Prezado Presidente,

19 de julho de 1996

 

Sendo que a Prelazia de Cristalândia abrange toda a margem leste da Ilha do Bananal, eu, como bispo da Prelazia de Cristalândia, participo do GTI (Grupo de Trabalho Interinstitucional). Sem dúvida, o senhor bem sabe que o GTI foi formado pelo atual Administrador Regional da FUNAI em Gurupi, Edson Silas Beiriz, em 1991, para ajudar na execução da determinação da Justiça Federal, que sentenciou a FUNAI e a União a cumprirem a Constituição de 1988, que manda tirar os não-indios das áreas indígenas. Certamente o senhor sabe quais são os participantes do GTI, composto de representantes governamentais e não-governamentais, mas faço questão de citá-los para mostrar a seriedade do Grupo e registrar meu orgulho em poder participar dele neste trabalho tão nobre. São membros do GTI, coordenado pela FUNAI, Regional Gurupi: O Ministério Público; representantes dos três estados que margeam a Ilha (Mato Grosso, Goiás e Tocantins); representantes das prefeituras de todos os municípios que fazem divisa com a Ilha; INCRA; IBAMA; GAIA; CIMI; CPT; FETAET; as Prelazias de São Félix do Araguaia e de Cristalândia; e, desde a sua criação em 1994, o Centro de Direitos Humanos de Cristalândia. Recentemente temos tido também a participação da Procuradoria Federal, Regional de Palmas.

 

A meta do GTI, desde o início, tem sido a de promover uma JUSTA E PACÍFICA desocupação da Ilha, conseguindo indenização adequada por todas as benfeitorias feitas na Ilha por todos aqueles obrigados a sairem dela, e, também, terras com características iguais às da Ilha, para o assentamento dos lavradores desocupantes. Apesar de muitos obstáculos e inúmeras manobras sujas por parte dos políticos e ricos e poderosos pecuaristas, no final de 1995 e início de 1996, tínhamos certeza de que iríamos conseguir nossa meta, que acabei de citar. O INCRA adquiriu a área, "Capão do Côco" e assegurou o crédito FOMENTO e Alimentação; uma estrada de acesso e para escoamento; construção de uma Agrovila com (futuramente) escola, posto de saúde, etc.; demarcação dos lotes e título legal dos mesmos; e assim por diante, tudo mediante um sério e eficiente cadastramento das famílias que têm direito ao assentamento. A FUNAI garantiu indenização das benfeitorias mesmo dos grandes pecuaristas que são obrigados a tirar seu gado da área indígena. E nós do GTI, divulgamos a feliz notícia, até no exterior, de que estávamos conseguindo, provavelmente, A ÚNICA DESOCUPAÇÃO PACÍFICA NO MUNDO de uma área indígena!

 

Sendo que apenas uma parte do dinheiro das indenizações foi liberad pela FUNAI (R$665.000,00 -- seiscentos sessenta e cinco mil reais, restando R$900.000,00 novecentos mil reais) somente no final de 1995 e isso no tempo das chuvas (durante as quais, devido as inundações, o trânsito fica impossibilitado), por isso só foi possível indenizar 331 das 411 famílias cadastradas para o Assentamento. Agora, no tempo da seca, é URGENTÍSSIMO antes das chuvas, recomeçar as indenizações, sem as quais é impossível retirar as famílias cadastradas.

  

Inclusive, numa reunião no dia 20 de junho na Procuradoria da República no Estado do Tocantins, em Palmas, com a participação do Dr. Carlos Vilhena, Procurador Regional, FUNAI (Nacional e Regional) e vários membros do CTI, o Dr. Wagner Sena, Chefe DPJ/FUNAI, "em nome do Presidente da FUNAI" comprometeu-se com a liberação dos R$900.000,00 (novecentos mil reais) ATÉ O DIA 30 DE JUNHO -- o que NÃO OCORREU ATÉ ESTA DATA! Sem indenizações, os lavradores não saem da Ilha, e isso traz duas preocupações gravíssimas: 1) Se não sairem antes das chuvas, sairão somente o ano que vem. 2) Já temos notícias de "invasões" no Assentamento Capão do Côco por famílias NÃO CADASTRADAS pelo INCRA.! Além do mais, os políticos da região -- que não conformam com perder mais de 400 famílias de eleitores (mudam da Ilha onde votavam no município de Formoso do Araguaia, para o Assentamento Capão do Côco, município de Lagoa da Confusão), e os grandes pecuaristas que colocavam de graça mais de 100.000 cabeças de gado -- estão espalhando a mentira de que foi concedido mais um prazo de 5 a 7 anos para a retirada dos lavradores. A falta dos restantes R$900.000,00 põe em perigo todo o processo: conflitos dos lavradores com os índios (que finalmente começaram a acreditar na desocupação); invasão dos lotes destinados aos desocupantes da Ilha (que ainda não receberam as indenizações -- e quando sairem vão brigar com os "invasores" ou não terão onde ir); descrédito, por parte de todos, da FUNAI, do INCRA, do GTI; continuidade da devastação da Ilha, principalmente por parte dos grandes pecuaristas e dos turistas (queimadas, devastação da flora e fauna; desequilíbrio ecológico; caça e pesca predatórias; etc); doença, fome, morte, perda da cultura, etc. por parte dos índios....

  Portanto, senhor Presidente, peço encarecidamente, pelo amor de Deus, faça tudo para liberar o restante do recurso financeiro (R$900.000,00) para concluir o processo de indenização das famílias obrigadas a desocuparem a Ilha do Bananal -- o que foi prometido, EM NOME DO SENHOR, por Dr. Wagner Sena, para acontecer até o DIA 30 DE JUNHO, PRÓXIMO PASSADO, mas que até esta data não aconteceu!

 

Atenciosamente,

+Heriberto Hermes, O.S.B.

Bispo da Prelazia de Cristalândia

Bispo Acompanhante da CPT Araguaia-Tocantins

Coordenador do Centro de Direitos Humanos de Cristalândia (filiado ao Movimento Nacional de Direitos Humanos)

 

Dr. Júlio Marcos Germany Gaiger

DD. Presidente da FUNAI

Brasília-DF

 

Volta Menu