soluções.
                        
                                                
                        Quinta: em nível internacional, consoante a
                        Constituição Brasileira, que manda que as relações
                        com os outros países se estabeleçam com a prevalência
                        dos direitos humanos, sugerimos que o Brasil preste
                        solidariedade a países que se encontram em sérias
                        dificuldades, a exemplo de Ruanda, Timor-Leste e  Bósnia.
                        
                                                
                        A  sexta
                        e última proposta 
                        seria a adoção imediata pelo Brasil da jurisdição
                        da Corte Interamericana de Direitos Humanos - 
                        destinada a julgar violações aos direitos
                        humanos pelos países signatários da Convenção
                        Americana de Direitos Humanos - 
                        como forma de incrementar a observância de
                        direitos humanos internamente.
                        
                         Diante
                        da clareza que temos, na qualidade de representantes de
                        parcelas da sociedade civil organizada, de que também
                        é  nosso
                        papel impulsionar o cumprimento das propostas constantes
                        do Programa Nacional de Direitos Humanos, com o que nos
                        somamos aos esforços desenvolvidos pelo Governo
                        Federal, colocamo-nos à disposição, para contribuir
                        no que estiver ao alcance do Movimento Nacional dos
                        Direitos Humanos, especialmente na elaboração de
                        ajustes ao Programa e na implementação das propostas
                        no sentido da democratização do nosso País.
                        
                                                
                        Muito obrigado. 
                        
                          
                        
                                                
                        O SR. PRESIDENTE (deputado Pedro Wilson) - Com a palavra o Dr. Paulo
                        Sérgio Pinheiro para 
                        complementar a sua exposição.
                        
                          
                        
                                                
                        O SR. PAULO SÉRGIO PINHEIRO - Sr. Presidente, esqueci-me de dizer
                        que o que falei de uma forma mais completa está num  texto que eu e o professor Paulo Mesquita Neto estamos
                        apresentando aqui na reunião sobre o Programa Nacional
                        de Direitos Humanos: 
                        avaliação do primeiro ano e perspectivas. Este
                        texto está sendo copiado pela secretaria do encontro, e
                        espero que V.Exªs. tenham acesso a ele. Com relação
                        à questão da implementação, V.Exªs. verão nesse
                        texto que há uma grande confluência com o que foi
                        comentado pelos meus dois amigos. Queria apenas dizer ao
                        presidente que vou comunicar ao Dr. José 
                        Gregori que o núcleo só poderá funcionar de
                        maneira adequada se o Movimento Nacional de Direitos
                        Humanos estiver presente.
                        
                                                
                        Muito obrigado. 
                        
                          
                        
                                                
                        O SR. PRESIDENTE (deputado Pedro Wilson) - Passamos a palavra ao
                        cacique Celestino Xavante, que fará a sua exposição. 
                        
                                                
                        Logo depois, vamos desfazer esta Mesa e convidar
                        os relatores das conferências estaduais para fazer a última
                        comunicação na parte da manhã, o que é muito
                        importante para os trabalhos em grupo. Peço, desde
                        agora, ao Dr. Paulo Sérgio Pinheiro, ao deputado Nilmário
                        Miranda e ao Dr. Jaime Benvenuto que acompanhem, se possível,
                        na parte da tarde, os diferentes grupos, no sentido da
                        avaliação,  porque
                        queremos dar a ela a maior objetividade possível.
                        
                                                
                        Com a palavra o cacique Celestino Xavante.
                        
                          
                        
                                                
                        O SR. CELESTINO XAVANTE -  (Pronunciado
                        em língua Xavante e traduzido, simultaneamente, por
                        Jeremias Xavante) Sr. Presidente, Srs. deputados, V.Exªs.
                        sabem que não é desde hoje que estamos presenciando o
                        problema do índio.  Há 500 anos que o homem branco chegou nestas tão amadas
                        terras brasileiras, tão respeitadas pelos nossos pais,
                        pelos nossos antepassados. Atualmente essas terras estão
                        sendo devastadas, o meio ambiente está sendo destruído,
                        e com ele as nações indígenas, verdadeiros guardiões
                        da natureza. Então, gostaria de conscientizar não só
                        as autoridades que estão aqui presentes, mas também
                        toda a sociedade para o fato de que muitas vezes
                        escutamos que muitas pessoas estão preocupadas com os
                        direitos humanos. É verdade, mas os índios são os
                        maiores prejudicados nessa história. Será que as
                        mortes anteriores, não só a do índio Galdino Jesus
                        dos Santos, foram punidas? Será que se fez justiça?
                        Estamos muito céticos com relação a isso. Sabemos que
                        os assassinos do Galdino, através de informações que
                        temos, vão ser soltos, vão responder ao processo em
                        liberdade. O que é isso, autoridades? O que é isso
                        senhores presentes ? Será que a impunidade mais uma vez
                        vai reinar? Vamos pensar seriamente a respeito disso.
                        Estamos realmente céticos e, por isso, apresento os líderes
                        que estão presentes aqui. Quero dizer para V.Exªs. que
                        eles são verdadeiros líderes. Quando eles vêm aqui,
                        quem os desrespeita primeiramente é o nosso órgão
                        tutor, a FUNAI. Aquela Fundação nunca recebeu os
                        nossos líderes que vêm aqui em busca de soluções e
                        para expor os seus problemas perante as autoridades.
                        Eles são ignorados, são jogados à própria sorte nas
                        pensões, onde há muita sujeira. Será que isso são
                        direitos humanos? Será que isso é respeitar um ao
                        outro? Acho que não. Então, gostaria de apresentar os
                        nossos líderes que estão aqui presentes: (apresentação
                        de lideranças indígenas).
                        
                                                
                         Baseados
                        na nossa concepção, queremos, primeiramente, que a
                        sociedade, de um modo geral, comece a respeitar-nos.
                        Queremos mudanças na FUNAI, queremos tirar o presidente
                        atual, que está desrespeitando o índio, efetuando prisões
                        e batendo no índio. Em pleno dia 19 de abril, na
                        capital do Brasil, fomos agredidos física, moral e
                        culturalmente. Os nossos guerreiros foram
                        desrespeitados, humilhados na Polícia Federal. Estamos
                        aproveitando essa oportunidade para dizer a V.Exªs. que
                        o Presidente da FUNAI está desrespeitando as nossas
                        autoridades. Respeitamos as autoridades de V.Exªs.,
                        deputados, senadores, e o próprio FHC respeitamos até
                        o momento. O presidente Fernando Henrique Cardoso ainda
                        não demonstrou interesse em discutir diretamente com as
                        sociedades indígenas o Estatuto do Índio, o problema
                        dos índios. Então, gostaríamos de conversar
                        diretamente com S.Exª. Assim como S.Exª. está
                        recebendo várias camadas da sociedade, —  já recebeu o MST, meninos de rua e as ONGs — por que não
                        receber o índio? Por que S.Exª. está evitando o índio?
                        Somos seres humanos, pensamos, estamos preocupados com o
                        nosso meio ambiente, com o Planeta Terra, e queremos
                        demonstrar isso. Queremos o apoio de V.Exªs. nesse
                        sentido. Sr. Presidente, queremos conversar com FHC,
                        porque o ministro que está aí interinamente não quer
                        conversar conosco, ele não quer receber os índios. Então,
                        peço a S.Exª., o presidente da República, que nos
                        receba imediatamente para sentarmos e discutirmos os
                        nossos problemas democraticamente, porque atualmente a
                        FUNAI é antidemocrática. As portas estão fechadas. 
                        
                                                
                        Aproveito a oportunidade para dizer a V.Exªs.
                        que a situação está insuportável. Estão dizendo que
                        um grupo está pedindo a saída do atual presidente. Não
                        só um grupo, mas todas as nações indígenas enviaram
                        um fax para falarmos, em nome delas também, sobre essa
                        questão. Então, a informação de que só um grupo está
                        querendo mudanças na FUNAI não é verdadeira. Todas as
                        nações indígenas estão querendo mudanças imediatas,
                        como a reestruturação da FUNAI, conforme pensam as
                        nossas lideranças e as nações indígenas, porque
                        todos nós estamos preocupados com o nosso órgão
                        tutor. Queremos resgatar a sua credibilidade, porque ele
                        atualmente está muito desacreditado, não só perante a
                        opinião pública nacional, mas perante a opinião
                        internacional também. E nós queremos as mudanças
                        dessa forma. 
                        
                                                
                        O cacique está falando isso porque estão
                        faltando projetos, estão faltando remédios para nós,
                        porque não fomos nós que levamos as doenças para as
                        nossas comunidades; as doenças foram introduzidas lá.
                        Os nossos curandeiros não estão conseguindo curar,
                        porque são doenças trazidas de longe, e isso está nos
                        prejudicando. É isso que ele está dizendo para todos
                        vocês, para que, neste momento, nós, conjuntamente,
                        conversemos com FHC para as mudanças imediatas na
                        FUNAI. 
                        
                                                
                        É isso.
                        
                          
                        
                                                
                        O SR. PRESIDENTE (deputado Pedro Wilson) - Agradecemos as palavras
                        do cacique Celestino Xavante, traduzidas pelo Jeremias. 
                        Gostaríamos de registrar a presença do vereador
                        Luiz Carlos Bassuna, do PT, presidente da Comissão de
                        Direitos Humanos da Câmara Municipal de Salvador,
                        Bahia; também da vereadora Nilza, da Comissão de
                        Direitos Humanos de Barreiras; da Ângela, do Serviço
                        Paz e Justiça, o SERPAJ. 
                        
                                                
                        Neste instante, desfazemos esta Mesa e convidamos
                        para tomar assento à Mesa os representantes das Conferências
                        Estaduais de Direitos Humanos. Começando por Aluízio
                        Matias, representante da Conferência Estadual de
                        Direitos Humanos do Rio Grande do Norte; Pedro
                        Montenegro, de Alagoas; Valéria Getúlio Britto e
                        Silva, do Distrito Federal; Oscar Gatica, da Paraíba;
                        Roseana Pereira, do Ceará; deputado João Leite, de
                        Minas Gerais; Sra. Maria Irene Pereira, de Goiás;
                        deputado Nelson Pelegrino, da Bahia, Salvador; Jayme
                        Benvenuto, de Pernambuco, e o jornalista Dermi Azevedo,
                        da Conferência do Estado de São Paulo.
                        
                         Na
                        área habitacional, em que pesem também as iniciativas
                        já em curso no Distrito Federal, percebe-se necessário
                        enfrentar adequadamente a situação, desenvolvendo políticas
                        públicas que considerem sobretudo as circunstâncias
                        que levaram segmentos desfavorecidos da população a
                        ocupar áreas públicas. A abordagem do problema, em hipótese
                        alguma, deve contemplar a utilização da força e da ação
                        violenta.
                        
                                                
                        Na área de educação para os direitos humanos e
                        cidadania, torna-se necessária a viabilização de uma
                        política educacional voltada para a formação humana.
                        
                                                
                        E assim por diante, nosso relatório avalia cada
                        área.
                        
                                                
                        Vamos distribuir esse documento a todos. As
                        entidades e organizações que coordenaram a I Conferência
                        do Distrito Federal foram o Conselho Distrital de Defesa
                        dos Direitos da Pessoa Humana, a Comissão de Direitos
                        Humanos da Ordem dos Advogados do Distrito Federal, a
                        Comissão de Direitos Humanos da Câmara Legislativa do
                        Distrito Federal, o Movimento Nacional dos Direitos
                        Humanos, o INESC, o Sindicato dos Jornalistas, o Centro
                        Ecumênico de Estudos Bíblicos, o Centro Cultural, e
                        outros.
                        
                                                
                        Muito obrigada.
                        
                          
                        
                                                
                         O SR. PRESIDENTE
                        (deputado Pedro Wilson) - 
                        Agradecemos à Valéria, e antes de passar a
                        palavra para o Oscar Gatica, da Paraíba, anunciamos
                        mais algumas presenças.
                        
                                                
                        Registro a presença de Maria Nazaré Pereira, da
                        STAS de Pernambuco; Lígia Guimarães Mesquita, da
                        Secretaria do Trabalho e Ação Social do Estado de
                        Pernambuco; Margareth Nicolau, da Secretaria da Criança
                        e do Adolescente do Distrito Federal; Maria de Lourdes
                        Brito, da Secretaria da Criança e Assistência Social
                        do Distrito Federal; Djalma Lopes de Souza, da
                        Secretaria de Justiça e Segurança do Maranhão;
                        Alberto Petrônio Carvalho, da Secretaria de Segurança
                        do Amazonas; Roseli de Souza Correa, da Secretaria de
                        Segurança Pública do Amazonas; Alexandre Tavares, da
                        Secretaria de Segurança Pública de Pernambuco; Flávio
                        Henriques, da  Secretaria
                        do Interior, Justiça e Cidadania do 
                        Rio Grande do Norte; Achiles Gonçalves Ferraz,
                        da Secretaria de Justiça e Segurança Pública; Ício
                        Brasil, da Secretaria de Justiça e Segurança Pública  do Rio Grande do Sul; Francisco Dagmar, da Secretaria de
                        Justiça do Rio Grande do Norte; delegado Hélio Luz,
                        chefe da Polícia Civil do Rio de Janeiro, aqui
                        representando o secretário de Segurança Pública do
                        Rio de Janeiro; Ademar Oliveira, da Secretaria de
                        Segurança Pública do Amapá; Perly Cipriano, que está
                        aqui na mesa, secretário de Justiça do Espírito
                        Santo; Erli dos Anjos, também da Secretaria de Justiça
                        do Espírito Santo; Mário Pedro, da Secretaria de
                        Fiscalização do Trabalho; Carlos Eduardo, da
                        Secretaria de Segurança e Cidadania; Ana Maria Macedo,
                        da Secretaria de Justiça e Cidadania do Paraná; e Adão
                        Rosa, secretário de Segurança Pública do Espírito
                        Santo.
                        
                                                
                        Passamos a palavra ao Oscar Gatica, aqui
                        representando a Conferência de Direitos Humanos do
                        Estado da Paraíba.
                        
                          
                        
                                                
                        O SR. OSCAR GATICA - Sr.
                        Presidente da Mesa, demais membros, Sras. e Srs., a
                        Conferência Estadual do Estado da Paraíba, 
                        realizada dia 9 de maio do corrente ano, no
                        Centro de Ensino da Escola da Polícia Militar da Paraíba,
                        com a participação de onze órgãos públicos e vinte
                        e três entidades da sociedade civil, 
                        foi promovida pelo Conselho Estadual de Defesa
                        dos Direitos do Homem e do Cidadão e pelo Movimento
                        Nacional de Direitos Humanos da Universidade Federal da
                        Paraíba. 
                        
                                                
                        Em primeiro lugar, considero o Programa Nacional
                        de Direitos Humanos, a principal iniciativa do Governo
                        Federal com relação à temática — em todos os
                        tempos não se tem conhecimento de uma iniciativa igual
                        na história brasileira — e o compromisso desta Conferência
                        é com a implantação, o monitoramento e 
                        tudo o mais 
                        que for necessário para que este Programa
                        Nacional de Direitos Humanos se transforme em 
                        realidade  no 
                        Brasil. 
                        
                                                
                        Observem que, como foi manifestado nas 
                        conferências estaduais, há um desconhecimento
                        geral por parte dos órgãos públicos e também das
                        entidades da sociedade civil com relação ao Programa.
                        Há necessidade de divulgá-lo mais, bem como os seus 
                        compromissos; e a responsabilidade monitorá-lo
                        é da sociedade civil. 
                        
                                                
                        Também entende a Conferência da Paraíba que o
                        Programa só se transformará numa realidade se a
                        sociedade civil  participar
                        da sua implantação e de todos os órgãos de execução,
                        sobretudo no âmbito estadual e municipal.
                        
                                                
                        Não vamos aqui abordar todas as avaliações,
                        porque o tempo não permitiria, mas afirmamos que o mais
                        importante, em nosso ponto de vista, 
                        é a ausência de mecanismos de monitoramento e
                        de implantação do Programa, assim como a questão do
                        compromisso dos estados e 
                        municípios para com ele. 
                        
                                                
                        Nesse sentido, gostaríamos de apresentar uma
                        proposta no sentido de  que o Governo Federal, o próprio presidente da República,
                        convoque os governadores dos estados a um compromisso de
                        adesão ao Programa, de forma a facilitar o diálogo com
                        as entidades da sociedade civil. 
                        
                                                
                        Vamos apresentar e discutir as demais propostas
                        no grupo.
                        
                                                
                        Obrigado. 
                        
                          
                        
                                                
                        O SR. PRESIDENTE (deputado Pedro Wilson) -  Obrigado, Oscar.
                        Passaremos a palavra, então, para Roseana Pereira, do
                        Ceará.
                        
                          
                        
                                                
                         A SRA. ROSEANA PEREIRA
                        - Boa tarde. Já é uma da tarde e eu só tenho vontade
                        de dizer que foi ótimo, porque temos 
                        tão pouco tempo e já estamos atrasados na
                        programação.
                        
                                                
                         No
                        Estado do Ceará realizamos a I Conferência Estadual no
                        dia 8 de maio, no Seminário da Prainha, e como disse na
                        ocasião o  nosso
                        deputado, presidente da Comissão de Direitos Humanos, Mário
                        Mamede, foi um momento ímpar para o estado. Foi um dos
                        maiores acontecimentos de direitos humanos que já
                        ocorreu no Ceará. Estavam presentes todos os segmentos
                        da sociedade civil que dizem respeito à questão dos
                        direitos humanos. Quero apenas lamentar a ausência do
                        MST e da CPT. Na parte dos órgãos públicos também
                        todos estiveram presentes. Quem não esteve presente
                        mandou representação. Foi um momento muito produtivo
                        com os grupos específicos de trabalho — crianças,
                        mulheres, negros, índios, homossexuais, sistema
                        penitenciário, questão da terra, justiça e segurança,
                        portadores de deficiência —, todos eles muito ricos
                        em propostas muito voltadas para o estado, para o município,
                        o que nos levou a pensar em dar continuidade a essa
                        Conferência para a confecção do Programa Estadual de
                        Direitos Humanos. Saiu essa proposta e nós vamos
                        caminhar para isso.
                        
                                                
                        Em segundo lugar, queria também dizer que tendo
                        em vista o desconhecimento do Programa Nacional dos
                        Direitos Humanos, identificado na Conferência (um
                        problema que já vínhamos sentindo), a Comissão de
                        Direitos Humanos e Cidadania da Assembléia Legislativa
                        do Ceará fez imprimir uma edição de bolso do
                        Programa, para que todo cidadão tenha acesso a ele no
                        seu bolso, na sua camisa. E ele vai ser distribuído
                        agora em todas as comunidades, grupos organizados,
                        setores públicos do estado, para democratizar essas
                        informações e as propostas que ali estão.
                        
                                                
                        Não constatamos também qualquer forma de
                        implementação do Programa e de monitoramento, nem no
                        estado, nem em âmbito nacional. Nós também sentimos
                        esta falta e é muito complicado fazer uma avaliação
                        do Programa quando não há, não foi estabelecido e não
                        funcionam as formas de implementação e monitoramento.
                        Outra coisa que gostaríamos de abordar: 
                        é preciso, nas propostas, reforçar os capítulos
                        referentes à conscientização e mobilização pelos
                        direitos humanos que estão no Programa Nacional, o que
                        seria uma forma, não só de divulgá-lo como também 
                        de enfrentar 
                        a visão preconceituosa que a maioria do pessoal
                        das periferias, das favelas e  do interior tem em relação aos direitos. 
                        
                                                
                        Por fim, a Conferência aconteceu 
                        num momento extremamente complicado, num momento
                        conjuntural específico do Estado do Ceará, configurado
                        pelas denúncias sobre violência policial e corrupção,
                        e nós nos deparamos com o encerramento das investigações
                        da Comissão Especial que tinha sido constituída no
                        Estado do Ceará para apurar tais denúncias.
                        
                                                
                        No dia da Conferência, o governador dava os
                        trabalhos da Comissão por encerrados, satisfeito com as
                        investigações. Mas nós não, porque mais denúncias
                        estão chegando, denúncias feitas inclusive durante a
                        Conferência, que manifestou em moção o nosso repúdio
                        pelo encerramento da Comissão, uma vez que os fatos não
                        foram devidamente investigados. Outra questão  
                        é que no Estado do Ceará começa a ser
                        implementado o Programa Nacional dos Direitos Humanos,
                        em vista de uma forte pressão 
                        das entidades da sociedade civil. 
                        
                                                
                        Tendo em vista o grande número 
                        denúncias de violência e corrupção, o
                        governador enviou uma mensagem à Assembléia
                        Legislativa instituindo cinco pontos do Programa
                        Nacional do Direitos Humanos, entre eles o Conselho
                        Estadual de Direitos Humanos. Isso para nós foi um avanço.
                        Mas, ao mesmo tempo, temos uma crítica: esta 
                        providência aconteceu em face de 
                        um problema sério de violação de direitos
                        humanos. As denúncias ocorreram agora, quer dizer, o
                        Governador não tinha tomado pé dessas coisas, não
                        tinha ainda se dado conta de que existia um Programa
                        Nacional de Direitos Humanos. Só diante das denúncias
                        e pressionado pela sociedade, ele fez isso. Pela
                        apresentação do deputado Nilmário Miranda, notamos
                        que todas as medidas que foram implementadas, as poucas,
                        sempre aconteceram após 
                        um massacre. É preciso que morra gente, é
                        preciso que aconteçam graves violações para que  o Programa  seja
                        implementado. 
                        
                                                
                        Isto é um absurdo. E lá no Estado do Ceará foi
                        preciso haver denúncia, aquele negócio todinho
                        estampado, para que o governador tomasse providências.
                        
                                                
                        Por último, queríamos expressar nossa indignação.
                        Foi criada a Ouvidoria-Geral do Estado do Ceará,
                        contudo, o Ouvidor é uma escolha direta do governador
                        e, ao mesmo tempo, a Presidência do Conselho Estadual
                        dos Direitos Humanos está vinculada a ele. Para nós,
                        isso é um retrocesso na luta pelos direitos humanos. 
                        
                                                
                        As propostas detalhadas da Conferência já estão
                        aqui; o relatório nós vamos reproduzir para servir de
                        subsídio aos grupos. 
                        
                                                
                        Muito obrigada.
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                        O SR. PRESIDENTE (deputado Pedro Wilson) - Muito obrigado, Roseana.
                        Antes de passar a palavra ao deputado João Leite, de
                        Minas Gerais, quero registrar as presenças da deputada
                        estadual Fátima Bezerra, do PT do Rio Grande do Norte,
                        e da Sra. Helena Greco, do Movimento Tortura Nunca Mais,
                        de Minas Gerais, que parabeniza a todos os participantes
                        da 2ª Conferência.
                        
                                                
                        Deputado João Leite, de Minas Gerais.
                        
                          
                        
                                                
                        O SR DEPUTADO JOÃO LEITE - Boa tarde,  trouxemos a esta Conferência o relatório (que está à
                        disposição em uma das mesas aí fora) do Ciclo de
                        Debates que fizemos 
                        para avaliação do Programa Nacional de Direitos
                        Humanos. 
                        
                                                
                        Para nós foi uma alegria ter um programa para
                        ser avaliado, mas todos que participaram puderam
                        localizar como grande problema a desarticulação do
                        Governo Federal em relação aos governos estaduais, que
                        desconhecem totalmente o Programa, como é o caso de
                        Minas Gerais; o que é um sério problema, já que várias
                        ações previstas no Programa, e a sua implementação,
                        dependem de cada estado. 
                        
                                                
                        Mas eu queria abordar três pontos que foram
                        muito importantes para os participantes (o restante está
                        no relatório). A autonomia da perícia oficial e das
                        corregedorias de polícia foi um ponto colocado como
                        fundamental. Fortalecimento, reconhecimento e
                        descentralização dos conselhos de direitos de todas as
                        áreas — mulher, criança, adolescente — com
                        autonomia financeira, administrativa, bem como incentivo
                        para a sua criação nos locais onde inexistem. 
                        
                                                
                        Aprovação urgente de um novo estatuto para os
                        povos indígenas. Temos oito mil indígenas em Minas
                        Gerais, muitas nações, e por meio da revisão e
                        atualização da Lei n.º 6.001, de 1973, 
                        poderiam ser retirados 
                        do seu texto os vícios do período ditatorial,
                        durante o qual se originou. 
                        
                                                
                        Contamos especialmente com a participação
                        efetiva e atuante das entidades. Em setembro nós
                        teremos em Minas Gerais o Seminário Estadual de
                        Direitos Humanos, no qual queremos tirar bases para o
                        Programa Estadual de Direitos Humanos, e o que nos traz
                        grande esperança é a participação intensa das
                        entidades de Minas Gerais.
                        
                                                
                        Muito obrigado, Sr. Presidente.
                        
                          
                        
                                                
                        O SR. PRESIDENTE (deputado Pedro Wilson) - Obrigado, deputado João
                        Leite, passaremos imediatamente para Irene Maria dos
                        Santos,  representando
                        a Conferência de Goiás.
                        
                          
                        
                                                
                        A SRA. IRENE MARIA DOS SANTOS - Eu não vou dizer boa tarde, porque
                        eu ainda não almocei. É bom dia a todos os presentes e
                        aos companheiros da Mesa.
                        
                                                
                        Realizamos a nossa primeira Conferência Estadual
                        dos Direitos Humanos no Estado de Goiás nos dias 19 e
                        20 de dezembro de 1996. Em relação à avaliação do
                        Programa Nacional dos Direitos Humanos não vou falar,
                        porque é o mesmo de todos os estados. E eu gostaria de
                        deixar registrada a dificuldade que tivemos em realizar
                        a 1ª Conferência no Estado de Goiás. 
                        
                                                
                        Primeiro, por um grande desconhecimento do conteúdo
                        do Programa, não só por parte dos órgãos públicos,
                        mas também dos movimentos e entidades. 
                        Então passamos por todas as dificuldades que já
                        foram referidas pelos representantes de outros estados,
                        mas conseguimos fazer a Conferência, cujo saldo foi
                        muito positivo. 
                        
                                                
                        Avaliamos, após a Conferência, que ela foi um
                        marco fundamental na promoção dos direitos humanos no
                        Estado de Goiás. Sentimos, durante a sua 
                        realização, que, quase completando cinqüenta
                        anos da Declaração Universal dos Direitos Humanos - 
                        mesmo com esse Programa de Direitos Humanos tão
                        falado mas tão desconhecido, criado pelo FHC - 
                        o anseio e a angústia do povo brasileiro, do
                        povo da América Latina apontam ainda para a busca de
                        soluções das questões sociais econômicas e políticas.
                        E, quando terminamos a nossa Conferência, tiramos uma
                        plenária permanente composta por três entidades, com a
                        responsabilidade de encaminhar a discussão de direitos
                        humanos no estado e na região. Estamos tentando, mas não
                        está sendo fácil encaminhar isso. Já marcamos para
                        conversar com o governo, porque o objetivo principal da
                        nossa Conferência é pressionar o governo de Goiás
                        para que efetive o Programa Nacional no âmbito do
                        estado. Fizemos não um relatório, mas um documento que
                        está aqui no stand
                        do Movimento Nacional dos Direitos Humanos, e que 
                        será distribuído entre os participantes. Temos
                        a esperança de que esse documento seja um instrumento
                        capaz de dar os primeiros passos significativos na promoção
                        dos direitos humanos.
                        
                                                
                        E neste momento eu gostaria de ressaltar a
                        participação e contribuição   do Ministério Público e da Polícia Militar de Goiás.
                        
                                                
                        Obrigada.
                        
                          
                        
                                                
                        O SR. PRESIDENTE (deputado Pedro Wilson) - Passamos o microfone ao
                        deputado Nelson Pelegrino, que representa a Conferência
                        da Bahia. Antes, registro a presença de Romeu Fortes,
                        deputado estadual e membro da Comissão de Defesa e
                        Cidadania, da Assembléia Legislativa de Pernambuco;
                        vereador Nílson Peixoto, da Comissão de Direitos
                        Humanos da Câmara Municipal de Recife; vereador
                        Valdemar Borges, da Câmara Municipal de Recife, também
                        presidente da Comissão de Direitos Humanos; deputado Cláudio
                        Vereza, da Assembléia Legislativa do Espírito Santo;
                        Fragato, da Comissão de Direitos Humanos da Assembléia
                        Legislativa do Espírito Santo; 
                        deputada Maria Cecília Tafareli, da Assembléia
                        Legislativa de São Paulo, aqui representando o
                        presidente daquela Assembléia; deputado João Henrique
                        Blass, da Assembléia Legislativa de Santa Catarina;
                        deputado Carlito Mers, da Assembléia Legislativa de
                        Santa Catarina; Fátima Carvalho, da Comissão de
                        Direitos Humanos da Assembléia Legislativa do Ceará;
                        deputado Renato Simões, presidente da Comissão de
                        Direitos Humanos da Assembléia Legislativa do Estado de
                        São Paulo, e  deputada
                        Maria Carmem Fidalgo, da Comissão de Direitos Humanos
                        da Assembléia Legislativa da Bahia; deputado Nílton
                        Lopes Nascimento, presidente da Comissão de Direitos
                        Humanos da Assembléia Legislativa do Maranhão. Também
                        gostaria de registrar a presença de Erenilton Brito
                        Silva, da Força Sindical, de João Carlos, advogado do
                        Espírito Santo; e de Maria Emília Ferreira, do
                        Departamento de Saúde do Estado de São Paulo. 
                        
                                                
                        Passamos então a palavra para Nelson Pelegrino.
                        
                          
                        
                                                
                        O SR. DEPUTADO NELSON PELEGRINO- A Conferência Estadual de Direitos
                        Humanos da Bahia foi organizada pelo Fórum Estadual de
                        Direitos Humanos e teve como temário a questão da violência
                        racial. A Conferência produziu a Carta da Bahia, resolução
                        que eu passo a ler: 
                        
                                                
                        Com a participação de 65 entidades da sociedade
                        civil, a 1ª Conferência Estadual de Direitos Humanos
                        da Bahia analisou o processo de implantação na Bahia
                        do Programa Nacional de Direitos Humanos. Verificamos
                        que não houve avanços significativos a esse respeito e
                        denunciamos a falta de empenho dos Governo Federal e
                        Estadual para a implementação do referido Programa,
                        tendo se agravado a situação da violência oficial
                        contra a maioria da população baiana. 
                        
                                                
                        Seguem-se os considerandos da Carta:
                        
                                                
                        Considerando que a violência racial no Brasil, e
                        em especial na Bahia, tem exterminado negros e índios
                        com o apoio do Estado; considerando a importância de
                        políticas públicas para a efetivação dos direitos
                        humanos como prioridade nacional; considerando que o
                        Programa Nacional de Direitos Humanos excluiu uma série
                        de reivindicações apresentadas por entidades não-governamentais
                        e da sociedade civil; considerando o princípio
                        fundamental da indivisibilidade e universalidade histórica
                        dos direitos humanos e que o Programa excluiu de suas
                        metas os objetivos sócio-econômicos, avaliamos que o
                        Programa ficou parcial neste sentido. 
                        
                                                
                        A Conferência Estadual de Direitos Humanos
                        reafirma todos os pontos que achamos importantes no
                        Programa, os gerais e os específicos. Pinçamos alguns
                        que  consideramos
                        centrais, abrangentes e gerais, e que por esses motivos
                        devam ser objeto inclusive de uma centralidade da luta
                        para a efetivação de medidas que estão no Programa
                        Nacional de Direitos Humanos. Essa 
                        é uma meta específica. No caso da Bahia, há
                        uma Comissão Parlamentar de Inquérito que tramita na
                        Assembléia para apurar a ação de grupos de extermínio.
                        Já foi criada, mas até hoje não foi instalada, pois a
                        maioria parlamentar não nomeia os seus membros,
                        impedindo dessa forma que a Comissão se instale. O
                        problema de grupos de extermínio na Bahia é muito sério.
                        
                                                
                        Apontamos como necessidade:
                        
                                                
                        Que seja criado em cada estado um programa de
                        defesa dos direitos humanos adequado à realidade local,
                        e que seja realizada uma conferência para elaborar um
                        programa estadual de direitos humanos na Bahia, assim
                        como em outros estados. Achamos que isso é importante
                        também.
                        
                                                
                        Que seja estimulada a organização dos diversos
                        segmentos da sociedade civil para fiscalizar, monitorar
                        e cobrar a implementação do Programa Nacional dos
                        Direitos Humanos. É importante também 
                        identificar essa Comissão que amanhã se reúne,
                        um ano depois que o Programa foi instituído, inclusive
                        com a participação da sociedade civil, para monitorar
                        o acompanhamento do programa.
                        
                                                
                        Que o Brasil seja integrado à Corte
                        Interamericana dos Direitos Humanos, que seja
                        estabelecido o cadastro federal de inadimplentes,
                        proposta que está no Programa Nacional dos Diretos
                        Humanos, organizando a relação de estados e municípios
                        que não cumprem obrigações mínimas de proteção e
                        promoção dos direitos humanos. Achamos que essa
                        importante medida deve ser viabilizada a curto prazo.
                        
                                                
                        Que seja atribuída à Justiça Federal competência
                        para julgar os crimes praticados em detrimento ou de
                        interesse dos direitos humanos, colocar sob a
                        responsabilidade  dos
                        órgãos federais de proteção dos direitos humanos, as
                        causas civis ou criminais que sejam de competência do
                        referido órgão ou da Procuradoria Geral da República.
                        Trata-se da  questão
                        da federalização dos crimes contra os direitos
                        humanos, que, sem dúvida, 
                        é uma medida fundamental. 
                        
                                                
                        Que as polícias sejam unificadas e
                        desmilitarizadas, com a revisão profunda de toda a
                        cultura organizacional das instituições policiais e a
                        extinção dos tribunais militares. Achamos que esta 
                        foi uma omissão do Programa Nacional de Direitos
                        Humanos, e que deve ser uma sugestão dessa Conferência,
                        a sua  incorporação
                        ao Programa Nacional de Direitos Humanos: a
                        desmilitarização, unificação e reestruturação de
                        todas as polícias do Brasil.
                        
                                                
                        Que seja proposto o afastamento de suas
                        atividades dos policiais acusados de violência contra 
                        cidadãos, com imediata instauração de inquérito
                        para a execução de processo criminal. Esta é uma
                        providência que está proposta no Programa Nacional de
                        Direitos Humanos, que consideramos relevante e que tem
                        sido sugerida por nós de forma reiterada ao Comando da
                        Polícia Militar da Bahia.
                        
                                                
                        Que seja regulamentado, para 
                        aplicação de fato, o art.129, inciso VII, da
                        Constituição Federal, que trata do controle externo da
                        atividade policial pelo Ministério Público; outra
                        providência que nós achamos muito importante. Em
                        alguns Estados, o Ministério Público tem declarado que
                        ainda não há regulamentação. Nós sabemos que em
                        Minas e São Paulo já há regulamentação e estamos até
                        trabalhando nesse sentido também na Bahia. Nós achamos
                        que é fundamental sua aplicação a curto prazo.
                        
                        
                        
                                                
                        Que seja apoiada a instalação de programas
                        estaduais de proteção às vítimas e testemunhas,
                        dando segurança à vida. Outra coisa importante também
                        é o Pró-Vida, que tem que ser ampliado e implantado
                        nos estados.
                        
                                                
                        Reformulação do Conselho de Defesa da Pessoa
                        Humana, ampliando a participação de representantes da
                        sociedade civil; essa é outra providência que está no
                        Programa e até hoje não foi efetivada.
                        
                                                
                        Achamos também importantes a revisão da legislação
                        sobre desacato à autoridade; o controle externo do
                        Judiciário; a definição de medidas que venham
                        combater a discriminação racial e 
                        a desvinculação dos institutos médicos legais
                        das secretarias de segurança pública; 
                        bem como a realização de 
                        uma conferência nacional de direitos humanos
                        para estudar, reexaminar e reelaborar o Programa
                        Nacional de Direitos Humanos.
                        
                                                
                        Por fim, a Carta diz que a Conferência objetivou
                        avaliar e apresentar sugestões ao Fórum Estadual de
                        Direitos Humanos da Bahia e ao Programa Nacional de
                        Direitos Humanos, e que se fazem necessárias a discussão
                        e a implementação de medidas em defesa desses
                        direitos, através da elaboração de um amplo plano de
                        metas específicas para a Bahia. Ou seja, a Carta da
                        Bahia apontou para a perspectiva de realizarmos, no
                        segundo semestre, uma conferência estadual de direitos
                        humanos para começarmos a reelaboração do Programa
                        Nacional de Direitos Humanos.
                        
                                                
                        Além disso, dedicamos a Conferência ao índio
                        pataxó Galdino Jesus dos Santos, reivindicando que
                        fosse instituída uma pensão para sua família durante
                        cem anos; recriminamos a violência policial que tem
                        havido na Bahia  e
                        a repressão contra os demitidos da Prefeitura e a
                        agressão sofrida por um dos integrantes do Fórum dos
                        Direitos Humanos, Leo Ornelas. Foi também apresentada
                        uma moção em repúdio à desativação da Residência
                        Feminina. 
                        
                                                
                        A Carta da Bahia, resultado da nossa Conferência,
                        será entregue à Coordenação dessa 2ª Conferência
                        Nacional de Direitos Humanos. Muito obrigado.
                        
                          
                        
                                                
                        O SR. PRESIDENTE (deputado Pedro Wilson) - Obrigado, deputado Nelson
                        Pelegrino. 
                        
                                                
                        Com a palavra o Sr. Jayme Benvenuto, que
                        representa a Conferência Estadual de Pernambuco.
                        
                                                
                        O SR. JAYME BENVENUTO - Boa tarde. Eu falarei muito brevemente sobre
                        os resultados da Conferência Estadual, porque muitos
                        pontos estão em comum com o que já foi apresentado.
                        
                                                
                        A Conferência de Pernambuco ocorreu nos dias 29
                        e 30 de abril, no auditório da Assembléia Legislativa
                        do Estado, e contou com cerca de cem participantes. Foi
                        uma promoção conjunta do Movimento Nacional de
                        Direitos Humanos, da Comissão de Direitos Humanos da
                        Assembléia Legislativa do Estado, da Comissão de
                        Direitos Humanos da Câmara Municipal, da Rede Estadual
                        de Direitos Humanos e do Conselho Municipal de Direitos
                        Humanos do Recife.
                        
                                                
                        A Conferência procurou priorizar três temas, de
                        modo a não se perder na discussão de todo o Programa
                        Nacional de Direitos Humanos. Esses três temas
                        priorizados foram considerados os mais importantes para
                        a realidade do Estado de Pernambuco: a questão dos
                        direitos econômicos, sociais e culturais, com
                        especialização na área da reforma agrária; 
                        o direito  à
                        justiça e à segurança; e o direito da criança e do
                        adolescente.
                        
                                                
                        Não entrarei propriamente nas propostas
                        relativas a estas questões porque elas constam de um
                        relatório cuja cópia vai ser distribuída e porque,
                        por ocasião do debate dos temas específicos, os nossos
                        representantes irão apresentá-las nos grupos de
                        trabalho.
                        
                                                
                        Abordarei então algumas questões bem gerais,
                        relacionadas à aplicação e à implementação do
                        Programa Nacional de Direitos Humanos no Estado de
                        Pernambuco. Em primeiro lugar, há a constatação —
                        comum a quase todos os estados — de que nós não
                        realizamos e elaboramos o Programa Estadual de Direitos
                        Humanos,  no
                        sentido de priorizar algumas questões para o estado,
                        relacionadas à questão geral do Programa Nacional. 
                        Temos  também
                        a proposta da  elaboração
                        de um mapa da violência rural e urbana, até como
                        elemento para a construção do Programa Estadual de
                        Direitos Humanos. Essas duas conclusões constituem
                        perspectivas de trabalho de uma comissão que foi
                        criada. 
                        
                                                
                        Talvez o principal resultado da Conferência seja
                        a criação, no estado, de uma instância de
                        monitoramento do Programa. Essa instância ainda não
                        tem nome mas provavelmente se chamará Fórum Estadual
                        de  Direitos
                        Humanos e será composta de representantes de órgãos
                        estaduais —  de 
                        todas as Secretarias (em especial Justiça e
                        Segurança), da Polícia Militar, de todos os Poderes
                        — e de representantes da sociedade civil, de entidades
                        da sociedade civil, como o MST, o Movimento Nacional de
                        Direitos Humanos, a CUT, a Rede Estadual de Direitos
                        Humanos, a OAB, entre outras. Essa instância terá
                        justamente o objetivo de fazer com que o Programa tenha
                        existência prática no estado, no prazo mais curto possível.
                        
                                                
                        Como resultado geral, foi proposta a instalação
                        do Conselho Estadual de Defesa Social, que tem a competência
                        de tratar das questões relacionadas aos direitos
                        humanos no estado. Embora tal Conselho esteja na
                        Constituição desde 1989, não existe na prática. Para
                        avançar na sua implementação, sabemos que o Governo
                        do Estado tem realizado reuniões.
                        
                                                
                        Em termos gerais, é isso o que tenho a destacar.
                        
                          
                        
                                                
                        O SR. PRESIDENTE (deputado Pedro Wilson) - Obrigado, Jayme. 
                        
                                                
                        Faltam apenas dois Estados e, antes de passar a
                        palavra ao Sr. Dermi Azevedo, de São Paulo, anuncio a
                        presença de Antônio Maria Rocha, da Fundação
                        Educacional do Distrito Federal; de João Bosco de
                        Oliveira, da Associação Brasiliense de Peritos
                        Criminais;  Ervino
                        Schimidt, do Conselho Nacional de Igrejas Cristãs do
                        Brasil; Francisco Badenes, delegado de Polícia Civil do
                        Espírito Santo; Francisco José Fitipaldi, do Tribunal
                        de Justiça do Espírito Santo; Sandro Torres Avelar, do
                        Tribunal de Justiça do Distrito Federal; Dyrceu Aguiar
                        Dias Cintra, da Associação Brasileira 
                        Juízes para a Democracia; Vanderlei Leal Chagas,
                        da Associação Brasileira de Criminalística; e Maria
                        Ivete Silva de Oliveira, da Consultoria Jurídica do
                        Governo do Distrito Federal.
                        
                                                
                        Com a palavra o penúltimo orador, Dermi Azevedo,
                        que representa o Estado de São Paulo.
                        
                          
                        
                                                
                        O SR. DERMI AZEVEDO - Companheiras e Companheiros, o nosso processo
                        de avaliação do Programa Nacional de Direitos Humanos
                        tem como base a elaboração do Programa Estadual de
                        Direitos Humanos. Desde o ano passado estamos
                        referenciando a elaboração do Programa Estadual com o
                        Programa Nacional. 
                        
                                                
                        Esse Programa Estadual está sendo elaborado em
                        regime de parceria. Há um comitê de acompanhamento
                        formado pela Secretaria da Justiça, pelo Núcleo de
                        Estudos de Violência da USP, pela Comissão de Direitos
                        Humanos da Assembléia Legislativa e pelo Conselho
                        Estadual de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana. Além
                        disso, têm sido realizadas audiências públicas no
                        interior, sendo que a última será realizada agora, na
                        capital. Posteriormente essas audiências serão
                        complementadas pela Conferência Estadual dos Direitos
                        Humanos, concluindo com a elaboração do Programa
                        Estadual de Direitos Humanos, que depois também será
                        monitorado  em
                        parceria.
                        
                                                
                        Cópias do nosso documento estão sendo distribuídas,
                        mas quero sinalizar apenas alguns aspectos do nosso
                        relatório de avaliação do Programa Nacional de
                        Direitos Humanos. Ele tem três partes. Na primeira 
                        falamos da violação estrutural dos direitos
                        humanos; na segunda, falamos dos avanços registrados
                        nessa luta; e na terceira especificamos algumas questões
                        que consideramos preocupantes e fazemos algumas
                        propostas.
                        
                                                
                         Na
                        parte da violação estrutural dos direitos humanos, a
                        premissa básica é a de que o aprofundamento do fosso
                        existente entre os incluídos e os excluídos no modelo
                        socioeconômico vigente no País é a nossa principal
                        realidade de violação dos direitos humanos. Não há
                        como negar que as políticas baseadas no ajuste
                        estrutural trazem consigo, de um lado, a estabilidade
                        econômica, mas, de outro, conseqüências funestas
                        traduzidas no desemprego programado e na restrição aos
                        bens mínimos necessários à dignidade humana.
                        
                                                
                        Nós falamos, em várias partes deste documento,
                        sobre a situação paradoxal dos direitos humanos no
                        Brasil, analisando também a política de privatizações
                        do Governo Federal à luz desses direitos. Os
                        governantes alegam que o dinheiro obtido com as
                        privatizações será utilizado em favor da saúde, da
                        educação, da moradia e da segurança, mas, até prova
                        em  contrário,
                        não é isso o que se constata, uma vez que verificamos
                        um agravamento do déficit em cada uma dessas áreas. 
                        
                                                
                        Ao mesmo tempo, assinalamos a responsabilidade
                        dos Poderes Legislativo e Judiciário; falamos do latifúndio,
                        da comunicação e da informação; da relação entre mídia
                        e direitos humanos; e do aumento da cultura da violência,
                        traduzida no individualismo, no consumismo e na falta de
                        solidariedade. 
                        
                                                
                        Também falamos no preconceito e na discriminação,
                        que continuam sendo praticados em larga escala,
                        exemplificados pelo assassinato do índio pataxó
                        Galdino Jesus dos Santos e pela queima de mendigos nas
                        grandes cidades, indicando um vazio de valores que
                        atinge, de modo particular, a juventude brasileira. 
                        
                                                
                        Falamos da questão carcerária; da não realização
                        da reforma agrária; e da questão indígena, sobretudo
                        num momento em que começam as comemorações dos 500
                        anos do "Descobrimento do Brasil".          
                        
                        
                                                
                        A seguir, registramos um aspecto muito especial
                        sobre a reforma agrária: para nós, sem reforma agrária
                        não se pode legitimamente falar de efetivação dos
                        direitos humanos no Brasil, e dizemos enfaticamente que
                        os movimentos sociais que lutam pela reforma agrária não
                        podem ser tratados como caso de polícia. Pelo contrário,
                        suas reivindicações devem ser atendidas em caráter
                        urgente e prioritário, e as vozes roucas de seus
                        participantes devem ser ouvidas prioritariamente, muito
                        mais do que as vozes do discurso único dos megaempresários
                        que se articulam para comprar nossas estatais.
                        
                                                
                        No que se refere aos avanços, assinalamos o
                        compromisso público das autoridades com os direitos
                        humanos, a começar pelo Presidente da República; a
                        elaboração desse Programa e dos programas estaduais; a
                        criação da Secretaria Nacional de Direitos Humanos; e
                        a ampliação dos espaços públicos de direitos humanos
                        — conselhos, comissões e comitês.
                        
                                                
                        Também assinalamos algumas questões muito específicas
                        que não foram tratadas, como a possibilidade de
                        retomada da corrida armamentista e da compra de novos
                        equipamentos de tortura. Como denunciou recentemente o Le
                        Monde, há uma ofensiva no sentido de se vender tais
                        equipamentos aos países do chamado Terceiro Mundo.
                        
                                                
                        Por fim, propomos que o Programa seja, cada vez
                        mais, tratado em parceria, que se elaborem os programas
                        estaduais, que tentemos ganhar um espaço permanente na
                        mídia e principalmente removamos o entulho autoritário
                        ainda existente nas estruturas das polícias.
                        
                                                
                        Para terminar, gostaríamos também de registrar
                        uma homenagem a uma grande companheira que deixou esta
                        vida recentemente, Dª Helena Pereira, do Grupo Tortura,
                        Nunca Mais. Muito obrigado.
                        
                          
                        
                                                
                        O SR. PRESIDENTE (deputado Pedro Wilson) - Obrigado, Dermi Azevedo.
                        
                                                
                        Esta Conferência tem também como um de seus
                        principais objetivos estimular a adequação do Programa
                        Nacional de Direitos Humanos aos estados, dada a sua
                        autonomia constitucional e legal e a sua proximidade com
                        o cidadão. Daqui a pouco começaremos a discutir o
                        Programa Nacional  de
                        Direitos Humanos no município, na comunidade, no
                        bairro, onde estão  a polícia, a igreja, a sociedade civil, as ONGs, os
                        sindicatos, as associações 
                        de moradores e o próprio Estado, que, pelo menos
                        constitucionalmente, é a principal fonte de proteção
                        e promoção dos direitos humanos.
                        
                                                
                        Agradecemos e recebemos essas contribuições com
                        carinho, esperando 
                        que todos os estados brasileiros se esforcem para
                        avançar suas estruturas de defesa e promoção dos
                        direitos humanos, de forma que, na entrada do terceiro 
                        milênio possamos ver a omissão, a conivência
                        do Estado e as violações de direitos humanos como algo
                        pertencente ao passado.
                        
                                                
                        Antes de encerrar esta primeira fase dos
                        trabalhos que, na nossa avaliação, cumpriu seus
                        objetivos  (de
                        dar conhecimento a todos sobre as propostas de luta nos
                        estados),  reafirmo
                        a importância da participação de todos nós nos
                        grupos temáticos, que vão se reunir hoje à tarde.
                        
                                                
                        Agradecendo a presença de todos, especialmente
                        dos representantes das nações indígenas, 
                        encerramos esta primeira parte, convocando todos
                        os participantes para os grupos temáticos, às 14:30h,
                        no Anexo II. Em cada sala há uma indicação dos grupos
                        de trabalho. Outras informações serão dadas nos
                        respectivos grupos de trabalho, e lembramos que amanhã
                        retornaremos às 9 horas em ponto neste plenário.
                        
                                                
                        Muito obrigado. 
                        
                          
                        
                         
                        
                         Sessão
                        do dia 13 de abril de 1997
                        
                         2º
                        dia da Conferência
                        
                          
                        
                                                
                        O SR. PRESIDENTE (deputado Pedro Wilson) - Bom dia a todos. É com
                        satisfação que reabrimos os trabalhos da 2ª
                        Conferência Nacional de Direitos Humanos. 
                        
                                                
                        Hoje, segundo e último dia de trabalho,
                        começaremos com a exposição do Programa Nacional de
                        Direitos Humanos, pelo secretário Nacional de Direitos
                        Humanos, Dr. José Gregori, a quem convidamos para
                        integrar a Mesa.
                        
                                                
                        Após a exposição do Dr. José Gregori, os
                        relatores dos doze grupos temáticos farão uma
                        apresentação sucinta das discussões que realizaram
                        ontem. São doze grupos. Pedimos a atenção de todos
                        relatores. Esses relatos vão subsidiar e documentar os
                        debates do final da manhã e do período da tarde.
                        
                                                
                        Fizemos reproduzir integralmente os relatórios
                        dos grupos temáticos. Esses relatórios estão
                        consolidados em um só documento, que está à
                        disposição de todos no saguão de entrada do
                        Auditório Nereu Ramos.
                        
                                                
                        Quero agradecer, em nome de todos os
                        participantes da 2ª Conferência Nacional de Direitos
                        Humanos, a colaboração aos relatores e coordenadores
                        dos doze grupos, que ontem se desdobraram até mais
                        tarde para que pudéssemos ter o registro das
                        discussões ainda hoje.
                        
                                                
                        Retomando a dinâmica desta 2ª Conferência,
                        depois da apresentação dos relatórios dos grupos,
                        passaremos aos debates. Faremos uma pequena
                        interrupção para o almoço e voltaremos às 14h30min,
                        para prosseguir com os debates e encaminhamentos finais.
                        Nosso propósito é encerrar este evento às 17h, com a
                        votação de moções. 
                        
                                                
                        Solicito a atenção de todos os conferencistas
                        para outro aviso. Depois do almoço, logo após a
                        retomada dos trabalhos, haverá o lançamento neste
                        plenário do livro "Direitos humanos e violência:
                        o que fazer?", trabalho realizado pela Secretaria
                        de Justiça e Cidadania do Governo do Espírito Santo.
                        Depois de falar sobre o livro, o secretário Perly
                        Cipriano ficará à disposição para autografá-lo no
                        saguão de entrada deste auditório. 
                        
                                                
                        Haverá também o lançamento do relatório do
                        Tribunal Internacional contra os massacres de Eldorado
                        dos Carajás, evento realizado em novembro do ano
                        passado pela Comissão de Direitos Humanos, presidida
                        pelo deputado Hélio Bicudo. 
                        
                                                
                        Outro lançamento será o do Relatório de
                        Atividades da Comissão de Direitos Humanos da Câmara
                        dos Deputados, referente aos trabalhos realizados entre
                        fevereiro de 1996 e janeiro deste ano, período de
                        gestão do deputado Hélio Bicudo. 
                        
                                                
                        Também será lançado o vídeo
                        "Retratação Política em Toritama,
                        Pernambuco", uma produção da CENARTE e do Grupo
                        Tortura Nunca Mais, de Pernambuco, que contou com apoio
                        do Centro de Direitos Humanos e Memória Popular de
                        Natal.
                        
                                                
                        Os livros e o vídeo que estão sendo lançados
                        nesta Conferência estarão à disposição dos
                        interessados no saguão de entrada do auditório, a
                        partir das 14h.
                        
                                                
                        Passamos agora a compor a Mesa. Convidamos para
                        tomar assento à Mesa o Dr. Paulo Sérgio Pinheiro; o
                        deputado Mário Mamede, presidente da Comissão de
                        Direitos Humanos do Ceará; o Prof. Rubens Pinto Lira,
                        presidente do Conselho de Direitos Humanos da Paraíba;
                        o Dr. Marcus Vinícius Pinto, da Divisão de Direitos
                        Humanos do Itamaraty; o Dr. Paulo Mesquita Neto, relator
                        do Programa Nacional de Direitos Humanos; o Dr. Roberto
                        Franca, secretário de Justiça do Estado de Pernambuco;
                        a Dra. Marilda Helena dos Santos, representando o
                        procurador-geral de Justiça de Goiás e todos os
                        membros do Ministério Público do Brasil; a Dra. Ana
                        Maria, do Conselho de Direitos Humanos do Paraná; o Dr.
                        Humberto Espíndola, do Conselho de Defesa da Pessoa
                        Humana do Ministério da Justiça; a deputada Dalila
                        Figueiredo, da Comissão de Direitos Humanos; e os
                        caciques Daniel e Aniceto, representando aqui as
                        nações indígenas.
                        
                                                
                        Hoje, dia 13 de maio, convidamos Marlene dos
                        Santos Pessoa, da Fundação Cultural Palmares,
                        representando a luta do povo negro pela libertação. 
                        
                                                
                        Convidamos também o deputado João Leite,
                        presidente da Comissão de Direitos Humanos de Minas
                        Gerais.
                        
                                                
                        Gostaríamos de comunicar a este plenário que a
                        coordenação desta Conferência acertou 
                        com os coordenadores do Grito da Terra (que está
                        sendo realizado com mais de mil participantes no
                        Auditório Petrônio Portela do Senado, os quais
                        estarão aqui conosco entre 16 e 17 h), 
                        para o final desta Conferência, a realização
                        de uma manifestação clamando por justiça na Praça
                        dos Três Poderes, em frente ao Supremo Tribunal
                        Federal, às 17h. 
                        
                                                
                        A partir das 12h estarão no balcão de entrada
                        os certificados de participação na Conferência. Quem
                        não registrou o nome poderá fazê-lo, pois vamos
                        distribuir certificados de participação.
                        
                                                
                        Vamos ouvir agora o Dr. José Gregori. Depois
                        teremos a apresentação dos relatórios, com cinco
                        minutos para cada grupo (peço que façam uma síntese).
                        Depois abriremos os debates, que continuarão após o
                        almoço. Logo após a apresentação dos 
                        doze relatórios, teremos a palavra franqueada.
                        Comunico ao plenário também que recebi convite e
                        comparecerei, ao meio-dia, a uma audiência com o Sr.
                        presidente da República.
                        
                                                
                        Com a palavra o Dr. José Gregori.
                        
                           
                        
                                                
                        O SR. JOSÉ GREGORI - Companheiros de Mesa, presidente da 2ª
                        Conferência Nacional de Direitos Humanos, deputado
                        Pedro Wilson, minhas amigas e meus amigos, estou aqui,
                        na qualidade de secretário Nacional de Direitos
                        Humanos, não para uma comemoração, porque acho que é
                        muito cedo para falar em comemoração, mas para uma
                        reafirmação de propósitos no que toca ao empenho, à
                        vontade política, à decisão do Governo Federal em
                        relação aos direitos humanos. 
                        
                                                
                        Pela primeira vez na história da República, um
                        governo federal se dispôs a assumir o imenso
                        compromisso de executar uma política pública de
                        direitos humanos. É claro que outros governos se
                        interessaram pelos direitos humanos, mas sempre em
                        atitudes pontuais, nunca na forma que o governo atual
                        fez, como uma das opções de governo, como seria a
                        opção pela saúde, pela educação, pelo comércio
                        exterior, pelo saneamento; agora, entre essas
                        tradicionais opções de políticas públicas se
                        encontram os direitos humanos. Portanto, operou-se uma
                        mudança de status
                        dos direitos humanos, que ganharam esse patamar de
                        política pública, sob a responsabilidade do Governo
                        Federal.
                        
                                                
                        Esta opção se materializou em primeiro lugar no
                        enfrentamento de questão espinhosa, difícil, que
                        vários governos tentaram, mas não lograram resolver a
                        bom termo. O atual governo resolveu enfrentar esse
                        problema não só por uma questão de princípio, de
                        responsabilidade, mas também como uma demonstração de
                        que, em matéria de direitos humanos, não estava
                        posando nem fazendo jogo de cena para platéias
                        desavisadas. Realmente, pelo tipo de dificuldade desse
                        problema, queria significar também o seu empenho e a
                        sua decisão relativamente aos direitos humanos.
                        Refiro-me ao enfrentamento da questão dos desaparecidos
                        políticos deste País.
                        
                                                
                        Em segundo lugar, pela elaboração do Programa
                        Nacional de Direitos Humanos, dando cumprimento a
                        compromisso internacional assumido pelo Brasil em 1993,
                        na Conferência Mundial pelos Direitos Humanos, em
                        Viena. O Brasil foi o segundo país, depois da
                        Austrália, a elaborar o seu Programa Nacional de
                        Direitos Humanos. Finalmente, há cerca de vinte dias,
                        foi criada a Secretaria Nacional de Direitos Humanos. 
                        
                                                
                        Portanto, estou aqui para dizer que estamos no
                        rumo do compromisso com os direitos humanos. Neste
                        sentido, embora seja cedo para balanços, para
                        comemorações, para análises definitivas, sem dúvida
                        nenhuma acho que há argumentos, fatos, medidas,
                        propósitos que demonstram que este rumo não é mera
                        retórica, mas é um rumo fático.
                        
                                                
                        Em matéria de direitos humanos, costumo dizer
                        que aquele que acredita neles e que aposta o melhor da
                        sua vida na concretização dos direitos humanos não
                        pode ter uma visão de prazo curto, mas sempre uma
                        visão de prazo médio. Porque quase tudo em matéria de
                        direitos humanos depende de um processo.
                        
                                                
                        Não há possibilidade de assinalar pela pedra
                        fundamental nenhum avanço dos direitos humanos com data
                        de conclusão para o corte da fita inaugural. Isso é
                        possível na construção de um túnel, de uma estrada,
                        de um viaduto; não é possível em matéria de direitos
                        humanos. Os avanços em direitos humanos dependem da
                        dimensão de comportamento, da dimensão de cultura,
                        enfim, da visão ética das pessoas. E esse tipo de
                        influência nesse campo não é fácil. Depende, como
                        disse, de um processo. 
                        
                                                
                        O importante é saber se há rumo e se há
                        disposição para seguir esse rumo. E eu posso garantir
                        aos senhores, com inteira honestidade, que há essa
                        vontade política, há esse rumo e há disposição de
                        prosseguir decididamente no sentido de fazer avançar os
                        direitos humanos, sobretudo neste País tão carente.
                        
                                                
                        Infelizmente — e temos de ter a coragem de
                        reconhecer — o Brasil é um dos países mais violentos
                        do mundo. As estatísticas a respeito da violência, de
                        crimes e de desrespeito aos direitos humanos estão
                        começando a ser feitas, porque, há muito pouco tempo,
                        a universidade abriu os seus olhos para esses problemas;
                        há muito pouco tempo, a Ciência abriu os seus olhos
                        para esse tema. Apesar da fragilidade dessas
                        estatísticas, desses dados, não hesitamos em afirmar e
                        repetir que, infelizmente, o Brasil é um dos países
                        mais violentos do mundo.
                        
                                                
                        Se medirmos essa violência pelo número de
                        assassinatos, são 100 mil pessoas por ano. As
                        estatísticas do Banco Interamericano de
                        Desenvolvimento, apresentadas num congresso em
                        fevereiro, no Rio de Janeiro, mostram que o Brasil se
                        situaria — medindo-se 
                        a violência pelo número de assassinatos de 100
                        mil pessoas em um ano — em terceiro lugar, só
                        perdendo essa marca perversa para a Colômbia e El
                        Salvador. Portanto, por mais que se faça, governo e
                        sociedade civil, fazemos pouco em relação às
                        necessidades brasileiras. 
                        
                                                
                        Mas o importante é saber, como eu disse, se
                        estamos no rumo, se as coisas estão começando a ser
                        diferentes do que sempre foram. E acho que uma análise
                        isenta e construtiva, uma análise de boa fé concluirá
                        que a situação começa a mudar, a ser diferente. 
                        
                                                
                        E eu quero dizer — não para agradar essa
                        platéia, pois já estou numa idade e tenho uma modesta
                        biografia que me dispensa de oferecer ou receber
                        gentilezas — que o primeiro sinal de que estamos
                        avançando é a realização de uma conferência como
                        esta. Isso seria impensável num Brasil que eu conheci,
                        vivenciei. Uma conferência como esta é possível e,
                        sem dúvida alguma, independentemente de que aqui se
                        tenham feito críticas ou se tenham feito elogios. Não
                        importa, a verdade é que a realização desta 2ª
                        Conferência, acostada na análise do Programa Nacional
                        de Direitos Humanos, dando continuidade à conferência
                        que se fez no ano passado para discutir esse programa,
                        ainda embrião, sem dúvida nenhuma, pela honestidade e
                        pela qualidade da participação, sem nenhuma ajuda
                        governamental — quem veio aqui foi por convicção,
                        foi por compromisso —, é muito importante e é um
                        dado concreto de que estamos caminhando, de que estamos
                        avançando.
                        
                                                
                        Nesse sentido, quero dizer que o Governo, por
                        intermédio da Secretaria Nacional de Direitos Humanos,
                        receberá com todo o empenho as conclusões desses
                        trabalhos, para analisá-las e incorporá-las naquilo
                        que elas se coadunarem com as linhas do Programa
                        Nacional de Direitos Humanos, na atividade diária da
                        Secretaria Nacional de Direitos Humanos. 
                        
                                                
                        Mesmo antes de recebê-las, queria anunciar
                        publicamente que uma das reivindicações desta
                        Conferência será atendida. Ou seja, de que haja um
                        representante da Conferência no corpo, ou no conselho,
                        ou na comissão de acompanhamento dos direitos humanos,
                        que se reunirá hoje à tarde no Ministério da
                        Justiça,  integrada
                        por pessoas de grande tradição no campo dos direitos
                        humanos — bastaria citar que o secretário desta
                        comissão de acompanhamento é o Prof. Paulo Sérgio
                        Pinheiro. Gostaria de anunciar, então, que será
                        reservado um lugar para aquele que for designado por
                        este plenário.
                        
                                                
                        Em segundo lugar, queria dizer que, em relação
                        a outra reivindicação surgida nesta Conferência, de
                        que houvesse não só o empenho da Secretaria Nacional
                        de Direitos Humanos do Ministério da Justiça em
                        relação ao cumprimento, à execução do Programa
                        Nacional de Direitos Humanos, mas de todo o corpo
                        governamental, todos os departamentos que compõem o
                        Governo Federal, logo mais, ao meio-dia, num ato
                        singelíssimo, que vai marcar o primeiro ano do Programa
                        Nacional de Direitos Humanos, no Palácio do Planalto, o
                        Presidente da República tomará uma medida concreta
                        nesse sentido, de empenho direto, constante e
                        sistemático de todo o corpo governamental na execução
                        do Programa Nacional de Direitos Humanos.
                        
                                                
                        Portanto, acho que estamos dando mostras
                        concretas de que não estamos no campo da retórica na
                        questão dos direitos humanos. Temos plena consciência
                        das dificuldades, do quanto são difíceis os avanços,
                        do quanto se precisa ter uma visão dialética quando se
                        trata de analisar as marchas e contramarchas, os
                        avanços e, às vezes, até os recuos em matéria de
                        direitos humanos; mas, na grande contabilidade, sem
                        dúvida alguma, já se começa a 
                        perceber neste País um interesse cada vez maior
                        pelos direitos humanos. 
                        
                                                
                        Neste sentido, trago uma das minhas angústias,
                        para socializá-la com cada uma das minhas amigas e dos
                        meus amigos: imaginar meios e modos de se 
                        conscientizar, cada vez mais, mais e mais gente
                        em relação aos direitos humanos. Estou convencido de
                        que ganharemos ou perderemos a batalha dos direitos
                        humanos no Brasil na medida em que as grandes massas
                        identificarem ou não, nos direitos humanos,  um
                        dos instrumentos para combater, para diminuir a
                        violência. 
                        
                                                
                        E acho que os direitos humanos só terão este
                        poder, esta eficácia no combate à violência na medida
                        em que mais e mais gente souber o que sejam os direitos
                        humanos e passar a coordenar, a condicionar, a pautar, a
                        afeiçoar, a conformar a sua vida diária, o seu
                        cotidiano de acordo com 
                        as linhas fundamentais dos direitos humanos.
                        
                                                
                        É claro que é preciso uma Justiça que
                        funcione, é preciso um ativo social que não deixe
                        ninguém sem ter acesso aos bens da civilização. É
                        claro que é preciso uma polícia moderna, que dê
                        combate aos delinqüentes, sem desrespeitar os direitos
                        humanos. É claro que é preciso um perfeito
                        funcionamento institucional, mas é claro também que é
                        preciso uma mudança de atitude das pessoas, umas com as
                        outras, para se conseguir baixar os índices de
                        violência.
                        
                                                
                        Tenho dito a todos que não é difícil atingir
                        aquela  meta
                        , uma vez que temos uma bíblia dos direitos humanos,
                        que expõe com toda a simplicidade, com clareza, com uma
                        didática direta, no sentido de informar o que sejam os
                        direitos humanos. Esse documento, que dá ao homem o
                        direito de se dizer civilizado, é a Declaração
                        Universal dos Direitos Humanos, da ONU. Portanto, não
                        é difícil que cada pessoa saiba como condicionar o seu
                        dia-a-dia aos ditames, às linhas gerais dos direitos
                        humanos.
                        
                                                
                        E lá está estabelecido, no primeiro artigo, que
                        defende o direito humano de todos os seres humanos, que
                        é o direito à vida. Cada um de nós, na vida em
                        sociedade, deve manter 
                        relacionamentos de  fraternidade, não de hostilidade. É inescapável que os
                        direitos humanos precisam estar na lei, precisam estar
                        nas conquistas sociais, econômicas; mas, se não
                        estiverem dentro de cada um, não há avanço possível
                        na "desviolência" que os direitos humanos
                        podem proporcionar.
                        
                                                
                        Neste sentido, é vital — e agora passo à 
                        minha angústia — que nós imaginemos meios e
                        modos de contagiar as pessoas, de imantar as pessoas, de
                        trazer as pessoas para a crença que temos no valor e na
                        importância dos direitos humanos; como criarmos uma
                        cultura dos direitos humanos, como elaborarmos uma
                        didática, uma pedagogia dos direitos humanos. É
                        comovedor, por exemplo, saber que por esforço de um
                        pequeno grupo do Ceará foi possível criar esse
                        livrinho, atraente até na sua cor, no seu formato, do
                        Programa Nacional de Direitos Humanos, sem nenhuma ajuda
                        do Governo Federal. 
                        
                                                
                        E queria deixar para a criatividade de cada um
                        dos meus companheiros e companheiras o que poderíamos
                        fazer no sentido de criarmos um megaevento; que, num
                        determinado dia, o Brasil inteiro parasse, por um
                        momento que fosse, no sentido da prática, no sentido do
                        testemunho dos direitos humanos. 
                        
                                                
                        Portanto, digo que nós estamos dispostos a isso.
                        Não achamos ainda a fórmula, mas, como agimos em
                        mutirão, num auditório, num plenário como este, digo
                        que uma das prioridades seria 
                        a de  realizarmos ainda este ano, no dia 10 de dezembro, quando 
                        se comemora o Dia da Declaração Universal dos
                        Direitos Humanos, algo 
                        no sentido de que todos os brasileiros, sem
                        nenhuma exceção, fossem tocados num determinado
                        momento pela questão dos direitos humanos. Sei que
                        esses avanços, que esses esforços que temos feito não
                        contagiaram ainda aqueles a quem chamamos de povão. 
                        
                                                
                        Na semana passada, junto com Paulo Sérgio
                        Pinheiro, tive ocasião de participar de um seminário
                        em São Paulo, que trouxe, pela primeira vez, com
                        disposição, uma das maiores organizações de
                        comunicação do mundo. Pela primeira vez se jogou, por
                        inteiro, a divulgação da reflexão sobre os direitos
                        humanos. E durante três dias, no auditório do
                        Parlatino, em
                        São Paulo, só se falou em direitos humanos, enquanto
                        as organizações, ou as televisões ligadas a essa
                        organização, com freqüência davam notícias sobre os
                        direitos humanos. E eu pedi à pessoa que me acompanha
                        em São Paulo — um soldado da Polícia Rodoviária
                        Federal, uma pessoa realmente diferenciada — que
                        perguntasse aos  dezesseis
                        seguranças, fardados ou não fardados, que estavam no
                        Parlatino, se algum deles tinha ouvido falar da
                        Secretaria Nacional de Direitos Humanos, do Programa
                        Nacional de Direitos Humanos ou, desculpem-me a
                        modéstia, de José Gregori. Nenhum deles tinha qualquer 
                        idéia a respeito 
                        das três perguntas. 
                        
                                                
                        Portanto, nós temos essa atribuição
                        fundamental: espalharmos esta nossa crença, divulgarmos
                        a  mensagem
                        que nós temos a respeito dos direitos humanos. E, neste
                        sentido, seria extremamente gratificante que, das
                        conclusões deste encontro, que 
                        serão enviadas à 
                        Secretaria Nacional dos Direitos Humanos. também
                        pudesse surgir sugestões para o que poderia ser 
                        um megaevento,  no sentido de um grande choque nacional em relação aos
                        direitos humanos.
                        
                                                
                        Tenho a dizer que, do ponto de vista concreto,
                        nós vamos fazer distribuir — já entreguei os poucos
                        exemplares que chegaram às minhas mãos, mas até o fim
                        desta Conferência quase todos os participantes poderão
                        recebê-los — um trabalho que elaboramos, uma espécie
                        de balanço do primeiro ano de implementação do
                        Programa Nacional de Direitos Humanos.
                        
                                                
                        Mas acho que o mais importante não está aqui;
                        mais importante do que a lei da tortura, do que a lei
                        que cria o crime de porte ilegal de arma, mais
                        importante do que a recaptura dos assassinos de Chico
                        Mendes, do que a condenação dos envolvidos em crimes
                        com a repercussão dos da Candelária, de Vigário Geral
                        (que foi possível, graças à proteção que demos a
                        testemunhas), mais importante do que a criação do
                        grupo da comunidade negra, mais importante do que os
                        pontos concretos, que aqui estão arrolados, que foram
                        possíveis graças ao nosso esforço comum - uma obra
                        que não é do Governo, uma obra que é do Brasil - mais
                        importante que tudo é aquilo que é difícil de ser
                        assinalado e ser traduzido em letra escrita: este País
                        readquiriu a capacidade de indignar-se. E isso, sem
                        dúvida alguma, é a primeira medida para poder lavrar o
                        terreno e semear a boa semente dos direitos humanos.
                        
                                                
                        Portanto, deixo às minhas amigas e amigos os
                        cumprimentos pela realização dessa 2ª Conferência,
                        que, sem dúvida alguma, terá seguimento nos anos
                        vindouros. Acho que os direitos humanos vieram para
                        ficar e não serão obra de um governo, mas da própria
                        sociedade permanente do Brasil. 
                        
                                                
                        Acho que é importante que fique clara, 
                        com absoluta honestidade, a disposição do
                        Governo Federal, a disposição da Secretaria Nacional
                        dos Direitos Humanos de continuar a sua luta com
                        acentuada intensidade, para conseguirmos índices de
                        maior respeito aos direitos humanos. É o nosso
                        compromisso com a História, é o nosso compromisso com
                        a humanidade, é o nosso compromisso com cada um de
                        nós.
                        
                                                
                         Muito
                        obrigado. 
                        
                          
                        
                                                
                        O SR. PRESIDENTE (deputado Pedro Wilson) - Agradeço ao secretário
                        Dr. José Gregori as suas palavras e a sua presença
                        nesta Conferência. E gostaria, permita-me, quebrando um
                        pouco o protocolo, de fazer um apelo a S.Sa. e ao
                        governo no sentido de que, no prazo o mais rápido
                        possível, pudessem ser convocados os Srs. governadores,
                        para não só analisarmos o Plano Nacional, os
                        resultados desta Conferência, como também o
                        comprometimento dos governadores no sentido de que, na
                        Federação como um todo — União e estados federados
                        —, se possa cada vez mais implementar programas
                        estaduais.
                        
                                                
                        Faço um apelo a S.Sa. no sentido de que o
                        Ministério da Justiça, a Secretaria Nacional dos
                        Direitos Humanos ou o Sr. presidente da República
                        possam convidar os Srs. governadores para que não só
                        leiam o Programa Nacional, mas também implementem os 
                        programas estaduais 
                        com a participação do poder público e das 
                        entidades  da sociedade civil.
                        
                                                
                        Agradecemos, mais uma vez, a presença ao Dr.
                        José Gregori. Neste momento, S.Sa. terá que se
                        retirar. Daqui a pouco, iniciaremos os relatórios.
                        Também agradecemos a presença a todos os que
                        participaram da Mesa dos trabalhos.
                        
                                                
                        Gostaríamos de anunciar a presença da deputada
                        estadual de São Paulo Maria Passarelli; do vereador
                        Joaquim,  de
                        Uberlândia; do vereador 
                        Luiz Bassuna, de Salvador; do deputado federal
                        Alcides Modesto; do vereador Daniel Antônio, 
                        de Goiânia, presidente da Comissão de Direitos
                        Humanos da Câmara Municipal; do deputado estadual
                        Renato Simões, de São Paulo; do deputado federal Paulo
                        Rocha, do Pará; do deputado federal Gilney Viana, de
                        Mato Grosso; do deputado federal Luiz Alberto, da Bahia;
                        do governador Vitor Buaiz, do Espírito Santo, que
                        esteve presente mais uma vez; do deputado estadual
                        Claudio Vereza, do Espírito Santo. 
                        
                                                
                        Convido o deputado Carlos Vereza, numa homenagem
                        a toda a luta pelos direitos humanos, em favor dos
                        portadores de deficiência, a tomar assento à Mesa.
                        
                                                
                        Gostaria também de registrar a presença da
                        deputada estadual Maria Del Carmen Fidalgo, da Bahia; da
                        deputada estadual  Izane
                        Monteiro, do Pará; da deputada federal Fátima Pelaes;
                        da deputada federal Alcione Barbalho; da deputada
                        federal Socorro Gomes, 
                        do Pará.
                        
                                                
                        Convidamos também para tomar assento à mesa o
                        deputado Antonio José Cafu,  membro da Comissão de Direitos Humanos da Câmara
                        Legislativa do Distrito Federal. 
                        
                                                
                        Convidamos os relatores dos doze grupos e as
                        pessoas indicadas para tomar assento à Mesa.
                        Infelizmente não temos os nomes aqui por escrito, mas
                        peço que tomem assento e se identifiquem com relação
                        aos respectivos grupos.
                        
                                                
                        Gostaríamos de registrar a presença de Maria da
                        Guia, do Ministério da Justiça; de Carmélia Marques,
                        do Instituto de Identificação do Distrito Federal; de
                        Niéliton Leite Gomes, da BSGI; de Welington Rodrigues,
                        da Associação Brasil Soka Gakkai Internacional; de
                        Anísio Alves, do Ministério da Justiça; de João
                        Bosco Oliveira, da Associação Brasiliense de Peritos
                        em Criminalística; de Wanderley Chagas, da Associação
                        Brasileira de Criminalística; de Genesman Pereira, da
                        Polícia Militar de Goiás; de Adailton Vieira, da
                        Polícia de Goiás; de Rosita Milezi, do Centro
                        Scalabriano de Estudos Migratórios; de Rubens Lira, da
                        Comissão da Universidade Federal da Paraíba; de Marta
                        Marília, da OAB-Paraná; de Pedro Jorge, da Polícia
                        Militar de Alagoas; do vereador Geraldo Correia, da
                        Comissão de Defesa dos Direitos Humanos Câmara
                        Municipal de Lins; de Ivanildo José Ferreira, do Centro
                        de Direitos Humanos Simão Bororo de Rondonópolis; de
                        José Antônio Carvalho, da Comissão de Direitos
                        Humanos da Assembléia Legislativa da Bahia; de Alceu
                        Prestes, do Instituto de Identificação da Polícia
                        Civil do Distrito Federal; de Ubiratan Oliveira, do
                        Instituto de Identificação da Polícia do Distrito
                        Federal; de Jaiece Gomes Santana, da Liga de Mulheres
                        Eleitoras do Brasil Regional Nordeste; de Abiail
                        Florentina, do GEIPOT; de Francisco, da Comarca de
                        Castelo, Espírito Santo; de Maria Cecília, da
                        Assembléia Legislativa de São Paulo; de Deise
                        Benedito, da OAB de São Paulo; de Lélio Benis Correia,
                        da Fundação ABRINq; de Bernadete Ferreira, da SERPAJ,
                        Tocantins; de Sérgio José, do Sindicato dos Policiais
                        Civis de Pernambuco; de Ana Cristina, assessora
                        parlamentar da Polícia Militar do Distrito Federal; de
                        Cíntia Rodrigues, da Assessoria Parlamentar da Polícia
                        Federal.
                        
                                                
                        Gostaríamos também de comunicar aos senhores
                        presentes que ontem houve reunião informal da Comissão
                        de Direitos Humanos, com representantes de Comissões de
                        Direitos Humanos das Assembléias Legislativas, e já
                        foram realizadas três reuniões, três fóruns, 
                        reunindo as Comissões Legislativas de Direitos
                        Humanos, a Comissão Federal, as comissões estaduais e
                        as comissões municipais organizadas.
                        
                                                
                        Vamos ter o 4º Fórum Nacional de Comissões
                        Legislativas de Direitos Humanos nos dias 4 e 5 de
                        setembro. Nesse fórum, teremos momentos de
                        articulações, de relatórios, de encaminhamentos na
                        luta em prol dos direitos humanos em todo o Brasil. Esta
                        reunião nacional, que será realizada aqui em
                        Brasília, nos dias 4 e 5 de setembro, na Câmara, vai
                        ser precedida de três reuniões regionais.
                        
                                                
                        A primeira reunião será a do Nordeste, nos dias
                        1º e 2 de agosto, em Fortaleza, e as comissões do
                        Ceará e da Bahia estarão encarregadas da
                        organização. 
                        
                                                
                        A segunda reunião será a das comissões dos
                        estados do Centro-Oeste e do Norte, nos dias 4 e 5 de
                        agosto, aqui em Brasília, e a responsabilidade será da
                        Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados e
                        também da Comissão Distrital de Brasília.
                        
                                                
                        A terceira reunião regional será a dos estados
                        do Sudeste e do Sul, nos dias 11 e 12 de agosto, em São
                        Paulo. Os Estados de São Paulo e Minas Gerais serão os
                        responsáveis pela organização.
                        
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