ABC
da Cidadania
João Baptista Herkenhoff
QUINTO
CAPÍTULO
A
CONSTITUIÇÃO DO ESTADO DO ESPÍRITO
SANTO. A LEI ORGÂNICA DO MUNICÍPIO
DE VITÓRIA.
1. Participação popular
na Constituinte Estadual.
Também no nível das constituintes
estaduais houve muita participação
popular.
A
Assembléia Constituinte do Espírito
Santo abriu suas portas à entrada de amplos
contingentes populares.
Foi
um momento de intensa vibração cívica
em nosso Estado.
2. As emendas populares na Constituinte
estadual.
A exemplo do Congresso Constituinte Nacional,
a Assembléia capixaba admitiu, no seu Regimento,
a possibilidade de apresentação
de emendas populares.
Muitas emendas foram apresentadas. O autor deste
livro teve a oportunidade de defender, perante
a Assembléia Constituinte Estadual, as
emendas propostas pela Pastoral Carcerária
e pela Comissão “Justiça e
Paz”, da Arquidiocese de Vitória.
Essas emendas foram incorporadas ao texto da Constituição
do nosso Estado.
3. Emendas de origem popular, ou que se
respaldaram em lutas e reivindicações
populares: destaque de algumas que, a meu ver,
merecem realce.
Creio que, dentre as emendas aprovadas, merecem
destaque as que vieram a ser transformadas nos
seguintes artigos da Constituição
do Estado:
Art.
3º, parágrafo único:
O
Estado e os Municípios estabelecerão,
por lei, sanções de natureza administrativa,
econômica e financeira a quem incorrer em
qualquer tipo de discriminação,
independentemente das sanções criminais.
Art.
4º, parágrafo único:
O
Estado prestigiará e facultará,
nos termos da lei, a participação
da coletividade na formulação e
execução das políticas públicas
em seu território, como também no
permanece controle popular da legalidade e moralidade
dos atos dos Poderes Públicos.
Art. 7º:
É
gratuita, para os reconhecimentos pobres, na forma
da lei, além dos atos previstos no art.
5º, LXXVI, da Constituição
Federal, a expedição de cédula
de identidade individual.
Art.
10 – O Estado promoverá a defesa
do consumidor, mediante:
I
– política estadual de defesa do
consumidor.
Art.
69:
A
iniciativa popular (das leis) pode ser exercida
pela apresentação à Assembléia
Legislativa de projeto de lei ou proposta de emenda
à Constituição, devidamente
articulados e subscritos por, no mínimo,
um por cento do eleitorado estadual, distribuído
em pelo menos cinco Municípios com um mínimo
de dois por cento dos eleitores de cada um dos
Municípios.
Art.
76, § 2º:
Qualquer
cidadão, partido político, associação
ou sindicato é parte legítima para,
na forma da lei, denunciar irregularidade ou ilegalidade
ao Tribunal de Contas do Estado.
Art.
132, § 1º:
Fica
assegurada, na forma da lei, a participação
popular, por meio de organizações
representativas, na formulação da
política penitenciária estadual.
Art. 132, § 4º:
Para
garantia dos direitos do presidiário, todo
estabelecimento penal ou prisão estará
sujeito à jurisdição do magistrado
competente.
Art.
132, § 4º:
Todo
estabelecimento penal ou prisão estará
sujeito à fiscalização dos
órgãos e entidades de defesa dos
direitos humanos ou de assistência ao preso.
Nossa
Constituição Estadual foi promulgada
no dia 5 de outubro de 1989.
4.
Lei Orgânica Municipal: corresponde, no
plano local, a uma verdadeira “Constituição
municipal”.
Tradicionalmente,
os Municípios brasileiros gozavam apenas
de autonomia administrativa.
Essa
autonomia administrativa era assegurada:
a) pela eleição dos Prefeitos e
Vereadores;
b) pela administração própria,
em tudo que se relacionava com assuntos de seu
peculiar interesse.
Essa
autonomia administrativa só foi quebrada
nos períodos em que o país esteve
sob o jugo de ditaduras. Então tivemos
fechamento de Câmaras de Vereadores e Prefeitos
nomeados pelos donos do poder imperante.
Ainda
que os Municípios elegessem seus Prefeitos
e Vereadores, não se podia falar em autonomia
política. Isso porque os Municípios
não tinham o poder de auto-organização
política. Os Municípios eram organizados
através de uma Lei Orgânica Municipal,
votada pelos Estados.
A
Constituição de 1988 assegurou aos
Municípios o poder de auto-organização,
ou seja, a autonomia política.
Diz o artigo 29 da Constituição
Federal que o Município reger-se-á
por lei orgânica, votada em dois turnos,
com o interstício9 mínimo de dez
dias. Essa lei orgânica deve ser aprovada
por dois terços dos membros da Câmara
Municipal, que a promulgará. Deve atender
os princípios estabelecidos na Constituição
Federal, na Constituição do Estado
respectivo, e os preceitos relacionados no citado
artigo 29.
A
Lei Orgânica Municipal, hoje votada por
cada um dos municípios brasileiros, corresponde,
no território da comuna,10 a uma verdadeira
Constituição. Embora, tecnicamente,
não receba o nome de “Constituição
Municipal”, faz as vezes de “Constituição”
no nível local.
A
autonomia administrativa, que já era prevista
nas Constituições brasileiras promulgadas,
continuou sendo assegurada aos Municípios.
Essa autonomia administrativa resultou ainda mais
realçada pela Constituição
de 1988.
_________________________________________________________________________________
9 Interstício mínimo
de dez dias quer dizer o seguinte: entre o primeiro
e o segundo turno de votação tem
de haver um intervalo de, pelo menos, dez dias.
Esse intervalo de dez dias é para impedir
que a “Lei Orgânica Municipal”,
tão importante, fosse votada “a toque
de caixa”.
10
Usamos a expressão “território
da comuna”, no texto corrido. Isto quer
dizer “território do município”.
A comuna é um sinônimo de município.
5.
A lei Orgânica do Município de Vitória.
A
Lei Orgânica do Município de Vitória
foi promulgada no dia 5 de abril de 1990.
Também
começa com um preâmbulo, escrito
nos seguintes termos:
“Nós,
os representantes do povo de Vitória, reunidos
sob proteção de Deus, em Câmara
Constituinte, por força do Art. 11, parágrafo
único do Ato das Disposições
Transitórias da Constituição
Federal, baseado nos princípios nela contidos,
promulgamos a Lei Orgânica Municipal, assegurando
o bem-estar de todo cidadão, mediante a
participação do povo, no processo
político, econômico e social do município,
repudiando, assim, toda a forma autoritária
de governo.”
Também,
em nível municipal, foram admitidas “emendas
populares”. A Lei Orgânica do Município
de Vitória foi discutida e votada com participação
popular. A participação popular
contribuiu muito para que nossa “Lei Orgânica”
abrigasse importantes idéias.
Algumas
determinações incluídas na
“Lei Orgânica do Município
de Vitória” merecem especial destaque.
Realçamos,
como importantíssimos, os seguintes princípios,
dentre outros:
•
os que mandam constituir objetivos fundamentais
do Município de Vitória:
- erradicar a pobreza e a marginalização
e promover o desenvolvimento da comunidade local;
- promover adequado ordenamento territorial, de
modo a assegurar a qualidade de vida de sua população;
- promover as funções sociais da
cidade;
- adotar formas de descentralização
do poder e de desconcentração dos
serviços a cargo do Município;
• o que determina que o Município
de Vitória busque a integração
econômica, política, social e cultural
das populações dos municípios
vizinhos e dos que estejam sob a influência
das bacias hidrográficas dos Rio Jucu e
Santa Maria, que o abastecem;
• o que não se limita a dizer que
o Município de Vitória acolhe os
direitos e garantias individuais e coletivos previstos
na Constituição Federal e Estadual.
Esta determinação seria óbvia,
ou seja, o Município não poderia
desconhecer os direitos da cidadania previstos
na Constituição do país e
do Estado. Nossa Lei Orgânica foi além
desse simples acolhimento. Ordena que o Município
de Vitória assegure, pela lei e demais
atos de seus órgãos e agentes, a
“imediata e plena efetividade dos direitos
e garantias individuais e coletivos”;
• o que assegura, como forma de viabilizar
a participação popular, a existência
de Conselhos Populares, não cabendo os
Poder Público qualquer tipo de interferência
nesses Conselhos e nas Associações
Populares;
• o que determina que ninguém poderá
ser privado dos serviços públicos
essenciais;
• o que realça, dentre as competências
do Município:
- cuidar da saúde e da assistência
pública e da garantia e proteção
das pessoas portadoras de deficiência;
- impedir a evasão, a destruição
e a descaracterização de obras de
arte e de outros bens de valor histórico,
artístico ou cultural, no território
do Município;
- proteger o meio ambiente e combater a poluição
em qualquer de suas formas, inclusive a poluição
sonora, tão prejudicial à saúde
psicológicas das pessoas e ao sossego público.;
- preservar as florestas, os manguezais, a fauna
e a flora;
- promover programas de construção
de moradias e a melhoria das condições
habitacionais e de saneamento básico;
- combater as causas da pobreza e os fatores de
marginalização, promovendo a integração
social dos setores desfavorecidos;
- estabelecer e implantar política de educação
para a segurança no trânsito urbano;
• o que faculta aos cidadãos em geral
a iniciativa de leis complementares ou ordinárias,
satisfeitos os requisitos estabelecidos na própria
Lei Orgânica;
• o que determina que as terras públicas
não utilizadas e as discriminações
sejam prontamente destinadas a assentamentos de
população de baixa renda e à
instalação de equipamentos coletivos.
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