Coleção Memória das Lutas Populares no RN
Coleção Memória Histórica

Juliano Homem de Siqueira - Volume VIII

Juliano Siqueira: nos tempos do Cine Clube Tirol
Antônio Capistrano

Conheci Juliano Siqueira no inicio dos anos sessenta. Período de muita efervescência política e cultural no nosso país, e aqui no Rio Grande do Norte não era diferente. A classe trabalhadora, do campo e da cidade, se mobilizava, era a criação dos sindicatos rurais e o fortalecimento dos sindicados dos trabalhadores urbanos. A UNE funcionava como o grande elo da juventude com a sociedade brasileira, os seus Centros de Cultura Popular (CPC’s) concretizavam essa parceria.

O CPC, aqui em Natal, dirigido por Hélio Vasconcelos, tinha uma ligação muito estreita com as ações culturais do prefeito Djalma Maranhão. Na administração popular do prefeito Maranhão educação e cultura andavam de mãos entrelaçadas em intensos programas populares, tais como “De Pé No Chão Também Se Aprende a Ler” e o “Programa Cultura na Praça”.

Em abril de 1964, o golpe militar interrompeu o processo de mobilização e conscientização da sociedade brasileira que, naquele momento, se organizava e avançava nas lutas por um Brasil independente. Golpe coordenado pelas forças mais retrogradas da nossa sociedade, gosto de afirmar que o golpe de 1964 foi resultado muito mais dos nossos acertos do que dos nossos erros. O governo brasileiro avançava nas reformas de base, a nossa política externa era independente, alinhada ao movimento terceiro mundista, buscava uma aproximação com a China e a União Soviética, posicionando-se contra o bloqueio econômico a Cuba. Portanto, desagradava aos interesses norte-americanos e à elite brasileira.

A juventude participava intensamente da vida politica e cultural do Estado, alguns jovens ligados ao Partidão (PCB) e outra parte à Ação Popular (AP), ligada à Igreja. Já dizia Maria Conceição Pinto de Góes, “eram cristãos e comunistas na construção da utopia”.

Juliano fazia parte de um grupo de jovens que brilhava no PCB. Eram jovens inquietos que buscavam, com a sua luta, um mundo justo, um mundo socialista. Faziam parte desse grupo Juliano Siqueira, Luciano Almeida, Franklin Capistrano, Emanoel Bezerra, Laércio Arruda, Hermano Paiva, Gileno Guanabara, Manoel Vale, Pedro Vicente e tantos outros. Eram jovens marxistas que gostavam de ler e eram apaixonados pela sétima arte, quase todos faziam parte do Cine Clube Tirol, alguns fundadores.

Juliano, além de participar da diretória do Cine Clube Tirol, com a fundação da Federação Nordeste de Cine Clubes foi eleito vice-presidente, tendo Pedro Vicente na presidência, Carlos Cesar Medeiros como secretário e Francisco Giovanni Fernandes como tesoureiro, portanto, sendo a primeira diretória totalmente potiguar.

No Cine Clube tinha uma turma que gostava de futebol, a pelada era realizada na praia do Forte. Quase todos os sábados reuníamos em frente ao Cine Rex para pegarmos o ônibus com destino a Brasília Teimosa, de lá seguíamos para o local do jogo. O time foi se entrosando, e com pouco tempo já estávamos jogando contra outras equipes. Lembro-me bem de um jogo contra o time do Regimento de Obuses, lá em Santos Reis. O interessante é que a maioria dos jogadores era do Partidão, mesmo assim fomos lá jogar contra a equipe do Exército. O nosso time só tinha “craques”, Ivanez, Franklin Capistrano, eu, Palocha (Paulo Rocha), Valdeci, Fernando Pimenta, Hermano Paiva, Bené Chaves, Alderico Leandro, Rubinho, Falves, Gilbert Stabili, e como técnicos tínhamos dois especialistas em futebol, Dom Inácio Magalhães (O bispo de Taipu) e o jornalista e poeta Anchieta Fernandes.

Com o aguçamento do regime militar e a decretação do AI 5, alguns foram presos e outros caíram na clandestinidade. Nesse momento houve uma dispersão dentro do PCB e da AP, muitos saíram para luta armada passando a fazer parte das diversas organizações que enfrentaram a repressão através da ação armada. Quem ficou no Partidão fez opção pela luta política. Juliano, com sua verve revolucionária, não esperou acontecer, fez a hora, foi para a luta armada, para a dura clandestinidade. Preso, torturado, Juliano não esmoreceu, não fraquejou, não perdeu a esperança revolucionária de um mundo justo e socialista. Juliano continua na luta, sem perder o ideal, fazendo lembrar aqui as palavras do filosofo Domenico Losuardo quando diz que “É natural que uma derrota de proporções históricas estimule uma posição de tipo religioso. Catastrófico seria, porém, obstinar-se em tal atitude. Se não quiserem condenar-se à subalternidade, aos comunistas impõe-se a reconquista da capacidade de pensar e de agir em termos políticos, até mesmo de uma politica sustentada por uma grande tensão ideal.”

Antônio Capistrano, como Juliano Siqueira e Oscar Niemeyer, é admirador de Stalin