Relatório
IV Caravana Nacional de Direitos Humanos
Uma amostra da
situação dos adolescentes privados de liberdade nas Febems e
congêneres
Esse
relatório é dedicado a
Ebeneézer
Salgado Soares,
Sueli
de Fátima Buzo Riviera e
Wilson
Ricardo C. Tafner.
Promotores
da Infância e da Juventude
do
Estado de São Paulo, exemplos de coragem e
determinação
Estatuto da Criança e do
Adolescente
Seção VII - Da Internação
Art. 121 - A internação constitui
medida privativa da liberdade, sujeita aos princípios da
G brevidade, excepcionalidade e respeito à condição peculiar de
pessoa em desenvolvimento.
Parágrafo primeiro - Será
permitida a realização de atividades externas, a critério da
equipe técnica da entidade, salvo expressa determinação
judicial em contrário.
Parágrafo segundo - A medida não
comporta prazo determinado, devendo sua manutenção ser avaliada,
mediante decisão fundamentada, o máximo a cada 6 meses.
Parágrafo terceiro - Em nenhuma
hipótese o período máximo de internação excederá três anos.
Parágrafo quarto - Atingido o
limite do parágrafo anterior, o adolescente deverá ser liberado,
colocado em regime de semi-liberdade ou de liberdade assistida.
Parágrafo quinto - a liberação
será compulsória aos vinte e um anos de idade.
Parágrafo sexto - Em qualquer
hipótese a desinternação será precedida de autorização
judicial, ouvido o Ministério Público.
Art. 122 - A medida de internação
só poderá ser aplicada quando:
I - tratar-se de ato infracional
cometido mediante grave ameaça ou violência contra a pessoa;
II - por reiteração no
cometimento de outras infrações graves;
III - por descumprimento reiterado
e injustificável da medida anteriormente imposta.
Parágrafo primeiro - O prazo de
internação na hipótese do inciso III deste artigo não poderá
ser superior a três meses.
Parágrafo segundo - Em nenhuma
hipótese será aplicada a internação, havendo outra medida
adequada.
Art. 123 - A internação deverá
ser cumprida em entidade exclusiva para adolescente, em local
distinto daquele destinado ao abrigo, obedecida rigorosa
separação por critérios de idade, compleição física e
gravidade da infração.
Parágrafo único - Durante o
período de internação, inclusive provisória, serão
obrigatórias atividades pedagógicas.
Art. 124 - São direitos do
adolescente privado de liberdade, entre outros, os seguintes:
I - entrevistar-se pessoalmente com
representante do Ministério Público;
II - peticionar diretamente a
qualquer autoridade;
III - avistar-se reservadamente com
seu defensor;
IV - ser informado de sua
situação processual, sempre que solicitada;
V - ser tratado com respeito e
dignidade;
VI - permanecer internado na mesma
localidade ou naquela mais próxima ao domicílio de seus pais ou
responsáveis;
VII - receber visitas, Gao menos,
semanalmente;
VIII - corresponder-se com seus
familiares e amigos;
IX - ter acesso aos objetos
necessários à higiene e asseio pessoal;
X - habitar alojamento em
condições adequadas de higiene e salubridade;
XI - receber escolarização e
profissionalização;
XII - realizar atividades
culturais, esportivas e de lazer;
XIII - ter acesso aos meios de
comunicação social;
XIV - receber assistência
religiosa, segundo a sua crença, e desde que assim deseje;
XV - manter a posse de seus objetos
pessoais e dispor de local seguro para guardá-los, recebendo
comprovante daqueles porventura depositados em poder da entidade.
XVI - receber, quando de sua
desinternação, os documentos pessoais indispensáveis à vida em
sociedade.
Parágrafo primeiro - Em nenhum
caso haverá incomunicabilidade.
Parágrafo segundo - A autoridade
judiciária poderá suspender temporariamente a visita, inclusive
de pais ou responsável, se existirem motivos sérios e fundados
de sua prejudicialidade aos interesses do adolescente.
Art. 125 - É dever do Estado zelar
pela integridade física e mental dos inGternos, cabendo-lhe adotar
as medidas adequadas de contenção e segurança.
Apresentação:
ANOTAÇÕES SOBRE UMA DISTÂNCIA
Marcos Rolim
"Sem justiça, o que são os
reinos
senão grandes assaltos; o que são
os
roubos senão pequenos
reinos?"
Santo Agostinho
O presente relatório oferece uma
idéia – mesmo que aproximada – da situação vivida pelos
adolescentes privados de liberdade em Unidades de internação das
FEBEMs e entidades congêneres no Brasil. Ao todo, foram 18
Instituições inspecionadas, em 5 estados visitados pela IV
CARAVANA NACIONAL DE DIREITOS HUMANOS, entre os dias 1 e 9 de
março desse ano. A esse conjunto, anexamos um breve relatório
sobre inspeção que realizamos no dia 20 de março em uma Unidade
de internação de Maceió, AL. No seu conjunto, as informações
aqui contidas permitem uma amostragem representativa da realidade
brasileira de tratamento de adolescentes em conflito com a lei.
O título que oferecemos ao
relatório – "O Sistema Febem e a Produção do Mal" -
expõe uma síntese de natureza crítica pela qual recusamos,
explicitamente, um modelo de "atendimento" aos
adolescentes infratores centrado no encarceramento e na submissão
dos jovens a um conjunto de sentenças exGtra-judiciais.
Denominamos esse modelo como "Sistema Febem" porque,
independentemente do nome dos departamentos ou fundações
encarregados de gerir o sistema de medidas sócio-educativas nos
estados, é a herança do antigo Código de Menores que se
apresenta como largamente hegemônica. A FEBEM, como se sabe, é
filha dileta daquele ultrapassado documento legal. O que
consideramos, então, "Sistema Febem" é o conjunto de
mecanismos institucionais responsáveis pela reprodução do
paradigma do encarceramento em tudo contrário ao que dispõe o
Estatuto da Criança e do Adolescente.
Esse sistema é "produtor do
mal" porque distribui sofrimentos, precipita vínculos
criminais e promove uma identidade delinquente entre os internos.
Por óbvio, a expressão
"Sistema Febem" não pretende traduzir os compromissos
de todos quanto, desde o interior das unidades de internação,
trabalham na execução de medidas sócio-educativas e na tutela
dos adolescentes em conflito com a lei. Muitos são os
trabalhadores das FEBEMS e congêneres que lutam, concretamente,
contra as características institucionais perversas que os
antecederam. Uma parte dos funcionários daquele sistema tem
demonstrado, inclusive, que é possível construir vínculos
afetivos e relações democráticas com os internos diante de
situações de carecimentos extremos quanto ao regime de trabalho
ou,mesmo, frente a estruturas tipicamente prisionais.
Outra parte desses funcionários,
infelizmente, tem se mostrado partícipe de uma tGradição que
encontrou na estupidez e na violência o caminho mais curto para
assegurar o que costumam chamar de "ordem e disciplina".
Hannah Arendt assinalou que "a fúria é a impotência
tornada ativa". De fato, os procedimentos responsáveis pelas
agressões contra os internos nas unidades de internação –
ainda hoje tão comuns – expressam, para além das patologias
identificáveis, uma incapacidade ou um não-saber. Seria,
ademais, injusto atribuir aos maus funcionários dessas
instituições a responsabilidade exclusiva pelos maus tratos. Em
larga medida, muitos dos governantes e dos próprios gestores do
sistema foram e são coniventes com as referidas violações.
Pode-se afirmar o mesmo, pelo menos, de uma parte dos magistrados
e promotores com atuação na área. Essas condutas de conivência
ou omissão , quando não de participação direta , não deixam
de refletir, de alguma forma, a demanda punitiva crescente na
sociedade brasileira cujas fronteiras com a barbárie nem sempre
são nítidas.
Seja como for, o que esse
relatório permite observar é uma distância impressionante entre
aquilo que dispõe a lei – no caso, uma das mais avançadas em
todo o mundo, o ECA – e a realidade mesma do tratamento
dispensado aos adolescentes privados de liberdade. Evidentemente,
o Brasil possui também exemplos dignificantes e experiências de
aplicação de medidas sócio-educativas em Unidades que não
reproduzem o perfil de encarceramento. Algumas delas foram
visitadas pela IV CARAVANA e muitas outras –de que temos boas
referências – poderiam ter sido visitadas. Nossa preocupação,
G entretanto, esteve centrada no conhecimento daquelas realidades
que sabíamos mais graves, cujo próprio histórico nos desafiava
a conhecê-las melhor. Nossas visitas foram realizadas, todas, sem
prévio aviso e os depoimentos que tomamos dos internos foram
registrados sem a presença de seguranças ou de qualquer outra
pessoa com vínculos às Instituições visitadas. Como regra,
mantivemos contato com as direções das unidades, antes e depois
das visitas, para levantar dados sobre as Unidades e compreender
melhor as políticas em andamento. Também como regra, não
entrevistamos funcionários do Sistema. Primeiro, porque o tempo
que dispúnhamos tornaria esse procedimento impossível; segundo,
porque a opinião dos funcionários, os problemas que enfrentam e
suas sugestões podem chegar até os canais competentes –
inclusive à Comissão de Direitos Humanos- através de suas
entidades de representação e lideranças sindicais. Nossa
opção foi a de assegura o tempo de "escuta" àqueles
que, de outra forma, não poderiam ser ouvido e àqueles a quem,
via de regra, jamais se concede a palavra: os próprios
adolescentes privados de liberdade.
Há uma comovente e extraordinária
personagem de um filme de Wim Wenders – "O Hotel de Um
Milhão de Dólares" – vivida pela atriz Milla Jovovich
que, em determinado diálogo, confrontada com os riscos de seu
hábito de fumante, oferece a seguinte resposta: - "Não há
problema em fumar, pois eu não existo." Como assim? Pergunta
seu interlocutor. Ela, então, insiste: - "Eu não existo,
compreende? Quem não existe não pode morrer." Uma
G funcionária de uma das Casas de Internação para adolescentes em
conflito com a lei no Rio de Janeiro relata a seguinte
experiência: "...numa dessas últimas rebeliões, um
adolescente jogou um botijão de gás no fogo e não saiu de
perto. Alguém perguntou se ele não pensou que, se aquilo
explodisse, ele iria junto. A resposta foi simplesmente essa: -
"E que diferença faz?"
As duas cenas - uma sugerida pela
sensibilidade do artista, outra recolhida como experiência
dramática - permitem que se vislumbre um fenômeno absolutamente
radical que parece ser oferecido pelas modernas sociedades: o fato
de que um número indeterminadado de seres humanos, excluídos e
marginalizados socialmente, percebem-se não apenas como carentes
de sentido, mas mergulhados em uma dinâmica de tamanha
negatividade que a sua vida mesma lhes aparece como desprovida de
realidade. Em primeiro lugar, para eles já não há história. O
passado que lhes foi possível só é suportável como
esquecimento. Suas cicatrizes - as que recobrem o corpo e as que
tatuam suas almas - lhes acompanharão de qualquer forma como uma
herança indesejada. Ao mesmo tempo, para eles não há
perspectivas, nem desejos que se projetem em direção ao futuro.
Aquilo que virá só possui significado como ameaça. Por isso,
trata-se de esquecer também o futuro e mergulhar em uma única
dimensão temporal: um presente contínuo, espaço de fruição
imediata e de um gozo sem limites que contraste a privação e o
nada em que foram confinados. Quando de nossa visita a U-30, no
complexo prisional erguido pelo governo de São Paulo para
encarcer adGolescentes a partir dos 12 anos, encontramos um jovem
que trazia tatuada em seu antebraço a seguinte pergunta:
"Por que o medo se o futuro é a morte?" A frase, por si
só, simboliza essa situação dramática de uma vida confinada ao
presente e, portanto, desprovida de sentido.
É preciso analisar como tudo isso
pode se afirmar entre segmentos da adolescência iniciando-se por
perguntar o que é a adolescência. Muitas dos trabalhos
clássicos ( Erik Erikson, Donald Winnicott, Arminda Aberasturay,
Eduardo Kalina, Maurício Knobel, por exemplo) e outros
contemporâneos destacam o fato de que a adolescência se
caracteriza por um "não lugar"; uma espécie de
"entre dois". Afinal, o adolescente não é uma
criança, mas tampouco é um adulto. Tal situação faz da
adolescência um espaço equivalente àquele conhecido pelos
migrantes, fora de seu meio original e ainda não alojados no novo
lugar. (2) Estudos antropológicos como o de Margaret Mead ou de
historiadores como Philippe Ariès fazem crer que a adolescência
não constitui um fenômeno universal; mas uma circunstância
moderna, resultado de determinadas características culturais. Em
muitas das sociedades antigas ou tradicionais, a entrada no mundo
adulto era assegurada, simbolicamente, por um ritual de passagem,
o que poderia acontecer em idades muito distintas a depender das
tradições. A idéia de uma "moratória social" , um
aprazamento necessário para que o adolescente se prepare para o
mundo adulto e tenham algo como um segundo crescimento, é uma
idéia nova na história mundial. A adolescência consiste em uma
G busca por um "lugar" (3) No caso, é, também, um
trabalho de luto, não somente pela infância perdida (4), mas um
"luto por uma certa forma de eficácia simbólica
comunitária destruída" (5) A adolescência, segundo Carmem
Oliveira (6) é, por isso mesmo, uma operação psíquica sem
duração determinada que, na ausência de ritos de passagem,
remete o jovem a uma indagação recorrente: o que o outro quer de
mim? (7)
Ora, esse momento tão particular
de adolescer passa a sofrer em nossa época uma série de
agenciamentos que precisam ser identificados. De início, parece
evidente o quanto a publicidade através dos grandes meios de
comunicação social passa a produzir de apelos comerciais
voltados exclusivamente ao chamado "público jovem" e o
quanto isto promove uma determinada "identidade" aos
próprios jovens. Eles existem, na exata medida em que consomem,
visto que só a propriedade de produtos e marcas
"jovens" lhes assegura visibilidade. Viver é ir entre o
que vive, diria João Cabral. E isto pressupõe ser observado, ser
visto, ser notado. Nossa existência, por óbvio, dá-se pelo
olhar do outro. Se ser visível no mundo contemporâneo pressupõe
a posse de determinados bens, sejam eles quais forem, então o ato
de consumir passa a ser uma condição incontornável da vida
mesma, enquanto vida reconhecida. Essa situação define, também,
em sua situação inversa, o que se desdobrará como experiência
dramática para aqueles que estejam alijados do consumo: eles
simplesmente não existirão. O processo de exclusão não se
delimita apenas espacialmente a pGartir das fronteiras que separam
o centro ou as áreas privilegiadas de nossas cidades de suas
periferias esquecidas. Ele se afirma, antes, pelas possibilidades
e impossibilidades de consumo. Dessa forma, no momento da vida
onde se espera que os jovens decidam-se e formem suas identidades
- o aprazamento já referido - o que se observa é que as
expectativas geradas pelas sociedades de consumo lhes oferecem um
padrão de beleza e saúde, um padrão de diversões e prazeres,
um padrão de inteligência e atração sexual, todos diretamente
vinculados ao consumo de produtos que são como que signos de
sucesso, griffes de felicidade. O que é oferecido simbolicamente
a todos, não obstante, é o mesmo que é subtraído de milhões
de jovens pobres, negros e semi-alfabetizados que habitam nossas
periferias. Esses jovens transitam desequipados de todos os
símbolos da inclusão. Não podem frequentar os espaços dos que
estão "dentro"da sociedade, nem ostentar suas marcas.
Logo, são invisíveis e, concretamente, não existem.
É difícil imaginar os sentimentos
vivenciados por esses jovens. Reportagem da Revista Veja em
22/06/94, traz um testemunho de uma jovem de 15 anos, moradora de
uma favela carioca: "A gente nunca compra roupa. Ou compra
roupa ou comida. Os dois, não dá. A gente ganha roupa usada.
Nunca ganhei um tênis novo da minha mãe ou do meu pai. Tenho um
sapatinho que ganhei de um bandido daqui que assaltou um caminhão
da C & A . Eu não gosto de usar roupas usadas. Preferia ter
dinheiro para comprar. Eu queria ter um tênis da Redley e uma
camiseta da Anonimato." Carentes de tudo aquiloG que a
modernidade construiu como emancipação e alijados das próprias
promessas de emancipação, a convivência desses jovens
marginalizados socialmente com aqueles que estão incluídos
torna-se atravessada por uma tensão primordial. Afinal, por que
mesmo alguns podem tudo e têm acesso garantido a tudo enquanto
outros devem conformar-se com o nada? Uma pergunta assim - que
jamais será respondida pelos defensores da ordem - oferece a
esses meninos e meninas apenas uma certeza: a certeza da
injustiça que os produz. Não por acaso, os jovens privilegiados,
integrantes das elites, são vistos com um misto de desdém e
ódio por muitos dos jovens de periferia. "Otário",
"playboy" , "gado" , são alguns dos nomes com
os quais se os designam; desqualificações pelas quais se tenta
compensar uma distância que se sabe insuperável. Inúteis,
condenados ao fracasso, ignorantes e ameaçadores, os jovens
excluídos não conhecem o processo argumentativo e, para eles, a
democracia é apenas uma palavra tola. Não há espaço público
onde se reconheçam e, por decorrência, não podem ser ouvidos.
Se um entre eles resolve empregar o seu salário na compra de uma
roupa de griffe ou na aquisição de qualquer dos ícones
produzidos pelo capitalismo, não serão raras as oportunidades em
que a Polícia os abordará sob a suspeita de terem roubado aquilo
que compraram e, muitas vezes, os expropriará. Aliás, é esta
face repressiva a única demonstração do Estado que conhecem.
Entre eles, a noção de "autoridade" e mesmo o sentido
da palavra "Lei" expressam tão somente o rosto do
inimigo. Por isso mesmo, eles reagem Gem um apelo mudo para afirmar
sua existência. A cidade os excluiu? Trata-se, então de ocupar a
cidade. Não lhes dão a palavra? Trata-se, então, de
registrá-la nos muros e nas fachadas com grafitte. Lhes sonegam o
dinheiro para que tenham acesso aos símbolos da juventude? Ora, o
dinheiro se pode tomar. Mas o pior é que, diante deles, a
sociedade dos incluídos responde com um largo silêncio. A
atitude predominante dos que estão do lado de cá, no mundo
paradisíaco do mercado, traduz apenas a indiferença, aquela que
"constitui o partido mais ativo e, certamente, o mais
poderoso" (8)
É precisamente a partir dessa
constatação que Glória Diógenes nos oferece uma pergunta
perturbadora: " Não seria a violência uma resposta
sangrenta e espetaculosa à indiferença a que são relegados os
jovens da periferia?" (9)
Antes mesmo de esboçar uma
resposta, caberia chamar a atenção para um outro agenciamento
sublinhado por Carmem Oliveira. Vivemos, atualmente, no Brasil,
uma "onda jovem". O fenômeno denota o crescimento da
população juvenil a partir da metade da década de 90 e resulta
do "baby boom" do início dos anos 80. Assim, o maior
segmento populacional dos anos 80 estava na faixa etária
compreendida entre 0 - 4 anos. Em 1995, situou-se na faixa entre
10 - 14 anos e, consequentemente, em 1999 estava entre 15 - 19
anos. A taxa de fecundidade no Brasil começou a cair a partir de
1983, notadamente devido às experiências de esterilização em
massa que atingiram as mulheres de comunidades pobres. Assim, há
G 12 anos, o número de jovens era relativamente pequeno enquanto
que, em 1995, o número de jovens entre 20 e 24 anos atingiu um
contingente de 13 milhões de indivíduos e o número de
adolescentes entre 15 e 19 anos alcançava 15,7 milhões de
pessoas. Somados, jovens e adolescentes eram já quase 19% da
população brasileira. Como resultado, entramos o novo milênio
em um pico demográfico no número de adolescentes e com a maior
população juvenil de nossa história.
Se tivermos em mente as dimensões
avassaladoras da crise econômica e social vivida nesse último
período no Brasil, os indicadores expressivos de desemprego
aberto e a ausência de alternativas que se oferece ao jovens da
periferia, teremos uma mistura explosiva que só poderia implicar
em mais violência.
De qualquer forma, seria preciso
denunciar o fato de que, ao se tratar do fenômeno da violência
juvenil, muitos dos analistas e, frequentemente, a maioria dos
formadores de opinião ignorem as dimensões reais do problema e
desconsiderem o fenômeno muito mais grave e dramático da
violência praticada no Brasil por adultos contra as crianças e
adolescentes. De fato, se desejássemos elencar prioridades para
políticas públicas que relacionassem a violência e a juventude
no Brasil, haveríamos de partir do jovem e da criança enquanto
vítimas e não como perpetradores.
As proposições que pretendem a
redução da idade penal nos oferecem a visão de uma viagem no
tempo. É em direção ao passado que elas nos orientam. Afinal, o
sistema de criminalizaçãGo de adolescentes caracterizou a
doutrina penal do século XIX com o Código Criminal do Império
que, promulgado em 1830, somente impedia a responsabilização
criminal dos menores de 14 anos. Pior do que isso, o primeiro
Código Penal da República, editado em 1890, só não considerava
criminosos "os menores de 9 anos completos" (!) ou
aqueles que sendo maiores de 9 e menores de 14 houvessem agido sem
discernimento. Nenhuma dessas experiências, aqui no Brasil ou em
qualquer outro país, foi capaz de afirmar um caminho para a
redução da violência juvenil ou para a reinserção social dos
infratores. Pelo contrário. São muitos os estudos que associam o
rigor penal à industrialização da própria violência pelo
efeito criminogênico das chamadas instituições totais. Não
casualmente, a grande maioria das nações fixou a idade de
imputabilidade aos 18 anos – hoje são 55% . ( 0,5% delas
mantém a idade de 14 anos; 8,0% a de 15 anos; 13% a de 16 anos;
19% a de 17 anos; 0,5% a de 19 anos e 4,0% a de 21 anos)
Os atos infracionais praticados por
adolescentes no Brasil, aliás, não alcançam 10% das crimes.
Quanto à violência contra a pessoa, estatísticas do SOS
Criança e da Secretaria Estadual da Família, da Criança e Bem
Estar Social de São Paulo demonstram que, para mais de 5.000
homicídios ocorridos no município de São Paulo, no ano de 1996,
não mais do que 275 foram praticados por adolescentes o que
corresponde a, aproximadamente, 5,5% do total. Observando o perfil
dos adolescentes em cumprimento de medidas sócio-educativas em
nosso país, descobre-se que, em sua grande maioria, a infração
G cometida se traduz em crimes contra o patrimônio - cerca de 74%,
sendo que, desse total, 50% são casos de furto. Os crimes
praticados contra a vida representam 8,46% deste universo. (10)
Segundo dados da própria FEBEM de São Paulo, 91% dos internos
não possuem o primeiro grau completo e, em todo o país, apenas
3,9% dos adolescentes sob medida sócio-educativa concluíram o
ensino fundamental.
Ora, pretender que o encaminhamento
desses jovens em conflito com a lei aos presídios brasileiros
possa construir alguma solução para o problema da violência
juvenil é, na melhor das hipóteses, uma ingenuidade sem
precedentes. Muitas vezes, não obstante, não há que se falar em
ingenuidade, mas em demagogia mesmo, em seu estado puro. O
discurso em favor do endurecimento penal procura estabelecer uma
sintonia com as angústias disseminadas socialmente por conta da
sensação de insegurança. Aqueles que sustentam, então, um
discurso reconhecido como "duro" contra o crime
obterão, mais facilmente, os dividendos eleitorais que procuram.
Concretamente, a eventual aprovação da redução da idade penal
só logrará aviltar ainda mais as condições de execução penal
no Brasil e nos oferecerá o gosto amargo de uma nova
impossibilidade: a de recuperar jovens infratores em convívio com
presos adultos, em presídios ou em delegacias de polícia.
Notas:
(1) BRAGANÇA
SOARES, Judá Jessé. &Gquot;O Sistema socioeducativo no âmbito
do Estado do Rio de Janeiro: panorama atual e
perspectivas". In: BRITO, Leila Maria Torraca (coord.)
Resposabilidade. Rio de Janeiro; EDUERJ, 2000.
(2) RASSIAL,
Jean-Jacques. "Da Delinquência". In: O
adolescente e o Psicanalista. Rio de Janeiro: Companhia de
Freud, 1999.
(3) RUFFINO,
Rodolfo. "Sobre o lugar da adolescência na teoria do
sujeito". In: RAPPAPORT, Clara Regina. Adolescência:
abordagem psicanalítica. São Paulo: EPU, 1993.
(4) ABERASTURY,
Arminda. "Adolescencia". In: ABERASTURY,
Arminda (org). Adolescencia. Buenos Aires: Ediciones Kargieman,
1973.
(5) RUFFINO,
Rodolfo. Ob.Cit
(6) OLIVEIRA,
Carmem. "A adolescência em Conflito com a Lei:
cartografias da juventude brasileira" . Porto Alegre,
2001
(7) CALIGARIS,
Contardo. Adolescência. São Paulo: Publifolha, 2000.
(8) FORRESTER,
Viviane. "O horror econômico". São Paulo:
UNESP. 1G997.
(9) DIÓGENES,
Glória. "Cartografias da Cultura e da Violência:
gangues, galeras e movimento hip hop" , São
Paulo, Annablume, 1998.
(10) SPOSATO,
Karyna. "Só se educando" In: Textos
Reunidos, Revista do ILANUD, n 12, São Paulo, 1998.
I - PARÁ :
Começamos a
IV Caranava Nacional de Direitos Humanos em Belém, capital do
Pará. Nessa cidade estão localizadas todas as unidades (em número
de quatro) de internação existentes no estado. Essa circunstância
- a concentração de unidades de internação na capital , já
evidencia um problema estrutural bastante grave uma vez que
adolescentes do interior do Pará que recebam medidas de privação
de liberdade devem ser encaminhados a Belém. Na maioria dos
casos, isso implicará na ausência de visitações por parte de
seus familiares, invariavelmente pobres e impossibilitados de
arcar com os custos do deslocamento. Assim, muitos dos
adolescentes internados não estarão apenas privados de sua
liberdade, estarão, também, sós.
A Comitiva local
que reuniu-se à Caravana, formada pelos Deputados Federais Marcos
Rolim (PT) e Cabo Júlio (PL) foi composta pelas Deputadas
Estaduais Araceli Lemos (PT), Sandra Bastista (PCdoB) e Tetê
(PSDB), mais o Deputado Estadual Mário Cardoso (PT); as
vereadoras Suely Oliveira (PT) e Regina Barata (PCdoB), o vereador
Paulo Fontelles (PCdoB); a assessora da Secretaria de Segurança Pública
do Pará, Heloísa; o Promotor Roberto Souza e o representante da
OAB, José Carlos Castro, mais os jornalistas Beatriz Magno e José
Varella (Correio Braziliense); Nicolau Farah e Carlos Eduardo
(Jornal do Brasil). O presidente da FUNCAP, Haroldo Teixeira, nos
acompanhou nas visitas às unidades.
1) CIAM -
Ociosidade e modelo prisional
Ficha
técnica:
Centro
de Internação para Adolescentes Masculino (CIAM)
Clientela
- Adolescentes com internação provisória
Diretor
- Domingos Campelo
Fone
- 091 - 255G3800
Capacidade
- 40 vagas
Lotação
- 35 internos
Analfabetos
- 11
Atividades
- poucas
Educação
- inexistente
Assistência
Jurídica - inexistente
Assistência
médica - precária
Assistência
social - precária
Assistência
Psicológica - precária
Sexualidade
- interditada
Alojamentos
- celas
Celas
de isolamento - sim
Denúncias
de maus tratos - sim
Denúncias
de tortura - não
A primeira unidade
visitada foi o Centro de Internação de Adolescentes Masculino (CIAM).
Trata-se de uma casa com capacidade para 40 internos, dividida em
3 galerias com celas - onde estão os internos, mais uma área
administrativa e um pátio interno no formato de quadra para
futebol de salão. Cada uma das galerias possui 8 celas onde
ficam, em média, 2 internos. A instituição procura garantir a
separação, nessas galerias, de adolescentes por idade e perfil
infracional o que é uma medida correta, em conformidade com o que
dispõe o Estatuto. Entre a área administrativa e as galerias, há
um espaço intermediário como um salão onde os internos podem
ter acesso a alguns jogos (dominó, pimbolim) e onde estavam, em
sua maioria, quando chegamos.
A unidade
caracteriza, nitidamente, uma prisão para adolescentes em
contraste flagrante com o preconizado pela Lei 8069/90, o Estaduto
da Criança e do Adolescente. (ECA) As celas são minúsculas e fétidas
e os adolescentes permanecem grande parte do dia trancados. As
celas não possuem banheiro, nem pia ou água. Para que tenham
acesso ao banheiro ou para que possam beber água, é preciso que
chamem os monitores, que gritem ou que batam insistentemente nas
grades. Os internos não possuem escovas de dente ou pasta.
Entre as queixas
G que ouvimos dos meninos - em contatos reservados que mantivemos -
podemos destacar:
1. Maus tratos - vários internos
relataram que alguns dos monitores os humilham frequentemente e são
agressivos distribuindo ameaças. Um dos internos relatou ter
apanhado após ter tentado uma fuga; acrescentou, também, que
permaneceu dois dias algemado em sua cela. Vários internos
relataram que, frequentemente e por motivos fúteis, são
encaminhados às celas de contenção e lá permanecem por muitos
dias. As punições são efetivadas segundo a discricionariedade e
o "humor" dos monitores; são arbitrárias não
obedecendo o disposto pela Lei.
2. Ociosidade - Os internos,
rigorosamente, não têm o que fazer. Nos poucos períodos em que
estão fora das celas, permanecem em total ociosidade. A quadra de
esportes é sub utilizada e o acesso dos jovens a ela dá-se por
um período muito curto. Não há qualquer atividade sócio-educativa.
3. Precariedade na atenção à saúde
- Vários dos meninos apresentam problemas de saúde que são,
simplesmente, ignorados. Pode-se afirmar que a maioria deles sofre
com as doenças de pele - promovidas pelas próprias condições
de encarceramento e pela rara exposição ao sol. Um dos jovens -
R.S., 16 anos - relatou a necessidade de intervenção cirúrgica
no estômago, já indicada há muito tempo. Há 28 dias, ele
aguardava por algum encaminhamento no CIAM sem jamais ter sido
examinado por um médico.
Foi possível
perceber que a unidade havia sido limpa antes de nossa visita. A
notícia de nossa inspeção vazou e era do domínio das
autoridades locais. No CIAM, os próprios internos foram
convocados a limpar toda a instituição; providência que, além
de pretender uma "maquiagem" do local, contraria
frontalmente o disposto pelo ECA e, também, o conteúdo da
portaria do Ministério do Trabalho de número 06 de 18/02/2000
que dispõe sobre as atividades perigosas ou insalubres vedadas
aos adolescentes.
Ao que tudo indica,
a alimentação oferecida aos internos é de baixa qualidade.
Muitos dos meninos reclamaram que a comida é "muita farinha
e pouca carne." Por motivos "de segurança" os
familiares dos internos não podem enviar gêneros alimentícios.
A restrição é desnecessária e pouco inteligente e só assegura
maiores dificuldades para afirmação e desenvolvimento de uma
relação afetiva dos internos com seus familiares.
Nessa mesma orientação
restritiva, os familiares dos internos são submetidos ao
procedimento vexatório, humilhante e ilegal das revistas com
desnudamento realizadas, no caso do Pará, por policiais
militares. No caso, como costuma ocorrer no sistema prisional, as
unidades não dispõem de detectores de metais. Na ausência desse
instrumento elementar de segurança - pela omissão e incompetência
do Estado - adota-se o procedimento padrão do desnudamento,
seguido por flexões e "arregaço"da vagina e ânus.
Como não se trata deG procedimento universal - funcionários,
autoridades, advogados, fornecedores, etc. não são submetidos à
revista - não há como se esperar dele qualquer segurança
efetiva. A única certeza nesse tipo de revista é a de que
centenas de pessoas pobres e humildes serão, sistematicamente,
humilhadas. Como se não bastasse, as visitas possuem uma duração
de, no máximo, duas horas por semana. Por que tão pouco tempo? Não
seria desejável e estimulante que familiares pudessem passar mais
tempo junto aos internos?
Dois dos internos são
pais. A grande maioria dos adolescentes do CIAM possuía vida
sexual ativa antes da internação. Alguns, seguramente, construíram
relações estáveis com suas companheiras. Nenhum deles possui,
no entanto, o direito a "visitas íntimas". Os motivos
alegados para essa interdição sem base legal são os mais
variados e, comumente, expressam hipocrisia. Primeiro, parte-se do
pressuposto de que a menoridade seja incompatível com a liberdade
sexual; posição que parece denotar, sim, incompatibilidade com
os hábitos e práticas sexuais amplamente aceitos pelas
sociedades ocidentais contemporâneas, notadamente o Brasil.
Segundo, sustenta-se a impossibilidade de realização das visitas
íntimas por conta das deficiências de infra-estrutura das próprias
unidades. Ora, nas unidades prisionais - reservadas aos adultos -
também não há, em regra, qualquer infra-estrutura que viabilize
as visitas íntimas. No entanto, elas ocorrem normalmente. De
outro lado, se há deficiências, porque elas nunca são
enfrentadas para que se viabilize o relacionamento sexual? Inúmeras
G reformas são realizadas em unidades de internação de
adolescentes em conflito com a lei. Normalmente, elas são feitas
para restringir ainda mais os direitos dos internos. Por que não
reformas a favor dos internos?
- EREC - Recomeço do Código de
Menores
Ficha
Técnica:
Centro
de Internação Espaço Recomeço - (EREC)
Clientela
- Adolescentes com medida de privação de liberdade
Diretor
- Raimundo Monteiro Gonçalves
Fone
- 091- 2554235
Capacidade
- 40 vagas
Lotação
- 49 internos
Analfabetos
- 09
Atividades
- poucas
GEducação
- precária
Assistência
Jurídica - inexistente
Assistência
Médica - precária
Assistência
social - precária
Assistência
psicológica - razoável
Sexualidade
- interditada
Alojamentos
- celas
Celas
de isolamento - Sim
Denúncias
de maus tratos - Sim
Denúncias
de tortura - Não
"Espaço
Recomeço" poderia indicar, pelo nome, uma possibilidade nova
oferecida aos internos. Pelo título da unidade de internação,
poder-se-ía imaginar um projeto capaz de oferecer aos
adolescentes em privação de liberdade uma "vida nova",
G cheia de promessas generosas. O que se descobre, não obstante, é
a existência de uma prisão comum com um prédio em forma de
"L" onde estão 13 celas, cada uma delas com dois
beliches de concreto. Em um outro ponto, longe de todos e de tudo
há uma espécie de "cofre" onde se construiu um
isolamento escuro, úmido e nojento. Além dessa estrutura
medieval, há duas outras celas chamadas "de contenção"
que ficam juntas à área administrativa, visíveis logo à
entrada. Quem visita essa instituição estaria autorizado a
imaginar que ela deveria ser, possivelmente, mais uma parte da
herança do antigo Código de Menores, tempo em que aprisionar
adolescentes era prática com sustentação legal no Brasil Ocorre
que o EREC foi inaugurado em novembro de 1998, oito anos após,
portanto, a vigência do Estatuto da Criança e do Adolescente. As
autoridades governamentais responsáveis pela obra deveriam ser
responsabilizadas por terem tido o desplante de erguer um prédio
que constitui, ele próprio, uma afronta à Lei e aos Direitos
Humanos.
No EREC, por conta
do projeto arquitetônico, sequer a providência assegurada no
CIAM de separação dos internos em alas por idade, compleição física
e perfil infracional é possível, pelo que se viola o disposto no
artigo 123 do Eca.
O perfil
infracional presente na Unidade envolve, aproximadamente, 50% de
casos de crimes contra o patrimônio, 20% de homicídios, 20% por
descumprimento de medida anterior, 5% de atentado violento ao
pudor e 5% de outras ocorrências.
Havia, pelo menos,
dois internos com problemas de saúde mental que não poderiam
estar ali, mas em local adequado para tratamento como dispõe o
ECA.
Pelo menos 6 dos
jovens internos são pais. Também aqui, a sexualidade de todos os
adolescentes é interditada na sucessão de "sentenças"
extra-judiciais que caracterizam as chamadas "instituições
totais" e com as quais parecem ter se habituado os operadores
do sistema.
Há denúncias dos
internos de maus tratos e práticas de agressões físicas por
parte de alguns monitores e Policiais Militares. Levantamento
realizado pelo Centro de Defesa da Criança e do Adolescente (CEDECA-EMAÚS)
de Belém - ONG que realiza um respeitável trabalho de
monitoramento da execução de medidas sócio educativas no Pará
- em dezembro de 2000, assinalou que 27,7% dos internos no EREC
relataram casos de agressão física na unidade. A prática parece
ser estimulada objetivamente por fatos como aqueles que sucederam
o motim de setembro de 2000 quando internos foram encaminhados ao
Ministério Público para que respondessem por danos ao patrimônio,
mas nenhum deles - em que pese as denúncias que faziam de
espancamentos - foi encaminhado a exame de lesões. (denúncia
constante do relatório do CEDECA). Recebemos denúncia de que, em
certas circunstâncias, os monitores retiram o colchão de
internos como forma de puni-los.
Os jovens reclamam
da qualidadGe da comida e, fundamentalmente, da pouca quantidade
que lhes é oferecida. Muitos afirmaram que sentem fome. A situação
da saúde dos internos é preocupante. Muitos possuem doenças de
pele; outros tantos sofrem com problemas dentários. Pelo menos 15
internos recebem medicação psicotrópica; todos, segundo nos
asseguraram os dirigentes da unidade, mediante prescrição de médico
psiquiatra.
Aqui, como no CIAM,
o que mais evidencia uma sistemática de violação aos direitos
dos jovens é o encarceramento. A prática de encaminhar internos
para a "contenção" ou para o "cofre" está
absolutamente institucionalizada e pode se prolongar por muitos
dias. E. A . R. , por exemplo, afirmava estar em cela de contenção
já há 36 dias. C. C. S. contava 30 dias no isolamento e, assim,
sucessivamente. No "cofre" encontramos dois meninos que
afirmaram estar ali há cinco dias, sem uma saída sequer para
banho de sol.
Os monitores - que
o sistema paraense chama de "Educadores" - são
servidores temporários, mal recrutados, mal formados e mal pagos.
Recebem uma "capacitação" com uma espécie de curso
com a duração de um dia (sic) e recebem pouco mais de 300 reais
por mês. O problema dos "temporários" não é só das
unidades de atendimento aos adolescentes, mas do serviço público
do Pará. Ao total, o Estado dispõe de cerca de 40 mil servidores
públicos regulares aos quais a pilantragem política local fez
acrescer 60 mil servidores "temporários". Pode-se
imaginar o queG significa essa prática - pela qual se contorna o
mandamento constitucional de concurso público como forma de
acesso ao serviço público - para o desenvolvimento do
clientelismo. Muitos dos técnicos do EREC também são servidores
"temporários". Quanto aos monitores - 31 ao todo -
chama a atenção o fato de que 30 deles sejam homens.
Possivelmente, entre os critérios de seleção há a
supervalorização da força física ou capacidade de
"enfrentamento" com os internos.
Também aqui os
familiares são humilhados quando da revista realizada por
policiais militares. Também aqui a duração das visitas é muito
pequena, sendo reduzida para 15 minutos para os adolescentes em
cela de "contenção".
O Espaço Recomeço,
por todas essas limitações e a despeito dos esforços que muitos
dos técnicos e administradores têm realizado só "recomeça"
o perfil de atendimento consagrado pelo antigo Código de Menores.
- CESEM - outro modelo, outra
realidade
Ficha
Técnica:
Centro
Sócio Educativo Masculino (CESEM)
Clientela
- Adolescentes com medida de privação de liberdade
Diretora
- Ângela Pompeu
Fone
- 91 - 248 1385
Capacidade
- 24 vagas
Lotação
- 17 internos
Analfabetos
- 6
Atividades
- poucas
Educação
- razoável
Assistência
Jurídica - inexistente
Assistência
Médica - precária
Assistência
Social - razoável
Assistência
Psicológica - razoável
Sexualidade
- interditada
Alojamentos
- quartos
Celas
de isolamento - Não
Denúncia
de maus tratos - Não
Denúncias
de tortura - Não
Em 05 de
fevereiro de 1996 houve uma grande rebelião no CIAM. Na época,
ele era a única instituição do estado para internação de
adolescentes com medidas de privação de liberdade. Por conta da
rebelião, 23 meninos foram transferidos para uma área que estava
ociosa na periferia de Belém. O local lembra uma pequena chácara,
com uma casa e muitas árvores. Ali, um grupo de técnicos passou
a implementar ações de caráter sócio-educativo e algumas
adaptações foram realizadas. Assim, o que deveria ser uma solução
provisória tornava-se permanente; estava surgindo o CESEM.
No CESEM,
encontramos o melhor trabalho oferecido pelo estado do Pará a
adolescentes privados de liberdade. A realidade aqui,
especialmente quando contrastada com as duas instituições que
havíamos visitado no dia anterior (CIAM e EREC), é muito
diversa.
Em primeiro lugar,
não há celas no local. Os internos dispõe de quartos como
alojamentos. Em cada um dos quartos há camas de vGerdade, roupa de
cama, etc. Há, também, uma pequena cômoda onde os jovens
guardam seus pertences e roupas. O local é cercado por um muro não
muito alto e dispõe de uma boa área para a prática de
atividades desportivas. Os internos acompanham, na condição de
ouvintes, aulas regulares em três escolas da comunidade. Saem em
companhia de um monitor para essa atividade e retornam. Há cada
15 dias, recebem autorização para passar o domingo em casa, com
a família. Os familiares, quando em visita, não são revistados.
O CESEM dispõe de
um quadro de 22 monitores e 4 técnicos (2 assistentes sociais, 1
pedagogo e 1 psicólogo). Atividades na área de computação e
artesanato são oferecidas. Nas conversas que mantivemos com vários
dos internos não foram registradas queixas com relação à violência
ou maus tratos por parte de funcionários.
O
trabalho que vem sendo desenvolvido nessa unidade merece, sem dúvida,
um registro positivo. O que não significa que problemas
importantes não mereçam a atenção das autoridades locais.
Primeiramente, nos chamou a atenção o fato de que a instituição
convive com margens muito significativas de ociosidade dos
internos. Sobre os cursos, pode-se afirmar que ou não são
oferecidos a todos, ou não despertam o interesse de todos. A
situação verificada do emprego sistemático dos adolescentes em
tarefas obrigatórias de limpeza - além daquelas esperadas para
os próprios quartos - caracterizam ação de efeito pedagógico
G nulo e podem revelar um tratamento instrumental dos jovens. Também
aqui, a sexualidade dos internos está interditada. Outro tema que
nos parece central para um exame do sistema montado no Pará
quanto ao cumprimento de medidas sócio-educativas é aquele que dá
conta dos critérios pelos quais um adolescente é encaminhado ao
CESEM. Como regra, chegam nessa instituição meninos vindos do
complexo CIAM-EREC. Pelo que foi possível perceber, a transferência
para o CESEM é vista como uma espécie de "prêmio" ao
qual só concorrem os internos "bem comportados" das
unidades já mencionadas. Ora, o critério de "bom
comportamento" diante de unidades como o CIAM ou o CEREC é,
no mínimo, discutível tendo em vista as características
prisionais lá vigentes. Pretender que um adolescente encarcerado
naquelas unidades demonstre "adaptação" ou
"conformidade" com a própria instituição parece ser,
exatamente, o oposto de uma conduta saudável. Seria preciso, pelo
menos, investigar até que ponto os critérios de "bom
comportamento"não estão a valorizar, precisamente, a sujeição
e a docilidade que as instituições totais não se cansam de
procurar produzir.
Seja como for, a experiência do
CESEM constitui uma referência importante que demonstra o quanto
se pode avançar quanto mais nos aproximamos do espírito do ECA.
4. Centro de Internação Feminino
- CIAF
Ficha
Técnica:
Clientela
- meninas com medida de privação de liberdade
Diretora
- Vera Lúcia Nascimento
Fone
- 273.2594
Capacidade
- 20
Lotação
- 3
Analfabetos
- 1
Atividades
- poucas
Educação
- precária
Assistência
Jurídica - precária
Assistência
Médica - precária
Assistência
Social - S/A *
Assistência
Psicológica - precária
Sexualidade
- interditada
Alojamento
- celas
Celas
de isolamentoG - sim
Denúncias
de maus tratos - não
Denúncias
de tortura - não
* Sem Avaliação
O CIAF é uma pequena unidade para
meninas com medida de privação de liberdade, provisória ou
não. Quando de nossa visita, havia apenas 3 jovens internas. Uma
delas, cumpria internação provisória já há mais de 40 dias
por conta de um furto. O caso dessa jovem é interessante e
simboliza a aplicação de uma medida abusiva. A menina é
moradora de rua em Belém e, desde muito cedo, sobrevive graças a
pequenos furtos. Foi flagrada quando furtava um cordão de mixelim
de uma senhora. No momento mesmo de sua detenção pela polícia,
devolveu à vítima o cordão objeto do furto. O caso, por óbvio,
deveria ser tratado a partir de outra medida que não a privação
da liberdade, nos termos do ECA.
A Unidade é relativamente
tranquila e limpa. Em conversa com a direção e funcionários,
percebeu-se, entretanto, um grande receio de que a unidade pudesse
ser visada por uma ação externa de resgate ou execução de uma
das meninas. Em 1998, o CIAF viveu a experiência do resgate de
duas internas. Nos dias que antecederam a nossa visita, a
instituição havia recebido telefonemas ameaçadores o que
preocupava a todos. As condições de segurança da unidade são
praticamente nulas.
Há uma grande ociosidade das
G internas e a educação que lhes é oferecida é bastante
precária. Chama a atenção que se aplique, também aqui, a
medida de isolamento em cela de contenção - pelo prazo limite de
15 dias - quando da entrada na casa. Trata-se de uma nova
sentença, desta vez extra-judicial, que agrava aquela já
proferida pela autoridade judiciária. Segundo o diretor da
unidade, a medida de contenção tem por objetivo
"avaliar" o perfil da novata. A medida, não obstante,
nos parece absolutamente contraproducente e desnecessária, além
de ilegal. Um bom profissional de psicologia pode em uma
entrevista rigorosa desvendar completamente o "perfil"
da interna oferecendo aos técnicos e à direção todas as
recomendações e cuidados necessários para a aplicação
individualizada de medida de natureza sócio-educativa. O
isolamento forçado e arbitrário pode estimular reações de
contrariedade e agressividade ou, por outro lado, induzir a
quadros depressivos.
Chamou nossa atenção, também, na
escuta das internas, a descrição detalhada de experiências
dramáticas vividas por duas delas durante o período de
detenção em delegacias de polícia. Os dois casos dão conta de
ocorrências de assédio sexual pelas quais policiais
inescrupulosos prometeram a liberação das meninas caso elas
concordassem em prestar-lhes favores sexuais. Esses dois casos em
um universo de três meninas pode indicar a presença bastante
frequente de comportamentos similares por parte de policiais
quando da tutela de adolescentes em conflito com a lei no Pará, o
que mereceria uma atenção especial das autoridades
coGnstituídas.
Ao que tudo indica, as algemas têm
sido usadas normalmente quando do transporte e deslocamento de
adolescentes infratores no Pará, inclusive no caso das meninas.
II - SERGIPE:
Em Sergipe, a caravana foi
constituída pelos Deputados Federais Marcos Rolim (PT/RS),
Alberto Fraga (PMDB/DF) e Tânia Soares (PCdoB/SE); por Marilda
Campolino, asessora da CDH; pelo Dr.Valdir Nascimento, Procurador
Regional da República; pela Dra. Euza Maria Missano, Promotora da
Infância e da Juventude; pelo Ouvidor Geral do Município de
Aracajú, Dr. Wellington Mangueira; pela Secretária Municipal de
Assistência Social, Dra. Maria da Conceição; pelo representante
da Pastoral Carcerária, Vereador Magal; pelo representante do
Conselho Tutelar, Robson Ancelmo e pelos jornalistas Beatriz Magno
e José Varella (Correio Braziliense), Nicolau Farah e Carlos
Eduardo (Jornal do Brasil).
Em Sergipe, quem coordena o setor
de execução de medidas sócio educativas é a Fundação
Renascer. As unidades de internação para medidas de privação
de liberdade são apenas duas em todo o estado, ambas localizadas
em Aracajú: o Centro de Reeducação Feminina e o Centro de
Atendimento ao Menor- Masculino (CENAM). Não há, portanto, como
já se havia anotado quanto ao Pará, o atendimento regionalizado
previsto pelo Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA).
5. Centro de Reeducação Feminina
- quando a direção expressa a bondade
Ficha
Técnica:
Clientela
- Meninas em privação de liberdade
Diretora
- Iracema Fontes
Fone
- 259.1131 (79)
Capacidade
- 20 vagas
Lotação
- 07
Analfabetos
- 1
Atividades
- Poucas
Educação
- inexistente
Ass.
Jurídica - precária
Ass.
Médica - S/A
Ass.
Social - S/A
Ass.
Psicológica - S/A
Sexualidade
- interditada
Alojamentos
- quartos
Celas
de isolamento - sim
Denúcias
de maus tratos - Não
Denúncias
de tortura - Não
A Casa de Reeducação Feminina de
Aracajú oferece um atendimento bastante razoável. Não há
superlotação e as internas dispõe de alojamentos que se
aproximam bastante de quartos coletivos. Não se identificou, ali,
o mesmo modelo prisional da maioria das unidades visitadas. As
internas , em número de 7, conversaram conosco em uma sala
separada, sem a presença de qualquer pessoa ligada à
instituição. Nos relataram seu cotidiano, suas apreeensões e
expectativas. Não houve o registro de qualquer queixa envolvendo
casos de violência na Unidade. Algumas, que já estavam
internadas há mais tempo, relataram que, no passado, era
frequente o emprego de punições físicas na instituição,
notadamente o "bolo", palavra com a qual denotam o
emprego de palmatória. Ao lado da instituição, funciona a
Academia da Polícia Militar de Sergipe. Enquanto conversávamos
com as internas, havia uma intensa atividade de treinamento dos
policiais em aula de tiro o que, por vezes, impedia que a conversa
prosseguisse normalmente. Segundo nos ralataram, os exercícios
são diários pelo que as internas são obrigadas a conviver com
os estampidos. Por óbvio, a justaposição de uma unidade de
internação de adolescentes com uma Academia de Polícia gera
razões para constrangimentos e deveria ser repensada.
O maior problema vivido pelas
internas é a ociosidade. Quando de nossa visita, as atividades
que lhes eram oferecidas consistiam, basicamente, no trabalho com
bordados e em passeios eventuais propiciados pela diretora da
unidade. Há cinco meses as adolescentes estavam sem aulas. Essa
informação, logo confirmada pela própria direção, causou
perplexidade à Caravana mesmo porque, quando de nossa entrada, a
Juíza da Infância e da Adolescência, Dra. Mary Nadja Freire de
Almeida Seabra, havia nos afirmado que todos os adolescentes ali
internados recebiam aulas regulares com professores da rede
estadual.
Outro ponto que nos chamou a
atenção é a longa permanência das adolescentes na
instituição. Uma das meninas já se encontrava privada da sua
liberdade há 3 anos e dois meses o que viola flagrantemente o
disposto pelo ECA. As demais internas estavam, todas, há mais de
um ano. Chamou a atenção da Caravana o fato de a Defensora
Pública, Dra. Maria do Carmo, que acompanhava a visita, ter se
colocado, tão logo a questão foi suscitada pelo Deputado Marcos
Rolim, a defender a legalidade da internação superior a 3 anos.
Pelo que pudemos ouvir depois, quando da visita à unidade
masculina, a referida "defensora" constituiu para os
adolescentes a identidade simbólica de uma defensora da
instituição e não dos internos.
O trabalho de bordado que as
meninas realizam é vendido para o público externo, levado a
exposições, etc. O apurado com as vendas reverte para a
instituição. Segundo foi possível saber ouvindo as internas, a
G diretora da unidade cuida de atender, com esses recursos, os
pedidos das meninas para aquisição de roupas íntimas, produtos
de higiene ou itens necessários ao embelezamento. Seria, de
qualquer forma, muito mais conveniente que as internas recebessem
diretamente os recursos obtidos com a venda de produtos que,
afinal, são o resultado do seu trabalho. O recebimento pelo
trabalho realizado e a possibilidade de dispor dos recursos , de
acordo com a escala de prioridades e necessidades de cada interna
- o que envolve, por exemplo, a chance de auxiliar os familiares -
constitui estímulo para a ampliação das atividades e desenvolve
a autonomia e o senso de responsabilidade. Esse princípio não é
contraditório com uma normativa que destacasse um pequeno
percentual do arrecadado para que houvesse a manutenção e a
ampliação das próprias atividades por parte da instituição.
Independente das limitações
estruturais da unidade, percebe-se que elas vão se tornando
suportáveis pelo tipo de relação direta e de confiança
construída pela diretora com as meninas. Quando a direção de
uma instituição do tipo constrói uma relação individualizada
com os que estão sob a sua guarda e quando essa relação
fundamenta-se em um determinado investimento afetivo, temos uma
expressão de bondade que termina por condicionar positivamente
todas as demais relações internas. É o que nos pareceu existir
no Centro de Reeducação Feminina.
6. CENAM - quando a direção
expressa a maldade
Ficha Técnica:
Clientela
- Adolescentes privados de liberdade
Diretora
- Enidete Cunha
Fone
- 259.2320 (79)
Capacidade
- 60 vagas
Lotação
- 48
Analfabetos
- S/A
Atividades
- nenhuma
Educação
- inexistente
Ass.
Jurídica - precária
Ass.
Médica - precária
Ass.
Social - precária
Ass.
Psicológica - precária
Sexualidade
- interditada
Alojamentos
- celas
Celas
de isolamento - sim
Denúncias
de maus tratos - sim
Denúncias
de tortura - sim
O CENAN de Aracajú é uma das
piores instituições para adolescentes infratores do país.
Quando de nossa visita, havia 60 jovens na unidade formada por
duas galerias que fazem lembrar as condições tipicamente
prisionais. Quando entramos na galeria e começamos a falar com os
internos - sem a presença de qualquer pessoa vinculada à
instituição - foi praticamente impossível anotar tudo o que
aqueles jovens pretendiam expressar. As denúncias e as queixas se
sucediam de uma maneira impressionante. Alguns afirmavam que tinha
sido Deus que nos enviara ali; que, finalmente, alguém estava
disposto a saber a situação real que enfrentavam, etc. Todos os
internos passam todo o tempo presos em celas imundas, escuras e
fedorentas. O acesso ao pátio interno é franqueado, em média,
duas vezes por semana. Em cada cela estão, em média, 5 jovens.
As celas não possuem abertura suficiente para a aeração e a
iluminação; não possuem lâmpadas, também. Ao fundo, há uma
privada "turca" onde os meninos são obrigados a
realizar as suas necessidades a vista de todos uma vez que, na
última reforma da unidade, algum imbecil tomou a decisão de
derrubar a proteção de alvenaria que garantia um mínimo de
privacidade aos que utilizassem o sanitário. Também por força
de uma reforma, abriu-se na grade de acesso às celas um pequeno
retângulo rente ao chão por onde as refeições dos meninos são
Gservidas. A comida, a propósito, é de péssima qualidade.
Muitos dos jovens ali presos estão
doentes. Alguns, comprovadamente, com doenças venéreas. Não
recebem, entretanto, qualquer tratamento médico digno desse nome.
Vários dos meninos reclamaram que os calções que recebem como
"uniforme", de volta da lavanderia, são distribuídos
ao acaso o que faz com que muitos temam por se contaminar com
doenças. Os jovens não possuem cuecas ou outro vestuário porque
uma das tantas normas arbitrárias da casa impede que os
familiares enviem qualquer peça de roupa.
Muitos dos internos relataram terem
apanhado dos monitores e ofereceram uma lista com os nomes
daqueles que espancam. Disseram que uma das formas de punição
que recebem por qualquer motivo consiste em permanecer algemado de
pé, em uma grade externa, nos fundos do prédio, por até 24h. Um
dos meninos relatou ter ficado nesse lugar, algemado, das 6 horas
da manhã de um dia até às 6 horas da manhã do outro dia.
Durante esses períodos de algema, os punidos não recebem comida
ou água e, pela posição em que estão imobilizados, são
obrigados a defecar e urinar sobre o próprio corpo. Outro dos
internos, relatou que em sua experiência de "algema" um
dos monitores derrubou água com açucar sobre o seu corpo dizendo
que, dessa forma, à noite, os insetos teriam mais prazer em
visitá-lo. Os internos indicaram o lugar onde seriam
frequentemente algemados. Nos dirigimos até o local e percebemos
que a tinta da grade onde seriam algemados estava desgastada. Os
internos nos indicaram a sala e o armárioG onde a direção
guardava as algemas. Fomos até o local, solicitamos que o
armário fosse aberto e encontramos cerca de 15 pares de algemas.
Segundo o relato unânime dos jovens, a diretora da unidade
comanda pessoalmente as sessões de espancamento selecionando
aqueles que "merecem apanhar". Quando os internos
reclamam de algum procedimento, a diretora e os monitores afirmam
que tudo aquilo que eles estão fazendo é por conta do que manda
o Estatuto da Criança e do Adolescente.
Os "monitores" em Sergipe
são, na verdade, funcionários terceirizados. O detalhe é que a
empresa contratada pelo governo do estado é uma empresa de
detetização. É fantástico! O governo de Sergipe busca em uma
empresa de limpeza a "mão de obra" para a tutela de
adolescentes privados de liberdade. Natural que obtenha como
resultado um conjunto de práticas que identificam os próprios
jovens com o lixo. Estamos, por óbvio, diante de uma
característica única no país que não seria imaginada sequer
pelo gênio criativo de um Gabriel Garcia Marquez.
Vários dos internos são pais.
Não possuem o direito, entretanto, de receber a visita dos seus
filhos pequenos. Em algumas oportunidades, podem fazê-lo no
juizado, condição restritiva desnecessária e produtora de
sofrimento psíquico. Os familiares dos adolescentes presos são
humilhados frequentemente. Não apenas quando das revistas com
desnudamento a que são submetidos de forma ilegal e arbitrária,
mas no contato com a direção da unidade e com alguns dos
técnicos que ali trabalham. Chamou nossa atenGção, também, a
prática corriqueira de encaminhar internos às celas "de
contenção" - eufemismo usado para isolamento. Pelo que
pudemos verificar, a grande maioria dos internos já havia sido
"contido". Durante a nossa visita, encontramos jovens
que estavam no isolamento há mais de dois meses (!) Ora, o
conjunto dessas características configura um quadro de maldade
absolutamente inaceitável que deveria envergonhar a todos. Muitas
dessas características não são encontradas mais sequer no
sistema prisional brasileiro - sabidamente um dos piores do mundo.
Ao final de nossa visita à
Unidade, nos dirigimos à sala da Juíza da Infância e da
Adolescência, Dra. Mary Nadja Freire de Almeida Seabra.
Participaram dessa conversa os Deputados Marcos Rolim, Alberto
Fraga e Tânia Soares mais a Promotora de Justiça, Dra. Euza
Maria Missano. Os Deputados relataram, então, o que haviam ouvido
dos internos expondo detalhadamente cada uma das denúncias.
Encaminharam também à digníssima magistrada uma relação de
nomes de funcionários que teriam por hábito espancar os
internos. Diante do relato que fizemos, a Dra. Mary Nadja Freire
de Almeida Seabra manifestou seu espanto e indignação. Nos
disse, aparentando estar horrorizada, que estava perplexa com a
situação que se apresentava; que jamais poderia imaginar que a
situação pudesse ser aquela e que estava tendo uma enorme
decepção com a direção da Unidade em quem havia confiado. De
pronto, assumiu com os presentes o compromisso de investigar cada
uma das denúncias e tomar providências rigorosas para que os
adolescentes fossem respeGitados. Embora nos parecesse no mínimo
estranho que a magistrada - cujo gabinete de trabalho situa-se
entre as duas unidades visitadas - não soubesse sequer que tanto
as meninas quanto os meninos estavam sem aula há 5 meses; todos
nós nos retiramos de sua sala confiantes em sua determinação e
boa vontade. Os internos da ala masculina nos haviam afirmado que
a digníssima magistrada jamais havia entrado no interior da
galeria onde estão as celas em que foram depositados. Quando
relatamos a ela essa queixa, sua reação pronta e firme foi a de
desmentir os internos. Segundo nos afirmou, ela já havia estado
"muitas vezes" no interior das galerias. Estranhamos,
então, mais uma vez, quando a digníssima magistrada manifestou
surpresa diante da informação de que os vasos sanitários usados
pelos internos no interior de suas celas não possuíam qualquer
proteção o que obrigava os adolescentes a defecar em frente aos
demais. Ora, se a digníssima magistrada tinha por hábito visitar
a galeria onde os adolescentes estão depositados como foi
possível que não tivesse observado a derrubada do muro que,
anteriormente, oferecia aos sanitários um espaço mínimo de
privacidade? Se a digníssima magistrada conhece
pormenorizadamente a situação dos internos e os visita nos
locais onde foram depositados, como não sabia da existência de
celas escuras e sem ventilação cuja existência contraria não
apenas a legislação brasileira mas as Regras Mínimas da ONU?
III - MINAS GERAIS
A Caravana em Minas Gerais contou
com a presença dos Deputados Federais Marcos Rolim (PT/RS) ,G Cabo
Júlio (PL/MG) e Alberto Fraga (PMDB/DF), de Marilda Campolino da
CDH e dos jornalistas Beatriz Magno e José Varella (Correio
Braziliense), Nicolau Farah e Carlos Eduardo (Jornal do Brasil).
Visitamos duas unidades de internação e a carceragem da
Delegacia especializada, todos em Belo Horizonte.
7. Centro de Internação
Provisória - CEIP, outro presídio
Ficha Técnica:
Clientela
- adolescentes em internação provisória
Diretor
- Mário de Lima Correia Júnior
Fone
- 34815145 / 34811607
Capacidade
- 64
Lotação
- 45
Analfabetos
- S/A
Atividades
- poucas
Educação
- inexistente
Ass.
Jurídica - precária
Ass.
Médica - precária
Ass.
Social - boa
Ass.
Psicológica - precária
Sexualidade
- interditada
Alojamentos
- celas
Celas
de isolamento - sim
Denúncias
de mais tratos - não
Denúncias
de tortura - não
O CEIP funciona em um prédio novo,
inaugurado há cerca de um ano. Suas características, não
obstante, são tipicamente prisionais. É lamentável que o Poder
Público em Minas Gerais tenha produzido uma obra desse porte e
reproduzido, em plena vigência do ECA, as condições de
carceragem que encontramos, frequentemente, nos presídios de
adultos. Há uma única galeria com as celas onde ficam, em
média, 3 adolescentes. Ao fundo da galeria, há 4 celas de
isolamento. Quando de nossa visita, apenas uma delas estava
ocupada. A planta da unidade situou os registros sanitários na
parte externa das celas, junto ao corredor de forma que apenas os
funcionários podem ligar a água ou pressionar a descarga do
vaso. É impressionante que se tenha planejado dessa maneira
subtraindo-se dos adolescentes, inclusive, a oportunidade de
eliminar imediatamente das celas os seus próprios dejetos. Até
G para isso, será preciso convocar um monitor e solicitar que ele
efetue a descarga.
Também aqui os familiares são
revistados com desnudamento. As visitas podem trazer aos internos
determinados itens e produtos alimentícios. Os adolescentes
internos recebem um "uniforme" - calção e camiseta,
peças que são trocadas apenas uma vez por semana.
Os internos não recebem aulas.
Duas pedagogas oferecem algumas atividades específicas em uma
sala especial. Como regra, os internos desfrutam apenas de jogos,
TV e atividades no pátio interno.
Como registros positivos, deve-se
assinalar, primeiramente, que os internos não fizeram qualquer
queixa envolvendo violência de monitores. Em segundo lugar, que o
tempo que lhes é oferecido de convivência no pátio da unidade
é bastante razoável (3 horas pela manhã e 3 horas pela tarde)
e, por fim, que a Instituição desenvolve um interessante
trabalho de assistência social junto aos familiares com um
programa de cestas básicas quinzenais.
Os adolescentes não podem receber
visitas de suas companheiras, nem de seus filhos. Reclamaram
bastante de que a comida poderia ser melhor e, especialmente, de
que as quantidades oferecidas não são suficientes. Muitos
queixaram-se de doenças de pele e alguns reclamaram de que sofrem
com dor de dente.
Vários dos internos, ao serem
perguntados sobre as condições de suas prisões e sobre como
foram tratados pela polícia após estarem sobG a sua guarda,
relataram casos impressionantes de espancamentos e tortura.
Segundo o que vários dos internos relataram, policiais teriam por
hábito conduzir adolescentes suspeitos da prática de atos
infracionais para uma região erma conhecida como "Mata do
Inferno". Lá, eles seriam espancados e torturados. Pela
frequência com que essa denúncia apareceu nos relatos e pela
profusão de detalhes dos vários depoimentos, valeria a pena que
as autoridades locais investigassem com cuidado sua veracidade. Um
dos meninos relatou o processo de tortura que teria sofrido em uma
cidade do interior. Algemado com as mãos para trás, os policiais
teriam passado uma corda na algema e o lançado sucessivas vezes
em uma lagoa. Antes que se produzisse o afogamento, ele era
içado. Os policiais renovavam as perguntas e, na ausência de
resposta, o jogavam de novo, etc..
8. Delegacia de Orientação do
Menor - DEOM
A Caravana tomou a decisão de
conhecer as dependências da delegacia especializada em Belo
Horizonte verificando de perto as condições de carceragem lá
existentes. Como a delegacia não é um espaço onde seja
possível executar qualquer medida de privação de liberdade,
nosso interesse restringiu-se apenas à verificação das
condições de triagem realizada pelos policiais que, para a
guarda dos adolescentes envolvidos em ocorrências, se valem de um
antiga carceragem situada no subsolo da Delegacia.
Por tudo aquilo que pudemos
constatar, restaria apenas sublinhar a absoluta impropriedade
daqueGlas celas; verdadeiras pocilgas que fazem lembrar os relatos
sobre as masmorras medievais. Quando de nossa visita havia 5
adolescentes encarcerados (dois em uma cela e três em outra).
Havia, em uma cela separada, um maior de idade. Abrimos as celas e
conversamos com os jovens detidos. Foi difícil permanecer lá
devido ao cheiro putrefato comum a todas. Foi difícil também
examinar um dos jovens que alegava ter apanhado muito quando de
sua prisão pois as celas são absolutamente escuras, mesmo
durante o dia.
Foi possível constatar, também,
uma outra limitação de natureza institucional que deveria ser
imediatamente sanada. Casualmente, acompanhamos o momento de
chegada à Delegacia de um jovem detido sob suspeita de
receptação. Policiais Militares encontraram com ele um casaco
objeto de furto. Pois bem, esse jovem alegava ter sido agredido
pelo policial que o conduziu à Delegacia. Não podemos saber se a
denúncia que ele fazia era verdadeira ou não. O ponto é que
durante o tempo em que ele permaneceu em uma pequena sala no
sub-solo da Delegacia estava em frente ao PM que o conduziu e
diante da vítima do furto (que, alíás, nada sabia sobre a
autoria) sem que houvesse um defensor público de plantão para
lhe dar assistência Circunstâncias do tipo costumam ser muito
funcionais para que injustiças e abusos sejam praticados.
9. Centro de Integração do
Adolescente - uma boa gestão
Ficha Técnica:
Clientela
- Adolescentes em prGivação de liberdade
Diretor
- Rômulo Magalhães do Nascimento
Fone
- 34815362 / 34813383
Capacidade
- 60 vagas
Lotação
- 63 internos
Analfabetos
- 03
Atividades
- poucas
Educação
- razoável
Ass.
Jurídica - razoável
Ass.
Médica - boa
Ass.
Social - boa
Ass.
Psicológica - boa
Sexualidade
- interditada
Alojamentos
- celas
Celas
de isolamento - sim
Denúncias
de maus tratoGs - não
Denúncias
de tortura - não
O Centro de Internação de
Adolescentes (CIA) de Belo Horizonte é uma instituição onde se
realiza um bom trabalho. Em que pese as condições precárias do
prédio onde funciona - um conjunto um tanto caótico de
pavilhões reformados que já foram utilizados como penitenciária
feminina, pode-se afirmar que aqui se executam medidas de natureza
sócio-educativa.
O CIA conta com uma boa retaguarda
técnica, com jornada de 6 horas de trabalho por dia, composta por
um advogado, 3 psicólogos, 1 psiquiatra, 3 assistentes sociais, 2
médicos, 2 pedagogos, 1 terapeuta ocupacional, 1 professor de
Educação Física e 1 instrutor de atividades manuais. O CIA
dispõe de 80 monitores que se revezam em 4 plantões de 12 horas
por 36 de folga. O salário de um monitor é de, aproximadamente,
650 reais. Quanto ao pessoal, as deficiências maiores estão
entre os monitores que trabalham, quase todos, em contrato
emergencial e que não possuem, em regra, formação adequada. A
instituição tem um histórico de fugas, 28 no último ano. No
mesmo período, enfrentou uma rebelião e registrou dois óbitos
de internos.
Pelo menos um dos internos, quando
de nossa visita, apresentava problemas de saúde mental. As
visitas também aqui são revistadas com o procedimento de
desnudamento. Os internos possuem o direito de receberem visitas
de seus filhos o que é muito significativo em uma unidade onde
G 40% dos jovens são pais. Seus familiares podem, também, trazer
alimentos e peças de vestuário. Os internos usam suas próprias
roupas, mas a direção informou que há um projeto para que todos
passem a usar "uniforme". Essa providência,
assinale-se, naquilo que ela propicia de homonegeização e
supressão de identidade, nos parece equivocada, além de
absolutamente desnecessária.
Os adolescentes frequentam escola
pela parte da manhã, mas carecem de mais atividades durante o
dia.
Observamos na unidade, várias
reformas que foram feitas "a favor" dos internos. Em um
dos pavilhões, por exemplo, todo o teto passou por melhorias que
permitiram uma maior aeração e iluminação. A direção
estabelece determinadas restrições quando ao fumo, mas criou um
espaço próprio denominado "fumódromo" para os
internos o que demonstra uma compreensão não comum em
instituições do tipo. Há um interessante projeto de
informática para os jovens em andamento e uma boa idéia
apresentada por um professor de nome Antônio Lago Filho que
redundou no projeto "Amizade Selada" pela qual alunos da
PUC mantém correspondência sistemática com os internos.
Não recebemos qualquer denúncia
de maus tratos ou tortura. O único interno que relatou uma
sessão de espancamento da qual foi vítima, referiu-se a um
episódio ocorrido há 6 meses que, aliás, mereceu a devida
investigação e o afastamento do agente agressor.
A instituição desenvolve um
G interessante trabalho de assistência social fornecendo sextas
básicas quinzenalmente para as famílias dos internos.
IV - São Paulo
A Caravana foi formada, em São
Paulo, além do Deputado Marcos Rolim (PT/RS), pelos promotores da
Infância e Juventude de São Paulo, Dr. Ebeneézer Salgado
Soares, Dra. Sueli de Fátima Buzo Riviera e Dr. Wilson Ricardo C.
Tafner; pelo Dr. Ariel de Castro Alves, coordenador do Movimento
Nacional de Direitos Humanos e assessor do Deputado Estadual
Wagner Lino, pela Senhora Conceição Paganele, presidente da
Associação das Mães e Amigos da Criança e Adolescente em Risco
(AMAR), por Marilda Campolino, assessora da Comissão de Direitos
Humanos e pelos jornalistas Beatriz Magno e José Varella (Correio
Braziliense), Nicolau Farah e Carlos Eduardo (Jornal do Brasil ),
Luciana Garbin (Estado de São Paulo) e Gabriela Athias (Folha de
São Paulo).
10 - Unidade de Atendimento Inicial
- UAI
- aqui se apanha quieto
Ficha Técnica:
Clientela
- adolescentes em internação provisória
Diretora
- Renata Maria Ramos Soares
Fone
– 279.6076
Capacidade
- 62 vagas
G Lotação
- 248
Analfabetos
– S/A
Atividades
- poucas
Educação
- inexistente
Ass.
Jurídica - S/A
Ass.
Médica - S/A
Ass.
Social - S/A
Ass.
Psicológica - precária
Sexualidade-
interditada
Alojamentos
- quartos
Celas
de isolamento - não
Denúncias
de maus tratos - sim
Denúncias
de tortura - sim
A UAI, loalizada no Brás, na Rua
Domingos Paiva, 618, é a porta de entrada da FEBEM de São Paulo.
Por essa unidade passam todos os adolescentes que entram no
sistema FEBEM. A Unidade oferece 62 Gvagas. No dia de nossa visita
lá estavam 248 meninos. Segundo levantamento da Promotoria da
Infância e da Juventude, cerca de 15 dias antes, a Unidade chegou
a abrigar 360 internos . Conforme confirmamos depois, 15 dias
após a nossa visita, a lotação ultrapassou 340 internos (!).
Entre todas as Unidades visitadas pela Caravana, a UAI é aquela
que oferece o quadro mais revoltante. Ironicamente, o prédio onde
a Unidade está instalada já abrigou dependências do Doi-Codi de
São Paulo.
Por conta da superlotação, os
internos passam a maior parte do dia sentados no chão, sem nada o
que fazer. Quando muito, lhes é permitido assistir filmes na
televisão. Se há uma imagem capaz de retratar o que é,
efetivamente, a UAI, essa imagem seria a dos meninos sentados no
chão, pequenas estátuas sofridas e atemorizadas. Mas o governo
de São Paulo, através da Secretaria Estadual de Assistência e
Desenvolvimento Social, foi capaz de produzir um folder
promocional da FEBEM onde, na página dedicada a UAI, aparecem
quatro fotos: a primeira, com um menino sentado em frente a um
funcionário que datilografa; uma segunda foto que mostra uma roda
de música no pátio com cinco meninos; uma terceira foto que
mostra dois internos jogando dama e uma quarta foto que mostra uma
cena de um jogo de futebol na quadra. Sabe-se, então, que o
objetivo explícito dessa publicação é falsear a realidade o
que, diante da situação da UAI, é simplesmente uma postura
criminosa. Na UAI, todos os meninos, entre 12 e 18 anos, tem as
cabeças raspadas e usam a mesma roupa - calção azul, camisetas
brancas e chinelos. Quando se desGlocam pelo interior da unidade, o
fazem em fila indiana, com as mãos para trás e a cabeça para
baixo. Nenhum deles possui autorização para falar. Qualquer
palavra, qualquer manifestação daqueles seres humanos - alguns,
pouco mais que crianças - todos miseráveis e humildes , é o
equivalente a uma infração disciplinar. As punições aos
"infratores" - bem entendido: aqueles que usarem as
cordas vocais para produzir qualquer som não autorizado - é
punida sumária e prontamente pelos atentos monitores; alguns dos
quais não vacilarão em usar seus punhos, suas botas ou os cabos
de vassoura para bater nos que romperem a norma do silêncio. Na
UAI se apanha quieto, é a "lei".
A Unidade não oferece condições
para que se cumpra o que determina o Estatuto quanto à
separação dos internos por idade, compleição física e perfil
de ato infracional. Vários dos internos permanecem ali além do
prazo máximo de 45 dias. Suas visitas são revistadas com
desnudamento e possuem a duração média de 15 minutos.
Quando entramos na Unidade e nos
dirigimos ao primeiro alojamento, solicitamos que todos os
monitores se retirassem da sala onde dezenas de meninos se
espremiam sentados no chão, um ao lado do outro. Foi possível,
então, ouvi-los. Desde o primeiro momento, a preocupação de
todos eles era de que apanhariam tão logo nos retirássemos do
local. Argumentamos que não seria possível lhes oferecer
qualquer garantia contra essa possibilidade, mas firmamos o
compromisso de retornar no dia seguinte para nos certificar se
alguma violência havia sido Gproduzida. Com base nesse
compromisso, eles começaram a falar. Enquanto íam nos contando o
que sofriam, nos mostravam seus ferimentos, as marcas pelos corpos
franzinos, os inchaços pela cabeça. Nenhum dos internos tem
acesso a cursos, atividades profissionalizantes ou aulas. Saem, em
grupos pequenos, para o pátio da unidade onde podem se exercitar
por cerca de 40 minutos, uma vez ao dia. Por qualquer motivo e
mesmo sem motivo algum apanham, diariamente. Em meio ao silêncio
que lhes é imposto, há uma expressão que todos devem dizer em
seus deslocamentos internos sempre que se aproximam de algum
funcionário ou visitante. A expressão que emoldura o silêncio
totalitário é : "licença, senhor". Assim, enquanto
estávamos na entrada de um corredor aguardando a passagem de uma
fila de cerca de 40 meninos, ouvimos 40 vezes a frase
"licença, senhor", proferida mecanicamente, como em um
reflexo condicionado. Em outro espaço na mesma Unidade, flagramos
o momento em que um "lanche" ( um copo com algum
líquido colorido não identificado e um pedaço de pão) era
servido aos internos. Havia um grupo deles sentados em torno de
algumas mesas em um refeitório, enquanto dezenas de outros
aguardavam sentados no chão em uma sala contígua.Todos em
absoluto silêncio. Os que estavam aguadando para iniciar a
refeição recebem então um "comando" de um dos
monitores que diz: "Reza!" Todos, então,
sincronizadamente, baixam a cabeça e permanecem assim cerca de um
minuto. Não nos foi possível saber se aqueles meninos rezavam
porque tudo o que vimos se passou, é claro, em silêncio. Na UAI,
o governo deG São Paulo, ao invés de medidas sócio educativas,
prefere o adestramento. Por dever de justiça, deve-se assinalar
que a "pedagogia" desenvolvida e aplicada na UAI superou
as características liberticidas do "Big Brother"
Orwelliano. Com respeito à metodologia empregada, nem Pavlov
obteria melhor resultado. O detalhe é que G. Orwell escreveu
peças de ficção e Pavlov realizou experiências com cães. Na
UAI, tratamos da realidade e de seres humanos.
11. Unidade de Internação
Provisória- UIP 6 - o regime do "couro"
Ficha Técnica
Clientela
- adolescentes privados de liberdade
Diretora
– Rosana Cristina Squitino Aun
Fone
– 270.3733
Capacidade
- 200 vagas
Lotação
- 270
Analfabetos
– S/A
Atividades
- poucas
Educação
- precária
Ass.
Jurídica - precária
G Ass.
Médica - precária
Ass.
Social - precária
Ass.Psicológica-
precária
Sexualidade
- interditada
Alojamentos
- quartos
Celas
de isolamento - não
Denúncias
de maus tratos - sim
Denúncias
de tortura - sim
O perfil do atendimento prestado
aqui é, a rigor, o mesmo da UAI. A mesma superlotação, a mesma
exigência de permanecerem todos sentados no chão,etc. Todos os
internos têm a cabeça raspada, usam o mesmo uniforme e estão
submetidos às mesmas regras do campo de concentração da UAI.
Vários dos internos reclamaram de maus tratos e relataram cenas
de tortura. Um grupo, por exemplo, foi obrigado a permanecer no
pátio interno, todos sentados no chão, durante várias horas sob
o sol, como castigo. Os adolescentes não podem receber visitas
dos filhos, nem das companheiras; não podem, também, ligar para
família. Em muitos, a frase que sintetiza o regime disciplinar é
: "Aqui é couro todo o dia".
Conversando com um grupo de meninos
muito jovens, entre 12 e 14 anos em média, o Deputado Rolim
perguntou o que era, na opinião deles, o pior daquela Unidade. Um
dos meninos, de pronto respondeu: -"É a saudade,
doutor." O atendimento de saúde que recebem é muito
precário. Um dos internos relatou ter arrancado um dente, ele
mesmo, após solicitar durante semanas um encaminhamento ao
dentista por conta de fortes dores que vinha sentindo; outro,
R.C.A , há mais de um mês na unidade, mostrou sob a pele uma
bala que precisava ser extraída.
A maioria dos meninos entrevistados
relatou que o plantão da noite é o pior e que os funcionários
passam o tempo todo fazendo ameaças. Segundo o relato de vários
dos adolescentes, alguns desses funcionários são usuários de
cocaína.
Foi impressionante registrar os
relatos desses meninos quanto aos procedimentos com que foram, em
regra, tratados pela polícia quando de suas prisões. A
impressão que ficamos é que as práticas de espancamento e
tortura de adolescentes por policiais em São Paulo é,
rigorosamente, uma norma. Vários dos internos descreveram
sessões de choque e o suplício de asfixia com saco plástico em
delegacias.
No retorno que fizemos a essa
Unidade, um dia após a primeira visita - conforme havíamos nos
comprometido com os internos - o Deputado Marcos Rolim registrou
em suas anotações uma cena curiosa e bastante significativa. Já
durante a noite, a Caravana entrou no prédio do Brás e quando
seus integrantes estavam emG um dos alojamentos, com dezenas de
adolescentes, um monitor subiu as escadas e, sem se dar conta da
presença do Deputado no corredor, perguntou a um outro
funcionário: "E daí, os ladrão (sic) já tomaram conta da
Casa? Esse funcionário estava inconformado com o fato dos
integrantes da Caravana estarem conversando com os meninos e
recolhendo suas queixas. Na sua opinião, esse procedimento - por
quebrar a regra do silêncio imposto aos internos - tornaria a
situação incontrolável e eles - os monitores - perderiam o
controle. Para ele, os internos são recohecidos e definidos como
"ladrões". O povo de São Paulo paga a esse monitor um
salário para que ele auxilie aqueles meninos a construírem uma
identidade diversa daquela que a vida criminosa lhes oferece. O
que ele faz, entretanto, é reforçar essa identidade.
12 - Complexo Tatuapé- Unidade 15
- o touro de Perilo
Ficha Técnica:
Clientela
- adolescentes privados de liberdade
Diretor
– Ubirajara Moreira Melo
Fone
– 669.27851
Capacidade
- 60 vagas
Lotação
- 100 internos
Analfabetos
- 1
Atividades
- poucas
Educação
- inexistente
Ass.
Jurídica – S/A
Ass.
Médica - precária
Ass.
Social – S/A
Ass.
Psicológica – S/A
Sexualidade
- interditada
Alojamentos
- celas
Celas
de isolamento - Sim
Denúncias
de maus tratos - não
Denúncias
de tortura - não
O Tatuapé é um complexo com 23
unidades, algumas em obras. Escolhemos visitar a Unidade 15,
apontada pelos Promotores da Infância e da Juventude como uma das
piores. O prédio encontra-se, visivelmente, destruído. Há
vazamentos por todo o lado e o mau cheiro parece uma constante.
Toda a estrutura hidráulica, sanitária e elétrica está
G comprometida. Aqui, entretanto, não recolhemos denúncias de maus
tratos ou qualquer relato de tortura por parte dos monitores. Como
regra, nos pareceu que há, inclusive, um bom relacionamento entre
os internos e os monitores. As queixas quanto à violência
dirigem-se, todas, aos "pirrio", gíria com a qual os
internos denotam a guarda externa que - em momentos de
tensionamento interno como motins ou protestos invadem a Unidade e
batem prá valer. Vários dos meninos relataram que a última
sessão de espancamentos teve vez antes do carnaval.
Os internos reclamaram muito da
alimentação. Vários deles relataram ter encontrado pedaços de
fio, pregos e mesmo insetos na refeição que recebem. Ao mesmo
tempo, há restrições à possibilidade de os familiares trazerem
gêneros alimentícios quando das visitas. De positivo,
registre-se o fato dos internos poderem receber visitas dos seus
filhos. Os internos passam o dia inteiro ociosos, boa parte do
tempo no pátio sem nada para fazer. Alguns deles possuem
problemas graves de saúde. Quase todos convivem com doenças de
pele.
Chamou a atenção da Caravana o
estado de vários dos alojamentos onde estão os internos.
Trata-se, na verdade, de celas coletivas, várias das quais com as
janelas lacradas por chapas compactas de metal. Por conta da
destruição das grades externas das janelas, alguém teve a
brilhante idéia de lacrá-las, por dentro, com as referidas
chapas. O resultado é que, além de subtrair dos meninos a luz e
a ventilação, transformou-se várias dessas celas em verdadeiros
fornos. Algo assim Gcomo o touro de bronze inventado por Perilo
que, segundo a mitologia, era oco. Ali dentro, Perilo colocava
suas vítimas. Ato contínuo, fazia uma fogueira sob o touro o que
obrigava suas vítimas a urrar desgraçadamente. Os que assistiam
a cena, imaginavam que era o touro que urrava. Aqui, se os meninos
urrarem, não haverá alguém para ouvi-los.
Mais uma vez, os relatos dos
adolescentes sobre os sofrimentos que lhe foram impostos pela
polícia quando de suas prisões foi uma constante. J.P. , 14
anos, além de ter apanhado muito, conta ter sido submetido à
roleta russa na 4 DP. Ele teria permanecido 1 mês nessa Delegacia
até que as marcas pelo seu corpo desaparecessem. D.B., 17 anos,
apanhou na 51 D.P. J.A , 18 anos, levou coronhadas de espingarda
calibre 12 na 68 D.P. de Pirituba e mostra várias cicatrizes pelo
corpo. L.N., 18 anos, apanhou muito na 38 D.P. mesmo possuindo uma
abertura horrenda no ventre resultado de uma cirurgia na bexiga e
assim sucessivamente.
13. Franco da Rocha, Unidade 30
- a pedagogia da dor
Ficha
Técnica:
Clientela
- adolescentes privados de liberdade com perfil agravado
Diretor
– Lucimar da Silva Souza
Fone
– 444.32777
G Capacidade
- 320 vagas
Lotação
- 305
Analfabetos
- 3
Atividades
- poucas
Educação
- inexistente
Ass.
Jurídica – S/A
Ass.
Médica – S/A
Ass.
Social – S/A
Ass.
Psicológica – S/A
Sexualidade
- interditada
Alojamentos
- celas
Celas
de isolamento - não
Denúncias
de maus tratos - sim
Denúncias
de tortura - sim
"Franco da Rocha" é um
conjunto de presídios para adolescentes. Todo o complexo foi
construído,G em tempo record, há cerca de um ano, pelo governo do
estado de São Paulo com o objetivo específico de encarcerar
adolescentes com um "perfil agravado". A obra é um
monumento à ilegalidade e deveria ser encarada como um
escândalo. Pelo contrário, o que se percebe é que, em São
Paulo, trata-se com extraordinária naturalidade o hábito de
encarcerar meninos desde os 12 anos o que, na prática, expressa
uma política de redução da idade penal. Percebe-se essa
"naturalização" do encarceramento - que contrasta
frontalmente com as disposições do ECA - pelo próprio discurso
das autoridades governamentais de São Paulo que falam com
desenvoltura em "Unidades de contenção máxima" ou
"periculosidade" como conceitos centrais de seu projeto.
A realidade vivida em Franco da Rocha, como em qualquer presídio,
estrutura-se na obscuridade. Aqui vive-se um cotidiano normalmente
invisível de violência cuja fundamentação "teórica"
está simbolizada por uma das máximas inscritas em um cartaz na
sala dos monitores da ala H. Ali pode-se ler: "O homem é um
aprendiz e a dor é seu mestre"
Visitamos a U-30, a maior de todo o
complexo, cujo nome é, sugestivamente, "Pau Brasil". O
prédio dispõe de 8 galerias, cada uma delas com 9 celas e pátio
interno próprio. Nas galerias, em média, 5 celas são usadas
como "alojamentos" e a capacidade de cada uma é de 12
vagas (!) As demais celas são depósitos de colchões e materiais
de limpeza. Há 6 camas em duas colunas em cada uma das paredes
laterais das celas e, ao fundo, um banheiro coletivo. Não há
G janelas, apenas respiradouros ao alto, por sobre o banheiro.
Nesses espaços deprimentes, os adolescentes passam 23 horas dos
seus dias. Pela manhã, bem cedo, os monitores acordam a todos e
recolhem os colchões e mantas. A providência, cuja
"racionalidade" é um desafio à mente humana, faz com
que os internos tenham de passar todo o dia deitados sobre a
pedra. Suas refeições, desde o café, as recebem nas celas ou,
como dizem os meninos, no "barraco". Vários dos
monitores batem nos internos com canos ou tacos envoltos por
panos. Após uma surra, o interno deve ficar debaixo da água fria
por até uma hora. A técnica permite que os hematomas
desapareçam ou diminuam. Os meninos não recebem aulas ou
qualquer tipo de atividade. No folder promocional da Secretaria
Estadual de Assistência e Desenvolvimento Social intitulado
"FEBEM, Unidades de Internação", datado de março de
2001, pode-se ler na página dedicada à U-30 de Franco da Rocha
que ali se oferece: "educação formal (curso supletivo),
artesanato com jornal, técnicas de redação, curso de espanhol,
teatro, percussão, street dance (sic), futebol de salão,
avaliação física, vôlei, dominó, xadrez e gincanas" As
quatro fotos que ilustram esse lugar "paradisíaco"
retratam: uma vista panorâmica da unidade, um menino colando o
que parece ser uma carta, outro limpando o chão de uma sala com
um rodo e outros cinco em uma animada roda de música. É
fantástico! Pela propaganda do governo de São Paulo fica-se
quase com vontade de passar umas férias na U-30. Aliás, talvez
fosse interessante que os responsáveis por esse folder mentiroso
G - a começar pelo Secretário de Assistência e Desenvolvimento
Social - passassem uns dias naqueles "dormitórios" -
esse é o nome com o qual o material publicitário designa as
celas.
Durante as horas em que passamos
conversando com os internos de 3 alas da U-30, recolhemos dezenas
de relatos de espancamentos sofridos ali mesmo. Foi difícil
encontrar um interno sem marcas espalhadas pelo corpo, algumas bem
recentes. Segundo os internos, o diretor da Unidade afirma em alto
e bom som para que eles ouçam que ele "segura qualquer B.O .
-Boletim de Ocorrência - contra os monitores" e que,
portanto, o "couro"está liberado. No dia 3 de maio de
2000, quando o Brasil inteiro se vestia de branco no dia nacional
contra a violência, acontecia em Franco da Rocha uma
"recepção" . "Recepção" é o nome que se
dá ao espancamento inicial - aquele que se oferece aos novatos
para que eles, ao entrarem na Unidade, já saibam qual é o
"regime disciplinar" que opera efetivamente. Nessa
recepção do dia pela paz, um menino perdeu 6 dentes por conta de
uma paulada. Em 7 de julho, houve outro espancamento geral e o
pátio teve de ser lavado com mangueira tamanha a quantidade de
sangue na quadra.
Os adolescente são, frequentemente,
humilhados. Um dos procedimentos mais comuns consiste em
obrigá-los a "imitar galinha" - pelo que são obrigados
a ficar de cócoras, na ponta dos pés e bater as "asas"
- ou, então, devem "instalar a moto" - pelo que devem
ficar também de cócoGras, na ponta dos pés, com as mãos em
posição como se estivessem segurando a direção de uma moto -
devem, então, acelerar, trocar de marcha, etc. se caírem,
apanham. Na ala "G" vários dos internos relataram que,
ultimamente, as cacetadas tem sido dadas com um acompanhamento de
fundo "musical": alguns monitores cantam o sucesso
"Um tapinha não dói" enquanto batem. Os
"ferros" ou tacos possuem incrições: "Diploma
prá ladrão" , "Direitos Humanos" , "Sossega
Leão", "Vem cá, neném" "Julinho"
(referência ao Padre Júlio) , "ECA" e "Ebeneézer"
(referência a um dos Promotores da Infância e da Juventude de
SP) , são algumas das expressões gravadas.
As visitas ocorrem em uma sala onde
todos devem ficar de pé, ou sentados no chão. Os monitores
"acompanham" as visitas de tal forma que os internos
não dispõe de qualquer momento de privacidade com seus
familiares. Por conta disso, os adolescentes não podem sequer
relatar aos familiares o que sofrem. Suas cartas - as que escrevem
e as que recebem - são violadas pelo que descumpre-se
frontalmente uma das garantias constitucionais asseguradas a todos
os cidadãos. Os internos podem receber visita de suas
companheiras, mas não podem receber visitas de seus filhos. A
sexualidade dos adolescentes aqui aprisionados - incluindo-se
aqueles que são pais ou que mantém relacionamentos estáveis -
encontra-se interditada, o que assinala sentença extra-judicial.
Em circunstâncias assim, todo e
quGalquer trabalho que se pretenda oferecer internamente aos
adolescentes através de um corpo técnico constitui,
simplesmente, uma fraude. Um dos internos, perguntado sobre suas
entrevistas com a assistente social, relatou que a referida
técnica costumava perguntar a ele: "Você está feliz?"
Ora, dizia ele, será que ela que estudou um montão pode imaginar
que alguém pode ser "feliz"aqui dentro?
A história de vida desses meninos
- tidos por muitos como "os mais perigosos" da Febem de
São Paulo - são, todas, muito semelhantes. J.O . L. , 17 anos,
por exemplo, já teve 7 passagens pela Febem. As quatro primeiras
por furto, as duas últimas por assalto à mão armada. J. morou
com sua mãe até os 7 anos em uma região muito pobre da
periferia de São Paulo. Seu pai verdadeiro está preso e seu pai
"de criação" sumiu após ter se separado de sua mãe.
Analfabeto, J. foi expulso da escola pela primeira vez aos 7 anos.
Aí resolveu ir prá rua e só aparecia em casa de vez em quando.
Relata que sua mãe chorava muito quando ele chegava e pedia para
que ele não fosse embora de novo. No "mundão" ,
entretanto, a vida era muito mais interessante que no
"barraco" de sua mãe, que mal conseguia comprar pro
"rango"e que, além de tudo, começara a beber .
Começou a cheirar cocaína aos 11 anos e passou a furtar para
comprar a droga. Sua vó, entretanto, recebeu-o em casa e levou-o
para a Igreja. Foi uma época "mais legal", ele conta.
Por insistência da avó até voltou a estudar. Um dia,
entretanto, foi flagrado cheirando cola no colégio e foi expulGso
de novo. Aí, diz ele, "não teve mais jeito". É
impressionante a presença uniforme de algumas características
nos relatos desses meninos. De uma forma ou de outra, todos eles
são filhos do abandono, da violência, da ignorância, da
miséria e das drogas. Chama atenção, quanto aos históricos de
drogadição pesada, que o Estado não tenha uma retaguarda capaz
de enfrentar pelo menos os casos mais graves de dependência
química.
Nos armários utilizados pelos
monitores, encontramos alguns dos filmes que são exibidos aos
internos : "Assalto sobre Trilhos" "Instinto
Selvagem" , "Fuga de Absalon", "Jogos,
Trapaças e 2 Canos Fumegantes" e "Cocaína, Passagem
Para a Morte" são alguns dos títulos. Encontramos, também,
um filme pornográfico.
V - Rio Grande do Sul
A Caravana no Rio Grande do Sul foi
formada pelo Deputado Federal Marcos Rolim, (PT/RS), pelo Deputado
Estadual Padre Roque Graziotin (PT/RS), pela advogada Soraia
Mendes da Comissão de Cidadania e Direitos Humanos da Assembléia
Legislativa , por Aline Borges , Ivone Duarte e Marilda Campolino,
assessoras da Comissão de Direitos Humanos da Câmara Federal,
pelo "rapper" Luis Daniel Machado Oliveira e pelos
jornalistas Beatriz Magno e José Varella (Correio Braziliense),
Nicolau Farah e Carlos Eduardo (Jornal do Brasil), José Luis e
Valdir Friolin (Zero Hora).
14 - Instituto Carlos Santos - ICS
-o primeiro presídio a gente nunca
esquece
Ficha Técnica:
Clientela
- jovens com internação provisória
Diretor
- Jorge Luis Pires
Fone
- 233.7099
Capacidade
- 30 vagas
Lotação
- 143 internos
Analfabetos
–
Atividades
- poucas
Educação
- razoável
Ass.
Jurídica - razoável
Ass.
Médica - precária
Ass.
Psicológica – S/A
Sexualidade
- interditada
Alojamentos
- celas
Cela
de isolamento - Sim
G
Denúncias
de maus tratos - sim
Denúncias
de tortura - sim
O ICS é a triagem da FEBEM em
Porto Alegre. Por ali passam os adolescentes que receberam medida
de internação provisória e os que serão, posteriormente,
distribuídos para outras casas de internação a depender da
sentença judicial.
No dia de nossa visita, a
Instituição - que oferece 30 vagas - mantinha 143 jovens
internados. Os números dessa superlotação são ainda mais
impressionantes quando descobre-se que 55 dos jovens internos já
estavam na Instituição há mais de 45 dias, prazo legal que
limita as internações provisórias. Apenas esse dado já é
suficiente para que se questione a responsabilidade do Poder
Judiciário local. O ICS dispõe de 75 monitores; três
assistentes sociais, duas psicólogas, dois médicos, dois
advogados, quatro auxiliares de enfermagem, dois técnicos em
educação, dois instrutores de atividades profissionais e um
técnico em recreação, além de pessoal de apoio. Cerca de 50%
dos adolescentes internos são oriundos de cidades da região
metropolitana e do interior do estado.
O ICS é um presídio típico onde
se encarcera adolescentes. Por conta da superpopulação, não há
condições de se garantir uma separação efetiva dos internos
observando-se idade, compleição física ou perfil infracional.
Ao que tudo indica, ocorrências de espancGamento não são raras.
Na conversa com os internos foi possível, inclusive, receber uma
lista com os nomes de alguns monitores que teriam por hábito
bater nos adolescentes. (Nesse caso, como em todos os demais,
encaminharemos, reservadamente - tendo em conta o princípio
constitucional da presunção da inocência - a listagem à
direção da FEBEM para as devidas providências ) As celas de
isolamento e duas outras celas usadas como triagem - logo na
entrada do prédio - não respeitam os padrões mínimos da ONU
para a vida prisional e descumprem as exigências da LEP. Ou seja:
nesses locais , não se admitiria sequer a permanência de adulto
condenado quanto mais adolescente cumprindo medida
sócio-educativa. Em uma dessas celas de triagem, encontramos o
jovem O .R.G. C. , 17 anos, que relatou ter sido violentamente
espancado, na rua, quando de sua prisão em flagrante, por um
grupo de pessoas, entre elas o dono do supermercado onde tentava
furtar. As lesões sobre o corpo desse menino eram de tal
gravidade que foi difícil para ele manter conosco uma
conversação normal. O lado direito de seu rosto, da testa até o
maxilar, era um único hematoma sobre o qual formara-se uma
protuberância azulada que lhe encobria totalmente o olho. Seria
necessário investigar o que, de fato, ocorreu com esse jovem.
Seja como for, parece bastante possível que um grupo de cidadãos
"de bem" tomem a si a tarefa de punir um menino negro e
miserável que tentava furtar em um supermercado e que o tenham
feito na forma de uma sessão coletiva de espancamento. Há pouco
mais de 100 anos, afinal, os senhores estavam acostumados a tratar
com negros indisciGplinados no tronco, não é mesmo?
No ICS, como na maioria das
unidades da FEBEM do RS, as visitas são desnudadas em um
procedimento conhecido como "Revista Íntima". Da mesma
forma, o sigilo de correspondência dos internos é violado
sistematicamente. Digno de nota é o fato do Estado do RS ter já
avançado em políticas específicas de superação desses mesmos
procedimentos humilhantes e atentatórios à ordem jurídica no
sistema prisional. Com efeito, há mais de um ano, não se tolera
a violação do sigilo da correspondência dos apenados e a
revista íntima sobre os visitantes foi abolida em todo o sistema
prisional, exceção feita às duas Unidades ainda sob a
administração da Força Tarefa da Brigada Militar.
As características tipicamente
prisionais do ICS são tão evidentes que encontram-se plenamente
incorporadas inclusive na linguagem dos adolescentes em primeiro
ingresso na FEBEM. Um desses meninos relatou que desejava ir
embora dali, o mais rápido possível e que jamais esqueceria o
que é estar "na tranca". Poderia ter acrescentado: o
primeiro presídio a gente nunca esquece.
Vários dos adolescentes relataram
terem sido espancados quando de suas prisões pela polícia.
Chamaram particularmente nossa atenção os relatos sobre
espancamentos na Delegacia Especializada da Criança e do
Adolescente (DECA). Um dos meninos relatou ter apanhado em outra
delegacia com a seguinte técnica "anti-marcas": deitado
no chão, os policiais colocavam sobre o seu estômago uma lista
telefônica soGbre a qual distribuíam cassetadas.
O ICS mantém atividades
pedagógicas durante o período da manhã, todos os dias e à
tarde, três vezes por semana, o que parece razoável embora não
se tenha condições de avaliar a qualidade das aulas ou os seus
resultados. Como registro positivo, deve-se assinalar que os
internos recebem pátio até três vezes ao dia, incluindo uma
saída à noite.
As celas não possuem banheiro, nem
água. Nos corredores, em frente a cada cela, há uma garrafa de 5
litros de água. Quando os internos desejam água ou quando
precisam se deslocar até o banheiro, precisam contar com o apoio
dos monitores. Alguém poderia perguntar porque não se permite
que os internos recebam as garrafas e administrem eles próprios o
abastecimento nas celas. Fizemos essa pergunta ao diretor que
respondeu afirmando que essa providência causaria problemas nas
relações entre os internos.
O jovem D.J. relatou necessitar de
uma intervenção para retirar uma bala alojada superficialmente
na parede abdominal. O mesmo adolescente necessitava de cuidados
especializados para tratar de problema grave que comprometia seu
olho direito. R.S.S. , da mesma forma, necessitava de tratamento
específico por conta de sequelas de um tiro na mão.
15. Instituto Padre Cacique - IPC
- um modelo intermediário
Ficha Técnica:
lientela
G - adolescentes privados de liberdade
Diretora
- Maximira Rocha
Fone
- 231.3848
Capacidade
- 40 vagas
Lotação
- 59 internos
Analfabetos
-
Atividades
- poucas
Educação
- razoável
Ass.
Jurídica - precária
Ass.
Médica - precária
Ass.
Social – S/A
Ass.
Psicológica – S/A
Sexualidade
- interditada
Alojamentos
- quartos
Celas
de isolamento - sim
Denúncias
de maus tratosG - não
Denúncias
de tortura - não
O Instituto Padre Cacique é uma
unidade onde verifica-se, mais claramente, um modelo de
transição. Por um lado, não observamos as mesmas
características prisionais do ICS; de outro, não há como se
falar em um modelo alternativo que supere aquelas
características. Não há celas, mas quartos coletivos,
razoavelmente limpos e ordenados. Os internos não permanecem
encarcerados, mas devem solicitar permissão para entrar ou sair
dos alojamentos. O IPC conta com o trabalho de um neurologista e
um psiquiatra, dois psicólogos, um pedagogo, um clínico geral,
dois assistentes sociais, uma enfermeira e quatro auxiliares de
enfermagem. O advogado estava de licença e os internos reclamaram
que há 6 meses não possuíam dentista.
Há restrições à entrada de
alimentos que os familiares poderiam trazer. A Casa destaca um
funcionário para, semanalmente, fazer compras requisitadas pelos
internos em um supermercado. Os adolescentes observam que esse
procedimento reduz o seu acesso a determinados bens uma vez que
seus familiares poderiam adquirir os mesmos produtos ou
equivalentes por preços menores.
Um dos adolescentes, V.P.C., 17
anos, possui evidentes transtornos mentais e deveria estar sendo
tratado em um local adequado. Outro dos internos, de conduta
homossexual reconhecida, é importunado e constrangido pelos
demais a tal ponto de temer por sua integridade física.
A estrutura do prédio expõe um
conjunto de limitações de difícil contorno. Particularmente os
banheiros encontravam-se, quando de nossa visita, em um estado
lamentável. Estava em andamento, contudo, um processo de reforma
da estrutura física em estágio bastante avançado que deverá
sanar esse problema e melhorar as condições de alojamento,
conforme foi possível constatar visitando a área em obras.
16. Centro de Jovens Adultos - CJA-
a prática da contenção química
Ficha Técnica:
Clientela
- Jovens entre 18 e 21 anos com perfil agravado
Diretor
- Major Irani Bernardes de Souza
Fone
- 233.9446
Capacidade
- 135 vagas
Lotação
- 54
Analfabetos
-
Atividades
- Poucas
Educação
- precária
Ass.
Jurídica -
Ass.
Médica -
Ass.
Social -
Ass.
Psicológica -
Sexualidade
- interditada
Alojamentos
- celas
Celas
de isolamento - sim
Denúncia
de maus tratos - sim
Denúncia
de tortura - não
O Centro de Jovens Adultos (CJA) é
uma Instituição concebida para a custódia de jovens entre 18 e
21 anos privados de liberdade por terem praticado atos
infracionais quando adolescentes. No mesmo prédio, funcionou o
Instituto Central de Menores -ICM - palco de inúmeras rebeliões,
fugas e mortes em passado recente. O CJA foi criado no final do
governo passado por inspiração do ex presidente da FEBEM, Dr.
Armando Konzen. A idéia básica era a de reunir, em uma única
instituição, jovens adultos que tivessem um perfil agravado e
adolescentes com histórico de participação em rebeliões. Na
verdade, o projeto do CJA foi, desde sempre, a expressão de uma
Casa de "Contenção Máxima" , ainda que não haja
qualquer previsão legal para tanto. Ao invés de resolver vários
G problemas com uma só tacada, a criação do CJA trouxe um
problema novo e colocou o próprio sistema FEBEM diante de
impasses que não foram, até hoje, superados. Por conta do perfil
da nova Instituição, do tratamento inadequado oferecido aos
internos e das sucessivas rebeliões, o CJA passou ao controle da
Brigada Militar em setembro de 1999. Desde então, o atual governo
vem ensejando esforços para esvaziar paulatinamente a Unidade com
o fito de extingui-la.
O CJA é um presídio como qualquer
outro. Sua cela de triagem lembra uma masmorra e as celas comuns
são deprimentes. Há 10 celas de isolamento disciplinar que
costumam ser usadas com bastante frequência. Não há estrutura
prevista para as funções de iluminação artificial das celas de
tal modo que as instalações elétricas são improvisadas. Os
adolescentes passam a maior parte do tempo na mais completa
ociosidade. Para agravar o quadro, o Juiz da Vara da Infância e
da Juventude de Porto Alegre, Dr. Leoberto Brancher, recusa-se a
receber os internos do CJA em audiência. O mesmo Juiz,
assinale-se, transformou o prazo de 6 meses para a revisão
periódica das medidas aplicadas aos internos em prazo mínimo; ou
seja: as medidas são reavaliadas após 6 meses e nunca antes
desse prazo.
Logo à entrada do prédio do CJA,
à direita, a Brigada Militar construiu um corredor gradeado para
cães adestrados da raça Rotweiller. Os animais são utilizados
como apoio ao sistema de segurança montado pela Instituição
providência que, por óbvio, não guarda com a sócio-educação
qualquer relação de perGtinência Os policiais militares que
trabalham no CJA (76 ao todo) realizam suas tarefas - mesmo as de
rotina, dentro da unidade - fortemente armados. No dia de nossa
visita, não estavam armados. Os internos, entretanto, relataram
que o emprego de armamentos na área interna do prédio é
corriqueiro. Trata-se de procedimento que contraria um dos poucos
consensos mundiais produzidos em torno da segurança de
Instituições de privação de liberdade. Efetivamente, o emprego
de armas na área interna da Instituição oferece mais riscos do
que garantias.
Entre todos os relatos que
colhemos, foi possível registrar duas queixas de maus-tratos.
Como regra, os internos manifestam uma relação não hostil
diante dos PMs que ali trabalham. Muitos dos PMs que estavam
trabalhando no dia de nossa visita não possuíam identificação
em suas fardas; os internos, não obstante, os reconheciam pelo
nome.
Um dos problemas mais graves
verificados no CJA parece ser o abuso medicamentoso. Ao que tudo
indica, a medicação psicotrópica ministrada na instituição -
mesmo com prescrição médica - é feita de forma indiscriminada.
Segundo a Dra. Ana Lúcia del Pino, no dia de nossa visita havia
12 internos recebendo medicação psicotrópica. Conversando com
os internos, não obstante, foi possível constatar que a
esmagadora maioria deles já tomou, em algum momento, no CJA, a
mesma medicação. Desde há muito a FEBEM do RS vem convivendo
com técnicas de "contenção química". O chamado
"prego" - gíria dos internos que denota a injeção
ministrada à forGça - parece ser, ainda, uma prática habitual
nessa e em outras unidades. Chama a atenção, também, a
ausência de uma retaguarda para tratamento especializado dos
casos de drogadição.
Os internos, quando da necessidade
de deslocamento para fora da unidade, são conduzidos algemados
pelas mãos e, através de uma corrente que perpassa um cinto
especial, pelos pés. Essa é a única instituição, entre todas
as que visitamos no país, que adota esse procedimento de
"algemas duplas". Percebe-se, nitidamente, que a
preocupação com a "segurança" , a
"contenção" e a "disciplina" estão
maximizadas no CJA. Quanto às medidas sócio-educativas, pode-se
afirmar que elas expressam mais uma vontade da direção do que
uma realidade para os internos.
17 - Comunidade Sócio Educativa -CSE
- 5 presídios em um só
Ficha Técnica:
Clientela
- adolescentes privados de liberdade
Diretor
- José Renato Dutra Argiles
Fone
- 266.5280
Capacidade
- 110 vagas (5 unidades com 22 vagas cada)
Lotação
- 101
Analfabetos-
Atividades
- poucas
Educação
- razoável
Ass.
Jurídica - S/A
Ass.
Médica - S/A
Ass.
Social - S/A
Ass.
Psicológica - S/A
Sexualidade
- interditada
Alojamentos
- celas
Celas
de isolamento - sim
Denúncia
de maus tratos - sim
Denúncia
de tortura - sim
A Comunidade Sócio Educativa ainda
não merece esse nome. A estrutura à disposição dos técnicos e
monitores é a de 5 pequenos presídios em um mesmo complexo fruto
de uma reforma estrutural ampla e recente. Os alojamentos são
celas individuais melhor denominados pelos adolescentes como
"bretes". A Instituição conta com um grande número dGe
funcionários. Ao todo, são 162 monitores mais o grupo de
técnicos formado por 2 advogados, 3 assistentes sociais, 3
psicólogos, 2 pedagogos, 3 psiquiatras, um médico clínico, um
dentista, uma enfermeira, 5 auxiliares de enfermagem e um
professor de educação física, além do pessoal de apoio. A
unidade "A" reúne adolescentes com um "perfil
agravado". A Casa, desde a época em que se chamava Instituto
Juvenil Masculino (IJM) possui um histórico traumático com
rebeliões graves. A última ocorrência com reféns ocorreu em
agosto de 2000. Um ano antes, outro motim produziu o assassinato
de um monitor.
Do total de internos, havia 21 com
atividades externas. A ociosidade dos internos, todavia, continua
sendo uma marca importante. Grande parte das queixas dos internos
referem-se, de uma ou outra forma, a casos de maus tratos
atribuídos a alguns monitores. Na unidade "A" foi
possível recolher relatos contundentes a respeito de ocorrência
recente de violência praticada contra os internos. Alguns dias
antes de nossa visita, o almoço foi servido estragado. Os
adolescentes recusaram a alimentação e foram encaminhados de
volta as suas celas. À noite, a janta foi servida estragada.
Após a segunda recusa, os internos daquela unidade passaram a
protestar "pedalando" as portas de suas celas. Em
represália a esse protesto, monitores do plantão da noite
teriam, durante a madrugada, agredido vários adolescentes que,
algemados nas mãos e nos pés, teriam sido submetidos à
medicação psicotrópica. As algemas só foram retiradas pela
parte da manhã.G O diretor da instituição atesta que a comida
estava, mesmo, estragada e responsabiliza a empresa fornecedora
por esse resultado. Reconhece, então, que os adolescentes
"tinham razão quanto ao mérito", segundo suas
palavras. Entende, entretanto, que o protesto subsequente não
poderia ter sido admitido e que os adolescentes revelaram
"agitação psicomotora" o que, segundo sua opinião,
justificaria a aplicação forçada da medicação. No caso de
"agitação psicomotora", haveria prescrição médica,
inclusive. É curioso o raciocínio. Resta saber se duas ofertas
consecutivas - no almoço e na janta - de comida estragada não
conformariam motivo suficiente para "agitação psicomotora"
de adolescentes encarcerados. Ou, ainda, qual teria sido a forma
"recomendável" para que jovens famintos fizessem valer
o direito básico a uma refeição que não fosse podre. Ainda
segundo os internos, após as agressões sofridas e o
"grampeamento"(uso de algemas) alguns monitores teriam
despejado garrafas de urina sobre os acometidos de
"agitação psicomotora." O Deputado Marcos Rolim
recolheu esses relatos, primeiramente, conversando com mais de uma
dezena de jovens da ala "A", em uma sala contígua ao
pátio interno da unidade. As celas ficam no andar superior. Logo
após, o parlamentar entrou na galeria e conversou, separadamente,
com três adolescentes que estavam isolados em suas celas desde os
episódios uma semana antes. A providência permitiu que a
história colhida inicialmente fosse checada três vezes nos seus
detalhes. Tudo o que havia sido dito foi repetido em cada um
dGesses momentos o que fornece uma evidência bastante forte sobre
a veracidade dos relatos.
Em outra ala , a ala "D"
onde estão, segundo a direção, meninos de primeiro ingresso e,
portanto, com um perfil bastante diverso daqueles da ala
"A" , foi possível colher novas evidências quanto ao
abuso medicamentoso. Vários dos internos relataram que se
desejarem "tomar um prego" , basta pedir. Ou seja: esses
jovens confirmam que eles mesmos podem solicitar medicação
psicotrópica e que são imediatamente atendidos nesse tipo de
solicitação. Estaremos diante de outro caso de "agitação
psicomotora" para a qual há, providencialmente, prescrição
?
18 - Instituto Educacional Feminino
- a melhor unidade visitada pela Caravana
Ficha Técnica:
Clientela
- adolescentes privadas de liberdade
Diretora
- Rosana Alicinda da Silva Azambuja Dias
Fone
- 266.5294
Capacidade
- 33 vagas
Lotação
- 25
Analfabetas
-
Atividades
- várias
Educação
- razoável
Ass.
Jurídica -
Ass.
Médica -
Ass.
Social -
Ass.
Psicológica - boa
Sexualidade
- interditada
Alojamentos
- quartos
Celas
de isolamento - não
Denúncias
de maus tratos - não
Denúncias
de tortura - não
O Instituto Educacional Feminino
Paulo Juarez Zílio - a casa de internação feminina da FEBEM
gaúcha, foi a melhor instituição visitada pela IV Caravana
Nacional de Direitos Humanos. Trata-se de uma Instituição
pequena e eficiente onde formou-se, efetivamente, um clima de
recuperação e confiabilidade. Os investimentos afetivos da
direção, dos funcionários e do corpo técnico são evidentes e
aparecem naturalmente na fala das internas. Uma delas, ao
referir-se à diretora, afirmou: - "G;Sabe, ela parece uma mãe
prá gente." A unidade conta com 41 funcionários entre
técnicos, monitores e pessoal de apoio. Do total de vagas, 5 são
reservadas para semi-liberdade.
O Instituto possui dois tipos de
alojamentos: as meninas privadas de liberdade possuem um quarto
individual. São peças simples e pequenas, porém decentes,
limpas e decoradas. Nada que lembre o confinamento e a
segregação. Os outros alojamentos são quartos maiores - usados
pelas meninas em semi-liberdade - que mais parecem suítes. Esses
quartos possuem, inclusive, um pequeno vestíbulo.
Dentro da Unidade, tem-se a
impressão de se estar no interior de uma grande casa de família.
Os ambientes internos, a existência de áreas comuns de lazer,
etc. Contribuem para que a própria Instituição adquira esse ar
"doméstico". Por óbvio, uma estrutura do tipo a qual
se agrega uma política adequada só podem produzir resultados
muito superiores àqueles condicionados pelo padrão de
encarceramento.
Ao fundo da Unidade, em uma área
gramada utilizada para recreação, instalou-se duas piscinas,
tão rudimentares quanto funcionais. Nesse espaço aberto, a
direção organiza festas e, mesmo, reuniões dançantes com
adolescentes da FEBEM que possuem autorização para atividades
externas. Segundo uma das meninas, nessas oportunidades, "dá
até prá namorar".
Anexo:
Alagoas:
O estado de AlagoGas viveu,
recentemente, um evento dramático em sua única unidade de
internação para adolescentes em conflito com a lei, o CRM. No
dia 13 de março desse ano, uma rebelião naquela unidade teve
como resultado a morte de 4 meninos, queimados. Os deputados
Marcos Rolim (PT/RS) e Régis Cavalcanti (PPS/AL) estiveram em
Maceió, para avaliar a situação, no dia 20 de março. Em sua
visita ao CRM foram acompanhados pelo Secretário da Justiça e
Cidadania do Estado de Alagoas, Tutmes Airam e pela imprensa
local. As observações a seguir são anexadas, então, a esse
relatório.
Centro de Ressocialização do
Menor - CRM
Ficha Técnica:
Clientela
- adolescentes privados de liberdade
Diretor
- José dos Santos
Fone
- 354.2313 (082)
Capacidade
- 56 vagas
Lotação
- 33
Analfabetos
-
Educação
- precária
Ass.
Jurídica - razoável
Ass.
Médica - inexistente
Ass.
Social - S/A
Ass.
Psicológica - S/A
Sexualidade
- interditada
Alojamentos
- quartos
Celas
de isolamento - não
Denúncias
de maus tratos - não
Denúncias
de tortura - não
O CRM de Maceió é a unica unidade
de internação para adolescentes em conflito com a Lei em todo o
estado. Assim, cerca de 70% dos internos na Instituição são
oriundos de municípios do interior ou da região metropolitana.
Tal característica, que contraria frontalmente o disposto no ECA,
termina por agregar dificuldades extraordinárias por conta das
dificuldades impostas aos internos de receberem visita. Na
Unidade, há 3 assistentes sociais, 4 psicólogos, um professor de
educação física, um professor de capoeira e uma enfermeira.
Não há médico ou dentista. Os monitores trabalham, todos,
mediante contrato emergencial e seus salários são da ordem de
270 reais. Os familiares são revistados mediante a prática
ilegal e humilhante do desnudamentoG, embora a casa disponha de
detector de metal. Na Unidade, a única cela de isolamento - um
cubículo imundo e escuro - foi interditada por decisão judicial.
Nesse espaço, ironicamente chamado de "quarto de
reflexão", um interno foi assassinado há cerca de 8 meses.
O CRM possui um bom projeto
arquitetônico formado por pequenas cabanas, onde estão os
alojamentos dos internos, em volta de uma área central coberta. A
rebelião recente expressou um "acerto de contas" entre
um grupo de internos tendo os autores das mortes sido
identificados e tranferidos da Unidade. Na conversa que mantivemos
com os adolescentes foi possível perceber a existência de uma
relação tranquila e respeitosa dos internos com os monitores e
com o diretor. Não recolhemos uma queixa sequer de maus tratos.
Nesse ponto, como em tantas outras unidades pelo país, a fala dos
meninos permite sim reconstruir cenas bastante violentas quando de
suas prisões. Também aqui, os espancamentos dos adolescentes por
parte de policiais, inclusive no interior da Delegacia
especializada, parecem integrar o cotidiano. De qualquer forma, o
fato de haver um bom relacionamento interno - pelo menos um
relacionamento não tensionado por agressões, é um ponto
positivo que merece ser destacado.
As visitas dos familiares acontecem
duas vezes por semana e duram, em média, 3 horas. Os adolescentes
que são pais, todavia, não podem receber visitas de seus filhos.
Por determinação judicial, podem apenas permanecer cerca de 10
minutos com seus filhos na parte administrativa da unidade.
G O que nos chamou sobretudo a
atenção é o fato de que, a rigor, todos os procedimentos
internos na relação da instituição com os adolescentes estão
regrados por portarias judiciais. Por conta dessa dinâmica, se
está produzindo no CRM um conjunto de restrições na execução
das medidas sócio educativas que refletem mais os valores morais
dos Juizes da I Vara da Infância e da Juventude da capital,
Fernando Tourinho de Omena Souza e Roldão Oliveira Neto, do que
as próprias normas do ECA. Assim, por exemplo, pela portaria
010/01 os internos estão proibidos de fumar com base,
fundamentalmente, em dois argumentos a) de que o cigarro produz
inúmeros malefícios a saúde e b) que seu uso na Instituição
coloca a unidade em risco. Sim, por certo o cigarro produz riscos
à saúde. Seria de se imaginar, então, que competiria ao Estado
desenvolver campanhas educativas para prevenir o tabagismo. Mas,
proibi-lo? Não estaríamos aqui diante de uma hipocrisia? Têm
idéia os ilustríssimos magistrados do que agrega de sofrimento
ao adolescente - dependente químico da nicotina , já privado de
sua liberdade - essa nova privação? Será que já tiveram
notícia sobre o uso de terapias de substituição usadas no
tratamento de dependência química de drogas pesadas? Pensamos
que não. Quanto ao risco à segurança da Unidade que seria
oportunizado pelo fumo, pode-se , tão somente, agregar que
qualquer dos direitos dos internos podem acrescentar riscos à
segurança da Instituição. Assim, por exemplo, o direito à
visita traz riscos; as atividades externas dos adolescentes,
também, etc. Em outra portaria, 09/01, suas excelências
G determinaram que o CRM devolvesse aos familiares todos os
aparelhos de televisão, os rádios e os aparelhos de som até
então de posse dos internos. O argumento, agora, é que as
notícias de rebeliões poderiam influenciar os meninos, que a
programação televisiva brasileira é ruim, "cheias de cenas
de sexo e violência" e que os internos, ao invés de
descansar, passavam horas a frente dos aparelhos. Os Juizes,
então, consideram que os adolescentes só podem ter acesso à
rádio e televisão para terem contato com programações
"selecionadas" pelos técnicos. Tal limitação
contraria um dos direitos mencionados pelo artigo 124 do ECA
(inciso XIII - "ter acesso aos meios de comunicação
social") O resultado da decisão é que, agora, os internos
estão, simplesmente, privados de TV, notícias ou música. Passam
a ser "influenciados", então, apenas, pelo ócio
absoluto. Outra portaria, 011/01, proibe que os internos usem
pulseiras, brincos, anéis ou similares. A idéia é a de que a
posse desses adereços traria o risco da existência de trocas e,
por decorrência, a possibilidade de conflitos, pequenos furtos,
etc. Ora, pelo argumento, os internos estariam impossibilitados de
manterem sob sua guarda qualquer bem pessoal. O interessante é
que o ECA estabelece (art.124, inciso XV) o direito dos internos a
"Manter a posse de seus objetos pessoais e dispor de local
seguro para guardá-los, recebendo comprovante daqueles porventura
depositados em poder da entidade." Pela redação, fica
evidente que o depósito de bens sob a administração da entidade
constitui medida excepcional sendo a regra aquela que Gassegura aos
internos a posse de seus bens pessoais. Mas para os juizes
alagoanos isso não pode valer sequer para uma pulseira ou um
brinco. Ao invés de determinarem ao Estado que providenciasse as
condições necessárias para que os internos pudessem
"dispor de um local seguro para guardar seus pertences"
viu-se por bem suprimir mais um direito dos adolescentes.
Fantástico!
Recomendações:
Ao Governo Federal
1) Que o Ministério da Justiça,
ouvido o Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do
Adolescente (CONANDA), defina critérios objetivos para a
liberação de recursos orçamentários da União que premiem os
estados com projetos efetivos de cumprimento do Estatuto da
Criança e do Adolescente (ECA) e que penalizem os estados que,
sistematicamente, violem esse diploma legal;
2) Que o Ministério da Justiça
constitua, ouvido o CONANDA, uma Comissão Nacional de
Acompanhamento e Fiscalização da Execução das Medidas Sócio
Educativas (CONAFIMS), integrada por técnicos e ativistas da
sociedade civil comprometidos com o ECA, para a inspeção regular
e periódica das unidades de internação de adolescentes em
conflito com a lei;
3) Que o Governo Federal
estabeleça, como exigência imediata aos estados da federação,
a imediata suspensão da violação da correspondência dos
adolescentes internados em cumprimento de medidas sócio
educativas de privação de liberdade.
4) Que o Governo Federal
estabeleça, como exigência imediata aos estados da federação,
a imediata interdição de todas as celas, quartos ou alojamentos
de dimensões inferiores a 6 metros quadrados, ou sem aeração
suficiente, ou sem iluminação suficiente, ou sem condições
adequadas à higiene e/ou à saúde.
5) Que o Ministério da Justiça,
ouvido o Conanda, elabore um ante-projeto de Lei regulando a
Execução de Medidas Sócio Educativas de privação de liberdade
com um sentido garantista.
6) Que o Ministério da Justiça
defina que os estados só receberão recursos da União para a
reforma, ampliação ou construção de novas unidades destinadas
à internação de adolescentes em conflito com a Lei caso os
projetos arquitetônico e pedagógico dessas unidades alcancem
pareceres favoráveis do CONANDA.
7) Que o Ministério da Justiça
solicite aos governos estaduais cópia de todos os documentos com
as regras disciplinares exigidas dos adolescentes internos com
medida sócio educativa de privação de liberdade, unidade por
unidade.
Aos governos dos estados
1) Que os governos estaduais
estabeleçam, imediatamente, uma política pública destinada a
superar a obscuridade que caracteriza grande parte das unidades de
internação para adolescentes em conflito com a Lei, credenciando
entidades da sociedade civil, familiares e ativistas em Direitos
Humanos para que tenham livre acesso e possam inspecionar,
constantGemente, a qualquer horário e sem prévio aviso, tais
instituições
2) Que os governos estaduais
desenvolvam ações administrativas urgentes destinadas a
regionalizar o atendimento aos adolescentes em conflito com a lei
nos termos do ECA;
3) Que os governos estaduais
desenvolvam ações administrativas urgentes destinadas a
desativar todas as unidades de internação de adolescentes em
conflito com a lei que mantenham padrão arquitetônico
tipicamente prisional e que definam projetos alternativos para a
construção de novas unidades segundo o princípio de
"Contenção Externa Máxima e Distensão Interna
Máxima".
4) Que os governos estaduais
assegurem a cada adolescente interno com medida sócio educativa
de privação de liberdade, inclusive àqueles com internação
provisória, a posse de um exemplar do Estatuto da Criança e do
Adolescente.
5) Que os governos estaduais
desenvolvam projetos efetivos de capacitação e formação dos
funcionários das FEBEMS e congêneres extinguindo as jornadas de
trabalho exaustivas e limitando ao máximo as possibilidades de
horas extras;
6) Que os governos estaduais apurem
rigorosamente todas as denúncias de violência, maus tratos e
tortura contra adolescentes internados afastando, de imediato, os
funcionários implicados até conclusão dos procedimentos
investigatórios;
7) Que os governos estaduais
desenvGolvam ações concretas de assistência social junto aos
familiares dos adolescentes privados de liberdade;
Pedidos de Informação:
O relator, Deputado Marcos Rolim,
encaminhou pedidos de informação às autoridades do estado de
São Paulo solicitando:
Ao M.P. Vara da Infância e
Juventude de São Paulo:
1. Número de inquéritos policiais
requisitados para apuração de denúncias de maus tratos e/ou
tortura na FEBEM de São Paulo nos últimos 12 meses;
2. Número de procedimentos
investigatórios do Ministério Público em andamento que envolvam
denúncias de maus tratos e/ou tortura na FEBEM ainda sem
requisição de inquérito;
3. Quais as ações - desde agosto
de 1999 - existentes no Ministério Público contra a FEBEM em
função de descumprimento do ECA, qual a situação atual desses
procedimentos e quais as decisões já tomadas?
A FEBEM de São Paulo:
4. De agosto de 1999 até agora,
relação de todas as demissões e punições disciplinares de
funcionários envolvidos em agressões, maus tratos, abuso de
autoridade e/ou tortura.
5. Número de sindicâncias em
andamento.
6. Nesse mesmo período, desde
agosto de 1999, quantas sindicâncias abertas na FEBEM foram
arquivadas? Solicitamos cópias de todas as justificativas de
G arquivamento.
Ao Procurador Geral de Justiça de
São Paulo
7. Solicitamos, desde a vigência
da Lei que tipificou o crime de tortura no Brasil, cópia de todas
as denúncias oferecidas pelo Ministério Público no estado de
São Paulo.
8. Quantos inquéritos por crime de
tortura foram arquivados?
9. Se existe Promotoria ou grupo
especializado no Ministério Público de São Paulo no combate à
tortura?
Ao Presidente do Tribunal de
Justiça de São Paulo
10. Cópia das liminares concedidas
pela Presidência ou Câmara Especial do Tribunal de Justiça de
São Paulo em favor da FEBEM em ações civis públicas ou
representações ou portarias judiciais com base no artigo 191 do
ECA. Cópia das liminares suspendendo decisões provisórias ou
definitivas de juizes da primeira instância nas ações antes
referidas contra a FEBEM;
A Secretaria de Segurança Pública
de São Paulo
11) Número de inquéritos
policiais em andamento ou já remetidos ao Poder Judiciário com
relatório conclusivo da autoridade policial cuja apuração
versava sobre as práticas de: tortura, maus tratos, abuso de
autoridade e denúncias com base no artigo 232 do ECA.
Agradecimentos:
Deputado Aécio Neves, Presidente
dGa Câmara dos Deputados;
Deputado Martinho Carmona (PSDB/PA)
, presidente da Assembléia Legislativa do Pará;
Deputado Sérgio Zambiazi (PTB/RS),
presidente da Assembléia Legislativa do RS;
Dr. Carlos Cardoso, Assessor para
Direitos Humanos do Ministério Público de São Paulo;
Vereador Magal, da Pastoral
Carcerária de Aracajú;
Ariel de Castro Alves, coordenador
do MNDH;
Yvone Duarte, Marilda Campolino,
Janete Lemos , Adriana Maria Godoy, Terezinha Lisiex Franco
Miranda, Clotildes de Jesus Vasco e Aldenir Áurea, assessoras da
Comissão de Direitos Humanos da Câmara Federal;
Miriam Beatriz Barbosa Corrêa e
Laura Vicuña Corrêa Lima, assessoras parlamantares do Gabinete
do Deputado Marcos Rolim;
Paulo José de Gouvêa, Genaro
Júnior de Souza Mendes e Marcos Túlio dos Santos, assessores
parlamentares do Gabinete do Deputado Cabo Júlio;
Ana Lúcia de Miranda Ramos e
Donizeti Mariano Passos, do Núcleo de Produção – CEFOR;
Wallace Souza Oliveira, seção de
informática –Biblioteca da Câmara dos Deputados;
Ao Correio Braziliense e ao Jornal
do Brasil que designaram profissionais que acompanharam toda a
Caravana.
Fotógrafos:
Marilda Campolino
Assessora CDH
José Varella
Correio Braziliense
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